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21 de dezembro de 2012

Confiar um no outro, essencial para um amor maduro




Amor implica depender, estar na mão da outra pessoa. Por isso, amar alguém que não nos transmite confiança é ser irresponsável para consigo mesmo.

Poucos são os casais que vivem em concórdia, num relacionamento que crie condições para que ambos cresçam emocional e intelectualmente. Mas, porque existem alguns casais que vivem em harmonia, devemos nos empenhar para também fazermos parte dessa minoria privilegiada. Hoje quero me dedicar a um aspecto essencial das boas relações amorosas que é o desenvolvimento da confiança recíproca. Amar implica depender, estar na mão de outra pessoa. Ela tem, mais do que ninguém, o poder de nos fazer sofrer. Basta querer nos magoar que conseguirá isso, com uma simples palavra ou gesto. Se quiser nos fazer sentir insegurança, não terá problema algum. Fica mais do que evidente que, quando uma pessoa ama alguém que não se empenha em despertar a sensação de confiança e de lealdade, ela irá padecer muito. Irá se sentir permanentemente ameaçada, terá ciúme de tudo e de todos. Amar alguém que não nos passa confiança é, pois, uma irresponsabilidade para consigo mesmo. É uma ousadia, uma ingenuidade e uma grande demonstração de imaturidade emocional - ou sinal de que se tem satisfação com o sofrimento.

Em geral as pessoas se colocam nessa condição em virtude de terem se encantado com alguém que, de fato, não dá sinais de confiabilidade. Aceitam essa atitude egoísta do amado imaginando que seja uma fase, um período doloroso que irá passar com o tempo. Fazem tudo para demonstrar o seu amor, para cativar o outro e esperam que isso faça com que, finalmente, ele se renda, e também se entregue de corpo e alma à relação afetiva. Acaba se compondo uma espécie de desafio, em que aquele que não é confiável percebe que recebe mais atenções e carinho exatamente por agir dessa forma. Com isso se perpetua a situação e me parece bobagem achar que o futuro será diferente do presente. Afinal de contas, aquele que não se entrega ao amor, acaba sendo altamente recompensado por isso e não terá nenhuma tendência para alterar sua atitude.

Quando a mágica do encantamento amoroso não vem acompanhada da mágica da confiança, a pessoa está posta numa situação muito difícil, na qual o sofrimento e insegurança serão as emoções mais constantes. E essa mágica da confiança de onde vem? De vários fatores, sendo que o primeiro deles depende do comportamento da pessoa amada. Não é possível confiarmos numa pessoa que mente, a não ser que queiramos nos iludir e tentemos achar desculpas para não perder o encantamento por ela. Não é possível confiarmos em pessoas cujo comportamento não está de acordo com suas palavras e suas afirmações. Aliás, quando o discurso não combina com as atitudes, penso que devemos tomar essas últimas como expressão da verdadeira natureza da pessoa. Não é possível confiarmos em pessoas que mudam de opinião com a mesma velocidade com que mudamos de roupa. É evidente que todos nós, ao longo dos anos, atualizamos nossos pontos de vista. Porém, acreditar em certos conceitos num dia - na frente de certas pessoas - e defender conceitos opostos no outro - diante de outras pessoas - significa que não se tem opinião firme sobre nada e que se quer apenas estar de bem com todo mundo. Amar uma pessoa assim é, do ponto de vista da autopreservação, uma temeridade.

A capacidade de confiar depende também de como funciona o mundo interior daquele que ama e não apenas da forma de ser e de agir do amado. Não são raras as pessoas que não conseguem desenvolver a sensação de confiança em virtude de uma autoestima muito baixa. Desconfiam da capacidade que têm de despertar e conservar o amor da outra pessoa; se sentem inseguras, acham que a qualquer momento podem ser trocadas por criaturas mais atraentes e ricas de encantos. E, o que é mais grave, se sentem assim mesmo quando recebem sinais constantes, coerentes e persistentes de lealdade por parte da pessoa amada. Nesses casos, não há o que essa criatura possa fazer para atenuar o desconforto daquelas, cuja única saída é um sério mergulho interior em busca de resgatar a autoestima e a autoconfiança perdidas em algum lugar do passado.

Finalmente, para uma pessoa desenvolver a capacidade de confiar é necessário que ela seja uma criatura confiável. Costumamos avaliar as outras pessoas tomando por base nossa própria maneira de ser. Se nos sabemos mentirosos, capazes de deslealdade e de desrespeito aos outros, como ter certeza de que as outras pessoas não farão o mesmo conosco? Só aquele que tem firmeza interior, que tem confiança em si mesmo no sentido de respeitar as regras de conduta nas quais acredita, pode imaginar que existam pessoas em condições de agir da mesma forma. Se a felicidade sentimental depende do estabelecimento da confiança recíproca, ela será, pois, um privilégio das pessoas íntegras e de caráter.


Flávio Gikovate



26 de novembro de 2012

Pressões sociais e liberdade individual




Acredito que possa ser de enorme valia dissecar certas peculiaridades das relações interpessoais e suas correlações com a questão da liberdade do ser humano. Apesar de já ter sido enfático na afirmação de que o prazer derivado da coerência entre os conceitos e a conduta - é assim que defino a liberdade - está na dependência da maturidade individual, não se pode subestimar o caráter pernicioso das pressões do meio. É preciso uma grande força interior para ter condições de não ceder às repressões externas; se o meio social fosse menos homogeneizador, sem dúvida alguma mais pessoas teriam mais força para buscar um modo de ser coerente com suas convicções.

Fica claro também que os esquemas econômicos e políticos repressivos - e que sempre estão a serviço de trazer benefícios materiais exagerados a um pequeno grupo - têm um maior interesse na imaturidade e consequente fraqueza emocional das pessoas; é evidente que, nessas condições, elas ficam totalmente submetidas às ordens do meio, por não terem forças para suportar qualquer tipo de dor derivada das críticas e maledicências. E estas pessoas mais inseguras também atuam de um modo repressor em relação às outras pessoas.

Um exemplo, bem característico do que costuma acontecer no seio da família, poderá nos esclarecer bem. Um pai ou uma mãe inseguros se comportam exatamente conforme as normas de uma dada sociedade; se sentem profundamente infelizes e frustrados com suas vidas, sendo capazes de se perceber como covardes - ao menos consigo mesmos - por não terem dado às suas vidas uma direção diferente. Temem o julgamento dos vizinhos, dos parentes e amigos e acham isto abominável. Porém, se tiverem um filho que, na adolescência, tende para condutas extravagantes e pouco convencionais, imediatamente se transformam nos repressores dele. Temem, por ele, represálias que eles, pais, seriam incapazes de suportar; temem também as críticas diretas relativas ao seu modo de educar os filhos; e, principalmente, agem de modo repressivo por causa da inveja, que é um impulso agressivo derivado da admiração.

Os esquemas repressivos podem ser diretos - autoritários - ou mais sutis. Os esquemas autoritários são de natureza primitiva, tanto através do exercício do poder efetivo que uma pessoa tenha sobre a outra (o pai pode impedir um filho de sair de casa, suprimir sua mesada etc.), como através da subtração das manifestações de afeto (ficar sem falar com um filho, mostrar-se indiferente e decepcionado etc.).

Os esquemas sutis são de natureza mais intelectualizada, tendo, por isso mesmo, uma aparência racional e lógica. O mais em voga tem a ver com o uso que muitas pessoas fazem das interpretações psicológicas. O modo como o conhecimento da subjetividade humana foi difundido pelos meios de comunicação em massa guarda apenas uma pálida semelhança com a grandeza do pensamento, sério e refinado, do grande nome e iniciador da psicologia como ciência, que foi Freud. Estabelecem-se rápidas e fáceis correlações entre os comportamentos atuais e eventuais experiências "traumáticas" do passado, todas elas com a finalidade de desqualificar a racionalidade da conduta afetiva.

Assim, se os jovens se opõem aos padrões convencionais de sua família, isso será porque teve uma forte carência afetiva na infância e está agora apenas querendo chamar a atenção e atenuar suas frustrações afetivas. Será que as coisas são mesmo assim? Será que se opor a padrões oficiais - mesmo quando seus seguidores não estão satisfeitos e se percebem como frustrados e covardes - é apenas uma manifestação de inadequação psicológica? Não será um esforço sincero no sentido de buscar uma solução individual mais satisfatória, ao menos como ingrediente fundamental?


Flávio Gikovate
 
 

29 de agosto de 2012

Preconceitos resistem ao tempo




O vislumbrar de perspectivas otimistas para a condição humana - uma vida cheia de alegrias, gratificações, essencialmente derivada de relações humanas ricas e desinteressadas - costuma levar a maioria das pessoas para a busca apressada deste objetivo sem que levem a sério os obstáculos e dificuldades a serem ultrapassados. É como interpreto hoje os fatos acontecidos nos anos 60: de repente as pessoas pensaram - especialmente os jovens - que bastava mudar o tipo de roupa, modificar o corte dos cabelos, usar sandálias para que se fizesse a revolução psicológica e de costumes que já podia ser prenunciada. Acredito que aqueles que não se aperceberem da existência de uma longa caminhada, de um profundo mergulho em si mesmo, cairão de novo no abismo da desesperança, das drogas e do consumismo conservador (e não foi isso que se deu nos anos 70?).

Quando as experiências libertárias não dão certo, isto significa que somos capazes de gerar ideias com muita rapidez e facilidade, mas que em geral não temos estrutura interior para viver segundo elas. Forçamo-nos a isto, nos desequilibramos, caímos, nos machucamos e concluímos que as ideias estavam erradas; na verdade, acho que a conclusão deveria ser outra: ainda não estamos prontos e maduros para viver de outro modo, para nos soltarmos das amarras que nos limitam mas também que nos protegem, nos dão sensação de aconchego e segurança. Não se pode tentar atalho para se chegar mais depressa ao que se pretende; há que percorrer toda a trajetória, sofrida e cheia de desesperos para se atingir uma estabilidade íntima. Senão, mais uma vez chegaremos apenas ao falso brilhante, à imitação.

Assim, se nos fixarmos numa das questões mais essenciais da liberdade que é o do respeito pelo modo de ser e de pensar do outro, vemos que esta coisa extremamente simples e óbvia nunca chegou a existir como fato. E isto não apenas como postura das classes dominantes, conservadoras e que tentam preservar seus privilégios. Todos os grupos minoritários agem da mesma forma: se consideram donos da verdade, superiores; têm um desprezo visceral pelos que pensam de modo diferente e tratam de impor suas ideias tanto através das palavras como mesmo pela força. Grupos religiosos diferentes já fizeram longas e sangrentas guerras para fazerem prevalecer suas opiniões e verdades. Ideologias políticas também se exerceram desta forma. E, isto é o mais incrível, os jovens libertários dos anos 60 ostentavam enorme desprezo pelos caretas; quem não fosse iniciado nas luzes advindas do uso da maconha - e depois do LSD - era tão desprezado e desinteressante que nem mesmo valia a pena trocar algumas palavras.

Os ateus acham imbecis os que acreditam em Deus; os crentes têm pena dos ateus - e a pena é outra forma de manifestação de desprezo; é sentimento de cima para baixo, de rico para pobre. Os homossexuais sãos os entendidos e os heterossexuais são, para eles, meio primários; os heterossexuais acham a homossexualidade abominável, uma perversão. O limite desta prepotência permanente e assim grotesca constitui a essência dos preconceitos e do fanático nacionalismo. Assim, os negros são uma raça inferior, os judeus perigosos e avarentos, os argentinos grosseiros e mal-educados...

Aí a gente vai conversar individualmente com as pessoas e todos se consideram criaturas de mente aberta, cheias de bom senso e compreensão, capazes de se ater a novos conceitos, sempre dispostos a rever suas posições. Até parece uma brincadeira e seria engraçado se não fosse extremamente grave, pois no meio deste discurso liberal sempre aparecem frases como: isto eu não admito, não sou racista, mas os turcos... não posso nem pensar em meu filho parar de estudar, etc. Parece-me fundamental aprofundar mais estas observações, ainda que a repetição de conceitos seja meio exaustiva e chata.

Flavio Gikovate
 

27 de agosto de 2012

Os opostos se atraem, mas não se entendem




É voz corrente, que nos relacionamentos afetivos, os opostos se atraem. Diante do fato, a gente se posiciona de forma curiosa: como sempre ouvimos falar disso, consideramos a afirmação absolutamente verdadeira. Não duvidar de sua lógica parece nos conduzir a um porto seguro e acabamos acreditando que o fenômeno é inevitável.

Por acaso alguém já se questionou a respeito? Afinal de contas por que os opostos se atraem? Trata-se de uma fatalidade, de uma lei da natureza que nos leva a bons resultados? Acho muito importante assumir uma atitude crítica e de reflexão em torno dos problemas do amor, pois é a emoção que mais dor e sofrimento nos tem causado. São raras as pessoas realmente felizes e realizadas nessa área. Devem existir muitos erros e ignorância em relação ao amor. Aliás, é só de algumas décadas para cá que os profissionais de psicologia – e, ainda hoje, poucos entre eles – começaram a se interessar pelo assunto, até então reservado aos poetas.

Gostaria de externar de modo categórico a minha opinião, fundamentada em muitos anos de experiência como psicoterapeuta: os opostos se atraem, mas nem por isso combinam bem. O resultado desse tipo de união não é obrigatoriamente um sucesso. Pessoas muito diferentes vivem brigando e se irritando uma com as outras. Temperamentos e gostos antagônicos dificultam a vida em comum. Durante o período de namoro, os obstáculos existem, mas não são tão importantes, uma vez que são raras as coisas práticas compartilhadas. Após o casamento, porém, as divergências infernizam o cotidiano. Como encaminhar a educação dos filhos se os pontos de vista são tão diferentes? Como planejar a economia doméstica, a ordem dentro de casa, as viagens de férias?

Na prática, ocorre o seguinte: os opostos se atraem, mas na rotina da vida em comum as contradições se acirram. Começa então a tarefa de cada um tentar modificar o outro. O marido quer moldar a mulher de acordo com o seu modo de ser; a mulher deseja que o marido a compreenda e se aproxime dos seus pontos de vista. Será que isso é possível? Não deveriam diminuir as diferenças com o convívio? Deveriam, mas não diminuem, talvez por causa do medo de ver o encantamento amoroso desaparecer. Sim, porque afinal de contas os namorados se sentiram atraídos exatamente por serem polos opostos. Se ficarem parecidos, não acabará o amor? Os casais convivem por anos, sempre se desentendendo, sempre procurando fazer do outro um semelhante e só conseguem agravar as diferenças e piorar as brigas.

Não deixa de ser ironia que a gente se sinta fascinado por pessoas com as quais não teremos um bom convívio. Esse fenômeno é responsável por um enorme número de uniões infelizes e que, hoje, acabam em divórcio. Cabe indagar: a atração por opostos é inevitável? Acho que não, apesar de ser muito comum, especialmente na adolescência. Considero fundamental entendermos as razões que levam a esse tipo de encantamento. Conhecendo-as, poderemos evitar o erro e nossas chances de sucesso no amor aumentarão bastante.

A principal causa do magnetismo entre opostos é, sem dúvida alguma, a falta ou diminuição da autoestima. Quando não estou satisfeita com o meu modo de ser, procurarei alguém que seja completamente diverso. Se eu for introvertido e tímido, a tendência será me apaixonar por uma pessoa extrovertida e sem inibição. Com o tempo, o que suscitava minha admiração e era uma qualidade se tornará fonte de irritação, mas no início ficarei encantado. Ao ter o outro, tenho a extroversão que me faltava. Sinto-me mais completo. Tudo muito lógico na teoria. Na prática, as diferenças nos desagradam, dificultam nossas vidas, criam barreiras e resistências cada vez maiores. Elas são responsáveis pelos atritos constantes e pelas brigas normais entre marido e mulher. Será que são mesmo normais?


Flávio Gikovate



6 de julho de 2012

Alguns modos de ser das mulheres



Estou consciente das dificuldades e da magnitude do desafio de escrever sobre a questão feminina. Temos que ir adiante e buscar explicações e afirmações que ultrapassem os limites do pensamento tradicional. Não adianta dizer e pensar que as mulheres querem mesmo é romance e que os homens querem só dinheiro, poder e sexo. Não há vilões e vítimas nesta história e a maioria das pessoas age de acordo com o que aprendeu e não obrigatoriamente de acordo com suas convicções ou objetivos. 

A verdade é que existem dois grandes grupos de mulheres: as que se apresentam socialmente de forma recatada; e aquelas que se colocam de forma exibicionista, tratando de atiçar o desejo masculino. Não saberia dizer qual a porcentagem de cada um destes grupos, mas é provável que entre as mais belas predominem as do segundo grupo e que muitas das mais recatadas ajam assim por estarem convencidas de que não serão capazes de provocar o desejo masculino. 

Entre as que se colocam de forma recatada existem as que aprenderam a se colocar desta forma por quererem ser vistas como moças sérias e que só estão mesmo interessadas em compromissos sérios. Elas mantêm uma certa ingenuidade em relação ao poder sensual feminino. São poucas e muitos homens pensam que as mulheres em geral desconhecem o poder que elas têm de despertar o desejo masculino. Outras, também recatadas, sabem muito bem que são dotadas deste poder, mas consideram imoral ou perigoso exercê-lo. Imoral, porque não acham legítimo provocar o desejo e depois não terem o menor interesse em satisfazê-lo. Perigoso, porque poderão ser objeto do assédio ativo de alguns homens contra os quais se acham indefesas. A maior parte das mulheres recatadas é moralmente bem constituída e parece não estar disposta a se beneficiar de uma vantagem que tem, mas que não fez nada para merecer. 

As mais exibidas também são de dois grupos: as que usam e abusam do poder sensual que têm; e as que sabem do poder, gostam da gratificação à vaidade que o exibicionismo determina, mas, apesar disso, não estão interessadas em fazer um uso malévolo dele. As primeiras deste grupo correspondem às mulheres egoístas, aquelas que abriram mão do prazer erótico e transformaram sua sensualidade em arma de dominação e de extrair vantagens nas relações com eles. Pode ser que usem o discurso romântico, podem dizer que estão atrás de um grande amor, podem dizer o que quiserem. A verdade é que são mulheres poderosas e que estão querendo negociar este poder por dinheiro. Isso de forma direta ou indireta. Estão mesmo é atrás de homens poderosos e ricos, a quem pretendem subjugar e extrair vantagens de todo o tipo. Os homens que aceitam conviver com estas mulheres o fazem por vaidade, pelo fato de se sentirem muito bem socialmente ao lado de beldades cobiçadas por tantos outros. 

As que gostam de se exibir, mas procuram mesmo um relacionamento de qualidade, que têm caráter e estão em busca de relacionamentos estáveis, vivem uma condição complicada e dramática. Os homens são atraídos por elas, mas muitas vezes têm medo de se aproximar. Os que se aproximam costumam ser os mais cafajestes, mais caras-de-pau. Estes são os que só estão atrás de intimidades eróticas. Elas querem romance, transmitem uma imagem de que querem sexo, atraem todos os homens e só os mais ousados conseguem chegar nelas. Não costumam encontrar os relacionamentos amorosos que pretendem e acusam os homens de serem “todos” iguais, de só quererem sexo etc... Nada disso é verdade. Existem tantos homens que querem relacionamentos intensos e de qualidade sentimental quanto mulheres. As generalizações são ruins. Os homens não entendem as mulheres, não sabem como decodificá-las. Elas não são claras ao se colocarem socialmente, porque não sabem muito bem como lidar com sua sensualidade, que mesmo não sendo o objetivo final da maioria delas, é o que mais exibem. 

Não acho que as mulheres são todas iguais e nem que os homens sejam todos do mesmo tipo. Agora, penso que há mais tipos femininos e que muitas mulheres são confusas acerca do que querem para si. Os homens são sim mais simples e mais fáceis: querem se dar bem na vida tanto porque isso é bom para sua autoestima e para sua vaidade como porque este é o caminho para se sentirem com condições para terem acesso à mulher dos seus sonhos. À mulher, para os românticos; às mulheres para os mais eróticos. As mulheres são mais confusas também em relação a isso: querem carreira ou marido? Ou os dois? Querem carreira, marido e filhos? Dão conta disso? Querem marido e filhos e abrem mão da carreira? Acho que existem todos os tipos. Acho apenas que seria mais fácil se elas fossem mais explícitas quanto às suas pretensões. 

Flávio Gikovate

18 de junho de 2012

Sobre estar sozinho




Não é apenas o avanço tecnológico que marcou o inicio deste milênio. As relações afetivas também estão passando por profundas transformações e revolucionando o conceito de amor.

O que se busca hoje é uma relação compatível com os tempos modernos, na qual exista individualidade, respeito, alegria e prazer de estar junto, e não mais uma relação de dependência, em que um responsabiliza o outro pelo seu bem-estar.

A ideia de uma pessoa ser o remédio para nossa felicidade, que nasceu com o romantismo, está fadada a desaparecer neste início de século. O amor romântico parte da premissa de que somos uma fração e precisamos encontrar nossa outra metade para nos sentirmos completos. Muitas vezes ocorre até um processo de despersonalização que, historicamente, tem atingido mais a mulher. Ela abandona suas características, para se amalgamar ao projeto masculino. A teoria da ligação entre opostos também vem dessa raiz: o outro tem de saber fazer o que eu não sei.

Se sou manso, ele deve ser agressivo, e assim por diante. Uma ideia prática de sobrevivência, e pouco romântica, por sinal. A palavra de ordem deste século é parceria. Estamos trocando o amor de necessidade, pelo amor de desejo. Eu gosto e desejo a companhia, mas não preciso, o que é muito diferente.

Com o avanço tecnológico, que exige mais tempo individual, as pessoas estão perdendo o pavor de ficar sozinhas, e aprendendo a conviver melhor consigo mesmas. Elas estão começando a perceber que se sentem fração, mas são inteiras. O outro, com o qual se estabelece um elo, também se sente uma fração. Não é príncipe ou salvador de coisa nenhuma. É apenas um companheiro de viagem.

O homem é um animal que vai mudando o mundo, e depois tem de ir se reciclando, para se adaptar ao mundo que fabricou. Estamos entrando na era da individualidade, o que não tem nada a ver com egoísmo. O egoísta não tem energia própria; ele se alimenta da energia que vem do outro, seja ela financeira ou moral. A nova forma de amor, ou mais amor, tem nova feição e significado. Visa a aproximação de dois inteiros, e não a união de duas metades. E ela só é possível para aqueles que conseguirem trabalhar sua individualidade.

Quanto mais o indivíduo for competente para viver sozinho, mais preparado estará para uma boa relação afetiva. A solidão é boa, ficar sozinho não é vergonhoso. Ao contrário, dá dignidade à pessoa. As boas relações afetivas são ótimas, são muito parecidas com o ficar sozinho, ninguém exige nada de ninguém e ambos crescem. Relações de dominação e de concessões exageradas são coisas do século passado. Cada cérebro é único. Nosso modo de pensar e agir não serve de referência para avaliar ninguém.

Muitas vezes, pensamos que o outro é nossa alma gêmea e, na verdade, o que fizemos foi inventá-lo ao nosso gosto. Todas as pessoas deveriam ficar sozinhas de vez em quando, para estabelecer um diálogo interno e descobrir sua força pessoal.

Na solidão, o indivíduo entende que a harmonia e a paz de espírito só podem ser encontradas dentro dele mesmo, e não a partir do outro. Ao perceber isso, ele se torna menos crítico e mais compreensivo quanto às diferenças, respeitando a maneira de ser de cada um.

O amor de duas pessoas inteiras é bem mais saudável. Nesse tipo de ligação, há o aconchego, o prazer da companhia e o respeito pelo ser amado. Nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém, algumas vezes você tem de aprender a perdoar a si mesmo.


Flávio Gikovate 

15 de junho de 2012

Por que somos supersticiosos?


Quando dizemos para alguém que nossos negócios estão indo bem, imediatamente sentimos uma forte compulsão na direção de buscar algum pedaço de madeira para nela batermos 3 vezes. O mesmo vale ao dizermos que estamos felizes no novo relacionamento sentimental ou que estamos bem de saúde. Ao agirmos de acordo com este ritual temos a impressão que afastamos de nós as perigosas influências malignas da inveja das pessoas. É fato que nossa felicidade pode provocar inveja; o duvidoso é se ela tem mesmo poder de influência negativa sobre nós, bem como se o ritual de proteção será mesmo eficiente. Porém, porque acreditamos nesta possibilidade nos sentimos mais apaziguados ao realizá-lo.

As situações descritas acima nos mostram alguns dos aspectos essenciais do pensamento supersticioso: um deles consiste em nos sentirmos inseguros e ameaçados em determinadas situações, especialmente aquelas em que estamos felizes; construímos uma associação entre a prática de certos rituais e a diminuição dos riscos, de modo a nos sentirmos protegidos contra as adversidades. O outro tem a ver com o desejo de interferir sobre eventos que não dependem de nós, mas que queremos muito que tenham um resultado positivo; associamos, por um caminho nada lógico, sua concretização à presença de algum objeto, um adorno promovido à condição de talismã e cuja presença, no processo ritual que construímos em torno dele, aumentaria – e muito – as chances de obtermos o favor desejado.

Pessoas inteligentes, cultas e um tanto céticas também costumam desenvolver algum tipo de ritual. As que são muito voltadas para as práticas religiosas tendem a desenvolver seus rituais dentro deste contexto: as promessas se assemelham muito ao processo que estamos analisando, sendo que aqui se renuncia a algo do qual se gosta muito em favor da facilitação de um resultado que aparece como muito importante (abre-se mão do chocolate por um tempo longo em benefício da saúde de um filho, por exemplo). As novenas, as peregrinações, os jejuns e as orações em geral têm por objetivo agradecer graças recebidas, pedir proteção para o que se tem e também para que o futuro nos sorria.

Afinal de contas, por que tanto empenho? A verdade é que nossa condição enquanto humanos (e conscientes) é bastante complexa, pois estamos expostos à incerteza de forma continuada e lidamos muito mal com isso. Não suportamos o fato de estarmos em uma embarcação sujeita a ventos que não controlamos. Não sabemos nada do que é relevante acerca do nosso futuro e tentamos nos defender disso por todos os meios.

Buscamos defesas contra a incerteza que cerca os relacionamentos afetivos através de estratégias de controle sobre as pessoas que amamos. As mães de adolescentes tentam saber deles o tempo todo e impedir que todos os males lhes alcancem. Homens e mulheres tentam vigiar os passos de seus parceiros, sempre com medo de serem traídos ou abandonados.

Usamos boa parte de nossas possibilidades intelectuais com o objetivo de projetarmos um futuro de acordo com nossos melhores sonhos. Tentamos impedir que as doenças nos alcancem, de modo que nos submetemos a um estilo de vida que nem sempre é aquele que mais gostamos. Consultamos os médicos para exames periódicos com o intuito de detectar doenças precocemente e, com isso, ter o poder de interferir ao máximo sobre sua evolução. Tentamos acumular o máximo de dinheiro, sempre norteados pela ideia de sermos mais parecidos com as cigarras do que com as formigas: para que nada nos venha a faltar.

Ainda assim não nos sentimos seguros. Temos, em nosso íntimo, a sensação de que estes meios concretos são muito insuficientes; considero muito provável que isso seja verdadeiro, já que todos os exames médicos, por exemplo, apenas nos dizem de nossa condição até hoje e das probabilidades de estarmos bem nos próximos tempos. O mesmo vale para o dinheiro, que poderá ser perdido por alguma fatalidade. Do amor então, nem é bom falar...

Os mais céticos podem pensar que é pura insegurança buscar em forças maiores que a nossa, os reforços a favor de nossos interesses. A grande maioria das pessoas pressente a existência de forças não tão concretas a nos cercar. Buscam também nelas algum apoio tanto com o objetivo de se protegerem contra a inveja para que seus sonhos se realizem. É por essa via que entra o pensamento supersticioso, presente em quase todos nós. Pode não ser de grande valia, mas ações concretas para garantir um futuro melhor também não o são. Por mais que façamos, a incerteza sempre sairá vencedora.

Flávio Gikovate

10 de junho de 2012

Pensar, um ato sem censura


Quase todas as pessoas se assustam com certos pensamentos "proibidos" que afloram à mente de forma espontânea. Chegam a sonhar que mataram a própria mãe ou o irmão e acordam angustiadas. Não se confor­mam com o fato. Experimentam culpa, vergonha e não têm coragem de contar o sonho nem para os mais íntimos. Ocorre o mesmo quando, acordadas, reconhecem que não gostam de um filho, que não sentiriam a mínima falta do companheiro se ele morresse. Isso sem falar das fantasias sexuais extravagantes. É enorme o constrangimento causado por alguns desejos sadomasoquistas, de sexo promíscuo ou de natureza homossexual.

Na verdade, poucos se conformam com a existência de emoções passeando por nossas mentes sem ser convidadas. Gostaríamos de ter controle sobre o que pensamos, mas surgem desejos que não estão de acordo com a ordem moral. Aí, somos forçados a lutar contra eles. Tentamos ajustá-los, reprimi-los. Por esse caminho, o porão do inconsciente se torna depósito de tudo o que sentimos, mas queremos ocultar. Se uma pessoa gosta de se imaginar boa, seus defeitos continuarão a existir. A agressividade e a inveja irão se manifestar de forma camuflada, burlando a vigilância de nossa razão. As ideias que rechaçamos permanecem dentro de nós. Perdemos o domínio sobre elas quando não as aceitamos, ficando à mercê dos impulsos mais primitivos.

Não há a menor chance de só termos pensa­mentos e desejos que estejam de acordo com nossos valores éticos. Somos simultaneamente seres racionais, capazes de reflexões sutis e elaboradas, e animais (até certo ponto não domesticados). O mamífero que existe em nós reage brutalmente à agressão, mesmo quando possui convicções ligadas a idéias de tolerância e perdão. Temos desejos sexuais que transbordam os limites do amor e as normas estabeleci­das pela sociedade. Sabemos ser impossível criar uma ordem social estável, sem que haja regras para a nossa vida sexual. Essas regras distinguem os parceiros aceitáveis dos que devem ser evitados ou proibidos. É claro, porém, que os desejos não desaparecem apenas porque existem impedimentos externos. Talvez até aumentem.

O que acontece, então? Nosso mundo interior perde a serenidade. Passamos a viver conflitos permanentes entre desejos e possibilidade de ação. Queremos, por exemplo, determinados objetos que não nos pertencem, mas abafamos o impulso natural de nos apropriar deles, pois é preciso respeitar o código de valores morais criado pela nossa própria razão. Segundo esse código, apossar-se de bens alheios constitui roubo, uma transgressão sujeita a punições. Saber isso não nos impede de cobiçar determinado objeto. Não podemos, por exemplo, levar para casa o carro importado que estacionou na esquina. Mas como gostaríamos de ter um! Neste momento, talvez apareça a tentação de roubá-lo. É um crime pensar assim?

Acho que não. Para mim não existe "pecado por pensamento" e, se existisse, de nada adiantaria querer se emendar, pois muitas idéias surgem de surpresa, sendo inviável desfazer algo que já aconteceu. Não devemos acreditar que só nós, criaturas inferiores, temos pensamentos inaceitáveis. Se eles invadiram nossa mente é porque são próprios dos seres humanos. Em matéria de fantasias e desejos, ninguém se diferencia; é moral ou imoral. É uma pena que as pessoas não sejam sinceras e não reconheçam que até mesmo os homens e as mulheres mais abnegados têm impulsos homicidas, sede de vingança, sonhos eróticos de todo tipo.

Precisamos aproveitar o surgimento desses desejos para nos conhecer melhor. A inveja, por exemplo, nos fala a respeito das coisas que queremos possuir. Aí, surge a alternativa: agredir quem provocou o sentimento negativo ou nos esforçar para também atingir o objeto cobiçado. Nesse caso, a inveja vai nos ajudar a descobrir nossas aspirações.

Não concluam, porém, que tudo é permitido. Na transferência do pensamento para a ação, a cons­ciência moral se impõe, pois se trata de questões totalmente diferentes. Posso sonhar em matar um irmão, mas é óbvio que não posso matá-lo de fato. Posso desejar o que quiser em relação ao sexo, mas na hora de praticá-lo devo respeitar minhas convicções e as do parceiro. A liberdade interior é uma das nossas maiores aquisições psicológicas. Podemos e devemos saber tudo o que se passa dentro de nós. As ações, no entanto, sempre terão de ser limitadas por valores morais e levar em conta os direitos das outras pessoas.

Flávio Gikovate 

4 de abril de 2012

Querer é mesmo poder?




As pessoas mais persistentes acabam indo mais longe do que aquelas que ora querem uma coisa ora querem outra. Mas não basta ter um projeto em nossa mente para que ele se concretize. 

A afirmação “querer é poder” pressupõe a concepção de que a vontade da nossa razão é soberana. Ela admite que basta que nossa mente construa um projeto e passe a perseguir esta meta para que todo o resto do organismo a siga. Assim, as pessoas não alcançariam um determinado resultado, não porque o querer não seja suficiente, mas porque o querer delas não seria bastante forte. Não desprezo, em hipótese alguma, a eficiência da razão e a importância de se querer muito uma coisa ou uma situação, para que se tenha mais chance de chegar lá. Não desprezo também os chamados poderes paranormais da mente, de tal forma que é possível que o “querer muito” abra portas para que um determinado evento aconteça. 

Porém, acho fundamental fazermos algumas ressalvas a respeito desse assunto. A primeira delas é que não se deve incluir no “querer” coisas ou atitudes que dependam da vontade de outras pessoas. Por exemplo, posso querer muito ganhar num jogo de bingo domingo no clube. É possível até que a força da minha razão aumente as minhas chances de isto acontecer. Mas não acho que se possa querer muito que uma determinada moça – ou rapaz – passe a se interessar pela gente. Tenho todo o direito de tentar me aproximar das pessoas que despertam em mim a admiração e o interesse. Mas tenho o dever de respeitá-las, de modo que não me resta alternativa senão me afastar quando não encontro reações favoráveis à minha aproximação. Quando se trata dos direitos das outras pessoas, querer não é poder. Não posso dizer: “Tudo o que eu quero eu consigo” quando este “tudo” é um ser humano. 

Na realidade, as pessoas sempre tomam o cuidado de querer coisas até certo ponto possíveis. Caso contrário seria óbvio que querer não é poder. Querer ter um helicóptero está longe de adquiri-lo! Agora, as coisas materiais – e outras conquistas que não sejam as de seres humanos – nos chegam mais facilmente quando a queremos com fervor e persistência. Ou seja, as pessoas mais determinadas e que mudam menos de opinião, acabam indo mais longe que aquelas que ora querem uma coisa, ora querem outra. Esta última atitude, que é a mais comum, acaba por provocar uma dispersão de energia psíquica, de forma que é bem menos provável que se atinja resultados muito positivos. É o que se quer transmitir quando se fala da mula que ficou indecisa diante de dois montes de feno. Não sabendo qual dos dois comer, acabou morrendo de fome! 

A ressalva mais importante que eu queria fazer é a de que não são raras as situações nas quais se quer muito um determinado resultado, mas não se tem condições emocionais para sustentá-lo. Eu posso querer ser promovido rapidamente para a direção da empresa onde trabalho. Mas é preciso ver se tenho competência emocional para arcar com este grau de responsabilidade e de obrigações. É preciso ver se eu posso assumir o cargo que tanto quero. Se não estiver pronto para ele, isso poderá me pesar tanto que não será incomum que eu venha a ter, por exemplo, minha saúde arruinada. O indivíduo que está numa posição que “quer”, mas não “pode” sofre de insônia, dores de estômago, dores de cabeça fortíssimas, palpitações cardíacas, falta de ar e, em situações extremas, poderá até mesmo chegar a ter um infarto do miocárdio ou um derrame. Estar maduro para assumir uma determinada função significa ter a competência técnica necessária e também estar psicologicamente apto às responsabilidades e tensões próprias daquele cargo. 

Existe a possibilidade, portanto, de acontecer que a gente deseje muito uma coisa ou situação e ainda não possa ter ou estar nela. Nesses casos, querer definitivamente não é poder. Será necessário um grande trabalho interior para que se processe o desenvolvimento íntimo que criará as condições para o exercício daquilo que se quer. 

A situação mais importante em que isso costuma acontecer é no amor. Muitas pessoas encontram um par com o qual se identificam muito intensamente. Nesses casos, se desenvolve um encantamento amoroso de forte intensidade, coisa que é do enorme agrado da razão. As pessoas assim, apaixonadas, querem muito ficar o tempo todo umas com as outras. Mas começam a ter várias reações emocionais que denunciam que ainda não são competentes para a realização do seu desejo amoroso. Começam a ficar com muito medo de que alguma coisa ruim irá acontecer. Começam a ter ciúmes desproporcionais aos riscos. Começam a procurar pelo em casca de ovo, ou seja, pretextos menores para justificar a falta de coragem para ficar juntas. Perdem o sono e o apetite, ficam muito nervosas, não pensam em outra coisa, ficam completamente obcecadas pelo assunto e não conseguem se decidir por coisa alguma. 

Esses dados indicam que ainda não estão emocionalmente preparadas para uma relação amorosa de grande intensidade. Terão que andar mais devagar e ir se acostumando aos poucos com a nova situação, de modo a um dia estarem em condições de “poder” agir conforme seu “querer”. 



Flavio Gikovate



12 de agosto de 2011

O amor como meio, não como fim




É hora de substituir o ideal romântico do amor que basta em si mesmo (por isso não dura) por uma relação que traga crescimento individual.

Há algo de errado na forma como temos vivido nossas relações amorosas. Isso é fácil de ser constatado, pois temos sofrido muito por amor. Se o que anda bem tem que nos fazer felizes, o sofrimento só pode significar que estamos numa rota equivocada.

Desde crianças, aprendemos que o amor não deve ser objeto de reflexão e de entendimento racional; que deve ser apenas vivenciado, como uma mágica fascinante que nos faz sentir completos e aconchegados quando estamos ao lado daquela pessoa que se tornou única e especial. Aprendemos que a mágica do amor não pode ser perturbada pela razão, que devemos evitar esse tipo de contaminação para podermos usufruir integralmente as delícias dessa emoção – só que não tem dado certo. Vamos tentar, então, o caminho inverso: vamos pensar sobre o tema com sinceridade e coragem. Conclusões novas, quem sabe, nos tragam melhores resultados.

Vamos nos deter em apenas uma das ideias que governam nossa visão do amor. Imaginamos sempre que um bom vínculo afetivo significa o fim de todos os nossos problemas. Nosso ideal romântico é assim: duas pessoas se encontram, se encantam uma com a outra, compõem um forte elo, de grande dependência, sentem-se preenchidas e completas e sonham em largar tudo o que fazem para se refugiar em algum oásis e viver inteiramente uma para a outra usufruindo o aconchego de ter achado sua metade da laranja. Nada parece lhes faltar. Tudo o que antes valorizavam – dinheiro, aparência física, trabalho, posição social etc. – parece não ter mais a menor importância. Tudo o que não diz respeito ao amor se transforma em banalidade, algo supérfluo que agora pode ser descartado sem o menor problema.

Sabemos que quem quis levar essas fantasias para a vida prática se deu mal. Com o passar do tempo, percebe-se que uma vida reclusa, sem novos estímulos, somente voltada para a relação amorosa, muito depressa se torna tediosa e desinteressante. Podemos sonhar com o paraíso perdido ou com a volta ao útero, mas não podemos fugir ao fato de que estamos habituados a viver com certos riscos, certos desafios. Sabemos que eles nos deixam em alerta e intrigados; que nos fazem muito bem.

De certa forma, a realização do ideal romântico corresponde à negação da vida. Visto por esse ângulo, o amor é a antivida, pois em nome dele abandonamos tudo aquilo que até então era a nossa vida. No primeiro momento até podemos achar que estamos fazendo uma boa troca, mas rapidamente nos aborrecemos com o vazio deixado por essa renúncia à vida. A partir daí, começa a irritação com o ser amado, agora entendido como o causador do tédio, como uma pessoa pouco criativa e desinteressante. O resultado todos conhecemos: o casal rompe e cada um volta à sua vida anterior, levando consigo a impressão de ter falido em seus ideais de vida.

Os doentes acham que a saúde é tudo. Os pobres imaginam que o dinheiro lhes traria toda a felicidade sonhada. Os carentes – isto é, todos nós – acham que o amor é a mágica que dá significado à vida. O que nos falta aparece sempre idealizado, como o elixir da longa vida e da eterna felicidade.

Diariamente, porém, a realidade nos mostra que as coisas não são assim, e acho importante aprendermos com ela. Nossas concepções têm de se basear em fatos, nossos projetos têm que estar de acordo com aquilo que costuma dar certo no mundo real. Fantasias e sonhos, ao contrário, têm origem em processos psíquicos ligados à lembranças e frustrações do passado. É importante percebermos que o que poderia ser uma ótima solução aos seis meses de idade, como voltar ao útero materno, será ineficaz e intolerável aos 30 anos. A bicicleta que eu não tive aos 7 anos, por exemplo, não irá resolver nenhum dos meus problemas atuais. É preciso parar de sonhar com soluções que já não nos satisfazem a adaptar nossos sonhos à realidade da condição de vida adulta.

Se é verdade, então, que o amor nos enche de alegria, vitalidade e coragem – e isso ninguém contesta –, por que não direcionar essa nova energia para ativar ainda mais os projetos nos quais estamos empenhados? Quando amamos e nos sentimos amados por alguém que admiramos e valorizamos, nossa auto-estima cresce, nos sentimos dignos e fortes. Tornamo-nos ousados e capazes de tentar coisas novas, tanto em relação ao mundo exterior como na compreensão da nossa subjetividade. Em vez de ser um fim em si mesmo, o amor deveria funcionar como um meio para o aprimoramento individual, nos curando das frustrações do passado e nos impulsionando para o futuro. Casais que conseguem vivê-lo dessa maneira crescem e evoluem, e sob essa condição seu amor se renova e se revitaliza.



Flávio Gikovate



Pet Shop Boys - Always on my mind


24 de julho de 2011

Juventude: a utopia da onipotência




Para derrotar o medo, alguns jovens acreditam ser imunes a qualquer perigo. Vestem a couraça da onipotência e põem em risco seu futuro e sua vida. Até que um dia descobrem porque não são imortais.

A adolescência é uma fase extremamente difícil da vida. Talvez a mais difícil. Temos que nos comportar como adultos sem dispor de cacife para isso. Temos que ser fortes e independentes quando ainda nos sentimos inseguros e sem autonomia de vôo. Temos que mostrar autoconfiança sexual, mesmo sendo totalmente inexperientes. Temos que formar um juízo a nosso respeito - se possível positivo -, mas nos falta a vivência para aprofundar o autoconhecimento. Enfim, temos que ser ousados e corajosos, embora a cada passo surja o medo para nos inibir.

O que fazer? Frente a tantas incertezas, acabamos seguindo os modelos sugeridos pela própria cultura. Passamos a imitar nossos heróis, travestindo-nos de super-homens e de mulheres-maravilha. Assim, encobrimos nossas dúvidas e inseguranças. Elas que sejam reprimidas e enviadas para o porão do inconsciente. Nós seremos os fortes e destemidos, para nós nada de errado ou ruim irá acontecer. Construímos uma imagem de perfeição, de criaturas especiais, particularmente abençoadas pelos deuses. Resultado: sentimo-nos onipotentes e, a partir daí, não há coisa no mundo que possa nos aterrorizar, uma vez que estamos revestidos de proteções extraordinárias.

Este estado de graça irá perdurar por um tempo variável. É um período bastante complicado para as pessoas que convivem com o jovem, pois ele sabe tudo, faz tudo melhor, acha todo o mundo alienado e burro. Só ele é competente e sábio. No entanto, para o próprio jovem, a fase parece muito positiva. Ele, finalmente, se sente bem, forte, seguro e não tem medo de experimentar situações novas. Pode montar o cavalo mais selvagem com a certeza absoluta de que não cairá em hipótese alguma. Mais tarde, quando não for mais tão ousado e confiante, se lembrará dessa época da vida como a mais feliz. Afinal de contas, a sensação de euforia é sempre inesquecível.

Na verdade, ninguém teria nada contra a onipotência, se ela correspondesse à realidade. Porém, não é isso que os fatos nos ensinam. Sabemos que, entre os jovens, são exatamente os mais confiantes aqueles que se envolvem em todo tipo de acidentes graves, quando não fatais. São estes jovens que dirigem seus carros na estrada, durante a madrugada, com o pé na tábua. Não sentem medo porque é óbvio que os pneus não irão estourar e é lógico que não irão adormecer ao volante. São estes jovens que saem de uma festa e, alcoolizados, vão a toda a velocidade para a praia. Sua imortalidade só é desmentida por um acidente fatal. Aliás, para ser sincero, parece incrível que não ocorra um maior número de acidentes.

Alguns jovens, onipotentes e filhos diletos dos deuses, andam de motocicleta sem capacete. Desafiam a chuva e o asfalto molhado, depois de usarem tóxicos ou ingerir álcool. Fazem curvas superperigosas. Não se intimidam porque para eles nada de mal irá acontecer. E morrem ou ficam paralíticos, interrompendo vidas que poderiam ser ricas e fascinantes. Estes mesmos jovens utilizam drogas em doses elevadas porque se julgam imunes aos riscos da overdose e suas graves conseqüências. Chegam a compartilhar seringas, ao injetar tóxicos na veia, pois é claro que não terão AIDS. E, pela mesma razão, continuam a ter relações sexuais com parceiros desconhecidos, sem sequer tomar o cuidado de usar camisinha.

Aqueles que não morrem ou não ficam gravemente doentes, um dia acordam desse sonho em que flutuavam em estado de graça. Acordam porque lhes aconteceu algo: aquele acidente considerado impossível. Caíram do cavalo. Eles também são mortais! 
Então, tomam consciência de toda a insegurança e de toda a fragilidade que os levaram a construir a falsa armadura da onipotência. Ao se tornarem criaturas normais, sentem-se fracos. Antes era muito melhor. Sim, mas era tudo mentira. Agora, o mundo perdeu as cores vibrantes da fantasia. Vestiu os meios-tons da realidade. Eles não conseguiram domar o cavalo selvagem e foram derrubados no chão. Terão de aprender a cair e se levantar. Terão de aprender a respeitar mais os cavalos! Terão de saber que todas as doenças, todos os acidentes, todas as faltas de sorte poderão persegui-los. E - o que é mais importante - terão de enfrentar com serenidade a plena consciência de que são vulneráveis. Este é um dos ingredientes da maturidade: ter serenidade na viagem da vida, mesmo sabendo que tudo pode nos acontecer.


Flávio Gikovate


Marina Lima - Fullgas