.

.

.
Mostrando postagens com marcador Clarice Lispector. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Clarice Lispector. Mostrar todas as postagens

23 de maio de 2013

*



Sempre que distraidamente via seu nome escrito
lembrava-se de seu apelido na escola primária:
Margarida Flores de Enterro.
Por que alguém não se lembrava de apelidá-la de
Margarida Flores do Jardim?
É que as coisas simplesmente não eram do seu lado.
Pensou uma bobagem: até a sua pequena cara era de lado.
Em esquina.
Nem pensava se era bonita ou feia. Ela era óbvia.
Depois. Depois não tinha problemas de dinheiro.
Depois havia o telefone. Telefonaria para alguém?
Mas sempre que telefonava tinha a impressão nítida de que
estava sendo importuna.
Por exemplo, interrompendo um abraço sexual.
Ou então era importuna por falta de assunto.
E se alguém lhe telefonasse?
Iria ter que conter o trêmulo da voz alegre
por alguém enfim chamá-la.
Supôs o seguinte:

- Trim-trim-trim.
- Alô? Sim?
- É Margarida Flores de Jardim?
Diante da voz masculina tão macia, responderia:
- Margarida Flores de Bosques Floridos!
E a cantante voz a convidaria para tomarem chá de tarde
na Confeitaria Colombo.
Lembrou-se a tempo que hoje em dia
um homem não convidava para tomar chá com torradas
e sim para um drinque. O que já complicaria as coisas:
para um drinque se deveria ir na certa vestida de modo
mais audacioso, mais misterioso, mais pessoal, mais…
Ela não era muito pessoal.
E que incomodava um pouco, não muito.

E, além do mais, o telefone não tocou.



(Clarice Lispector - A Bela e a Fera)








.
*
*

28 de março de 2013

.






Pensei numa festa - sem bebida, sem comida, festa só de olhar.
(...)
Para essa festa eu convidaria todos os amigos e amigas que tive e não tenho mais.
Só eles, sem nem sequer os entre-amigos mútuos.
Pessoas que vivi, pessoas que me viveram.


|Clarice Lispector - O chá| |Para não Esquecer|







.

26 de março de 2013

.







Experimentou calcular se estaria perto ou infinitamente longe 
daquilo que acontecia em algum lugar. 
Mas parava, e de novo o silêncio do sol se refazia e o desorientava.

|Clarice Lispector - A Maçã no Escuro|








.

5 de abril de 2012

.

Era uma vez

Respondi que gostaria mesmo era de poder um dia afinal escrever uma história que começasse assim: "era uma vez...". Para crianças? perguntaram. Não, para adultos mesmo, respondi já distraída, ocupada em me lembrar de minhas primeiras histórias aos sete anos, todas começando com "era uma vez"; eu as enviava para a página infantil das quintas-feiras do jornal de Recife, e nenhuma, mas nenhuma, foi jamais publicada. E era fácil de ver por quê. Nenhuma contava propriamente uma história com os fatos necessários a uma história. Eu lia as que eles publicavam, e todas relatavam um acontecimento. Mas se eles eram teimosos, eu também.

Mas desde então eu havia mudado tanto, quem sabe eu agora já estava pronta para o verdadeiro "era uma vez". Perguntei-me em seguida: e por que não começo? agora mesmo? Seria simples, senti eu.

E comecei. Ao ter escrito a primeira frase, vi imediatamente que ainda me era impossível. Eu havia escrito:

"Era uma vez um pássaro, meu Deus".



(Clarice Lispector - Para não esquecer)


.


22 de janeiro de 2012

.



A senhora alguma vez já chorou como uma boba e sem saber por quê?
pois eu já!



(Clarice Lispector - Uma italiana na Suiça)

(Para Não Esquecer)


.
.




Com os olhos abertos sobre o lençol,
ela espiava os pequenos pensamentos piscarem.
De algum modo os pensamentos eram o paraíso.


(Clarice Lispector - Uma italiana na Suiça)

(Para não esquecer)


.

5 de novembro de 2011

.


As pessoas nunca me irritam mesmo,
certamente porque eu as perdôo de antemão.



(Clarice Lispector)

(Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres)


.

31 de outubro de 2011

.

Não ter esperança era a coisa mais estúpida que podia acontecer ...



É pecado não ter esperança.



(Clarice Lispector - A maçã no escuro)


.

22 de outubro de 2011

.



(...)

E as máscaras? Eu tinha medo, mas era um medo vital e necessário porque vinha de encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara.
À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério.
Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.



(Clarice Lispector - Restos do Carnaval)

(Felicidade Clandestina)


.

29 de setembro de 2011

...................................................................................................................................... .....................................................................................................................................


Minha verdade espantada é que eu sempre estive só de ti e não sabia.
Agora sei.


(Clarice Lispector - Água Viva)


.

21 de agosto de 2011

.............................................................................................................................................
.............................................................................................................................................

- Mas agora vamos brincar de outra coisa. Quero saber se o senhor é inteligente.
Este quadro é concreto ou abstrato?

- Abstrato.

- Pois o senhor é burro. É concreto: fui eu que pintei,
e pintei nele meus sentimentos e meus sentimentos são concretos.


(Clarice Lispector - Irmãos)

(Para não esquecer)



.

........................................................................................................................................................................
........................................................................................................................................................................


Vi no seu rosto a pequena convulsão de um conflito, o mal-estar de não entender o que se sente, o de precisar trair sensações contraditórias por não saber como harmonizá-las.



(Clarice Lispector - Mineirinho)

(Para não esquecer)


.

11 de agosto de 2011

.


Me surpreendo, os olhos abertos para o espelho pálido,
de que haja tanta coisa em mim além do conhecido, tanta coisa sempre silenciosa.

Por que calada?




(Clarice Lispector - Perto do Coração Selvagem)


.

29 de julho de 2011

.


Seus olhos tinham a expressão que os olhos têm quando a boca está amordaçada.



(Clarice Lispector - A Maçã no Escuro)


.
.
.


É sempre assim que acontece -
quando a gente se revela, os outros começam a nos desconhecer.


(Clarice Lispector - A Maçã no Escuro)


.
.

5 de julho de 2011

...........................................................................................................................
...........................................................................................................................

– Mamãe, vi um filhote de furacão, mas tão filhotinho ainda,
tão pequeno ainda, que só fazia era rodar bem de leve umas três folhinhas na esquina...


(Clarice Lispector - Futuro de uma delicadeza)

(Para Não Esquecer)

.
.

27 de maio de 2011

......................................................................................................................
.....................................................................................................................


Por dentro não há como a verdade deixar de existir.


(Clarice Lispector - Um amor conquistado)

(Para não Esquecer)

.
.

23 de maio de 2011

......................................................................................................................
......................................................................................................................

Eu sou uma pessoa.
E quando o fantasma de mim mesma me toma - então é um tal encontro de alegria,
uma tal festa, que a modo de dizer choramos uma no ombro da outra.
Depois enxugamos as lágrimas felizes, meu fantasma se incorpora plenamente em mim,
e saímos com alguma altivez por esse mundo afora.


(Clarice Lispector - Encarnação Involuntária)

(Felicidade Clandestina)

.
.

1 de janeiro de 2011

.


.
Nova era, esta minha, e ela me anuncia para já.
Tenho coragem?
Por enquanto estou tendo: porque venho do sofrido longe ...

Eu que venho da dor de viver. E não a quero mais.
Quero a vibração do alegre.



(Clarice Lispector - Água viva)

.
.

8 de dezembro de 2010


.
.

Eternidade não era só o tempo, mas algo com a certeza enraizadamente profunda
do não poder contê-lo no corpo por causa da morte;
a impossibilidade de ultrapassar a eternidade era eternidade;
e também era eterno um sentimento em pureza absoluta, quase abstrato...


Definia eternidade e as explicações nasciam fatais como as pancadas do coração.
Delas não mudaria um termo sequer, de tal modo eram sua verdade.
Porém mal brotavam, tornavam-se vazias logicamente.
Definir a eternidade como uma quantidade maior que o tempo
que a mente humana pode suportar em idéia também não permitiria,
ainda assim, alcançar sua duração.
Sua qualidade era exatamente não ter quantidade,
não ser mensurável e divisível porque tudo o que se podia medir e dividir
tinha um princípio e um fim.
Eternidade não era a quantidade infinitamente grande que se degastava,
mas eternidade era a sucessão.



(Clarice Lispector - Perto do coração selvagem)

.

. .