Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

Mostrando postagens com marcador negritude. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador negritude. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, julho 25, 2011

TANTÃS (uma celebração)



Dionisos é negro e dança em transe,
Vertiginosa dança com seus mitos.
Escuto o som distante:

Tum dee dee dum!

Maracatumbam tambores:
Tum dee dee dum, dee dee dum!
Vozes líquidas vazam dos casebres
onde se dança à transmutação.

Abro a janela,
instante numinoso,
júbilo de concelebração:

Tum dee dee dum a um Pã universal!

Sem guante a africana gesta e um falo
fecunda intensamente a natureza.
Regaço, cosmos, mãe, força telúrica:
Deus é um útero,
um dentro, um aconchego.

E solto Dionisos dança negro,
abandonado à ondulação da vida,
vertiginosa dança com seus ritos:

Tum dee dee dum
com alegria cósmica,
voz de tambores, noite suburbana.
Sambarrebatamento nos barracos
e percutidos gritos ao Infinito!



***

****************************
Nota do editor: (em meados de 2009)

O motivo dessa reedição do poema Tantãs
é a total falta de espaço na mente para poetar.
Ando com a cabeça, o corpo e os membros
todos dedicados a pensar o projeto do
Lá estou eu a produzir um roteiro para um curta,
uma cartilha com a história do maracatu para as crianças,
um álbum iconográfico/documentado sobre as origens grupo,
uma grife afro para gerar renda extra,
e já planejando o carnaval 2010.
E tudo isso é a primeira vez que faço na vida.
Entenderam porque não tenho postado?
rsrsrs


Eurico


Poema publicado originalmente
no zine Eu-lírico n.º 4, Ano 1995,
em Edição comemorativa dos 300 anos de Zumbi


Fonte da imagem:
http://sol.sapo.pt/Storage/ng1012228.jpg

Resenha do processo criativo deste poema:
UM CRONIST'AMADOR
pelo poeta Carlinhos do Amparo

Em tempo:
e corrigindo um lapso da primeira publicação,
o poema é dedicado ao poeta e político senegalês,
Leopold Sedar Senghor (1906-2001)

****************************

No BG: Afrociberdelia - Côco Dub, Chico Science & Nação Zumbi

                             


                   

terça-feira, maio 26, 2009

Femme nue, femme noire... - um hino de Léopold Sédar Senghor




























Femme nue, femme noire
Vétue de ta couleur qui est vie,
de ta forme qui est beauté
J'ai grandi à ton ombre;
la douceur de tes mains bandait mes yeux
Et voilà qu'au coeur de l'Eté et de Midi,
Je te découvre, Terre promise,
du haut d'un haut col calciné
Et ta beauté me foudroie en plein coeur,
comme l'éclair d'un aigle

Femme nue, femme obscure
Fruit mûr à la chair ferme,
sombres extases du vin noir, bouche qui fais
lyrique ma bouche
Savane aux horizons purs,
savane qui frémis aux caresses ferventes du Vent d'Est
Tamtam sculpté,
tamtam tendu qui gronde sous les doigts du vainqueur
Ta voix grave de contralto est le chant spirituel de l'Aimée

Femme noire, femme obscure
Huile que ne ride nul souffle,
huile calme aux flancs de l'athlète, aux
flancs des princes du Mali
Gazelle aux attaches célestes,
les perles sont étoiles sur la nuit de ta peau.
Délices des jeux de l'Esprit,
les reflets de l'or ronge ta peau qui se moire
A l'ombre de ta chevelure,
s'éclaire mon angoisse aux soleils prochains
de tes yeux.

Femme nue, femme noire
Je chante ta beauté qui passe,
forme que je fixe dans l'Eternel
Avant que le destin jaloux
ne te réduise en cendres pour nourrir les
racines de la vie.


Extrait de
" Oeuvres Poétiques"
Le Seuil

************************************

Tradução de Leo Gonçalves


mulher nua, mulher negra
vestida de tua cor que é vida, de tua forma que é beleza!
eu cresci à tua sombra;
a doçura de tuas mãos vendava meus olhos.
e eis que no ventre do verão e do meio-dia,
eu te descubro, terra prometida,
do alto de um alto colo calcinado
e tua beleza me acerta em pleno peito,
como o relâmpago de uma águia.

mulher nua, mulher obscura
fruto maduro de carne firme,
sombrios êxtases do vinho negro,
boca que bota lírica a minha boca.
savana dos horizontes puros,
savana que freme às carícias quentes do vento leste
atabaque esculpido,
atabaque tenso que rosna sob os dedos do vencedor
tua voz grave de contralto é o cântico espiritual da amada.

mulher nua, mulher obscura
azeite que não crispa nenhum sopro,
azeite plácido nos flancos do atleta,
nos flancos dos príncipes do mali
gazela de laços celestes,
as pérolas são estrelas sobre a noite de tua pele
gozo de jogos espirituosos,
os reflexos do ouro rubro sobre tua pele que rebrilha
à sombra de teus cabelos, se esclarece minha angústia
aos sóis próximos de teus olhos.

mulher nua, mulher negra
eu canto tua beleza que passa,
forma que fixo no eterno
antes que o destino cioso
te reduza a cinzas para nutrir as raízes da vida.

*****************************

A tradução é de LEO GONÇALVES, na REVISTA RODA, Nº1.
O poema é do senegalês LÉOPOLD SÉDAR SENGHOR,
considerado o grande hino do continente africano.
Para ver o belo sítio de origem,
CLIQUE AQUI.
Fonte da tradução:
http://www.salamalandro.redezero.org/categoria/leopold-sedar-senghor/page/2/

domingo, maio 24, 2009

Tantãs - (uma celebração)






Dionisos é negro e dança em transe,
Vertiginosa dança com seus mitos.
Escuto o som distante:
Tum dee dee dum!
Maracatumbam tambores:
Tum dee dee dum, dee dee dum!
Vozes líquidas vazam dos casebres
onde se dança à transmutação.
Abro a janela,
instante numinoso,
júbilo de concelebração:
Tum dee dee dum a um Pã universal!
Sem guante a africana gesta e um falo
fecunda intensamente a natureza.
Regaço, cosmos, mãe, força telúrica:
Deus é um útero,
um dentro, um aconchego.
E solto Dionisos dança negro,
abandonado à ondulação da vida,
vertiginosa dança com seus ritos:
Tum dee dee dum
com alegria cósmica,
voz de tambores, noite suburbana.
Sambarrebatamento nos barracos
e percutidos gritos ao Infinito!



***


Eurico
Poema publicado originalmente
no zine Eu-lírico n.º 4, Ano 1995,
em Edição comemorativa dos 300 anos de Zumbi
Fonte da imagem:



****************************


Nota do editor:
O motivo dessa reedição do poema Tantãs
é a total falta de espaço na mente para poetar.
Ando com a cabeça, o corpo e os membros
todos dedicados a pensar o projeto do
Ponto de Cultura Almirante do Forte.
Lá estou eu a produzir um roteiro para um curta,
uma cartilha com a história do maracatu para as crianças,
um álbum iconográfico/documentado sobre as origens grupo,
uma grife afro para gerar renda extra,
e já planejando o carnaval 2010.
E tudo isso é a primeira vez que faço na vida.
Entenderam porque não tenho postado?
rsrsrs


Em tempo:
e corrigindo um lapso da primeira publicação,
o poema é dedicado ao poeta e político senegalês,
Leopold Sedar Senghor (1906-2001)
****************************

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Reflexões de Cinzas: Loas a João Cândido



Viver é sublevar-se!
Resistir quando tudo diz pra desistirmos.

Ser honesto
em meio à vilania.
Buscar justiça
em meio à tirania.
Erguer a fronte
contra o despotismo.


************************


João Cândido, o Almirante Negro,
vendedor de peixes na Praça 15- RJ, até morrer em 1969.

Sobreviver honradamente à miséria
é também uma forma de heroísmo.


*************************

Em 2010: 100 anos da Revolta da Chibata

**************************

domingo, fevereiro 22, 2009

Reflexões de Carnaval: um maracatu e seu nome















FOTOMONTAGEM ELETRÔNICA DE ADROALDO BAUER.


Corria o ano de 1931, e nos bastidores da política do Estado Novo era decidida a expulsão, pela polícia do Rio, de um francês: o escritor surrealista Benjamim Péret. Seu crime? Ter retomado em um livro chamado O Almirante Negro, a famosa revolta da chibata, numa abordagem que fazia um paralelo com o levante da esquadra russa na baía de Odessa, ocorrida em 1905, e que deu tema à ação do famoso filme de Eisenstein, O Encouraçado Potemkim.

A recriação e a análise que o francês Péret faz da revolta de 1910, ou seja, apenas 5 anos depois dos russos, e liderada por um marinheiro negro, que também se insurgia contra os castigos corporais na esquadra brasileira, provocam sua expulsão do país, em dezembro de 1931.
O livro de Péret era protagonizado por João Cândido Felisberto (1880-1969), cognominado de Almirante Negro, até pouco tempo, um dos nomes proibidos pela Marinha brasileira, sempre constrangida com o fato de um simples marinheiro ter assumido o comando da nossa esquadra, recém-chegada da Inglaterra, quando a sua oficialidade ainda estava aprendendo com os oficiais ingleses como manejá-la.
O paralelo com a revolta do Encouraçado Potemkim fez com que, em novembro de 1931, a edição inteira do livro fosse confiscada. Segundo Jean Puyade, professor e jornalista francês, somente quatro folhas do texto foram encontradas pelo pesquisador Dainis Karepovs e testemunham o vigor que deveria ter sido o conjunto da obra, cujo manuscrito estava pronto em setembro de 1931.

A coincidência desses fatos e datas com a fundação do
Maracatu Almirante do Forte, em 7 de setembro de 1931, me deixou deveras encafifado. Contaram-me que o nome desse maracatu deve-se ao nome de um navio de guerra atracado no porto do Recife, na Semana da Pátria, naquele ano de 1931. Sei não! Quase todo navio de nossa Marinha tem nome de Almirante Fulano de Tal. Mas, apenas Almirante...esquisito isso né?

Interessante ressaltar que, em setembro de 1931, era também fundado o primeiro partido político de negros no Brasil, a FNB, Frente Negra Brasileira. Apesar de que também eram anos de perseguição aos terreiros de candomblé, pelo Estado Novo.
Não é curioso que, com tantos fatos ligados à negritude acontecendo no Brasil, naquele ano, um maracatu escolhesse para seu nome de batismo enquanto nação africana, o nome de um simples navio?
O que tem um navio a ver com a história de um maracatu, a não ser a lembrança dos funestos navios-negreiros?
Deixo essa pergunta no ar.
E salve o Almirante Negro!!!
Pois, no meu íntimo, algo me diz que o povo negro que fundou o Almirante usou de um estratagema, comum à época da repressão, para driblar a polícia política do Estado Novo, dizendo que Almirante era o nome de um navio. Que nada! O Almirante verdadeiro deve ser o marinheiro negro João Cândido, que 21 anos antes da fundação do maracatu, manobrou, sozinho, a moderníssima esquadra atracada no Rio, num feito memorável e digno de nomear qualquer instituição afro-brasileira, inclusive um maracatu.
E, se estiver ao meu alcance, o Almirante do Forte, em breve, homenageará o notável Almirante Negro.


Fonte das informações:
Benjamin Péret: um surrealista no Brasil (1929-1931)
Jean Puyade (professor e jornalista francês, especializado em América Latina)
http://www.oolhodahistoria.ufba.br/artigos/benjamin-peret-surrealista-brasil-jean-puyade.pdf


Fontes auxiliares:
PÉRET, Benjamin. .A palavra a Péret. (Cidade do México, Novembro de 1942). In:
PÉRET, B.; GOMBROWICZ, Witold. Contra os poetas. Tradução, introdução e notas de Júlio Henriques. Lisboa, Antígona, 1989, p. 51.
www.oolhodahistoria.ufba.br - Edição Nº 8





Fonte do samba:

http://www.boemio.com.br/midivoice/nacionais/

*********************************************



P. S.: Abaixo transcrevo a letra original do samba, antes das alterações da censura em 1970:
Fonte:
http://www.cefetsp.br/edu/eso/patricia/revoltachibata.html


O Mestre Sala dos Mares
(João Bosco / Aldir Blanc)


Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo marinheiro
A quem a história não esqueceu
Conhecido como o almirante negro
Tinha a dignidade de um mestre sala
E ao navegar pelo mar com seu bloco de fragatas
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas
Rubras cascatas jorravam das costas
dos negros pelas pontas das chibatas
Inundando o coração de toda tripulação
Que a exemplo do marinheiro gritava então
Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias
Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais
Salve o almirante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais


************************

Veja no youtube:
A REVOLTA DA CHIBATA

*************************

sexta-feira, maio 09, 2008

Tantãs


Dionisos é negro e dança em transe,
Vertiginosa dança com seus mitos.
Escuto o som distante:
Tum dee dee dum!
Maracatumbam tambores:
Tum dee dee dum, dee dee dum!
Vozes líquidas vazam dos casebres
onde se dança à transmutação.
Abro a janela,
instante numinoso,
júbilo de concelebração:
Tum dee dee dum a um Pã universal!
Sem guante a africana gesta e um falo
fecunda intensamente a natureza.
Regaço, cosmos, mãe, força telúrica:
Deus é um útero, um dentro, um aconchego.
E solto Dionisos dança negro,
abandonado à ondulação da vida,
vertiginosa dança com seus ritos:
Tum dee dee dum com alegria cósmica,
voz de tambores, noite suburbana.
Sambarrebatamento nos barracos
e percutidos gritos ao Infinito!
***
Eurico
Poema publicado originalmente
no zine Eu-lírico n.º 4, Ano 1995,
em Edição comemorativa dos 300 anos de Zumbi
Fonte da imagem:

sábado, abril 26, 2008

Mel/a/nina

imagem Google

E
s
c
o
r
r
e
o mel
à flor da pele demerara, açúcar preto, mascavo
Mel
Melaço
Melado
Mel novo
Mel de engenho: terra roxa massapê terra de cana
caiena caiana cana de açúcar
moenda garapa tropicana
terra onde mana
mel ( e leite) e a sacarose morena
melíflua voz de veludo melosa
pele de mel demoiselle cubista
lábios de mel língua doce
lamber teu céu linda noite
caldo de cana caiena favos de mel
A tez de fruta mestiça malícia cajus compotas
Sapotis cristalizados
E toda a doçaria colonial
Água na boca
Desliza mel na língua
portuguesa e um gosto de infância
lembrança de um confeito chamado nego bom.
Noite na pele negra rara demerara
A lua açúcar céu amorenado mel
Enamorado
Melado
Doce na boca,
delícia
no tacho
de bronze,
desliza
na cuba
daqui e de Habana:
de niña/mujer;
de sinhá/menina.
de mel, melanina.
Tua noite nos ilumina...
********
Eurico
meados de 2000



sábado, março 29, 2008

Hagar


Agora, um mundo sem guante
e essa pele azul, diamante
sob o sol primevo:
Hagar é livre!
*
Bem sei que há fome,
e que esquálidas infantas
perambulam pelas estepes,
a fronte de ébano sob o sol.
Sei que há natimortos
e dor, muita dor.
Mas é livre Hagar !
*
E não há bem maior,
nem outro anelo,
mesmo entre abrolhos,
mesmo à deriva
maior que a vida,
é estar sem guantes,
é a liberdade
de andar à toa, pelas planícies,
levando a noite dentro da pele.
*
E Hagar é livre -
é livre, Hagar!
***
Eurico
Março 2008
(retomando a produção)
***
Poema dedicado a Jorge Rosmaninho
editor de Africanidades