“Sempre que queria sair procurava um título na biblioteca.”
José Eduardo Agualusa, “Teoria Geral do Esquecimento”.
José Eduardo Agualusa, “Teoria Geral do Esquecimento”.
«Um pão!
Segurou-o, incrédula, com ambas as mãos.
Cheirou-o.
O perfume do pão devolveu-a à infância. A irmã e ela, na praia, dividindo um pão com manteiga. Mordeu a massa. Só deu conta de que chorava quando terminou de comer.»
José Eduardo Agualusa, «Teoria Geral do Esquecimento»; pintura de Salvador Dali.
“Pequeno Soba lembrou-se dos sapeurs que Papy Bolingô lhe apresentara, anos antes, durante uma breve visita a Kinshasa. «Sapeur» é o nome que se dá no Congo aos maníacos da moda. Sujeitos que se vestem com roupas caras e vistosas, gastando tudo o que têm, e o que não têm, para depois se passearem pelas ruas como modelos numa passarela.”
José Eduardo Agualusa, “Teoria Geral do Esquecimento”; um verdadeiro sapeur congolês.
“O sistema socialista foi desmantelado, pelas mesmas pessoas que o haviam erguido, e o capitalismo ressurgiu das cinzas, mais feroz do que nunca. Sujeitos que, havia ainda poucos meses, bramiam em almoços de família, em festas, em comícios, em artigos nos jornais, contra a democracia burguesa, passeavam-se agora muito bem vestidos, com roupas de marca, dentro de veículos refulgentes.”
José Eduardo Agualusa, “Teoria Geral do Esquecimento”; todos sabem quem são os fotografados e não sei o nome do fotógrafo.
As pessoas não veem nas nuvens o desenho que elas têm, que não é nenhum, ou que são todos, pois a cada momento se altera. Veem aquilo por que o seu coração anseia.
Não vos agrada a palavra «coração»?
Escolham outra: alma, inconsciente, fantasia, a que acharem melhor. Nenhuma será a palavra adequada.
Ludo contemplava as nuvens e via alforrecas.“
José Eduardo Agualusa, «Teoria Geral do Esquecimento»; pintura de Thomas Cole.
“Capitão Jeremias Carrasco. Suponho que Carrasco seja alcunha. O senhor é culpado de atrocidades sem fim. Torturou e assassinou dezenas de nacionalistas angolanos. Alguns camaradas nossos gostariam de o ver num tribunal. Eu acho que não devemos perder tempo com julgamentos. O povo já o condenou.”
José Eduardo Agualusa, “Teoria Geral do Esquecimento”; um julgamento de mercenários em Luanda, 1976. Fotografo não identificado,
“Milhares de pessoas viviam nos subterrâneos, mergulhadas
na lama e na escuridão, alimentando-se daquilo que a burguesia colonial lançava para os esgotos. Ludo caminhou por entre a turba. Os homens agitavam catanas. Batiam as lâminas umas contra as outras e o ruído ecoava pelos túneis. Um deles aproximou-se,
colou o rosto sujo ao da portuguesa, e sorriu. Soprou-lhe ao ouvido, numa voz grave e doce:
O nosso céu é o vosso chão.”
José Eduardo Agualusa, “Teoria Geral do Esquecimento”; Angola em 1975, fotógrafo não identificado.