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22/05/2019

Histórias da Lista Vermelha: Phleum arenarium



Phleum arenarium L.


Para a grande maioria dos portugueses, "férias" e "praia" são perfeitos sinónimos: de Maio a Outubro, enquanto a chuva e o frio se mantiverem educadamente ausentes, ir à praia é, para o grosso da população, o único modo de ocupar os períodos de lazer. Que o país inteiro se estenda na praia ao sol não é bom para as plantas dunares, mas a instalação de passadiços de acesso às praias um pouco por todo o litoral contribuiu para minimizar os estragos e, em certas casos, até potenciou uma notável recuperação da vegetação das dunas. Contudo, os tempos já foram melhores, e as ameaças sobre as plantas dunares voltam a avolumar-se. A erosão costeira tem feito recuar o cordão dunar, às vezes de forma dramática, em muitos pontos do litoral norte. E algumas câmaras municipais deixaram de se preocupar com a gestão desses habitats, seja para poupar no orçamento, seja porque a conservação da natureza é moda que já passou e poucos votos rende. Entre as prevaricadoras avulta a Câmara Municipal de Gaia (CMG), que, sob a égide do actual presidente Eduardo Vítor Rodrigues (primeiramente eleito em 2013), deixou de controlar o chorão (Carpobrotus edulis) e outras plantas infestantes nos 15 km de dunas do concelho, mantendo embora de pé os cartazes garantindo que esse controlo é feito. Depois de dez ou mais anos em que nos habituámos a ver essas dunas recuperar gradualmente a sua biodiversidade, eis que regressámos à idade das trevas em que tais preocupações são um luxo desnecessário.

A sorte da gramínea dunar que hoje apresentamos, de seu nome Phleum arenarium, não depende, felizmente para ela, do empenho do presidente da CMG, ainda que não se possa dizer o mesmo de outras plantas constantes da Lista Vermelha da Flora de Portugal (um exemplo é o Centaurium chloodes, classificado como "Em Perigo", desaparecido há poucos anos do litoral gaiense). Já em tempos recuados a presença do Phleum arenarium no nosso país parecia restringir-se à faixa litoral a norte do Douro. Na Flora Portuguesa de Gonçalo Sampaio, publicada postumamente em 1946, diz-se que a área de distribuição da planta se estendia até ao Alentejo, mas nenhum registo de herbário corrobora tal informação. Actualmente só se sabe dela em três ou quatro pontos nos concelhos de Vila do Conde, Esposende e Viana do Castelo. As dunas entre a Amorosa e o Cabedelo, a sul do Lima, marcam o limite norte da distibuição portuguesa da planta e albergam o seu maior contingente populacional, atingindo a ordem dos milhares. Mas a planta é pequena, uma simples espiga com 10 a 15 cm de altura; e, tratando-se de uma planta anual de surgimento efémero (floresce entre Maio e Junho, depois seca e desaparece), os seus números podem oscilar muito de ano para ano.

O Phleum arenarium (que, segundo a Lista Vermelha, está "Em Perigo" no nosso país) vive na transição entre a duna primária e a duna cinzenta, em zonas ainda não completamente estabilizadas. Não tolera a instabilidade da frente dunar, mas é pouco competitivo e tem dificuldade em colonizar dunas consolidadas com bom coberto vegetal. O refúgio que encontrou entre a Amorosa e a foz do Lima responde de forma exacta aos seus requisitos, e os passadiços que o põem a salvo do pisoteio também lhe proporcionam um importante habitat secundário. Noutros pontos do litoral norte, o habitat da planta terá sido obliterado pelo estreitamento do cordão dunar, pela caótica rede de carreiros de acesso às praias, e pela expansão de plantas invasoras como o chorão e a acácia-de-espigas.

O Phleum arenarium está amplamente distribuído pela costa atlântica europeia, mas desce também ao Mediterrâneo e, atravessando-o, espeta uma modesta lança em África, não se aventurando para lá de Marrocos. Não é o único penacho-das-areias em miniatura que temos na nossa flora, mas é talvez o mais raro. Se o leitor lograr encontrá-lo, parabéns. Mas, antes de festejar, tire algumas fotos e certifique-se de que aquilo que está a ver não é, por exemplo, o Lagurus ovatus, que tem um aspecto bastante mais fofo e sedoso e é comum em dunas de norte a sul do país.

12/05/2015

A romúlea que faltava



Romulea columnae Sebast. & Mauri


Os nossos passeios pelo país, à procura de flora ou habitats que nunca vimos, têm uma propensão natural para locais com espécies mais raras. Em si, esse pormenor não acrescenta ânimo às caminhadas nem entusiasmo à pesquisa, mas não resistimos, sempre que a ocasião se proporciona, ao arrebatamento que se sente quando se fecha um capítulo de uma colecção. Pois bem: relativamente ao género Romulea, faltava-nos este cromo. Por isso, quando o João Lourenço gentilmente nos informou que vira esta espécie num pinhal em Amorosa, Viana do Castelo, corremos para a conhecer. Decerto o leitor quererá saber por que um tal achado é tão valioso, e aqui estamos para satisfazer a sua curiosidade.

Em Portugal ocorrem espontaneamente apenas quatro espécies de Romulea, e a folhagem desta, feita de tubos longos e fininhos, difere pouco da das outras três espécies. A flor, porém, é muito mais pequena, detalhe que nem sempre as fotos exibem com clareza: as tépalas medem cerca de 1 cm de comprimento. Dê agora, caro leitor, toda a sua atenção ao centro da flor: está lá uma coluna envolta em pólen amarelo-alaranjado que protege tão bem o estigma que este mal se nota. Apesar do receituário botânico mencionar mais características que ajudam à identificação, é precisamente esta particularidade que assegura que se trata da R. columnae.

Nativa do bacia mediterrânica, do oeste europeu e da Macaronésia, e apreciadora de lugares arenosos e arejados, em geral pisoteados no Verão, a R. columnae costuma florir no final do Inverno. Isso é de alguma ajuda na detecção de planta tão esquiva, pois a vegetação herbácea tem ainda porte diminuto nessa altura do ano. A glória é, contudo, breve: logo depois a planta hiberna, ficando reduzida a um bolbo subterrâneo, e só volta a mostrar-se no ano seguinte.

24/01/2015

Margarida do mar



Matricaria maritima L. [= Tripleurospermum maritimum (L.) W. D. J. Koch ]



Em várias praias do litoral atlântico, onde o mar é frio e tormentoso, encontramos perto da espuma, entre redes de pesca e barcos a descansar na areia, exemplos notáveis de estatuária: estátuas com homens de gorro e rosto sulcado, a vencer ondas bravas ou a recolher redes pesadas de peixe, numa homenagem aos pescadores e ao mar fértil; e estátuas com mulheres, mães, viúvas e orfâs, desesperadas ou incrédulas, a injuriar o destino e o mar cruel.

Pelo fim do Outono, no solo arenoso ou junto aos calhaus rolados de praia, protegida do ar salgado e da maresia por dunas ou pela vegetação mais alta, pode também ver-se uma margarida em flor, de folhas verde-claro, sem aroma, laciniadas e carnudas (ou, dado o habitat costeiro, peixudas). Trata-se de uma planta perene, de base algo lenhosa, pertencente (até há pouco tempo) ao género Matricaria, nome que alude a matriz, ou mãe, e à fama da acção medicinal da camomila (Matricaria recutita) no alívio de febres e inflamações, especialmente em parturientes, e como calmante.

O continente português contava com duas espécies de Matricaria, mas recentes revisões taxonómicas alteraram-lhes a identidade. A Matricaria recutita é agora designada por Chamomilla recutita (L.) Rauschert; a Matricaria maritima subsp. maritima, das costas do norte da Europa, chama-se agora Tripleurospermum maritimum. O que distingue estes dois géneros é essencialmente um detalhe aritmético da morfologia das sementes: na Matricaria cada semente tem quatro ou cinco nervuras salientes, no Tripleurospermum há apenas três.

11/01/2014

Os três espinhos de Brotero


Genista triacanthos Brot.


As rochas de Montedor, que preenchem 1 Km da faixa costeira no concelho de Viana, são o nosso poiso favorito em todo o litoral minhoto. Há areais antes e depois, mas ali os veraneantes não encontram lugar macio onde estender as toalhas. As enormes rochas são varridas por ondas que por estes dias nem sequer respeitam os pescadores à linha. Nos interstícios mais a salvo dos salpicos das ondas desponta toda a vegetação característica das falésias costeiras, condimentada por algumas especialidades: armérias (Armeria pubigera), funcho-marítimo (Crithmum maritimum), Silene uniflora, Cochlearia danica, Romulea clusiana, Asplenium marinum e Ophioglossum lusitanicum. O feto-dos-carvalhos (Davallia canariensis) liberta-se da árvore que lhe ná nome e poleiro para descer intrepidamente até ao mar, e aqui e ali despontam as flores cor-de-rosa de um raro centáureo (Centaurium portensis). Mas a maior singularidade de Montedor é o denso mato rasteiro de tojo e urze que reveste a suave encosta entre as falésias e o pinhal. É como se alguma inexplicável deslocação da crosta terrestre tivesse arrastado um pedaço das montanhas do norte para a beira-mar. Com essa migração, os festivos amarelo e roxo da floração primaveril têm uma oportunidade única de contracenar com o azul marinho, a diversidade vegetal sai enriquecida com o encontro de dois mundos, e as daninhas acácias que dominam outros ponto da costa têm fraca oportunidade de se expandir enquanto a manta de tojo se mantiver com poucos rasgões.

O tojo (género Ulex) não é planta que se deixe gostar à primeira, muitas vezes nem à enésima, mas em Montedor ele está indiscutivelmente no local certo. Se soubermos que, embora sempre espinhentos, há muitos e diferentes tojos, já lhes começamos a achar alguma graça. E aqui, com o mar à vista, acabamos por detectar, à mistura com o tojo normal, um outro «tojo» glabro, de flores mais pequenas e mais intensamente amarelas, com espinhos menos agressivos. Averiguado o caso, concluímos que não se trata propriamente de um tojo, mas sim de uma Genista, um género botânico diversificado que inclui plantas com muitos, poucos ou nenhuns espinhos. A Genista triacanthos (a que o povo, pouco dado a subtilezas botânicas, chama tojo-gatanho ou tojo-molar, nomes que também dá a certas espécies de Ulex) é, entre elas, das mais aculeadas, destacando-se pelos espinhos trifurcados (ver 3.ª foto) que justificam o epíteto escolhido por Brotero. Dignas de nota são ainda as folhas algo carnudas, formadas por 1 a 5 folíolos curtos e estreitos (uns 6 mm de comprimento por 1 ou 2 de largura). Nos verdadeiros tojos (género Ulex) não existem folhas reconhecíveis como tal, mas apenas filódios, que são mais espinhos a juntar aos muitos que a planta já tem.

A nortada que tantas vezes estraga os planos aos veraneantes também não deixa estes arbustos no litoral erguer muito a cabeça. Em Montedor a G. triacanthos não ultrapassará o joelho de um adulto, mas noutros pontos da sua distribuição pode chegar aos 2 metros de altura. Este quase endemismo ibérico, que fora da Península só surge do outro lado do estreito de Gibraltar, no norte de Marrocos, prefere substratos ácidos e, no nosso país, onde está assinalado em todas as províncias, é assíduo frequentador de urzais-tojais a maior ou menor altitude, aparecendo também no sub-bosque de carvalhais, sobreirais e outras matas de folhosas.


Montedor, Viana do Castelo

04/01/2014

Acelgas


Beta maritima L.



O dicionário Houaiss regista nove entradas para a palavra beta, algumas delas com múltiplos significados. Em geral, o termo alude à noção de segundo. Em ciência, tanto designa a segunda estrela em grandeza numa constelação, como um segundo produto de uma reacção química, a segunda das três radiações por emissão de partículas das substâncias radioactivas, o número dois ou a segunda letra do alfabeto grego. Mas beta também pode ser uma lista sobre um fundo de cor diferente, seja ele de tecido, pelagem, plumagem, ou o contraste na coloração entre os lenhos de Verão e de Primavera de um tronco de madeira. E, mais localmente, beta também é o nome dado a um cabo com que se puxa a rede para terra depois da pesca de arrastão, e ainda a um tresmalho para a pesca de sargos e robalos; ou, em momentos de atrapalhação, azáfama ou grande pressa, a algum instrumento sem denominação própria.

Em botânica, Beta é o nome científico das acelgas, usado a partir da designação vernácula proveniente do celta bett, que quer dizer vermelho. Beta é o género que contém a beterraba (B. vulgaris), aquela raiz intumescida e adocicada, globosa ou fusiforme, vermelha-cor-de-vinho-tinto, branca ou amarela, com que se fazem sopas, saladas, sumos ou bolos coloridos, e que é fonte de grande percentagem do açúcar consumido no mundo. A espécie B. maritima, ou acelga-brava, comum no litoral, que se pendura em arribas ou se estira em dunas e sapais salgados, tem uma raiz grossa mas não tão carnuda. É nativa da oeste e sul da Europa, parte da Ásia, norte de África e Macaronésia.

As fotos mostram como as folhas desta espécie, que encontrámos nas areias marítimas e em praias de seixos de Viana do Castelo, são glabras, inteiras e alternadas, com a nervura central conspícua e, por vezes, tingida de vermelho ou rosa, tendo as basais um longo pecíolo. As flores, que nascem entre Abril e Outubro, são esverdeadas com um leve matiz púrpura e apresentam cinco tépalas encurvadas para dentro, desse modo formando uns capuzes onde se protegem os estames. Além disso, são hermafroditas, agrupando-se em inflorescências que parecem espigas. Se tivéssemos arrancado uma noz a algum dos pares que os frutos soldam à haste, poderíamos agora conferir que cada um contém uma semente alongada.

Por cá, ocorrem espontaneamente três espécies do género, mas a B. macrocarpa é rara e, até agora, só terá sido avistada no Algarve e Estremadura. Da B. maritima há registos em quase toda a faixa costeira, tirando Alentejo e Douro Litoral.


Areosa, Viana do Castelo

03/12/2012

Plantamar

Plantago maritima L.


Os plantagos, que pouco devem às noções convencionais de beleza, também não se distinguem pela raridade. Constituem, com umas tantas gramíneas, cardos e dentes-de-leão, aquela massa vegetal anónima que enche terrenos baldios ou que invade, oportunista, pedaços de cidade deixados ao abandono. São ervas de pisar que, quando as encontramos, nunca nos fazem deter o passo.

Mas mesmo da planta mais trivial se pode contar a história da sua relação com o homem. Várias espécies de Plantago, incluindo o muito comum P. lanceolata, tiveram uso medicinal desde a antiguidade. E o nome Plantago remete à anatomia humana, pois significa planta do pé: as folhas de algumas espécies do género, em especial do P. major, são tão largas que evocam a marca de uma pegada. Não menos interessante é o nome vernáculo tanchagem, que parece derivar de chantagem por simples metátese. Será que a planta induz de alguma forma à prática da extorsão? Mas trata-se apenas de um caso fortuito de convergência fonética, já que chantagem-enquanto-crime vem do francês chantage, e tanchagem-a-planta, embora não pareça, evoluiu do étimo latino plantaginis.

Posto isto, dentro da grande uniformidade das espécies do género (uma roseta basal de onde saem as características espigas florais), há plantagos que a nossos olhos nascem mais iguais que outros, numa discrepância que reflecte apenas a nossa compulsão em valorizar o que é escasso. Sucede que a própria medida de raridade é por vezes subjectiva, pois uma planta que é rara num país ou região pode não o ser noutras paragens. É o caso deste Plantago maritima, de ampla distribuição europeia e mediterrânica, que em Portugal só se encontra, e com alguma dificuldade, no litoral minhoto. O seu habitat são as rochas costeiras ou os sapais nos estuários de grandes rios, duas preferências exemplificadas pelas populações portuguesas da espécie. As plantas das fotos vivem numa zona lodosa da foz do Lima, em Darque; também em Viana do Castelo, mas do outro lado do rio, há Plantago maritima nas falésias salpicadas pelas ondas junto ao forte da Areosa.

O Plantago maritima distingue-se bem pelas folhas, que têm cerca de 20 cm de comprimento, são estreitas, semi-carnudas e glabras. É uma planta perene, de raiz algo lenhosa, que floresce de Abril a Setembro. A sua variabilidade tem levado a propostas de divisão em subespécies que, na opinião de Franco (vol. 2 da Nova Flora de Portugal), não são facilmente destrinçáveis. Além da subespécie maritima, a única que ocorreria no litoral minhoto, a Flora Ibérica reconhece a subespécie serpentinica, de rochas ultrabásicas no interior. Contudo, um dos caracteres diagnósticos indicados nessa obra parece falhar: nas plantas por nós observadas, as folhas, em vez de terem as margens lisas, apresentavam por vezes alguns dentes (ver fotos 2 e 3), fenómeno que só deveria ocorrer na subesp. serpentinica.

01/11/2012

Entre marés

Quem pretende morar na fronteira entre terra e mar, onde o sal fino é uma segunda pele e o chão foge a cada recuo das ondas, ou é inerte como um seixo ou tem que ser versátil como um pirata. Essa parece ser uma das qualidades das plantas do género Suaeda, cujo habitat, sapais e marismas, raramente está calmo e enxuto. As folhas, sésseis e com aspecto farinhento, são suculentas, o que é comum nas plantas que vicejam à beira-mar; as raízes são longas, permitindo que a planta se segure num solo arenoso e sugue água doce num meio misto onde abunda a água salgada. E as espécies deste género revelam algum polimorfismo, sinal de oportunas adaptações ao ambiente.

A S. albescens (amiúde confundida com a Suaeda maritima (L.) Dumort.) é uma herbácea anual de hábito prostrado, esporádica em areais marinhos do Algarve ao Minho. As folhas são metades de cilindro com cerca de 3 centímetros de comprimento e ponta aguçada, que começam por dispor-se em roseta e depois se eriçam num arbusto descabelado. As flores, de Verão, são verdes, hermafroditas ou femininas, e agrupam-se em glomérulos lassos nas axilas das folhas.

Suaeda albescens Lázaro Ibiza


A S. vera, a que o povo chama valverde-dos-sapais, é perene e lenhosa, e cresce muito mais que a espécie anterior. As suas flores, igualmente minúsculas (cerca de 1 milímetro de diâmetro), agrupam-se às dúzias, protegidas por uma bráctea grande e várias bractéolas; os frutos são utrículos com uma semente. Diz-se que, em tempos idos, era queimada para se retirar das cinzas um carbonato de sódio usado no fabrico de vidro. É nativa da região mediterrânica e da costa atlântica norte até Inglaterra e, por cá, segundo a Flora Ibérica, ocorre no Algarve, Baixo Alentejo e Estremadura. Contudo, o exemplar das fotos mora no estuário do Lima, em Darque, Viana do Castelo. Com sorte, é um recém-chegado da Galiza e trouxe consigo a sua fantástica parasita, a Cistanche phelypaea.

Suaeda vera Forssk. ex J. F. Gmel
Das cerca de cem espécies do género Suaeda, a Flora-On dá conta de quatro em Portugal (além das anteriores, também a S. spicata (Willd.) Moq. e a S. splendens (Pourr) Gren & Godr.). Porém, a designação da primeira não é consensual entre os taxonomistas, e a Flora Ibérica não a regista em Portugal. Por isso também neste âmbito poderão estar para breve novos cortes.

05/09/2012

A próxima invasão


Senecio inaequidens DC.



Nomes vulgares: em inglês, narrow-leaved ragwort ou South African ragwort; em francês, séneçon du Cap; em português, propomos tasneira-do-Cabo
Ecologia: terrenos ruderais, afloramentos rochosos, dunas costeiras
Distribuição global: nativa da África do Sul, Namíbia e Moçambique, foi introduzida acidentalmente na Europa no final do século XIX; hoje em dia está naturalizada em quase toda a Europa ocidental (incluindo a Grã-Bretanha, a Escandinávia e a faixa mediterrânica entre Espanha e Itália) e também na América do Norte e do Sul
Distribuição em Portugal: desconhecida, pois nunca até hoje ela tinha sido detectada no nosso país; está pelo menos naturalizada no estuário do Lima e nas dunas da Amorosa, em Viana do Castelo
Época de floração: quase todo o ano, mas especialmente de Abril a Outubro
Data e local das fotos: 12 de Agosto de 2012, Amorosa, Viana do Castelo
Informações adicionais: planta perene com 60 a 80 cm de altura, glabra, por vezes de base lenhosa, que se distingue pelas suas folhas estreitas e pelas brácteas involucrais com ápices escuros; tem vindo a expandir a sua área de ocupação a grande velocidade, e é considerada uma invasora preocupante em vários países europeus pela ameaça que pode representar para a flora nativa; contudo, a sua presença em Portugal, onde tenderá a ocupar dunas e lugares degradados, dificilmente representará uma ameaça comparável à dos chorões (Carpobrotus edulis), que, por ignorância ou incúria, ainda são usados ocasionalmente no ajardinamento público (em Moledo do Minho, por exemplo)

13/01/2005

A única revista que...

Neste mundo em que, cada vez mais, comunicamos à distância com aqueles que partilham os nossos gostos e ignoramos tudo sobre os nossos vizinhos, as revistas especializadas cumprem um papel agregador dessas dispersas comunidades de interesses, fornecendo-lhes referências e uma marca identitária. Um caçador de fim-de-semana - equipado com cão, veículo todo-o-terreno, artilharia quanto baste, farda e botas a condizer - alimentará a sua paixão, no dia-a-dia sedentário entre duas saídas de campo, com a leitura atenta de Cães & Tiros: a prosaica aparência quotidiana esconde afinal a sua verdadeira personalidade, que é a de um membro ferrenho do clube mato tudo quanto mexe.

Um relance pelos quiosques e ficamos convencidos: há interesses para tudo, e para cada interesse há uma revista ou até muitas revistas. Há assuntos em que mesmo em português elas proliferam: carros, motociclismo, cães, cavalos, caça, pesca, culturismo, decoração, bordados, saúde & bem-estar, moda, computadores, puericultura, futebol, música... No meio deste gasto desvairado de papel, uma revista há que proclama ser a única portuguesa sobre jardins; intitula-se precisamente Jardins. Será mesmo a única? Haverá mais portugueses interessados em motociclismo ou na criação de cavalos do que em jardins?

A falar verdade, a revista não é bem portuguesa: é a versão nacional de uma publicação que existe em várias línguas. Mais de dois terços do seu conteúdo não publicitário é traduzido; daí que muitas vezes ela pareça desajustada do público a quem se dirige, como nos insistentes conselhos sobre as precauções a tomar com a neve. Há dicas que são puro dislate, atribuível talvez à tradução: «devolva as formas às árvores de sombra em repouso, eliminando o ramo central principal» (n.º 28, Janeiro de 2005, pág. 36). Quer isto dizer que devemos cortar-lhes a flecha, fazendo assim com que as árvores cresçam deformadas?

O conteúdo português da revista, embora escasso, é de leitura proveitosa. Neste número de Janeiro, por exemplo, aparece uma boa reportagem sobre o jardim público de Viana do Castelo na margem do Lima: aprendemos que a sociedade que o construiu, na década de 1880, foi a mesma a quem se deve o Palácio de Cristal portuense; e recordamos a amputação que o jardim sofreu há quatro anos em prol do automóvel. Pena é que, contando-se a história do jardim, não se identifiquem as árvores, arbustos e flores que hoje o compõem. Regista-se ainda com agrado o espaço que a revista abre aos arquitectos paisagistas portugueses para descreverem os seus projectos, mas seria desejável que tais textos, potencialmente tão interessantes, fossem escritos em estilo menos canhestro.