
Ouço muitas vezes dizer que, para se governar convenientemente, é necessária uma maioria absoluta. Seja nas autarquias ou na Assembleia da República, entranha-se nas mentes do povão a ideia de que governar é uma actividade que só pode exercer-se com total liberdade de opção dos detentores do poder. A oposição serve apenas para atrapalhar e, caso não exista maioria absoluta, serve para paralisar o governo, empatando e provocando problemas incontornáveis enquanto se espera por novas eleições. Resumindo, não acreditamos verdadeiramente nas virtudes do sistema democrático que deveria assentar na troca de opiniões diferentes para encontrar soluções adequadas para os problemas comuns. Para se governar "como deve ser" ou se tem poder total ou não se pode fazê-lo.
Esta distorção da Democracia leva-nos a criar maiorias absolutas e, apesar de tudo o que aconteceu quando Cavaco foi dono e senhor do país, insistimos e agora temos Sócrates no papel de tiranete democraticamente eleito. As maiorias absolutas em Portugal têm sido desgraçadas mas continuamos a preferi-las e, de certo modo, a acarinhá-las. São monstruosidades mas são nossas e, como tal, amamo-las como se ama um filho que tem duas cabeças e nos morde sempre que tentamos ensinar-lhe a comer com as bocas fechadas.
Com maioria absoluta na Assembleia temos tido primeiros ministros que se tornam em caricaturas de monarcas absolutistas. Eles têm uma visão para o país e estão determinados a torná-la realidade, dê lá por onde der, contra e tudo e contra todos, se necessário fôr, mesmo contra aqueles que votaram e lhes deram o poder.
Basta passarmos os olhos pelo programa eleitoral que levou Sócrates a este poder (quase) absoluto para percebermos como ser eleito é uma espécie de atestado de ininputabilidade, de tal forma esse programa e as promessas nele contidas são imediatamente esquecidas e distorcidas.
Governar deveria ser um acto praticado com senso e não uma folia libertina de medidas quase pornográficas e desatinadas como as que vemos serem tomadas com demasiada frequência pelos nossos governantes.
Qual a lição que poderemos estudar? Talvez devamos reflectir sobre a bondade destas maiorias absolutas. Talvez devamos pensar que é melhor repartir o poder do que concentrá-lo nas mãos de uma única força partidária. Talvez... uma democracia não pode ser governada por déspotas (mal) iluminados sob o risco de se tornar uma ditadura de merda.
Esta afirmação leva-me a concluir que, no caso do Portugal actual, ou não estamos a viver uma democracia ou estamos a viver uma merda de ditadura, o que acaba por ser a mesma coisa e o seu contrário. Isto não faz qualquer sentido mas não importa, Portugal também não é nenhum modelo de objectividade e, no entanto, aí está em grande estilo, preparando-se para assumir a presidência rotativa da União Europeia.
Caramba, gostava mesmo de viver num país democrático. Há por aí algum? Aceito opiniões e agradeço pistas que me permitam encontrar um país verdadeiramente democrático. Quem sabe poderei emigrar!