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domingo, dezembro 04, 2022

É o bicho, é o bicho!

     A nossa opinião, a minha, a tua, as opiniões dos nossos familiares, dos nossos amigos, devem ter algum valor. Não sei se muito, se pouco, mas algum valor haverão de ter para que sejam empregues tantos meios na tentativa de as orientar, manipular e condicionar.

    Por vezes dou por mim a pensar se a diferença entre um estado democrático e um estado autocrático (ou de outra qualquer natureza política) não será, no fim das contas bem feitas, essencialmente uma questão de maquilhagem. Mas depois lembro-me da Liberdade de Expressão e as dúvidas acabam logo ali.

    As democracias vivem tempos difíceis (alguma vez viveram tempos fáceis?) pois estão infectadas por um capitalismo selvagem que é maleita peçonhenta e incapacitante. As leis complicam-se e engalfinham-se umas nas outras numa confusão que ora mete ordem no bicho capitalista, ora parece protegê-lo como se corresse risco de extinção. E o bicho cresce e fica cada vez mais agressivo.

    Teremos futuro enquanto sociedade democrática? Depende muito de nós mas nem David teve desafio tão angustiante.

    

sábado, junho 25, 2022

Ser como o caranguejo

    "Quem anda pra trás é o caranguejo", diziam-me quando eu era pequeno. Penso que fosse uma forma de incentivar a criançada a pensar no futuro como sendo algo que se procura e não algo a que se regressa. Talvez, não posso afirmá-lo com certeza.

    E tenho vivido a minha vida a imaginar que as coisas são assim, que a construção da sociedade é sempre prá frente que "prá frente é que é o caminho"! Esta sensação de evolução irreversível estaria decerto relacionada com o facto de ter vivido o tempo da Revolução, que aconteceu tinha eu 11 anos de idade. Sair de uma sociedade salazarista, sufocada no seu próprio vómito, para entrar num processo revolucionário que haveria de culminar com a adesão à União Europeia, deu-me a impressão de pertencer a uma sociedade que se deslocava convictamente em direcção a um amanhã cantor. Engano.

    2022 tem sido um annus horribilis para o sonho democrático. Da invasão do Capitólio à invasão da Ucrânia, os sinais de alerta para um maremoto que poderá levar tudo à frente são alarmantes. Para Putin, Trump e Xi Jinping, nomeando apenas os demónios maiores deste inferno, é como se o episódio do Dilúvio fosse mesmo um facto histórico (Bolsonaro nunca duvidou), daqueles que se repetem, a História a andar pra trás, como o tal caranguejo. Os ditadores anseiam por um maremoto que ponha fim a essa coisa que designam por Democracia, lavando o mundo todo, deixando-o virgem para que nele se institua uma Nova Ordem, assente em regimes autocráticos, governados por homens (nunca mulheres!) providenciais, alguns deles cumprindo mesmo uma missão que lhes foi confiada directamente por Deus.

    Temos assistido a um sem número de sinais que nos alertam para a possibilidade de uma angustiante regressão civilizacional. Há, no entanto, milhões de pessoas que apoiam esse passeio ao jeito do caranguejo, em direcção ao precipício do passado. Tal com Hitler ou Mussolini também Putin, Trump e outros monstros, que não têm mais que fazer que não seja o exercício da sua monstruosidade, são levados por ondas de loucura popular até aos cadeirões do poder .

    Vivemos tempos perigosos para as minorias, para as mulheres e para todos os que não vergam a mola perante a brutalidade dos chefes. O povo quer, o povo tem o caranguejo. Haja saúde económica!

    

quinta-feira, junho 02, 2022

Um imenso adeus

     É com uma incómoda sensação de impotência que assisto ao esboroar do sonho democrático provocado pela crescente imposição da força bruta, da supremacia arrasadora da lei do mais forte. Regressamos à selva. O Estado de Direito perde pontos a cada dia que passa. À medida que o Conhecimento vai perdendo aceitação entre o povo (há mesmo uma espécie de vingança dos ignorantes contra os intelectuais) elegemos governantes cada vez mais boçais e agressivos, pessoas para quem a Democracia pouco mais é que uma palavra. 

    A utopia de um espaço geopolítico onde os direitos das minorias são reconhecidos e defendidos pela lei é cada vez mais uma névoa dispersada pelos ventos furiosos disparados pelas autocracias e pelos partidos de extrema-direita que vão escavando os seus ninhos nas sombras da sociedade. Uns e outros, democratas e fascistas, dependem demasiado da força económica. Serão todos alimentados pelos mesmos interesses?

    A Pós-democracia não é um conceito discutível, é a realidade em que vivemos. Repito mais uma vez, as grandes decisões que influenciam as nossas vidas não são tomadas por aqueles que elegemos. São tomadas por aqueles de quem dependem os nossos eleitos, os donos do guito, os manobradores, os manipuladores de marionetas. O sonho de uma sociedade mais justa vai ficando mais longe, mais longe, mais longe...

quarta-feira, junho 09, 2021

Macacada

Muita gente fala e avisa que estamos a caminhar em direcção a um abismo de incompreensão entre a esquerda e a direita, que estamos com conversas cada vez mais de surdos e extremadas, muita gente fala e avisa mas parece que ninguém ouve ou dá grande importância à questão. A situação faz-me recordar (ou terei imaginado?) gritaria generalizada na aldeia dos macacos e agressões cruzadas com pedaços de merda arremessados em direcção ao oponente. Vejo merda a voar em todas as direcções. Baixo a cabeça e tento encontrar uma nesga por onde me possa escapulir deixando para trás este merdançal insuportável.

O palco mediático é alegremente entregue aos macacos mais agressivos, aos mais capazes de enterrarem as patitas na merda, aos que não hesitam em guinchar como porcos a serem capados: é deles a ribalta! A sociedade, de um modo geral, gosta de sangue e ama o sofrimento alheio. O discurso institucional está longe de admitir esta ânsia de dor mas todos compreendemos que o que a boca diz é negado pelo cérebro. 

Isto parece muito o cortejo fúnebre das democracias ocidentais.

quinta-feira, junho 11, 2020

O tempo dos monstros

O clima é de conflito latente. Talvez seja exagero chamar-lhe clima de guerra mas que é propício à bordoada, disso não tenho grandes dúvidas. 

Habituámo-nos a pensar que a Democracia se constrói com base no diálogo, na confrontação de ideias que estão na base de perspectivas diferentes para a organização da sociedade. Imaginámos que seria possível perpetuar esses sistema de funcionamento, delegando os nossos interesses em representantes eleitos que procurariam consensos nos Parlamentos, buscando soluções adequadas e tendo como finalidade o bem comum. 

Tudo isto só poderia correr bem pois um desses objectivos seria a educação das populações, a elevação da sua capacidade de reflexão e discernimento. Com uma sociedade cada vez mais informada o Nirvana começava a desenhar-se no horizonte próximo. Só faltavam os unicórnios e os passarinhos.

Esquecemos a tendência natural do ser humano para a boçalidade, a agressão e a necessidade típica do macho em ser o bicho dominante, o líder da manada. A Democracia revela-se demasiado frágil precisamente num dos seus aspectos mais importantes: a tolerância.

Nos tempos que correm o diálogo não ultrapassa o nível da conversa de surdos. E, como qualquer conversa de surdos, degenera em gritaria. As ideias transformam-se em verdades absolutas, o consenso é uma impossibilidade. Erguem-se barreiras de incompreensão que se transformam em barricadas. Estamos prontos para o que der e vier.

Precisamos de estar alerta, precisamos de elevar a nossa capacidade de conter a raiva e continuar a procurar o diálogo. Alguns antagonistas recentes poderão ser os nossos aliados do futuro próximo. Para mantermos a possibilidade de uma sociedade democrática devemos identificar com clareza os verdadeiros inimigos mortais, para os derrotarmos alianças estranhas terão de ser estabelecidas. A sobrevivência daquilo em que acreditamos exige atitudes extraordinárias.

Vem aí o tempo dos monstros.

sábado, março 30, 2019

Dignidade republicana


Andamos todos a olhar para o dedo que nos aponta a lua. O problema dos laços familiares entre membros do actual governo será o da diminuição da capacidade de decisão independente e ponderada que um cargo governativo deveria implicar. 

Imagina-se o pai a dizer à filha: “faz assim”, e ela a fazer; o marido a dizer à mulher (afinal de contas vivemos numa sociedade patriarcal): “quero assim”, e ela a obedecer. Como já alguém sugeriu por aí, as coisas resolver-se-ão à mesa durante um jantar de família e isto não é maneira digna de se gerir a República! 

Pessoalmente, há muito que me incomoda a forma como funcionam os grupos parlamentares na Assembleia da República. Ali, apesar de não existir essa promiscuidade familiar, os deputados obedecem com grande naturalidade à direcção da bancada a que pertencem. Não é tanto a relação pai-filha ou marido-mulher que orienta as decisões, é mais um tipo de relação senhor-vassalo ou dono-escravo: "faz assim" e o deputado faz; "quero assado", e o deputado obedece. 

Se não obedece é penalizado, muitas das vezes, se insiste em ter opinião diversa, é simplesmente corrido. 

Neste universo as coisas resolver-se-ão durante um jantar entre líderes. Os deputados menores sentam-se em redor de outra mesa, como se faz com os putos nos tais jantares de família. Esta sim, é a forma digna de se gerir a República. 

A quem poderá interessar que o poder seja entregue a pessoas que pensem pela sua própria cabeça, pessoas que tenham sido eleitas pelo povo de acordo com o credo democrático?

Carta enviada ao director do Público

segunda-feira, outubro 02, 2017

Armaduras pretas

O que se está a passar na Catalunha é uma grande confusão. Assistimos incrédulos a uma escalada de violência que poderia perfeitamente ser evitada caso houvesse interesse de parte a parte em que as coisas acontecessem de acordo com o bom senso. Mas não. A uns aproveita a violência, a outros está-lhes na massa do sangue.

No meio do terramoto o povo anónimo. Não duvido que, caso fosse catalão, haveria de andar a levar porrada da Guarda Civil. Mas, estando descansadinho cá no meu Portugal, olho para tudo aquilo com uma enorme dose de desconfiança.

Fica a imagem da brutalidade do estado policial. Aqueles cães de fila, enfiados nas suas armaduras, protegidos por capacetes negros, são o símbolo do poder, a sua materialização junto de quem protesta e clama por aquilo que acredita serem os seus direitos. Não há diálogo, apenas violência. Todos sabemos que a violência se propaga como um incêndio em dia de Verão.

Rajoy é um pirómano perigoso e Puigdemont, para apagar o fogoléu, traz um bidão de gasolina em cada mão. Não é preciso fazer um grande esforço de memória para recordarmos situações vagamente semelhantes um pouco por toda a Europa. Sempre que o povo sai à rua lá aparecem os gajos das armaduras pretas e dos capacetes fechados.

São as forças que garantem que a Democracia funciona como DEVE ser.

quarta-feira, setembro 13, 2017

O dia das eleições

É sempre a mesma bambochata, o dia das eleições em Portugal é como se fosse uma coisinha feita de cristal que é preciso tratar com o máximo dos cuidados não vá desfazer-se ao mais leve sussurro.

A abstenção tem vindo a aumentar, o povo eleitor parece cada vez mais arredado das urnas e das cruzinhas no boletim de voto. Tenta-se explicar a a abstenção das mais variadas formas: o povo baldou-se porque estava a chover ou porque estava calor e foi para a praia. Ou porque era um fim-de-semana prolongado e emigrou em direcção ao Sul, ou porque outra coisa qualquer.

Em suma, todas as razões são boas para não votar. Não é que o povo se esteja a marimbar para o seu dever cívico, não! O povo até queria cumprir o ritual democrático mas há sempre qualquer coisa a distraí-lo.

Desta vez a questão de lesa-democracia é a marcação de um jogo de futebol entre o Porto e o Sporting para esse dia 1 de Outubro de 2017. Haverá alguém que deixe votar porque se joga futebol lá para o fim da tarde? Se isso acontecer parece-me que o problema é do eleitor e não do jogo. Tal como não me parece correcto culpar a chuva ou o sol da falta de cultura democrática.

Talvez os partidos políticos e os candidatos e os meios de comunicação social tenham algumas culpas no cartório. Mas não, o futebol é bem mais fácil de culpar.


segunda-feira, outubro 31, 2016

Santa estupidez!

Olhando de relance para os livros de História fico pensando: quantas vezes os que acreditaram agir em nome de Deus acabaram abrindo as portas de suas almas ao Diabo? Quantas vezes os que têm fé na própria santidade convidam o Vampiro a entrar nas suas casas. Ovelhas mansas são perfeitas para ferrar dentes aguçados.

A força da religião é proporcional à debilidade mental. A crendice alimenta-se da estupidez como besouro se alimenta de merda.

Levámos tantos séculos a separar o Estado da Igreja, a construir a Democracia à custa de tantos sacrifícios e agora assistimos, incrédulos, ao cristianismo na sua pior versão, a versão exploradora, assassina da Humanidade, parasita da miséria, assistimos à chegada do fundamentalismo cristão aos lugares do poder Democrático no Brasil.

O resultado disto só pode ser a morte da Democracia. Fundamentalismo religioso e Democracia são como a água e o azeite, não se misturam por mais que o tentemos fazer. As igrejas evangélicas são como serpentes, demónios com asas feitas com penas de galinha, a fingir que são anjos.

Atenção que a coisa medra em Portugal. Eles estão aí, fingindo que não existem, passando despercebidos, a martelar nos bairros pobres, a arrebanhar os analfabetos sociais, fazendo o trabalho do Diabo com frieza e método. A IURD não dorme. A Besta está activa.

Santa estupidez!

sábado, agosto 15, 2015

Genuinidade democrática


Qualquer cidadão de qualquer nacionalidade é elegível para obter o “golden visa”, basta-lhe ter dinheiro suficiente para pôr a salivar certos agentes económicos e as portas da Europa ser-lhe-ão abertas de par em par. Entretanto, no Mar Mediterrâneo, continuam a naufragar outros aspirantes a habitar este espaço genuinamente democrático que é a comunidade europeia. É tudo uma questão de capacidade de investimento. 

Os que morrem no Nosso Mar investiram tudo o que tinham para comprar o seu lugar miserável num bote mortífero, às mãos de traficantes sem escrúpulos. Os que compram moradias de luxo negoceiam com outro género de traficantes, nem por isso mais escrupulosos do que os outros mas os riscos que correm são praticamente nulos. 

É tudo uma questão de quantidade. Se forem podres de ricos, os aspirantes a um lugar deste lado do mar não encontram obstáculos. Se forem pobres têm assegurada uma aventura inesquecível: ondas, enjoo, muros, arames farpados, centros de detenção, anilhas e pulseiras, fome medo e, caso sobrevivam, talvez consigam um buraquito qualquer onde aconchegar o que restar das suas pessoas e dos seus entes queridos.

Esta diferença na atribuição de autorizações para habitar o espaço europeu é o retrato perfeito daquilo que somos, enquanto projecto social e político comum. O dinheiro impera, o dinheiro é deus, o dinheiro justifica tudo, limpa tudo, limpa-se a si próprio e limpa os crimes cometidos por aqueles que o acumulam. 

Nem quero pensar que algum do capital aplicado a comprar casas de luxo em Portugal seja proveniente do tráfico de emigrantes no Mediterrâneo ou do comércio de armamento nas guerras que os obrigam a navegar para a morte.

Se é isto que temos para oferecer aos países não democráticos ou a democracias pouco genuínas, não admira que nos odeiem e nos combatam com quanta força têm.


quinta-feira, agosto 06, 2015

Trampa

Imaginemos que Donald Trump chega a Presidente dos Estados Unidos da América. Estamos a imaginar...? Vá lá, só mais um bocadinho, um pequeno esforço de imaginação... pois é, a coisa não gera imagens particularmente agradáveis, pois não?

Que sociedade é capaz de gerar um candidato ao mais alto lugar da sua organização política com as características do descabelado Trump? Que doença, que droga, que alucinação colectiva pode fazer com que este homem seja levado a sério por uma parte significativa dos seus concidadãos?

Muito falamos dos líderes perigosos que governam partes deste mundo. Kim Jong-un, Maduro, Obiang, Eduardo dos Santos, ditadores mais ou menos populares nos seus países, a loucura e a ausência de direitos civis, caricaturas de democracias, tudo isto nos faz tremer um pouco. E se Trump vier a chefiar os EUA? Uma trampa!


terça-feira, março 03, 2015

Democracia

Alguma vez terá existido Democracia?

Se existiu deixou de existir; é passado, dificilmente será futuro outra vez. Governantes e governados deixaram de ter tempo para pensar nesse assunto.

Andamos todos demasiado ocupados a tentar ganhar dinheiro e a discutir como se pode arranjar mais dinheiro e quem deve dinheiro a quem e qual a melhor forma de cobrar a dívida e a menos ruinosa de pagar os juros agiotas que quem empresta dinheiro sempre cobra.

A Democracia vende-se e compra-se, troca-se, empresta-se e negoceia-se.

A Democracia é um franchise de uma marca made in USA que comprou os direitos de representação à Europa ali por volta dos tempos do pós 2ª guerra. A Democracia é fabricada na China por operários que trabalham 20 horas num dia e recebem uma tigela de arroz em troca do seu trabalho.

quarta-feira, janeiro 07, 2015

Incomodidade

A coisa aquece lá para os lados da Grécia. As sondagens indicam vantagem do Syriza nas intenções de voto. Os mercados começam a ficar nervosos. Os mercados e os líderes dos países mais pesados na União Europeia.

À medida que força do partido extremista grego aparenta crescer os recados vão sendo mais numerosos e sobem no tom de ameaça. Resumindo: se os gregos se atreverem a escolher um partido que desagrade aos mercados e à senhora Merkel a coisa vai tremer.

Há quem diga que um lado e outro vão fazendo bluff : nem o Syriza será tão atrevido nas suas acções, caso chegue ao poder, nem os mercados entrarão em colapso nervoso caso isso aconteça. Será? Não dá para fazer previsões sobre tão complexa situação.

O que quero fazer notar é que no presente panorama económico e político que vivemos na Europa a democracia tornou-se uma coisa incómoda e dispensável. Tudo seria mais belo e mais fácil se os gregos obedecessem ao ditames da troika e da comissão europeia sem respingar, tal como fazem os bons alunos.

domingo, maio 18, 2014

Pesadelo dominical

Poderá a Democracia sobreviver a si própria? A abertura dos regimes democráticos permite a proliferação de todo o tipo de agremiações de sacanas e de filhos da puta. 

A mentira (ou "inverdade", como por vezes se diz) passa com facilidade para a opinião pública travestida de verdade inquestionável. O espaço de reflexão colectiva fervilha de propaganda e tende a menosprezar o pensamento estruturado, a frase curta é uma bomba que faz explodir em bocadinhos o pensamento especulativo. A nossa Democracia idolatra a Facilidade e teme a Dificuldade. Assim resvalamos alegremente para uma fossa repleta de merda.

A Economia ocupa todo o horizonte, nada mais parece visível aos olhos da maioria: só vemos dinheiro, sonhamos com dinheiro, desejamos dinheiro. A Solidariedade, base dos regimes democráticos, é olhada com indiferença, quando não com desdém. O mundo Ocidental contorce-se com dores difíceis de suportar num parto que promete trazer a este mundo um qualquer ser social monstruoso.

Assistimos a tudo isto com uma sensação de impotência, um torpor estupidificante, que parece impedir-nos de pensar e agir. A Política perde terreno, afunda-se em contradições e recuos impensáveis perante a Grande Finança. O que vai sair daqui?

quarta-feira, junho 27, 2007

Educando os animais


Li algures que não se deve deixar a uma criança a responsabilidade de educar um cão. O desconhecimento das crianças sobre os mecanismos educativos seria nocivo para o animal, deixando-o confuso. Uma festa na cabeça depois de um chichi no canto da sala ou uma sapatada após uma boa acção canina iria contribuir apenas para confundir o pobre animal e desregulhar-lhe os desejados bons costumes. A educação do animal é responsabilidade demasiada para ser entregue a quem não tem ainda bem definida uma conduta de vida pautada pelo rigor ético que caracteriza um adulto.

Olhando para os acontecimentos recentes no nosso país sou levado a concluir que a educação cívica e politica do nosso povo está a ser descurada por termos um 1º ministro que se comporta de forma infantil e um presidente da república que já nasceu velho. Os sinais enviados pelos nossos dirigentes supremos são frequentemente contraditórios. Premeia-se a mediocridade, aplaude-se a mesquinhez e ignora-se a falta de ética, como se a ética fosse um mal que tem de ser suportado apenas quando não há outra hipótese, mas o discurso oficial é de sentido contrário. Quem andar distraído ficará confuso com certas aventuras ideológicas e trapacices processuais que se vão tornando o pão-nosso de cada dia.

Se não nos organizarmos, se não estivermos atentos nem protestarmos quando há razões para isso, vão fazer-nos a folha e nem migalhas havemos de aproveitar. A Democracia não nos é oferecida pelos que estão no poder. Bem antes pelo contrário. Temos de conquistá-la CONTRA eles. É triste mas quer-me parecer que é a realidade.

domingo, junho 17, 2007

Aut(oritar)ismo

Ouço muitas vezes dizer que, para se governar convenientemente, é necessária uma maioria absoluta. Seja nas autarquias ou na Assembleia da República, entranha-se nas mentes do povão a ideia de que governar é uma actividade que só pode exercer-se com total liberdade de opção dos detentores do poder. A oposição serve apenas para atrapalhar e, caso não exista maioria absoluta, serve para paralisar o governo, empatando e provocando problemas incontornáveis enquanto se espera por novas eleições. Resumindo, não acreditamos verdadeiramente nas virtudes do sistema democrático que deveria assentar na troca de opiniões diferentes para encontrar soluções adequadas para os problemas comuns. Para se governar "como deve ser" ou se tem poder total ou não se pode fazê-lo.
Esta distorção da Democracia leva-nos a criar maiorias absolutas e, apesar de tudo o que aconteceu quando Cavaco foi dono e senhor do país, insistimos e agora temos Sócrates no papel de tiranete democraticamente eleito. As maiorias absolutas em Portugal têm sido desgraçadas mas continuamos a preferi-las e, de certo modo, a acarinhá-las. São monstruosidades mas são nossas e, como tal, amamo-las como se ama um filho que tem duas cabeças e nos morde sempre que tentamos ensinar-lhe a comer com as bocas fechadas.
Com maioria absoluta na Assembleia temos tido primeiros ministros que se tornam em caricaturas de monarcas absolutistas. Eles têm uma visão para o país e estão determinados a torná-la realidade, dê lá por onde der, contra e tudo e contra todos, se necessário fôr, mesmo contra aqueles que votaram e lhes deram o poder.
Basta passarmos os olhos pelo programa eleitoral que levou Sócrates a este poder (quase) absoluto para percebermos como ser eleito é uma espécie de atestado de ininputabilidade, de tal forma esse programa e as promessas nele contidas são imediatamente esquecidas e distorcidas.
Governar deveria ser um acto praticado com senso e não uma folia libertina de medidas quase pornográficas e desatinadas como as que vemos serem tomadas com demasiada frequência pelos nossos governantes.
Qual a lição que poderemos estudar? Talvez devamos reflectir sobre a bondade destas maiorias absolutas. Talvez devamos pensar que é melhor repartir o poder do que concentrá-lo nas mãos de uma única força partidária. Talvez... uma democracia não pode ser governada por déspotas (mal) iluminados sob o risco de se tornar uma ditadura de merda.
Esta afirmação leva-me a concluir que, no caso do Portugal actual, ou não estamos a viver uma democracia ou estamos a viver uma merda de ditadura, o que acaba por ser a mesma coisa e o seu contrário. Isto não faz qualquer sentido mas não importa, Portugal também não é nenhum modelo de objectividade e, no entanto, aí está em grande estilo, preparando-se para assumir a presidência rotativa da União Europeia.
Caramba, gostava mesmo de viver num país democrático. Há por aí algum? Aceito opiniões e agradeço pistas que me permitam encontrar um país verdadeiramente democrático. Quem sabe poderei emigrar!


sábado, maio 05, 2007

Incómodo

Anda no ar uma estranha sensação. Será do calor que chegou em força e já nos vai empurrando para as sombras projectadas dos prédios sobre a calçada, será do stress característico após mais uma semana de trabalho? Não consigo explicar exactamente o que me incomoda. Mas que há algo a remexer-me as tripas, ai isso há!

Talvez seja algo relacionado com notícias insistentes e diárias que nos vão atravancando o sótão com centenas, milhares de macaquinhos. Notícias que falam de corrupção em tudo quanto é gabinete e cargo público, notícias que explicam o desrespeito continuado das leis por aqueles que as criam e aprovam (para os outros cumprirem, ao que parece!), notícias que me deixam a balançar entre a tristeza e a revolta, impotente, seja como for.

A Democracia começa a perder-se neste labirinto de vigaristas e oportunistas que vasculham o lixo dos poderosos em busca do seu quinhão, da sua migalha, desesperados por encontrarem restos que lhes aproveitem. Nem serão tanto os ministros. Quem os apoia, quem lhes preenche a sombra? As máquinas partidárias (o texto de Pacheco Pereira no Público de hoje é muuuuito interessante) são o cimento do sistema e os partidos políticos os alicerces da nossa Democracia? Temo que isso deite tudo a perder.

Penso ser daqui que vem a tal estranha sensação, o incómodo. Há qualquer coisa mas não consigo perceber exactamente os seus contornos. É um mostrengo, uma angústia, uma coisa ruim, não sei. É uma coisa pútrida mas cheia de vitalidade, um coisa que deixa um rasto de pus quando se move e que muda de lugar com toda a facilidade. Uma coisa que está a minar a nossa sociedade. Um parasita tremendo que nos suga o sono e nos devora os sonhos.

O que fazer?


segunda-feira, fevereiro 12, 2007

O dia seguinte

E pronto. A novela referendária chegou ao fim. Ganhou o SIM, penso que todos ganhámos. O resultado não despoletou ondas de regozijo nem festejos nas ruas. Recebemos a coisa com serenidade e alívio. Afinal ainda há esperança para este país.
A economia continuará a ser uma espécie de fronteira farpada, o ensino um pântano voraz e a justiça uma estátua de pedra, mas Portugal tem nos portugueses uma reserva de esperança numa vontade difusa de mudar e ser diferente daquilo que foram os nossos trisavós.
A vitória da tolerância e da confiança na capacidade de cada um de nós poder ponderar livremente as suas opções de vida abre uma janela sobre o futuro que poderá significar uma sociedade civil mais madura e interventiva.
É claro que os mais ferrenhos adeptos do NÃO vão continuar a agitar fantasmas horrendos e sedentos de sangue aos olhos do pessoalzinho. Estão despeitados por lhes recusarem a bondade que ofereciam e a caridadezinha merdosa que continuam a imaginar ser o destino dos mais pobres. Metam a viola no saco. Essa merda acabou.
Espero que, a partir daqui, consigamos olhar a besta nos olhos agarrando-a pelos cornos até lhe torcermos o pescoço e a vergarmos de joelhos no chão. Sonho com um país capaz de assumir sem medo nem preconceitos uma perspectiva mais justa e solidária do significado e do sentido da vida da nossa comunidade. A vitória do SIM aproxima-nos mais do grau civilizacional do resto da Europa. Esperemos que a Assembleia da República tenha agora lucidez suficiente para legislar com sabedoria e prudência sobre o tema que ontem fracturou mais uma vez o território nacional num Norte tacanho e com medo do demónio, que se afasta de um Sul muito mais próximo do desassombro libertário que nos está na massa do sangue por herança cultural a desaguar vinda dos lados da Europa.
Esta treta acabou finalmente. É preciso explicar e mostrar aos mais ultramontanos de entre nós que eles não perderam nada. Ganharam algo e ganharam connosco.
Força Portugal. Por uma vez não me fizeram ter vergonha de ser quem sou (apesar do resultado na minha cidade natal ter sido o que foi).

domingo, janeiro 21, 2007

Outra razão

Se mais razões para votar SIM no referendo de 11 de Fevereiro faltassem eis um novo e fortíssimo argumento: Marques Mendes vota NÃO e explica o que o leva a tomar esta posição num texto publicado no Correio da Manhã. http://www.correiomanha.pt/noticia.asp?id=228283&idselect=93&idCanal=93&p=200

O líder do PPD (ou será líder do PSD?) lá vai desfiando uma série de considerações mais ou menos piedosas, mais ou menos enroladas, até encontrar os argumentos que a seguir reproduzo:

"Também é difícil combater a corrupção, mas combatêmo-la. Não a legalizamos.
Também é difícil combater o tráfico de droga, mas combatêmo-lo. Não o legalizamos."

Combatemos, pois, com os resultados que se sabem. Mas, antes do mais, gostaria de tentar imaginar a corrupção legalizada. Talvez até não fosse má ideia criar uma tabela que pusesse alguma moralidade na corrupção que por aí grassa, porque a droga está, mais ou menos tabelada e os preços de mercado podem ser controlados pelos consumidores.
Assim, quando um honesto cidadão precisasse de uma licança para fazer obras em casa ou fazer desaperecer uma multa por excesso de álcool, saberia exactamente o montante a investir sem se arriscar a ser vigarizado por algum funcionário... corrupto.

Voltando à questão inicial deste post, as razões de Marques Mendes eram absolutamente desnecessárias. Lendo aquilo percebemos que são apenas justificações de um tipo que não se quer comprometer por aí além. A cada afirmação corresponde uma justificação que implica a compreensão do seu contrário. Mendes parece querer dar uma palmadinha nas costas a deus e manter relações cordiais com o diabo. O resultado é uma coisa sem sal à qual nem um quilo de pimenta valerá se se lhe quiser dar algum sabor.
Ai Marques, Marques, estás mesmo com os sapatinhos prá cova.

sábado, janeiro 20, 2007

SIM


O "debate" público em redor do referendo tem sido lamentável. Começam a chatear as trocas de galhardetes entre os dois lados da contenda, as vaidadezinhas individuais, os golpes baixos, as insinuações infundadas, vale tudo e ainda hão-de ir uns quantos olhos pró maneta! No meio da peixeirada há tendência a subalternizar a questão que iremos encontrar nos boletins de voto e que é, afinal, aquela que importa debater: o aborto deve ou não ser considerado um crime até às 10 semanas?
Eu voto SIM mas isso não quer dizer que sou a favor do aborto. Ninguém, no seu perfeito juízo é a favor do aborto. A questão é demasiado complexa para ser tratada à paulada tal como tem acontecido e, à medida que se for aproximando a data da votação, as coisas tenderão a piorar. Quem pensa que o nível do debate anda rasteiro que se prepare para a fase em que se tornar subterrâneo.
Os adeptos do NÃO deveriam assumir que estão a pugnar pela manutenção da legislação em vigor e deixarem-se de golpes baixos como os que têm sido aplicados pela padralhada por esse país fora. A igreja católica volta a mostrar a sua face intolerante e fundamentalista quando usa o púlpito para fazer campanha de forma desavergonhada.
No fundo a questão fundamental é essa; devemos ou não alterar a lei actual? Comparar os defensores do SIM a nazis só mostra a falta de inteligência e de ética de quem é capaz de arrotar semelhante posta de pescada. Com bispos capazes de tais dislates não há igreja que sobreviva aos tempos que correm.