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sexta-feira, 22 de maio de 2020

[VÍDEO] - Do Livro dos Espíritos ao Roustainguismo

Canal do Observador Espírita no YouTube traz vídeo sobre o contexto do surgimento de O Livro dos Espíritos na França, e a metodologia implantada por Allan Kardec para aceitação ou não das verdades que comporiam a obra fundamental da Doutrina Espírita, fazendo um paralelo com a obra Os Quatro Evangelhos de Jean Baptiste Roustaing, considerada o primeiro cisma do Espiritismo.

Segue o link abaixo:


segunda-feira, 6 de abril de 2020

2057, a Data Limite: de novo?


Por Artur Felipe 

E eis que se passaram várias "datas-limites" e cá estamos novamente, alertando mais uma vez sobre a incessante e inglória tentativa de tornar o Espiritismo mais uma seita apocalíptica como tantas outras que passaram pelo mundo.

Em março de 2012, lançamos o artigo "O Espiritismo e os Vários Fins do Mundo", em que citamos as várias ocasiões em que fanáticos religiosos se arriscaram a fazer previsões sobre o chamado "fim do mundo" e, como sabemos, erraram flagorosamente. Alguns chegaram a arriscar estabelecer datas por diversas vezes, já que, após cada previsão, nada acontecera. As desculpas eram basicamente as mesmas: alguma possível falha na interpretação ou uma moratória qualquer, concedida por Deus ou algum alienígena ou divindade qualquer.

Por incrível que pareça, o Espiritismo, apesar de todo o grandioso trabalho de seu Codificador Allan Kardec e dos Espíritos Superiores no propósito de tornar a Doutrina nascente um farol de lucidez a iluminar as consciências, não passou incólume às tentativas das sombras organizadas de desviar o movimento espírita de seus mais nobres objetivos. Servindo-se de indivíduos meramente interessados em fama e popularidade, ou mesmo aproveitando-se da ingenuidade de alguns, entidades espirituais envolvidas nas teias da ignorância e da pseudosapiência incutem conceitos e ideias que não encontram o menor respaldo na magna Doutrina, procurando apequená-la e ridicularizá-la.

Tudo pareceu começar nos anos 50s, com as previsões do médium Hercílio Maes, adotando o pseudônimo Ramatis a fim de dar maior credibilidade às suas ideias. Segundo ele, a aproximação de um astro resultaria na elevação abrupta do eixo terrestre, ceifando, assim, a vida de um terço da população do planeta e deixando um rastro de completa destruição. A data-limite, naquela feita, era o ano 2000. Denunciamos a impostura no ano de 1997, com a publicação do livro "Ramatis, Sábio ou Pseudo-Sábio? pela Editora EME. Em 2008, escrevemos o artigo "Catastrofismo Aparvalhante: as Previsões Apocalípticas que não se Cumpriram", em que relembramos ao leitor a importância de se estar alerta a esse tipo de conteúdo.

Fora dos arraiais espíritas, mas se valendo de obras ditas mediúnicas de cunho duvidoso, foi a vez de Alziro Zarur, presidente da LBV, de propagar, em seus programas radiofônicos, o seu famoso "a 1000 chegará, mas de 2000 não passará". Zarur voltou ao mundo espiritual em 1979 e não presenciou, em vida, a passagem tranquila pelo ano 2000.

Até então, o movimento espírita permanecia fiel aos ditados dos Espiritos Superiores, que claramente advertiram que nada temos a temer, "nem um dilúvio, nem o abrasamento do planeta, nem outros fatos desse gênero, porquanto não se pode denominar cataclismos a perturbações locais que se têm produzido em todas as épocas. Apenas haverá um cataclismo de natureza moral, de que os homens serão os instrumentos."

No entanto, no ano de 2009 correu mundo a notícia de que os Maias teriam previsto o "fim do mundo" para 21 de dezembro de 2012. Mais que depressa, em 2011, é lançado o livro "Não Será em 2012", de autoria de Marlene Nobre e Geraldo Lemos Neto. Na citada obra, os autores afirmam ter ouvido da boca do médium Chico Xavier, em 1986, a previsão de que 2019 seria a data-limite para que os países aprendessem a conviver em harmonia, evitando a todo custo uma terceira Guerra Mundial. Caso contrário, uma nova idade das trevas abater-se-ia, podendo levar até mil anos para a humanidade se recompor.

Como bem sabemos, nem uma coisa, nem outra, ocorreu. A Terra permanece sofrendo as agruras comuns a um planeta de provas e expiações e nenhum cataclismo ocorreu, nem de ordem natural, nem causada pela ação humana.

Após muitas aparições na mídia e os holofotes direcionados aos autores de "Não Será em 2012", o ano de 2019 chegou ao seu fim e respiramos aliviados, não por que achássemos que algo realmente ocorreria, mas por considerar que os aproveitadores e oportunistas de plantão finalmente se calariam, amargurando a vergonha de terem levado apreensão a tantas pessoas e maculado o movimento espírita com suas afirmações inconsequentes e antidoutrinárias.

Chegou 2020 e, para nossa surpresa, em meio a uma pandemia pelo corona vírus, surge a notícia de que o ano fatídico é, na verdade, 2057 (!!!). Novamente, é o sr. Geraldo Lemos Neto, vulgo "Geraldinho", fundador da "Vinha de Luz Editora", quem revive sozinho a profecia, já que a sra. Marlene Nobre desencarnou em 2015. Reafirmando a todo momento ter convivido com Chico Xavier, o sr. Geraldo se faz valer da boa fama do médium mineiro para deflagrar novamente a sua campanha com a velha e surrada cantilena apocalíptica sem o menor embasamento doutrinário e factual. Para piorar, desta feita as previsões incorporam teses ufológicas e futuros contatos diretos com ETs e suas naves espaciais.

A alegação, desta feita, é que a humanidade conseguiu resistir à não-conflagração de uma guerra nuclear e que, assim, segundo o espírito Emmanuel, no livro “Plantão de Respostas: Pinga-Fogo II”, o mundo estaria regenerado em 2057, contrariando, inclusive, uma outra mensagem sua contida na obra "Encontros no Tempo" (IDE), de Hércio Marques C. Arantes, publicado na época em que Chico Xavier ainda estava vivo, onde consta o seguinte:

"Muitas realizações para o Terceiro Milênio, segundo Emmanuel, poderão talvez ocorrer depois de 2990. Imaginemos, pois, certos fenômenos de triagem para séculos não muito próximos. Os amigos desencarnados afirmam que na próxima galáxia, de cuja vida e grandeza compartilhamos, existem numerosos mundos de feição primitiva, aptos a nos receberem para estágios mais simples de progresso espiritual, caso não queiramos seguir o surto de elevação em que a nossa Terra está penetrando."

Vemos claramente uma imensa discordância sobre datas atribuídas ao mesmo espírito. Em qual deveríamos acreditar?

Segundo a Doutrina Espírita, o processo de transformação é atual, não sendo, portanto, algo a se iniciar no futuro: encontra-se em plena marcha. Em "A Gênese", de Allan Kardec (Cap. XVIII), aprendemos que, cada vez mais, menos espíritos inclinados ao mal reencarnam na Terra e mais espíritos propensos ao bem viriam em seus lugares. Tal processo, lento e gradual, consolida-se através de várias gerações, povoando o planeta de espíritos mais propensos ao bem.

“Tudo, pois, se processará exteriormente, como sói acontecer, com a única, mas capital diferença de que uma parte dos Espíritos que encarnavam na Terra aí não mais tornarão a encarnar. Em cada criança que nascer, em vez de um Espírito atrasado e inclinado ao mal, que antes nela encarnaria, virá um Espírito mais adiantado e propenso ao bem”. (Cap. XVIII, item 27)

P. — Disseram os Espíritos que os tempos são chegados em que tais coisas têm de acontecer: em que sentido se devem tomar essas palavras?

R. — Em se tratando de coisas de tanta gravidade, que são alguns anos a mais ou a menos? Elas nunca ocorrem bruscamente, como o chispar de um raio; são longamente preparadas por acontecimentos parciais que lhes servem como que de precursores, quais os rumores surdos que precedem a erupção de um vulcão. Pode-se, pois, dizer que os tempos são chegados, sem que isso signifique que as coisas sucederão amanhã. Significa unicamente que vos achais no período em que se verificarão.

A busca por fama e holofotes, apesar das previsões que nunca se cumprem, continua a todo vapor. O médium ramatisista Roger Bottini, na tentativa de salvar Ramatis, já cravou sua data-limite para 2036. Segundo ele, desta vez a hecatombe acontece...

Portanto, queridos amigos espíritas, não podemos mais assistir impassíveis essas absurdas tentativas de ridicularização do Espiritismo da parte de indivíduos irresponsáveis e inconsequentes que, em nome da Doutrina, intentam espalhar o terror e a apreensão, jogando o Espiritismo na vala comum das seitas apocalípticas. Esses só se calarão quando denunciarmos, a plenos pulmões, essas imposturas, conduzidas com o intuito de adquirir notoriedade e vendagem de livros, com os quais auferem elevados lucros e projeção social.

Caso deseje aprofundar-se nesta temática, acesse mais esses artigos de nossa autoria:


Se puderem, portanto, espalhem essa mensagem para que mais pessoas possam precaver-se e afastar-se definitivamente de todo esse exotismo irrefletido insuflado por mentes perversas, encarnadas e desencarnadas.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

"Em torno do Nosso Lar" é lançado em livro pela Editora Appris

A dissertação de Mestrado em Ciências das Religiões (UFPB) "Em torno do Nosso Lar - Uma análise das controvérsias produzidas no movimento espírita" foi lançada em formato de livro pela Editora Appris, de Curitiba, sob o título "Em torno do Nosso Lar - As controvérsias do Espiritismo".

Com 152 páginas, o livro, que trata das controvérsias surgidas no movimento espírita após a publicação de "Nosso Lar"em 1944, está disponível à venda no site da editora através do link:








No vídeo abaixo, o autor faz sua divulgação do livro:

sábado, 4 de janeiro de 2020

[VÍDEO] - Nos passos de Kardec

O vídeo-documentário Nos passos de Kardec é uma produção de Fernando Lima Ribeiro e de sua esposa Mariana Soares Pena, lançado no YouTube no dia 18.04.18, data em que se comemora o aniversário de “O Livro dos Espíritos” e o “Dia Nacional do Espiritismo”. As gravações foram realizadas pelo casal em uma viagem de 4 dias a Paris em 2016.

Este documentário tem a permissão de seus idealizadores para ser compartilhado gratuitamente, sendo vedado seu upload em canais não oficiais do casal. A produção mostra os passos de Allan Kardec em Paris e quinze pontos onde morou, atuou e desencarnou. O Blog dos Espíritas o recomenda positivamente a todos aqueles que se interessam não apenas pela Doutrina Espírita, mas também em conhecer melhor Allan Kardec. 

Bom aprendizado!

domingo, 30 de junho de 2019

"O Blog dos Espíritas" - 10 anos!

Há poucos dias O Blog dos Espíritas completou 10 anos de existência online. Nesse período, fizemos muitos amigos, entramos em algumas controvérsias, selecionamos textos de Allan Kardec e colaboradores que, segundo os e-mails que nos chegaram, fizeram diferença para muitos. Desde mensagens de agradecimento, relatos de pessoas que passaram a enxergar a Doutrina Espírita de um modo mais racional, mensagens que nos pediam o esclarecimento de dúvidas doutrinárias e sugestões de centros espíritas pelo Brasil.

De todo coração, foi um enorme prazer realizar este trabalho em O Blog dos Espíritas. Aprendemos muito nesse período e, se nos últimos anos, não nos foi possível dedicar-nos integralmente ao blog, foi apenas pela falta de tempo devido a dedicação à vida acadêmica e familiar.

Não há reconhecimento maior do que tantas mensagens, não só de brasileiros, mas também do exterior, com destaque para Portugal, Estados Unidos e nossos irmãos sul-americanos. Recentemente, em um grupo de Whatsapp, recebemos um PDF com mais de 400 páginas de textos selecionados de O Blog dos Espíritas, o que demonstra que ao longo destes dez anos conseguimos realizar um trabalho aprovado pela maioria de nossos visitantes. Espero que venham mais 10 anos pela frente. Um abraço a todos vocês que nos seguem até hoje.

O Blog dos Espíritas

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

[RE] - Slamora, a druidesa ou o espiritualismo no século XV

Slamora, a druidesa ou o espiritualismo no século XV*

As ideias espíritas formigam em grande número de escritores antigos e modernos, e muitos contemporâneos ficariam admirados se lhes provássemos, por seus próprios escritos, que são espíritas sem o saberem. Pode, pois, o Espiritismo encontrar argumentos em seus próprios adversários, que parecem ter sido levados, malgrado seu, a lhe fornecer armas. Assim, autores sacros e profanos apresentam um campo onde não só há o que respigar, mas a colher a mancheias. É o que nos propomos fazer um dia. Então veremos se os críticos julgam correto mandar para os asilos aqueles que incensaram e cujo nome, de pleno direito, tem autoridade nas letras, nas artes, nas ciências, na Filosofia ou na Teologia. O autor do livrinho que anunciamos não é um daqueles que pode ser chamado de espírita sem o saber. Ao contrário, é um adepto sério e esclarecido, que se dispôs a resumir as verdades fundamentais da doutrina numa ordem menos árida que a forma didática, e com o atrativo de um romance semi-histórico. Com efeito, aí encontramos o delfim, que mais tarde foi Luís XI, e alguns personagens de seu tempo, com a pintura dos costumes da época. Siamora, último rebento das antigas Druidesas, conservou as tradições do culto dos antepassados, mas esclarecida pelas verdades do Cristianismo. Num artigo da Revista de abril de 1858, vimos a que grau haviam chegado os sacerdotes da Gália, no tocante à filosofia espírita. Assim, nenhuma contradição existe ao pôr essas mesmas ideias na boca de sua descendente. Ao contrário, é pôr em evidência uma verdade muito pouco conhecida, e que o autor bem mereceu dos espíritas modernos. Podemos julgá-lo pelas seguintes citações. Num momento de êxtase, dirigindo-se a Siamora, a jovem noviça Edda assim se exprime: 

“Sob a forma de meu bom anjo, meu anjo familiar, aparece-me um Espírito. Oferece-se para me guiar nas penosas visões daqui debaixo. Os homens, diz-me ele, são maus apenas porque ignoraram sua natureza espiritual; porque rejeitaram esse agente sutil, esse fluxo divino que Deus havia espalhado para a felicidade dos homens na criação, e que os fazia iguais e irmãos. Então os homens curavam, porque apelavam a esse agente sutil da criação, dele retirando poderoso auxílio”. 
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“É na hora da morte que cada homem me aparece! Que tristeza! Que desgosto! Que desespero amargo! Cessaram de amar, esses seres perversos. Siamora! Ao morrer, cada homem leva as virtudes e os vícios. Leve, ou carregada de faltas, sua alma se eleva mais ou menos, pois guardou pouco ou muito do agente sutil, o amor, essa substância de Deus que, conforme as afinidades, atrai para si as substâncias semelhantes e repele as que procedem de um princípio contrário. 

“A alma do homem mau fica errante aqui embaixo, a todos insuflando sua essência pestilenta. Ela tem a alegria do mal e o orgulho do vício. Nós a chamamos demônio; no Céu, seu nome é irmão transviado. ─ Mas de todos os corações piedosos, Siamora, eleva-se um suave vapor e, malgrado seu, a alma-demônio chega a ser saturada pelo mesmo; assim se retempera, despojando-se em parte de sua corrupção... Então começa a perceber a ideia de Deus, o que naquele estado de alma não conseguia. Assim como a alma leva consigo a imagem exata, embora espiritual de seu corpo, assim a ela se junta esta outra, impregnada de seus vícios e imperfeições, e a alma se adensa e não pode ver. 

“Nesse mundo invisível, acima do nosso, Siamora, onde com esforço me elevo pouco a pouco, nuvens brilhantes limitam-me a visão. Milhares de almas, Espíritos celestes, nele entram e saem. Assim como flocos de neve, abaixados, elevados, espalhados, correm arrastados pela força caprichosa dos ventos. Em sua essência espiritual, descem até nós os anjos, dizendo a uns palavras de paz; insinuando ao coração de outro a crença divina; inspirando a este a busca da Ciência; insuflando naquele o instinto do bem e do belo, porque foi tocado pelo dedo de Deus aquele que, em sua arte, a esta levou o gosto das nobres e grandes coisas. Todo homem tem a sua Egéria, o seu conselho, o seu imã. A todos foi lançada a corda da salvação. A nós, cabe segurá-la. 

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“Esse homem mau, ou antes, essa alma-demônio, cujos olhos, ao contato de um ar puro, começaram a se abrir, vai chorando o seu crime e pedindo o sofrimento para expiá-lo. Só e sem auxílio, o que fará? 

“Aproxima-se um anjo de caridade e lhe diz: irmão transviado, entra comigo na vida. Aqui é o Inferno, o lugar de sofrimento, onde cada um de nós se regenera. Vem. Eu te sustentarei. Tratemos de fazer um pouco de bem, a fim de que, para ti, a balança do bem e do mal acabe pendendo para o lado bom. 

“É assim, Siamora, que para todos os homens chega o momento de morrer. Eu os vejo elevando-se mais ou menos nos céus, reentrar na vida, sofrer de novo, depurar-se, morrer ainda e subir incessantemente, nos espaços celestes. Ainda não atingem o Céu do Deus único, mas, através de longas peregrinações em outros mundos muito mais maravilhosos e aperfeiçoados que este, à força de se depurarem, chegarão a possuí-lo.

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* Um vol. In-18, preço 2 fr. ; Vannier, livraria e editora, Rua Notre Dame-des-Victoires, 52. – 1860.

Revista Espírita - Jornal de estudos psicológicos - 1860 - Março 
https://kardecpedia.com/roteiro-de-estudos/894/revista-espirita-jornal-de-estudos-psicologicos-1860/4692/marco/bibliografia-slamora-a-druidesa-ou-o-espiritualismo-no-seculo-xv

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Porque todos nos calamos!

Por Marcelo Henrique

Primeiro eles vieram com a exaltação à "santidade" e a "pureza", ou "perfeição" do homem de Nazaré. Deturparam textos de Kardec, com traduções bizarras. E você se calou!

Depois, resolveram editar "Os quatro evangelhos" e, massificadamente, utilizaram o expediente da publicidade em sua "revista oficial", a da Reforma - não por acaso - divulgando a obra com seu epíteto "a revelação da revelação", porque "precisavam" de "novidades". E você se calou!

Então, foram introduzindo livros, ditos psicografados ou escritos por literatos espíritas, editando-os em sequência, apresentando o Jesus-fluídico (sem sofrimentos físicos) e a virgindade de Maria, para celebrar os "mistérios". E você se calou!

Elegeram um "anjo" - materialização de uma fábula católica - como "guia espiritual" do planeta e você achou sublime, porque a ideia da angelitude é uma metáfora em relação ao ápice do percurso espiritual. Você se deixou convencer, e se calou!

Adiante, aproveitando-se de uma prodigiosa (mas ingênua) mediunidade, que produzia muito, deram-lhe o caráter de "continuador" doutrinário, sem criticar os textos que provinham de um velho sacerdote católico, impregnado de suas crendices e visões igrejistas. E você, novamente, se calou!

Dizem, até, que os originais das obras psicografadas foram todos destruídos. Porque não havia necessidade de mantê-los, pois tínhamos os livros editados, físicos. E o silêncio foi a sua resposta!

Foram desistindo da filosofia e da ciência, entendendo que o edifício estava pronto e que as manifestações de espíritos eleitos e médiuns escolhidos, do ontem e do hoje, foram todas, sempre, autorizadas pela "Espiritualidade", e você silenciou novamente!

Capciosamente, tocaram o teu coração com a simbologia da mensagem sublime, sobre amor e caridade, sobre perdão e não-discórdia, para tê-lo como cordeiro diante do Pastor, e você não esboçou qualquer reação!

Resgataram velhos conceitos de temor e culpa, tão comuns entre as igrejas, desde Constantino, instituindo "prêmios" para bons comportamentos, bonificadores, definindo lugares imaginários para o regalo das almas submissas à meia-verdade, com departamentos e ocupações similares às da Terra, e você deixou "barato", porque desejava uma esperança de que, na outra vida, as coisas se parecessem com a "atmosfera" da vida física. E você se aquietou!

Agora resgatam textos evangélicos diferentes dos escolhidos como relevantes por Kardec e pela Verdade, publicando oficialmente "O Novo Testamento" e projetando uma versão da Bíblia (Antigo Testamento), porque, afinal, um é a consequência do outro, e que voltar aos textos antigos é buscar a "sinergia" entre as mensagens. E você até está pensando, silente, em comprar as obras!

Disseram-te, também, que o tal controle das mensagens só era necessário na época de Kardec, porque a doutrina estava iniciando e era necessário filtrar as muitas comunicações, evitando a desfiguração da "árvore cristã". E você aplaudiu, inconsciente, entendendo que a diretriz vinha, mesmo, do Alto, e calar-se para aprender seria a única alternativa!

E os pastores prosseguem, tangendo as almas pacatas, desfigurando a mensagem e aproximando-a das vaidades e das honrarias do mundo. Todos se maravilham ante os "dotes" artísticos, literários e de oratória de um ou outro virtuose, enquanto os grupos de aprofundamento espírita, de discussão e de promoção de saudáveis debates em busca dos conhecimentos progressivos, mingua e se esvai, no tempo, contando com a tua aquiescência e timidez, silenciosas!

Dizemos, por vezes, que não temos tempo, nem energia para gastar com contendas, que precisamos cuidar de coisas mais importantes, que não estamos no "movimento" para "procurar confusão", e os dias vão passando... E a você só resta o silêncio de sua intimidade, a conversa com seus botões, e aquela indignação quase morta, que não ultrapassa os limites de sua boca, de sua letra, ou de sua própria casa...

Porque você, eu, todos nós... Nos calamos!

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Cosme Massi refuta afirmações de Luiz Felipe Pondé sobre o Espiritismo

O filósofo Luiz Felipe Pondé resolveu fazer críticas ao Espiritismo em seu canal do YouTube. Demonstrou desconhecer os princípios elementares da Doutrina Espírita e recebeu uma resposta muito bem fundamentada e educada de Cosme Massi, que pôs abaixo suas críticas. Confiram:

O espiritismo é uma filosofia respeitada pelo mainstream filosófico? - Luiz Felipe Pondé


Cosme Massi rebate Pondé

terça-feira, 18 de abril de 2017

domingo, 26 de março de 2017

[VÍDEO] - O Que é o Espiritismo - Viagem Espírita em 1862

Fabiano Nunes apresenta O Que é o Espiritismo: seus princípios, suas obras fundamentais, a metodologia utilizada por Allan Kardec, dentre outros esclarecimentos sobre os conceitos e a prática da Doutrina dos Espíritos. Esse quadro faz parte do programa de TV Despertar Espírita exibido no dia 27 de outubro de 2012.

[VÍDEO] - Ramatis em uma análise espírita

Apresentamos aqui uma série de apresentações do escritor e pesquisador espírita Artur Felipe Ferreira, autor de Ramatis: sábio ou pseudossábio?, a respeito das comunicações mediúnicas deste espírito que tantas controvérsias trouxe ao meio espírita.

O Blog dos Espíritas

 

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Marcha gradual do Espiritismo. Dissidências e entraves

Por Allan Kardec


27 DE ABRIL DE 1866

(Paris, em casa do sr. Leymarie, méd. sr. L...)

Caros condiscípulos, o que é verdadeiro deve ser; nada pode se opor à irradiação de uma verdade; às vezes, pode-se velá-la, torturá-la, fazer nela o que fazem os teredos nos diques holandeses; mas uma verdade não é edificada sobre estaca: ela corta o espaço; está no ar ambiente, e se pôde deslumbrar uma geração, há sempre encarnações novas, de recrutamentos da erraticidade que vêm trazer germes fecundos, outros elementos, e que sabem atrair para eles todas as grandes coisas desconhecidas.

Não vos apresseis muito, amigos; muitos dentre vós gostariam de ir a vapor, e nesse tempo de eletricidade, correr como ela. Esqueceis as leis da Natureza, gostaríeis de ir mais depressa do que o tempo. Refleti, no entanto, o quanto Deus é sábio em tudo. Os elementos que constituem o vosso planeta sofreram uma longa e laboriosa criação; antes que pudésseis existir, foi necessário que tudo se constituísse segundo a aptidão de vossos órgãos. A matéria, os minerais, fundidos e refundidos, os gases, os vegetais, pouco a pouco harmonizados e condensados, a fim de permitir a vossa eclosão sobre a Terra. É a eterna lei do trabalho que não cessou de reger os seres inorgânicos, como os seres inteligentes.

O Espiritismo não pode escapar a essa lei, à lei da criação. Implantado sobre um solo ingrato, é preciso que haja suas más ervas, seus maus frutos. Mas também, cada dia se roçam, se arrancam, se cortam os maus ramos; o terreno se surriba insensivelmente, e quando o viajor, fatigado das lutas da vida, encontrar a abundância e a paz à sombra de um fresco oásis, virá estancar a sua sede, enxugar seus suores, nesse reino lenta e sabiamente preparado; ali o rei é Deus, esse dispensador generoso, esse igualitário judicioso, que sabe bem que o trajeto a seguir é doloroso, mas fecundo; penoso, mas necessário; o Espírito formado na escola do trabalho, dela sai mais forte e mais apto para as grandes coisas. Aos desfalecidos ele diz: coragem; e como esperança suprema, deixa entrever, mesmo aos mais ingratos, um ponto de atraso, ponto salutar, caminho demarcado pelas reencarnações.

Ride das vãs declamações: deixai falar os dissidentes, berrar aqueles que não podem se consolar por não serem os primeiros; todo esse pequeno ruído não impedirá o Espiritismo de fazer invariavelmente o seu caminho; é uma verdade, e, como um rio, toda verdade deve seguir o seu curso.

Fonte: Obras Póstumas - http://www.espirito.org.br/portal/codificacao/op/op-57.html

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

[RE] - Resposta ao Sr. Oscar Comettant

Por Allan Kardec

Senhor, 

Consagrastes o folhetim do Le Siècle de 27 de outubro último aos Espíritos e aos seus partidários. Apesar do ridículo que lançais sobre um problema muito mais sério do que pensais, apraz-me reconhecer que, atacando o princípio, guardais as conveniências pela urbanidade da forma, pois não é possível dizer com mais polidez que a gente não tem bom-senso. Assim, não confundirei o vosso espirituoso artigo com as grosseiras diatribes que dão uma triste ideia do bom gosto de seus autores, aos quais fazem justiça todas as pessoas educadas, sejam ou não nossas partidárias.

Não tenho o hábito de responder às críticas. Assim, teria deixado passar o vosso artigo, como tantos outros, se não tivesse recebido dos Espíritos o encargo, primeiramente de vos agradecer por vos terdes ocupado deles, e depois de vos dar um conselho. Compreendereis, senhor, que de mim mesmo não o faria. Desincumbo-me de minha tarefa. Eis tudo.

─ Como! – direis – Então os Espíritos se ocupam de um folhetim que escrevi sobre eles? É muita bondade de sua parte.

─ Certamente, pois estavam ao vosso lado quando escrevíeis. Um deles, que vos quer bem, chegou mesmo a tentar impedir que utilizásseis certas reflexões, que não eram por ele julgadas à altura da vossa sagacidade, temendo por vós a crítica, não dos Espíritos, com os quais vos ocupais muito pouco, mas daqueles que conhecem a extensão do vosso conhecimento.

Ficai certo de que eles estão por toda parte; que sabem tudo quanto se diz e se faz e que no momento em que lerdes estas linhas, estarão ao vosso lado, vos observando. Podeis dizer:

─ Não posso crer na existência desses seres que povoam o espaço mas que não vemos.

─ Credes no ar que não vedes e que, entretanto, nos envolve?

─ Isto é muito diferente. Eu creio no ar porque, embora não o veja, eu o sinto; eu o escuto rugir na tempestade e ressoar no tubo da lareira, e vejo os objetos por ele derrubados.

─ Pois então! Os Espíritos também se fazem ouvir; também movem os corpos sólidos, levantam-nos, transportam-nos, quebram-nos.

─ Ora esta, Sr. Allan Kardec! Apelai para a vossa razão. Como quereis que seres impalpáveis, ─ supondo que eles existam, o que só admitiria se os visse, ─ tenham tal poder? Como podem seres imateriais agir sobre a matéria? Isto não é razoável.

─ Credes na existência dessas miríades de animálculos que estão em vossa mão e que podem ser cobertos aos milhares pela ponta de uma agulha?

─ Sim, porque não os vejo com os olhos, mas o microscópio me permite vê-los.

─ Mas antes da invenção do microscópio, se alguém vos tivesse dito que tendes sobre a pele milhares de insetos que nela pululam; que uma límpida gota d’água encerra toda uma população; que os absorveis em massa com o ar mais puro que respirais, que teríeis respondido? Teríeis gritado contra o disparate e, se fôsseis folhetinista, não teríeis deixado de escrever um belo artigo contra os animálculos, o que não teria impedido que existissem. Hoje o admitis porque o fato é patente. Antes, porém, teríeis declarado que era coisa impossível.

Que há, pois, de mais irracional em crer que o espaço seja povoado de seres inteligentes que, embora invisíveis, não são microscópicos? Quanto a mim, confesso que a ideia de seres pequenos como uma parcela homeopática e, não obstante, providos de órgãos visuais, sensoriais, circulatórios, respiratórios, etc., me parece ainda mais extraordinária.

─ Concordo, mas ainda assim são seres materiais, são qualquer coisa, enquanto os vossos Espíritos, o que são? Não são nada. São seres abstratos, imateriais.

─ Para começar, quem vos disse que são imateriais? A observação, ─ peço-vos que peseis bem este vocábulo observação, que não quer dizer sistema, ─ a observação, dizia eu, demonstra que essas inteligências ocultas têm um corpo, um envoltório, invisível, é certo, mas não menos real. Ora, é por esse intermediário semimaterial que elas agem sobre a matéria. São apenas os corpos sólidos que têm força motriz? Não são, ao contrário, os corpos rarefeitos que possuem esse poder no mais alto grau, tal como o ar, o vapor, todos os gases, a eletricidade? Por que, então, o negareis à substância que constitui o envoltório dos Espíritos?

─ De acordo, mas se essas substâncias são invisíveis e impalpáveis em certos casos, a condensação pode torná-las visíveis e mesmo sólidas. Poderemos pegá-las, guardá-las, analisá-las, com o que sua existência ficaria irrecusavelmente demonstrada.

─ Ora! Essa é boa! Negais o Espírito porque não podeis metê-lo numa retorta e saber se são compostos de oxigênio, hidrogênio e nitrogênio. Dizei-me, por obséquio, se antes das descobertas da Química moderna eram conhecidas a composição do ar, da água, e as propriedades de uma porção de corpos invisíveis, de cuja existência nem suspeitávamos. Que teriam dito, então, a quem anunciasse todas as maravilhas que hoje admiramos? Tê-lo-iam tratado como charlatão e visionário. Suponhamos que vos caia nas mãos um livro de um cientista de então, negando todas essas coisas e que, além do mais, tivesse tentado demonstrar-lhes a impossibilidade. Diríeis: Eis um cientista bem pretensioso, que se pronunciou muito levianamente, decidindo sobre o que não sabia. Para sua reputação teria sido melhor abster-se. Numa palavra, faríeis um juízo muito pouco lisonjeiro de sua opinião. Então! Em alguns anos veremos o que se pensará daqueles que hoje tentam demonstrar que o Espiritismo é uma quimera.

É sem dúvida lamentável para certas pessoas, e para os amadores, que os Espíritos não possam ser postos dentro de um frasco, para serem observados à vontade. Não penseis, entretanto, que eles escapem aos nossos sentidos de maneira absoluta. Se a substância que constitui o seu envoltório é invisível em estado normal, também pode, em certos casos, como o do vapor, mas por outra causa, experimentar uma espécie de condensação ou, para ser mais exato, uma modificação molecular, que a torna momentaneamente visível e mesmo tangível. Podemos então vê-los, como nós nos vemos, tocá-los, apalpá-los. Eles podem pegar-nos e deixar marcas em nossos membros. Mas esse estado é temporário. Podem deixá-lo tão rapidamente quanto o tomaram, não em virtude de uma rarefação mecânica, mas por efeito da vontade, pois são seres inteligentes e não corpos inertes. Se a existência dos seres inteligentes que povoam o espaço está provada; se, como acabamos de ver, eles exercem ação sobre a matéria, que há de admirável em que possam comunicar-se conosco e transmitir seus pensamentos por meios materiais?

─ Se a existência desses seres for provada, sim. Aí, porém, é que está a questão.

─ Inicialmente, o importante é provar essa possibilidade. A experiência fará o resto. Se essa existência não está provada para vós, está para mim. Ouço daqui dizerdes intimamente: “Eis um argumento fraquíssimo.” Concordo que minha opinião pessoal tenha pouco valor, mas não estou só. Muitos outros, antes de mim, pensavam do mesmo modo. Eu não inventei nem descobri os Espíritos. Essa crença conta com milhões de aderentes, tanto ou mais inteligentes do que eu. Quem decidirá entre os que creem e os que não creem?

─ O bom-senso, direis vós.

─ Que seja. Acrescento, no entanto, que o tempo diariamente nos auxilia. Mas com que direito aqueles que não creem se arrogam o privilégio do bom-senso, quando principalmente os que acreditam são recrutados, não entre os ignorantes, mas entre gente esclarecida, cujo número cresce dia a dia? Eu o julgo por minha correspondência; pelo número de estrangeiros que me vêm ver; pela propagação de meu jornal, que completa o seu segundo ano e tem assinantes nas cinco partes do mundo, nas mais altas camadas da Sociedade e até nos tronos. Dizei-me, em sã consciência, se isto é a marcha de uma ideia oca, de uma utopia.

Constatando esse fato capital no vosso artigo, dizeis que ele ameaça tomar as proporções de um flagelo e acrescentais: “Já não tinha a espécie humana, ó bom Deus! tantas futilidades para lhe perturbar a razão, sem esta nova doutrina que vem apoderar-se de nosso pobre cérebro?”

Parece que não apreciais as doutrinas. Cada um tem o seu gosto. Nem todos gostam das mesmas coisas. Direi apenas que não sei a que papel intelectual o homem seria reduzido se, desde que se acha na face da Terra, não tivesse tido suas doutrinas que, fazendo-o refletir, o tiraram do estado passivo de bruto. Sem dúvida há doutrinas boas e más, justas e falsas, mas foi para discerni-las que Deus nos deu a razão.

Esquecestes uma coisa: a definição clara e precisa daquilo que classificais como futilidades. Há pessoas que assim qualificam todas as ideias de que não compartilham, mas vós tendes inteligência suficiente para acreditar que esta se tenha condensado apenas em vós. Há outras pessoas que dão esse nome a todas as ideias religiosas, e que olham a crença em Deus, na alma e na sua imortalidade, nas penas e recompensas futuras como boas somente para as beatas e para intimidar as crianças. Não conheço vossa opinião a respeito, mas do ponto de vista do vosso artigo, alguém poderia inferir que aceitais um pouco essas ideias. Quer delas partilheis, quer não, eu me permitirei dizer, com muitos outros, que nelas estaria o verdadeiro flagelo, caso se propagassem. Com o materialismo; com a crença de que morremos como os animais e depois de nós será o nada, o bem não terá nenhuma razão de ser e os laços sociais nenhuma consistência. É a sanção do egoísmo. A lei penal será o único freio a impedir que o homem viva à custa de outrem. Se assim for, com que direito puniremos o homem que mata o seu semelhante para apoderar-se de seus bens? Porque isso seria um mal, direis vós. Mas por que é um mal? E ele vos responderá: Depois de mim não há nada. Tudo se acaba. Nada receio. Quero viver aqui o melhor possível, e para isso, tomarei dos que têm. Quem mo proíbe? Vossa lei? Vossa lei terá razão se for mais forte, isto é, se me pegar. Mas se eu for mais esperto, se lhe escapar, a razão estará comigo.

Então vos perguntarei qual a Sociedade que poderá subsistir com semelhantes princípios?

Isto me recorda o seguinte fato:

Um senhor que, como se diz vulgarmente, não acreditava em Deus nem no diabo, e não o ocultava, notou que vinha sendo roubado por seu criado. Um dia pilhou-o em flagrante e lhe perguntou:

─ Como ousas, infeliz, tomar o que não te pertence? Não crês em Deus?

O criado pôs-se a rir e respondeu:

─ Por que haveria eu de crer, se vós também não credes? Por que tendes mais do que eu? Se eu fosse rico e vós pobre, quem vos impediria de fazer o mesmo que faço? Desta vez não tive sorte, eis tudo. De outra, procurarei agir melhor.

Aquele senhor teria ficado mais contente se seu criado não tivesse tomado a crença em Deus como uma futilidade. É a essa crença e às que da mesma decorrem que deve o homem a sua verdadeira segurança social, muito mais do que à severidade da lei, pois a lei não pode tudo alcançar. Se a crença se arraigasse no coração de todos, nada deveriam temer uns dos outros. Atacá-la de frente é soltar as rédeas a todas as paixões e destruir todos os escrúpulos. Foi isto que levou recentemente um sacerdote, quando pediram sua opinião sobre o Espiritismo, a dizer estas palavras sensatas: “O Espiritismo conduz à crença em alguma coisa. Ora, eu prefiro aqueles que acreditam em alguma coisa aos que em nada acreditam, pois estes não creem nem mesmo na necessidade do bem”.

Com efeito, o Espiritismo é a destruição do materialismo. É a prova patente e irrecusável daquilo que certas pessoas chamam futilidades, a saber: Deus, a alma, a vida futura feliz ou infeliz. Este flagelo, como vós o chamais, tem outras consequências práticas. Se soubésseis, como eu, quantas vezes ele fez voltar a calma a corações ulcerados pela mágoa; que doce consolação espalha sobre as misérias da vida; quanto acalma o ódio e impede os suicídios, zombaríeis menos.

Suponde que um de vossos amigos venha dizer-vos: “Eu estava desesperado; ia estourar os miolos, mas hoje, graças ao Espiritismo, sei quanto isto me custaria, e desisto.” Se outra pessoa vos disser: “Eu invejava o vosso mérito e a vossa superioridade. O vosso sucesso tirava-me o sono. Queria vingar-me, derrotar-vos, arruinar-vos. Queria, mesmo, matar-vos. Confesso que correstes grande perigo. Hoje, porém, que sou espírita, compreendo tudo quanto esses sentimentos possuem de ignóbil e os abjuro. Em vez de vos fazer mal, venho prestar-vos um obséquio.” Provavelmente diríeis: “Ainda bem que existe algo de bom nessa loucura”.

O que estou dizendo, senhor, não visa convencer-vos, nem vos converter às minhas ideias. Tendes convicções que vos bastam e que, para vós, resolvem todas as questões sobre o futuro. É, pois, muito natural que as conserveis. Mas vós me apresentais aos vossos leitores como o propagador de um flagelo. Eu precisava mostrar-lhes, pois, que seria desejável que nenhum flagelo produzisse um mal maior, a começar pelo materialismo. Conto com a vossa imparcialidade para transmitir-lhes a minha resposta.

Então direis:

─ Mas eu não sou materialista. Pode-se muito bem não ter essa opinião e não crer nas manifestações dos Espíritos.

─ Concordo. Então se é espiritualista sem ser espírita. Se me equivoquei quanto à vossa maneira de ver, é porque tomei ao pé da letra a profissão de fé do fim do vosso artigo. Dizeis: “Creio em duas coisas: no amor dos homens por tudo quanto é maravilhoso, mesmo quando esse maravilhoso é absurdo, e no editor que me vendeu o fragmento da sonata ditada pelo Espírito de Mozart, pelo preço de 2 francos.”

Se toda a vossa crença se limita a isso, ela me parece ser a prima irmã do ceticismo. Mas aposto que credes em algo mais do que no Sr. Ledoyen, que vos vendeu por 2 francos um fragmento de sonata. Credes no produto de vossos artigos, que, segundo presumo, salvo engano meu, não ofereceis mais pelo amor de Deus do que faz o Sr. Ledoyen com os seus livros. Cada um tem o seu ofício. O Sr. Ledoyen vende livros. O literato vende prosa e verso. Nosso pobre mundo não está suficientemente adiantado para que possamos morar, comer e vestir-nos de graça. Talvez um dia os proprietários, os alfaiates, os açougueiros, os padeiros estejam bastante esclarecidos para compreender que é ignóbil para eles pedir dinheiro. Então os livreiros e os literatos serão arrastados pelo exemplo.

─ Com tudo isto, não me destes o conselho que me dão os Espíritos.

─ Ei-lo: É prudente não nos pronunciarmos muito levianamente sobre aquilo que não conhecemos. Imitemos a sábia reserva do sábio Arago, que dizia, a propósito do magnetismo animal: “Eu não poderia aprovar o mistério que hoje fazem os cientistas sérios quando vão assistir às experiências de sonambulismo. A dúvida é prova de modéstia e raramente prejudica o progresso das ciências. Já o mesmo não podemos dizer da incredulidade. Aquele que, fora das matemáticas puras, pronunciar o vocábulo impossível, denota falta de prudência. A reserva é um dever, principalmente quando se trata do organismo animal”. (Notícia sobre Bailly).

Respeitosamente,

ALLAN KARDEC

Revista Espírita, Dezembro de 1859

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

[RE] - O músculo que range

Por Allan Kardec

Os adversários do Espiritismo acabam de fazer uma descoberta que deve contrariar bastante os Espíritos batedores. É para eles um desses golpes do qual dificilmente se reabilitarão. Com efeito, que devem pensar esses pobres Espíritos da terrível cutilada com que os atingiram o Sr. Schiff, depois o Sr. Jobert (de Lamballe) e por fim o Sr. Velpeau? Parece-me vê-los muito embaraçados, resmungando mais ou menos assim: “Ora veja, meu caro, estamos em palpos de aranha! Estamos naufragados! Não havíamos contado com a Anatomia, que descobriu as nossas artimanhas. Positivamente não podemos viver num país onde há gente que enxerga tão longe!”

─ Vamos, senhores basbaques, que acreditastes em todas essas histórias do arco da velha; impostores que nos quisestes enganar, levando-nos a admitir a existência de seres que não vemos; ignorantes que admitis a existência de alguma coisa que escapa ao nosso escalpelo, inclusive a vossa alma. E vós todos, escritores espíritas ou espiritualistas, mais ou menos espirituosos, inclinai-vos e reconhecei que não passais de iludidos, de charlatães e até de marotos e de imbecis. Esses senhores vos deixam a escolha, porque aqui está a luz, a verdade pura:

“ACADEMIA DE CIÊNCIAS (Sessão de 18 de abril de 1859). 

DA INVOLUNTÁRIA CONTRAÇÃO MUSCULAR RÍTMICA.

O Sr. Jobert (de Lamballe) comunica um fato curioso da involuntária contração rítmica do pequeno peroneal lateral direito, que confirma a opinião do Sr. Schiff, relativamente ao fenômeno oculto dos Espíritos batedores.
“A senhorinha X..., de 14 anos, forte, bem constituída, desde os 6 anos é afetada de movimentos involuntários regulares do pequeno músculo peroneal lateral direito e de batidas, que podem ser escutadas, por detrás do maléolo externo direito, com a regularidade do pulso. Apareceram pela primeira vez na perna direita, à noite, acompanhados de dor muito forte. Depois de pouco tempo, o pequeno peroneal lateral esquerdo foi atingido por uma afecção da mesma natureza, posto que de menor intensidade.

“O efeito desses batimentos é o de provocar dor; de produzir insegurança ao caminhar e até de provocar quedas. A jovem doente declarou-nos que a extensão do pé e a compressão exercida sobre certos pontos do pé e da perna chegam a pará-los, embora continue sentindo dores e fadiga no membro.

“Quando essa criatura interessante se nos apresentou, eis o estado em que a encontramos. Era fácil de constatar, ao nível do maléolo externo direito, no bordo superior dessa saliência óssea, um batimento regular, acompanhado de uma saliência passageira e de um levantamento das partes moles da região, os quais se apresentavam com um ruído seco, após cada contração muscular. Esse ruído era ouvido no leito, fora do leito e a uma distância bem considerável do lugar onde a moça repousava. Notável por sua regularidade e pela nitidez dos estalos, o ruído a acompanhava por toda parte. Auscultando o pé, a perna e o maléolo, distinguia-se um choque incômodo, que atingia todo o trajeto percorrido pelo músculo, tal qual um golpe que se transmite de uma a outra extremidade de uma viga. Por vezes o ruído se assemelhava a um atrito, a uma raspagem, quando as contrações eram menos intensas. Esses mesmos fenômenos se repetiam sempre, estivesse a doente de pé, sentada ou deitada, a qualquer hora do dia ou da noite em que a examinássemos.

“Se estudarmos o mecanismo desses batimentos e se, para maior clareza, descompusermos cada batimento em dois tempos, veremos que:

“No primeiro tempo o tendão do pequeno perônio lateral se desloca, saindo da goteira e por isso levantando o grande perônio lateral e a pele.

“No segundo tempo, realizado o fenômeno de contração, seu tendão se relaxa, retorna à goteira e, batendo nela, produz o ruído seco e sonoro de que acabamos de falar.

“Repetia-se, por assim dizer, de segundo em segundo, e cada vez o pequeno artelho sofria um abalo e a pele que recobria o quinto metatarso era levantada pelo tendão. Cessava quando o pé estava fortemente estendido. Cessava ainda quando se exercia pressão sobre o músculo ou sobre a bainha dos perônios.

“Nestes últimos anos, os jornais franceses e estrangeiros têm falado muito de ruídos semelhantes a marteladas, ora regulares, ora afetando um ritmo particular, e que se produziam em volta de certas pessoas deitadas em seu leito.

“Os charlatães se apoderaram desses fenômenos singulares, cuja realidade, aliás, é atestada por testemunhas fidedignas, e tentaram relacioná-los com a intervenção de uma causa sobrenatural, do que se serviram para explorar a credulidade pública.

“A observação da senhorinha X mostra como, sob a influência da contração muscular, podem os tendões deslocados, no momento em que entram nas goteiras ósseas, produzir batimentos que, para certas pessoas, anunciam a presença de Espíritos batedores.

“Com o exercício, qualquer pessoa pode adquirir a faculdade de produzir à vontade semelhantes deslocamentos dos tendões e batimentos secos que se ouvem à distância.

“Repelindo qualquer ideia de intervenção sobrenatural e notando que esses batimentos e esses ruídos estranhos se passavam sempre ao pé do leito dos indivíduos agitados pelos Espíritos, o Sr. Schiff se perguntou se a sede desses ruídos não estaria neles próprios, e não exteriormente. Seus conhecimentos anatômicos levaram-no a pensar que bem podia ser na perna, na região peroneal onde se acham uma superfície óssea, tendões e uma corrediça comum.

“Tendo-se arraigado em seu espírito essa maneira de ver, fez ele experiências e ensaios em si mesmo, os quais o convenceram de que o ruído tinha sua sede por detrás do maléolo externo e na corrediça dos tendões do perônio.

“Em breve o Sr. Schiff foi capaz de executar ruídos voluntários, regulares, harmoniosos e, perante um grande número de pessoas (cinquenta testemunhas), pôde imitar os prodígios dos Espíritos batedores, com ou sem sapatos, de pé ou deitado.

“O Sr. Schiff concluiu que todos esses ruídos se originam no tendão do grande perônio, quando passa na goteira peroneal, e acrescenta que eles coexistem com um adelgaçamento ou ausência da bainha comum no grande e no pequeno perônio.

Quanto a nós, admitindo inicialmente que todos esses batimentos são produzidos pela queda do tendão na superfície óssea peroneal, pensamos, entretanto, que não há necessidade de uma anomalia da bainha para que isto aconteça. Basta a contração do músculo, o deslocamento do tendão e sua volta à goteira para dar-se o ruído. Além disso, só o pequeno perônio é agente do citado ruído. Com efeito, ele afeta uma direção mais reta que o grande perônio, o qual sofre vários desvios em seu trajeto; está situado profundamente na goteira; recobre inteiramente a goteira óssea, de onde é natural concluir que o ruído é produzido pelo choque desse tendão sobre as partes sólidas da goteira. Ele apresenta fibras musculares até a entrada do tendão na goteira comum, ao passo que o contrário se dá com o grande perônio.

“O ruído é de intensidade variável e podem realmente distinguir-se as suas várias nuanças. É assim que, desde o ruído retumbante, que se ouve à distância, encontramos variedades de ruídos, de atritos, de serra, etc.

“Pelo método subcutâneo, fizemos incisões sucessivamente através do corpo do pequeno perônio lateral direito e do corpo do mesmo músculo do lado esquerdo de nossa doente e mantivemos os membros imobilizados por meio de um aparelho. Feita a sutura, as funções dos dois membros foram restabelecidas sem qualquer traço dessa singular e rara afecção.

“Sr. Velpeau. Os ruídos de que acaba de tratar o Sr. Jobert em seu interessante comunicado parecem ligados a uma questão muito ampla. Com efeito, observam-se os mesmos ruídos em inúmeras regiões. A anca, a espádua, a face interna do pé frequentemente lhe servem de sede. Observei, entre outros, o caso de uma senhora que por meio de certos movimentos de rotação da coxa produzia uma espécie de música suficientemente nítida para ser ouvida de um ao outro lado da sala. O tendão da parte longa do bíceps braquial a produz facilmente, saindo de sua bainha, quando os feixes fibrosos que o retêm naturalmente se relaxam e se rompem. Dá-se o mesmo com o músculo posterior da perna ou com o músculo flector do artelho, por trás do maléolo interno. Como bem o compreenderam os senhores Schiff e Jobert, tais ruídos se explicam pela fricção ou pelos sobressaltos dos tendões nas ranhuras ou contra os bordos de superfícies sinoviais. Consequentemente, são possíveis numa infinidade ou nas vizinhanças de uma porção de órgãos. Ora claros e sonoros, ora surdos e obscuros, por vezes úmidos, outras vezes secos, variam extremamente de intensidade.

“Esperemos que o exemplo dado a respeito pelos senhores Schiff e Jobert leve os fisiologistas ao estudo desses vários ruídos e que um dia eles deem a explicação racional dos fenômenos incompreendidos ou até agora atribuídos a causas ocultas e sobrenaturais.

“O Sr. Jules Cloquet, em apoio às observações do Sr. Velpeau sobre os ruídos anormais que podem produzir os tendões nas várias regiões do corpo, cita o exemplo de uma moça de 16 a 18 anos que lhe foi apresentada no Hospital São Luís, numa época em que os senhores Velpeau e Jobert estavam vinculados a esse mesmo estabelecimento. O pai da moça, que se intitulava pai de um fenômeno, espécie de saltimbanco, esperava tirar partido de sua filha, exibindo-a publicamente. Informou que a filha tinha no ventre um movimento de pêndulo. A moça estava perfeitamente conformada. Por um ligeiro movimento de rotação na região lombar da coluna vertebral, ela produzia estalos muito fortes, mais ou menos regulares, segundo o ritmo de ligeiros movimentos que ela imprimia à parte inferior do torso. Esses ruídos anormais podiam ser ouvidos muito distintamente a mais de 25 pés de distância, e se assemelhavam ao ruído das antigas assadeiras de carne. Dependiam da vontade da moça e pareciam estar situados nos músculos da região lombo-dorsal da coluna vertebral.”

Este artigo do L’Abeille médicale, que nos julgamos no dever de transcrever na íntegra, para edificação de nossos leitores, e a fim de não sermos acusados de pretender fugir a certos argumentos, foi reproduzido, com algumas variantes, em diversos jornais, acompanhado dos qualificativos costumeiros.

Não é nosso hábito revelar as grosserias. Passamos por cima, porque o nosso bom-senso nos diz que nada se prova com tolices e com injúrias, por mais sábio que se seja. Se o artigo em questão se tivesse limitado a essas banalidades, que nem sempre têm o cunho da urbanidade e da educação, não o citaríamos. Mas ele encara a questão do ponto de vista científico. Fatiga-nos com demonstrações, com as quais pretende pulverizar-nos. Vejamos, pois, se estamos realmente mortos pelo decreto da Academia de Ciências ou se temos alguma chance de viver como o pobre e louco Fulton, cujo sistema o Instituto declarou um sonho vazio e impraticável, quando apenas privou a França da iniciativa do navio a vapor. Quem sabe quais as consequências que tal força, nas mãos de Napoleão I, poderia ter tido nos ulteriores acontecimentos!

Faremos um ligeiro reparo sobre a qualificação de charlatães, atribuída aos partidários das ideias novas. Ela nos parece um tanto ousada, quando se aplica a milhões de criaturas que dessas ideias não tiram nenhum lucro e quando alcança os mais altos planos da escala social. Esquecem que em poucos anos o Espiritismo fez incríveis progressos em todas as partes do mundo; que se espalha entre os ignorantes, mas também entre os letrados; que em suas fileiras conta um bom número de médicos, de magistrados, de eclesiásticos, de artistas, de homens de letras, de altos funcionários ─ pessoas às quais geralmente se atribuem algumas luzes e um pouco de bom-senso. Ora, confundi-los no mesmo anátema e remetê-los sem-cerimoniosamente para os hospícios é agir com muita petulância.

Direis, entretanto: Trata-se de gente de boa-fé. São vítimas de uma ilusão. Não negamos o efeito; apenas contestamos a causa que lhe atribuís. A ciência acaba de descobrir a verdadeira causa; torna essa causa conhecida e, por isto mesmo, faz desabar todo esse andaime místico de um mundo invisível que pode seduzir as imaginações exaltadas, mas sinceras.

Não temos a pretensão de ser tido como sábio, e ainda menos ousaríamos colocar-nos no mesmo nível de nossos ilustres adversários. Diremos apenas que os nossos estudos pessoais de Anatomia e de Ciências físicas e naturais, que tivemos a honra de ensinar, nos permitem compreender sua teoria e que de modo algum nos sentimos aturdido por essa avalanche de vocábulos técnicos. Os fenômenos de que falam nos são perfeitamente conhecidos. Em nossas observações sobre os efeitos atribuídos aos seres invisíveis, tivemos o cuidado de não negligenciar uma causa tão patentemente desprezível. Quando se apresenta um fato, não nos contentamos com uma observação apenas. Queremos vê-lo por todos os ângulos, sob todas as faces, e antes de aceitar uma teoria, verificamos se ela abarca todas as circunstâncias e se nenhum fato desconhecido poderá contradizê-la. Numa palavra, se ela resolve todas as questões. Eis o preço da verdade.

Senhores, vós admitis perfeitamente que esta maneira de proceder é absolutamente lógica. Muito bem. Não obstante todo o respeito devido ao vosso saber, há algumas dificuldades na aplicação do vosso sistema ao que se costuma chamar Espíritos batedores.

A primeira é que pode-se considerar pelo menos singular que essa faculdade até aqui excepcional e considerada como um caso patológico, que o Sr. Jobert (de Lamballe) qualifica de rara e singular afecção, de repente se tenha tornado tão comum. É verdade que o Sr. de Lamballe diz que todos podem adquiri-la pelo exercício. Mas como também diz que é acompanhada de dor e fadiga, o que é perfeitamente natural, é de convir que seja necessária uma forte dose de vontade de mistificar para fazer seu músculo estalar durante duas ou três horas seguidas, sem nenhum lucro, com o único fito de divertir algumas pessoas. Falemos sério. Isto é mais grave, porque se trata de Ciência.

Esses senhores que descobriram esta maravilhosa propriedade do longo perônio não imaginam tudo quanto podem fazer esses músculos. Ora, aqui está um belo problema a resolver. Os tendões deslocados não batem apenas nas goteiras ósseas.

Por um efeito realmente singular, batem também nas portas, nas paredes, nos tetos, e tudo isto à vontade, exatamente nos pontos designados. Eis algo de mais forte: a Ciência estava longe de suspeitar de todas as virtudes desse músculo que range. Ele tem o poder de levantar uma mesa sem tocá-la; de fazê-la bater com os pés, andar pela sala e de manter-se no espaço sem ponto de apoio; de abri-la e fechá-la! E imaginai a sua força! De quebrá-la na queda.

Pensais que se trata de uma mesa frágil e leve como uma pena, que a gente levanta com um sopro? Que ilusão! Trata-se de mesas pesadas e maciças, de cinquenta a sessenta quilos, que obedecem às mocinhas e às crianças. Mas, dirá o Sr. Schiff, eu jamais vi tais prodígios. Isto é fácil de compreender. É que só quis ver pernas.

Terá o Sr. Schiff dado às suas ideias a necessária independência? Estava isento de qualquer prevenção? Temos o direito de duvidar, e não somos nós que o dizemos.

É o Sr. Jobert. Segundo ele, o Sr. Schiff, ao falar de médiuns, se perguntou se a sede de tais ruídos não estaria de preferência neles, e não fora deles. Seus conhecimentos de Anatomia o levaram a pensar que bem podia ser na perna. Estando este modo de ver bem arraigado em seu espírito, etc. Assim, conforme a confissão do Sr. Jobert, o Sr. Schiff tomou como ponto de partida não os fatos, mas a sua própria ideia, sua ideia preconcebida e bem arraigada. Daí as pesquisas num sentido exclusivo e, consequentemente, uma teoria exclusiva, que explica perfeitamente o fato que ele viu, mas não explica os que não viu. E por que não os viu?

Porque em seu pensamento só havia um ponto de partida verdadeiro e apenas uma explicação verdadeira. Partindo daí, todo o resto deveria ser falso e não mereceria exame. Disso resultou que, no ardor de atingir os médiuns, errou o golpe. Senhores, pensais conhecer todas as propriedades do grande perônio apenas porque o surpreendestes a tocar violão na bainha? Ora esta! Temos coisa muito diferente a registrar nos anais da Anatomia. Pensastes que o cérebro fosse a sede do pensamento. Errado! Pode-se pensar pelo tornozelo. As batidas dão prova de inteligência. Logo, se essas batidas vêm exclusivamente do perônio, quer do grande perônio, segundo o Sr. Schiff, quer do pequeno, segundo o Sr. Jobert (o que exigiria um acordo entre ambos), é que o perônio é inteligente.

Isto nada tem de admirável. Fazendo estalar o seu músculo à vontade, executará aquilo que quiserdes: imitará a serra, o martelo, baterá sinais de atenção ou o compasso de uma música que se pedir. Vá lá, que seja, mas quando o ruído responde a uma coisa que o médium ignora absolutamente; quando vos revela esses pequenos segredos que só vós conheceis, esses segredos que a gente gostaria de enterrar profundamente, é preciso convir que o pensamento vem de outra parte do cérebro.

De onde virá então? Ora essa! Do grande perônio. E isto não é tudo. Ele também é poeta, pois esse grande perônio faz versos encantadores, mesmo que jamais em sua vida o médium tenha sabido fazê-los. Ele é poliglota, pois dita coisas realmente muito sensatas, em línguas de que o médium ignora a mínima palavra. Ele é músico... nós bem o sabemos, pois o Sr. Schiff fez o seu executar sons harmoniosos, com ou sem sapatos, diante de cinquenta pessoas. Sim, mas também compõe. Ora, Sr. Dorgeval, o senhor, que ultimamente nos deu uma encantadora sonata, acredita piamente que a mesma tenha sido ditada pelo Espírito de Mozart? Que esperança!

Era o seu grande perônio que tocava piano. Na verdade, senhores médiuns, os senhores não suspeitavam que houvesse tanto espírito em seus calcanhares. Honra seja feita aos autores de uma tal descoberta. Que os seus nomes sejam escritos em letras garrafais, para a edificação da posteridade e para a honra de sua memória!

Dirão que brincamos com coisas sérias, pois brincadeiras não são raciocínios. De fato. Não menos racionais que tolices e grosseria.

Confessando nossa ignorância junto a esses senhores, aceitamos a sua sábia demonstração e a tomamos muito a sério. Pensávamos que certos fenômenos fossem produzidos por seres invisíveis, que se diziam Espíritos. Pode ser que nos tenhamos enganado. Como procuramos a verdade, não temos a tola pretensão de emperrar numa ideia que de modo tão peremptório nos demonstram ser falsa. A partir do momento em que o Sr. Jobert, por uma incisão subcutânea, eliminou os Espíritos, já não há mais Espíritos. Uma vez que, diz ele, todos os ruídos vêm do perônio, é preciso crê-lo e admitir todas as consequências. Assim, quando as batidas são dadas na parede ou no teto, ou o perônio lhes corresponde ou a parede tem um perônio.

Quando as batidas ditam versos por uma mesa que bate com o pé, de duas uma: ou a mesa é poetisa, ou tem um perônio. Isto nos parece lógico. Vamos mesmo mais longe. Um oficial nosso conhecido, fazendo experiências espíritas, recebeu um dia, por mão invisível, um par de bofetadas tão bem aplicadas que ainda as sentia duas horas depois. Como provocar uma reparação? Se isso acontecesse ao Sr. Jobert, ele não se inquietaria. Diria apenas ter sido esbofeteado pelo grande perônio.

Eis o que, a respeito, lemos no jornal La Mode, de 1.º de maio de 1859:

“A Academia de Medicina continua a cruzada dos espíritos positivistas contra todo gênero de maravilha. Depois de ter, com justa razão, mas um tanto desajeitadamente, fulminado o famoso doutor negro, pelo órgão do Sr. Velpeau, eis que acaba de ouvir o Sr. Jobert (de Lamballe) o qual revela, em pleno Instituto, o segredo daquilo que ele chama a grande comédia dos Espíritos batedores, representada com tanto sucesso nos dois hemisférios.

“Segundo o célebre cirurgião, todo toc-toc, todo pan-pan que de boa-fé faz arrepiar aqueles que os escutam; esses ruídos singulares, esses golpes secos, vibrados sucessivamente e como que cadenciados, precursores da chegada, sinais certos da presença dos habitantes do outro mundo, são simplesmente o resultado de um movimento imprimido a um músculo, um nervo, um tendão! Trata-se de uma bizarria da Natureza, habilmente explorada para produzir, sem que se possa constatar, essa música misteriosa que encantou e seduziu tanta gente.

“A sede da orquestra é na perna; é o tendão do perônio, tocando na bainha, que faz todos esses ruídos que são ouvidos sob as mesas ou à distância, à vontade do prestidigitador.

“De minha parte, duvido muito que o Sr. Jobert tenha posto a mão, como ele acredita, no segredo daquilo que ele mesmo chama “uma comédia” e os artigos que foram publicados neste mesmo jornal, por nosso confrade Sr. Escande, sobre os mistérios do mundo invisível, me parecem apresentar a questão com amplitude muito mais sincera e filosófica, no verdadeiro sentido da palavra. “Se, porém, os charlatães de todos os matizes são insuportáveis com o seu toque de caixa, temos de convir que esses senhores sábios por vezes não o são menos, com o apagador que pretendem aplicar sobre tudo aquilo que brilha fora dos candelabros oficiais.

“Eles não compreendem que a sêde do maravilhoso, que devora a nossa época, tem exatamente como causa o excesso de positivismo para onde certos espíritos quiseram arrastá-la. A alma humana sente necessidade de crer, de admirar e de contemplar o infinito. Trabalharam para tapar as janelas que o catolicismo lhe abria. Ela olha pelas claraboias, sejam estas quais forem”.

HENRY DE PÈNE

“Pedimos licença ao nosso distinto amigo Sr. Henry de Pène para uma observação. Ignoramos quando o Sr. Jobert fez esta imortal descoberta e qual o dia memorável em que a comunicou ao Instituto. O que sabemos é que esta original explicação já havia sido dada por outros. Em 1854, o Doutor Rayer, célebre clínico, que então não deu mostras de grande perspicácia, também apresentou ao Instituto um alemão cuja habilidade, na sua opinião, dava a chave de todos os knokings e rappings23 dos dois mundos. Como agora, tratava-se de deslocamento de um dos tendões musculares da perna, chamado o grande perônio. A demonstração foi feita numa sessão e a Academia exprimiu o seu reconhecimento por tão interessante comunicação. Alguns dias depois, um professor substituto da Faculdade de Medicina consignou o fato no Constitutionel e teve a coragem de acrescentar que “enfim os cientistas” se tinham pronunciado e o mistério estava “esclarecido”. Isto não impediu que o mistério persistisse e aumentasse, apesar da Ciência que, ao recusarse a fazer experiências, contenta-se em atacá-lo com explicações ridículas e burlescas, como estas a que acabamos de nos referir.

Pelo respeito devido ao Sr. Jobert (de Lamballe), apraz-nos pensar que se lhe tenha atribuído uma experiência que absolutamente não lhe pertence. Algum jornal, à cata de novidades, terá encontrado nalgum recanto esquecido de sua pasta, a antiga comunicação do Sr. Rayer e a terá ressuscitado, publicando-a sob seu patrocínio, a fim de variar um pouco. Mutato nomine, de te fabula narratur. “É desagradável, por certo, mas ainda melhor do que se o jornal tivesse dito a verdade”.
A. ESCANDE.

Revista Espírita - Junho de 1859 (Da Kardecpedia)