Gostam de sitcoms?
Qual a vossa favorita?
Vi muitas enquanto crescia. A maioria americanas mas também bastantes inglesas. Eram o estilo de programa que não perdia porque faziam-me reflectir, rir e, no final, deixavam-me bem disposta. Descobre-se muito vendo sitcoms, em especial às que recorrem ao humor satírico para representar a sociedade e tecer críticas político-sociais. Assisti a contemporâneas, a grandes sucessos americanos e às clássicas ainda a preto e branco.
Contudo existe uma com que me delicio até hoje. Acho-a fenomenal. A rainha de todas pois cada episódio que calhe rever parece-me encaixar com a actualidade como uma peça de um puzzle. Este episódio que encontrei na net é um exemplo. O ano é 1972, mas bem que podia ser 2016. Olhem que podia!
Infelizmente o vídeo parece não permitir a activação das legendas.
Mas vou resumir o tema. Archie, o homem da casa, quer conseguir uma promoção no emprego mas sabe que esta não está ao seu alcance por não ter terminado o liceu. Decide então regressar à escola para conseguir o diploma que, no seu entender, o impede de ser considerado para ocupar o cargo. Está tão animado, com tanta vontade de melhorar de vida, de ser valorizado num cargo de maior responsabilidade... Lá consegue o seu diploma mas no final a vaga é preenchida pelo sobrinho do patrão.
Acham que isto podia acontecer hoje? (irony mode)
Para cúmulo o episódio termina com Archie a dizer: "Now I'm stuck with a highschool diploma!" Que é mais ou menos o equivalente ao que se diz na actualidade: Tirei um curso superior para nada :)
Pelo meio existe sempre a rotina familiar, a lida da casa, os lanches, jantares e almoços. E neste episódio em particular diverti-me com
o pormenor do queijo em fatias individuais embrulhadas em
papel celofane. Algo que demorou talvez uns 20 anos a chegar a Portugal mas, como se vê por esta série, no início dos anos 70 o queijo em fatias envoltas em película em plástico era um «sinal» da evolução da alimentação para a comida processada na América.
Os americanos levam 20 anos de progresso na ingestão de alimentos processados e são quase todos gordos... Imaginem nós quando os apanharmos...
É uma série riquíssima, que aborda diversos temas que ainda hoje são debatidos calorosamente, como por exemplo a tensão racial e as eleições entre candidatos Republicanos (Archie) e Democratas (Mike). São feitas imensas referências a momentos-chave da política americana, como o caso watergate - que à altura deste episódio ainda estava para acontecer.
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| «Se as parvoíces do Archie Bunker serviram para melhorar algo na américa? Duvido» - Archie/Carroll O'Connor, 1998/9 |
A série deu origem a outras
spin-offs, todas igualmente interessantes. Como por exemplo... Alguém se lembra da sitcom
O príncipe de Bel Air? Pois esqueçam essa produção engraçada mas carregada de racismo. Décadas antes de aparecer essa que ficou famosa por ser "a primeira a dar protagonismo a negros ricos" existiu "
Os Jeffersons"
(1975-1985), uma das primeiras
spin-offs desta série
que ainda não nomeei e a verdadeira
pioneira.
Apresentadora: Porquê acham que raramente mencionam os Jeffersons como sendo a primeira família negra na televisão? Bill Cosby é muito falado por isso...
Pois é. E eu não gosto disso. Nunca mencionam os Jeffersons. Raramente referem os Jeffersons ou nos dão crédito. - Louise/Isabel Sanford, 6/3/1995
Muitas pessoas diziam que éramos um estereótipo... Não sei porquê. Algumas pessoas tinham problemas com a família... A minha personagem falava alto e acho que isso foi considerado ofensivo entre a "burguesia" (ironia) - George/Sherman Hemsley 6/3/1995
Até os dias de hoje esta série que esteve no ar por 10 anos raramente é mencionada e não lhe atribuem o estatuto que lhe é devido, por ter sido a primeira a mostrar uma família negra e de posses, em televisão. Para mim, que vi todas -
O príncipe de Bell Air, O Cosby Show e os Jeffersons, a primeira é em alguns aspectos melhor, no sentido em que me pareceu focar-se mais em temas e menos na «cor da pele», um sério detalhe em que hoje as outras parecem-me falhar. É talvez a menos racista, porque inseriu a família na comunidade, não a sobrevalorizou nem a "transformou" em negros com "vida de brancos", não inverteu estereótipos mantendo noções racistas, como as posteriores tanta vez fizeram. Era constituída por uma mulher generosa e afável, um homem preconceituoso e sovina e um filho moderno e sagaz. Pela recusa do público negro em aceitar esta como sendo a PRIMEIRA família negra na TV americana se vê que... o racismo é algo que não quer ir embora.
«Nunca que uma mulher vai chegar à presidência!»
E repito as palavras daquele que deu vida a um dos maiores simplórios e preconceituosos homens na TV americana: «Se as parvoíces do Archie Bunker serviram para melhorar algo na américa? Duvido»