Wednesday, February 27, 2013
Tuesday, February 26, 2013
Friday, February 15, 2013
Nas esplanadas americanas também há crianças
Motherlode é uma página do New York Times que reúne uma série de gente muito diferente mas a escrever bem e a pensar sobre esta coisa de ter filhos e famílias e vê-los crescer e educá-los e etc. Nem sempre concordo com o que leio mas vale sempre a pena a viagem. Por exemplo, para ficar a saber, que engraçado, que aquela conversa das crianças que incomodam os outros nas esplanadas não é um exclusivo nacional.
Labels: Filhos
Monday, February 11, 2013
Friday, January 25, 2013
Estas não incomodavam ninguém na esplanada (II)
(...) Mikaela Linea Abecassis nasce a 6 de abril de 1962, em Nova Iorque. (...) Já em Portugal, o segundo filho, Ricardo, nasce em setembro de 1964 (...), a terceira filha, Rebecca, é planeada por Snu para nascer em outubro de 1971. (...)
Nos primeiros tempos em Lisboa a bebé Mikaela é apaparicada pela tia Helena Abecassis, irmã do pai, que saltita entre a casa de Snu, no 6º piso da D. João V, e o 7º piso, o andar da avó Lucienne. (...)
"A Snu não sabe ser uma mãe carinhosa, falta-lhe mimo para os filhos", testemunha Helena (...) As prioridades (...) estão em tudo o resto, em todos os outros cuidados, em não faltar nada em casa ou na escola. Mas falta o afecto. "Isso é olhado como uma mariquice, os abraços, os beijinhos, é tudo muito rápido. Há coisas mais importantes a fazer."
(...) As vidas preenchidas de Snu e Vasco roubam-lhes o tempo para estar, para brincar com os filhos pequenos (...). Os miúdos Mikaela e Ricardo são colocados na escola inglesa de Carcavelos, o St. Julian's, onde mais tarde andará também, por pouco tempo, a mais nova Rebecca. Em casa têm o apoio das empregadas.
Aos domingos, muito cedo, Ricardo acorda estremunhado, sabe que vai ter a mãe só para ele, a manhã inteira. Por volta das 6 da manhã saem de casa em direção a Cascais. (...) "Montamos juntos a cavalo, andamos pela praia, subimos por aquelas dunas." (...) A delícia dos momentos preciosos, juntos na praia, termina ao fim da manhã. "A missão da minha mãe está cumprida." O resto do domingo de Ricardo prossegue "no meu quarto a brincar", entre as quatro paredes (...). O pai também não tem tempo, para além das frequentes viagens de negócios, está sempre no escritório com a porta fechada. "Bato à porta, mas não posso entrar, o pai está a trabalhar."
Ricardo adora a mãe, mas vê nela uma pessoa "extremamente ocupada, com a profissão dela e com uma vida social intensa". Aos olhos dos miúdos, a entrada e saída de convidados são momentos empolgantes em que, do alto da escadaria de madeira [vêem chegar os convidados] (...). Mas "nós não participamos dos jantares dos adultos". Os miúdos ficam pela zona de serviço do duplex, que conhecem bem: o longo corredor em mármore que abre para uma cozinha grande na mesma pedra e a espaçosa mesa no centro onde as crianças tomam as refeições com as empregadas. (...) Depois de jantarem, Ricardo e as irmãs seguem para os quartos.
(...) Depois dos primeiros anos no St. Julian's, Mikaela acaba por ser enviada para uma escola interna de raparigas em Inglaterra. (...) Não se adapta e ao fim de três meses foge. Ricardo acompanha a mãe a Inglaterra para trazerem Mikaela de volta, destroçada, e testemunha uma "enorme tristeza na minha irmã". Snu tem planos para formar a personalidade da filha mais velha, quer contrariar-lhe o espírito rebelde, forçá-la a aceitar regras, o que alimenta uma péssima relação entre ambas. Apesar do mau resultado, Mikaela volta a Inglaterra. O casal decide enviar os dois filhos para uma escola que conhecem bem, Michael Hall.
"Não se discute se é opção para os miúdos, é-lhes imposto, eles são mandados tal como eu já tinha sido e a Snu também." Vasco partilha as responsabilidades pelo envio dos filhos para Inglaterra, o que se torna mais cómodo para a vida do casal em Lisboa (...). Aos onze anos Ricardo segue para Michael Hall. (...) Mikaela volta a adaptar-se mal (...). As férias suspendem a atribulada vida escolar de Mikaela, que passa por três colégios internos sem nunca se adaptar, com viagens entre Lisboa e Londres. (...) Ao mesmo tempo, Vasco e Snu preparam a sua própria separaração. (...)
Os desencontros acentuam-se ao limite no dia em que Snu expulsa a filha de casa, a meio de 1976. Vasco está a viver temporariamente no Chiado quando recebe um telefonema de Snu: "Daqui a dez minutos a Mikaela está a aí e a partir de agora tu tomas conta dela." (...) Aos 14 anos, Mikaela faz a viagem da D. João V para o Chiado, com toda a carga de uma separação forçada com a mãe que deixa marcas para sempre. (...)
Em Inglaterra, Ricardo começa a ser cada vez mais atraído pela agitação de Londres (...). As aulas no colégio interno ressentem-se, ele está sozinho, só vê os pais nas férias, mas no telefonema semanal Snu começa a aperceber-se da situação e toma uma decisão drástica. Faz seguir Ricardo, aos 14 anos, para as montanhas da Suíça, para Aiglon College, uma escola inglesa bastante mais rigorosa em termos de disciplina. (...)
Rebecca cresce alheia aos colégios internos em Inglaterra e às atribuladas adolescências dos irmãos mais velhos, uma vez que a diferença de idades é significativa. Nos primeiros tempos de escola ainda frequenta o St. Julian's, mas Snu alimenta dúvidas sobre o rigor dessa escola e, por influência da sogra francesa, Lucienne, Rebecca entra para o Liceu Francês (...). "Todos os dias o pai leva-me muito cedo para a escola e quando terminam as aulas uma empregada vai-me buscar." Às cinco e meia a mãe chega para o chá. Rebecca tem direito a uma ou duas bolachas de chocolate, e é o momento em que conta o que aprendeu na escola, se tem ou não trabalhos escolares para fazer. (...) A relação é mais pacífica, com uma mãe "muito calma, conservadora, muito séria, mas também sou assim, o feitio dela entende-se com o meu." (...) "Eu tenho direito ao beijinho da manhã, antes de sair para a escola, e ao beijinho à noite, quando me vou deitar, um ritual quase sempre cumprido, o que para mim é perfeito." (...)
in 'Snu e a vida privada com Sá Carneiro', de Cândida Pinto (Dom Quixote, 2011)
Nos primeiros tempos em Lisboa a bebé Mikaela é apaparicada pela tia Helena Abecassis, irmã do pai, que saltita entre a casa de Snu, no 6º piso da D. João V, e o 7º piso, o andar da avó Lucienne. (...)
"A Snu não sabe ser uma mãe carinhosa, falta-lhe mimo para os filhos", testemunha Helena (...) As prioridades (...) estão em tudo o resto, em todos os outros cuidados, em não faltar nada em casa ou na escola. Mas falta o afecto. "Isso é olhado como uma mariquice, os abraços, os beijinhos, é tudo muito rápido. Há coisas mais importantes a fazer."
(...) As vidas preenchidas de Snu e Vasco roubam-lhes o tempo para estar, para brincar com os filhos pequenos (...). Os miúdos Mikaela e Ricardo são colocados na escola inglesa de Carcavelos, o St. Julian's, onde mais tarde andará também, por pouco tempo, a mais nova Rebecca. Em casa têm o apoio das empregadas.
Aos domingos, muito cedo, Ricardo acorda estremunhado, sabe que vai ter a mãe só para ele, a manhã inteira. Por volta das 6 da manhã saem de casa em direção a Cascais. (...) "Montamos juntos a cavalo, andamos pela praia, subimos por aquelas dunas." (...) A delícia dos momentos preciosos, juntos na praia, termina ao fim da manhã. "A missão da minha mãe está cumprida." O resto do domingo de Ricardo prossegue "no meu quarto a brincar", entre as quatro paredes (...). O pai também não tem tempo, para além das frequentes viagens de negócios, está sempre no escritório com a porta fechada. "Bato à porta, mas não posso entrar, o pai está a trabalhar."
Ricardo adora a mãe, mas vê nela uma pessoa "extremamente ocupada, com a profissão dela e com uma vida social intensa". Aos olhos dos miúdos, a entrada e saída de convidados são momentos empolgantes em que, do alto da escadaria de madeira [vêem chegar os convidados] (...). Mas "nós não participamos dos jantares dos adultos". Os miúdos ficam pela zona de serviço do duplex, que conhecem bem: o longo corredor em mármore que abre para uma cozinha grande na mesma pedra e a espaçosa mesa no centro onde as crianças tomam as refeições com as empregadas. (...) Depois de jantarem, Ricardo e as irmãs seguem para os quartos.
(...) Depois dos primeiros anos no St. Julian's, Mikaela acaba por ser enviada para uma escola interna de raparigas em Inglaterra. (...) Não se adapta e ao fim de três meses foge. Ricardo acompanha a mãe a Inglaterra para trazerem Mikaela de volta, destroçada, e testemunha uma "enorme tristeza na minha irmã". Snu tem planos para formar a personalidade da filha mais velha, quer contrariar-lhe o espírito rebelde, forçá-la a aceitar regras, o que alimenta uma péssima relação entre ambas. Apesar do mau resultado, Mikaela volta a Inglaterra. O casal decide enviar os dois filhos para uma escola que conhecem bem, Michael Hall.
"Não se discute se é opção para os miúdos, é-lhes imposto, eles são mandados tal como eu já tinha sido e a Snu também." Vasco partilha as responsabilidades pelo envio dos filhos para Inglaterra, o que se torna mais cómodo para a vida do casal em Lisboa (...). Aos onze anos Ricardo segue para Michael Hall. (...) Mikaela volta a adaptar-se mal (...). As férias suspendem a atribulada vida escolar de Mikaela, que passa por três colégios internos sem nunca se adaptar, com viagens entre Lisboa e Londres. (...) Ao mesmo tempo, Vasco e Snu preparam a sua própria separaração. (...)
Os desencontros acentuam-se ao limite no dia em que Snu expulsa a filha de casa, a meio de 1976. Vasco está a viver temporariamente no Chiado quando recebe um telefonema de Snu: "Daqui a dez minutos a Mikaela está a aí e a partir de agora tu tomas conta dela." (...) Aos 14 anos, Mikaela faz a viagem da D. João V para o Chiado, com toda a carga de uma separação forçada com a mãe que deixa marcas para sempre. (...)
Em Inglaterra, Ricardo começa a ser cada vez mais atraído pela agitação de Londres (...). As aulas no colégio interno ressentem-se, ele está sozinho, só vê os pais nas férias, mas no telefonema semanal Snu começa a aperceber-se da situação e toma uma decisão drástica. Faz seguir Ricardo, aos 14 anos, para as montanhas da Suíça, para Aiglon College, uma escola inglesa bastante mais rigorosa em termos de disciplina. (...)
Rebecca cresce alheia aos colégios internos em Inglaterra e às atribuladas adolescências dos irmãos mais velhos, uma vez que a diferença de idades é significativa. Nos primeiros tempos de escola ainda frequenta o St. Julian's, mas Snu alimenta dúvidas sobre o rigor dessa escola e, por influência da sogra francesa, Lucienne, Rebecca entra para o Liceu Francês (...). "Todos os dias o pai leva-me muito cedo para a escola e quando terminam as aulas uma empregada vai-me buscar." Às cinco e meia a mãe chega para o chá. Rebecca tem direito a uma ou duas bolachas de chocolate, e é o momento em que conta o que aprendeu na escola, se tem ou não trabalhos escolares para fazer. (...) A relação é mais pacífica, com uma mãe "muito calma, conservadora, muito séria, mas também sou assim, o feitio dela entende-se com o meu." (...) "Eu tenho direito ao beijinho da manhã, antes de sair para a escola, e ao beijinho à noite, quando me vou deitar, um ritual quase sempre cumprido, o que para mim é perfeito." (...)
in 'Snu e a vida privada com Sá Carneiro', de Cândida Pinto (Dom Quixote, 2011)
Estas não incomodavam ninguém na esplanada (I)
(...) A Parada, um clube privado (...). O meu pai fez-nos sócios e os meus irmãos e eu andávamos para ali nem sei bem a fazer o quê, com as criadas vigiando-nos a fazer renda ou a ler fotonovelas (...) Só agora, cinquenta anos depois, arrisco: era um clube indolente, onde as mães bebiam Canada Dry a cartear enquanto os maridos jogavam ténis, e as mademoiselles de Bristol, Paris ou Trás-os-Montes passeavam os filhos na espécie de bosque que rodeava o clube (...)
Voltando à Parada: grande parte das crianças veio a drogar-se depois ou a traficar ou a assaltar casas de amigos ou a despenhar-se nos carros dos pais ou, ainda, a roubar lojas para comprar droga, tudo fruto daquela educação impaciente confiada a pessoal primário, industriado para se abster de considerações e só incomodar os progenitores em casos muito graves, como partir um braço ou morrer afogado nas ondas que não existiam na Praia da Conceição. Resultado: quando voltaram a ser incomodados, anos mais tarde, foi pela judiciária.
(...) Era muito pequena, pelo que a verdade é que não tenho grandes recordações da Parada, a não ser a ideia cada vez mais precisa de que os adultos não nos ligavam bóia (...)
Foi por essa altura que o meu pai, alheado mas lúcido, resolveu que aquilo não era meio para os filhos crescerem e nos arrastou nas férias para a Praia das Maçãs. (...) Os cafés eram pindéricos, a praia desabrigada, a água ártica e as ondas todos os anos levavam umas tantas crianças anónimas, já que os banheiros vigiavam com outra aplicação os filhos-família:
- Ó Fortunato, tenha paciência, veja-me aí a Madalenazinha, que é muito afoita no mar. Posso ficar descansada? (...)
in 'A menina é filha de quem?', de Rita Ferro (Dom Quixote, 2011)
Voltando à Parada: grande parte das crianças veio a drogar-se depois ou a traficar ou a assaltar casas de amigos ou a despenhar-se nos carros dos pais ou, ainda, a roubar lojas para comprar droga, tudo fruto daquela educação impaciente confiada a pessoal primário, industriado para se abster de considerações e só incomodar os progenitores em casos muito graves, como partir um braço ou morrer afogado nas ondas que não existiam na Praia da Conceição. Resultado: quando voltaram a ser incomodados, anos mais tarde, foi pela judiciária.
(...) Era muito pequena, pelo que a verdade é que não tenho grandes recordações da Parada, a não ser a ideia cada vez mais precisa de que os adultos não nos ligavam bóia (...)
Foi por essa altura que o meu pai, alheado mas lúcido, resolveu que aquilo não era meio para os filhos crescerem e nos arrastou nas férias para a Praia das Maçãs. (...) Os cafés eram pindéricos, a praia desabrigada, a água ártica e as ondas todos os anos levavam umas tantas crianças anónimas, já que os banheiros vigiavam com outra aplicação os filhos-família:
- Ó Fortunato, tenha paciência, veja-me aí a Madalenazinha, que é muito afoita no mar. Posso ficar descansada? (...)
in 'A menina é filha de quem?', de Rita Ferro (Dom Quixote, 2011)
Wednesday, January 23, 2013
Não é preciso ser mãe para saber como é
Tentar educar um ou mais filhos ao mesmo tempo que se trabalha oito ou muito mais horas por dia e se tenta ser bom nesse trabalho, estar a par, não perder a competitividade, tentar fazê-lo sem a ajuda de avós que ou estão longe ou ainda trabalham, sem a presença de tias ou madrinhas ou família alargada que hoje em dia está quase sempre afastada e também atarefada com a sua vidinha, sem a presença de baysitters caríssimas ou empregadas internas ou outras, só uma mulher a dias (as mais das vezes num só dia) e já é uma sorte, e por isso tentar educar um ou mais filhos e trabalhar no duro ao mesmo tempo que se tem uma casa para governar e para arrumar, compras para fazer e comida para cozinhar, tentar ainda assim fazer qualquer coisa gira no pouco tempo de lazer, praticar um desporto, pôr os miúdos a fazer desporto, ir ao cinema ou ao teatro ou a exposições, passar algum tempo com os amigos, passear, com ou sem os filhos, praticar uma religião, ter algum tipo de atividade política ou cívica.
Não conseguir. Recusar convites para viagens de trabalho porque são muitas noites e é complicado. Viver em função do horário da escola. Por isso recusar ficar a trabalhar até mais tarde. Por isso ser olhada de lado no trabalho. Recusar constantemente todos os convites para eventos ao fim da tarde ou à noite, jantares, saídas, cinemas, festas. Conseguir fazer algumas destas coisas mas sempre sozinha porque algum dos pais tem que ficar com os filhos, né?
Ouvir o despertador e não poder dizer só mais um bocadinho porque esse bocadinho vai pôr toda a família em stress. Garantir que os miúdos têm roupa para vestir, o equipamento do desporto lavado, os trabalhos de casa em dia. Garantir que há leite para o pequeno-almoço e bife para o jantar. Pensar em tudo. Chegar a casa e não descansar. Não podermos estender-nos no sofá e ficar em silêncio. Ler-lhes uma história ao fim do dia e aconchegar-lhes o cobertor e saber que ainda se tem a loiça por lavar e a roupa por estender. Estar estafada e ainda assim sorrir-lhes, porque eles merecem e porque de facto nos fazem felizes.
Fazer isto tudo tentando não gritar nem bater (mas gritando e batendo quando é preciso). Fazer isto tudo tentando dar-lhes a melhor educação, o melhor exemplo, ensinar-lhes os valores que contam. Dar-lhes as melhores memórias possíveis da infância ao mesmo tempo que exigimos que se portem bem à mesa, que se esforcem na escola, que sejam responsáveis. Tentar moldá-los aos nossos sonhos e ao mesmo tempo dizer-lhes para serem eles mesmos. Ter dúvidas. Morrer de culpa, porque hoje em dia os senhores psiquiatras que escrevem nas revistas são peritos em fazerem sentir-nos culpadas. Prometer a nós mesmas que amanhã seremos melhores.
É. Ser mãe é a melhor coisa do mundo, que é, mas também é isto. E não me venham cá dizer que não é preciso ser mãe para poder criticar e dizer como é que deveria ser. Tretas. Todas nós sonhámos em ser melhores mães do que aquilo que somos. Todas nós imaginámos como iriamos fazer, como seríamos perfeitas, quão maravilhosos seriam os nossos filhos. Que respostas daríamos. Quantas certezas teríamos. Como manteríamos a calma e dominaríamos a situação. Como seríamos encantadoras, sempre a falar baixo e a fazer coisas divertidas, e os nossos filhos tão queridos, tão educados, tão inteligentes. Sem fazerem birras nem dizerem palavrões. A gostarem de música clássica e a lerem ficção científica. Todas nós. Mas depois. A vida de todos os dias troca-nos as voltas. São poucas as que conseguem trocar as voltas à vida (conheço duas ou três). Mas são muitas as excelentes mães, apesar de tudo.
Sim, lamento, mas é preciso mesmo passar por isto para saber.
(já escrevi sobre este assunto antes, e várias vezes até, mas esta semana li uma coisa que me fez ter vontade de dizer isto de novo. e não foi o senhor henrique raposo - esse não sabe nada sobre crianças, é óbvio. estou mesmo a falar de quem não sabe nada do que é ser mãe/pai)
Não conseguir. Recusar convites para viagens de trabalho porque são muitas noites e é complicado. Viver em função do horário da escola. Por isso recusar ficar a trabalhar até mais tarde. Por isso ser olhada de lado no trabalho. Recusar constantemente todos os convites para eventos ao fim da tarde ou à noite, jantares, saídas, cinemas, festas. Conseguir fazer algumas destas coisas mas sempre sozinha porque algum dos pais tem que ficar com os filhos, né?
Ouvir o despertador e não poder dizer só mais um bocadinho porque esse bocadinho vai pôr toda a família em stress. Garantir que os miúdos têm roupa para vestir, o equipamento do desporto lavado, os trabalhos de casa em dia. Garantir que há leite para o pequeno-almoço e bife para o jantar. Pensar em tudo. Chegar a casa e não descansar. Não podermos estender-nos no sofá e ficar em silêncio. Ler-lhes uma história ao fim do dia e aconchegar-lhes o cobertor e saber que ainda se tem a loiça por lavar e a roupa por estender. Estar estafada e ainda assim sorrir-lhes, porque eles merecem e porque de facto nos fazem felizes.
Fazer isto tudo tentando não gritar nem bater (mas gritando e batendo quando é preciso). Fazer isto tudo tentando dar-lhes a melhor educação, o melhor exemplo, ensinar-lhes os valores que contam. Dar-lhes as melhores memórias possíveis da infância ao mesmo tempo que exigimos que se portem bem à mesa, que se esforcem na escola, que sejam responsáveis. Tentar moldá-los aos nossos sonhos e ao mesmo tempo dizer-lhes para serem eles mesmos. Ter dúvidas. Morrer de culpa, porque hoje em dia os senhores psiquiatras que escrevem nas revistas são peritos em fazerem sentir-nos culpadas. Prometer a nós mesmas que amanhã seremos melhores.
É. Ser mãe é a melhor coisa do mundo, que é, mas também é isto. E não me venham cá dizer que não é preciso ser mãe para poder criticar e dizer como é que deveria ser. Tretas. Todas nós sonhámos em ser melhores mães do que aquilo que somos. Todas nós imaginámos como iriamos fazer, como seríamos perfeitas, quão maravilhosos seriam os nossos filhos. Que respostas daríamos. Quantas certezas teríamos. Como manteríamos a calma e dominaríamos a situação. Como seríamos encantadoras, sempre a falar baixo e a fazer coisas divertidas, e os nossos filhos tão queridos, tão educados, tão inteligentes. Sem fazerem birras nem dizerem palavrões. A gostarem de música clássica e a lerem ficção científica. Todas nós. Mas depois. A vida de todos os dias troca-nos as voltas. São poucas as que conseguem trocar as voltas à vida (conheço duas ou três). Mas são muitas as excelentes mães, apesar de tudo.
Sim, lamento, mas é preciso mesmo passar por isto para saber.
(já escrevi sobre este assunto antes, e várias vezes até, mas esta semana li uma coisa que me fez ter vontade de dizer isto de novo. e não foi o senhor henrique raposo - esse não sabe nada sobre crianças, é óbvio. estou mesmo a falar de quem não sabe nada do que é ser mãe/pai)
Friday, January 18, 2013
Tal e qual
Isto são os meus filhos. Tal e qual. Juro. Não estou a exagerar.
E juntos são assim:
E agora isto sou eu:
Têm graça estes senhores do Baby Blues. Fazem-me esquecer por um bocadinho as patacoadas do FMI e do nosso desgoverno.
Monday, January 07, 2013
Wednesday, January 02, 2013
Friday, December 28, 2012
Férias de inverno (só as partes boas)
Eu digo estou de férias.
E há sempre alguém por perto a comentar que sorte.
Ora convém explicar que não se trata de sorte. São férias marcadas desde fevereiro, são cinco dias dos tais 22 a que todos temos direito, dias em que eu trabalhei enquanto vocês estavam na praia, num avião para algum lado, na eurodisney ou no brasil. Guardei-os para agora porque gosto demasiado do natal (não sei se já tinham reparado) para me contentar com a noite da consoada, preciso de começar a festejar uns dias antes, convenientemente, ou seja, no alentejo. E porque acho que, apesar da escola estar aberta, eles precisam destas pausas, no natal e na páscoa, e, como não temos avós que fiquem com eles, tentamos, sempre que possível, tirar uns dias nestas alturas. Ficamos com menos férias no verão, é certo, mas aproveitamos para fazer coisas diferentes. Coisas assim deste género:
E há sempre alguém por perto a comentar que sorte.
Ora convém explicar que não se trata de sorte. São férias marcadas desde fevereiro, são cinco dias dos tais 22 a que todos temos direito, dias em que eu trabalhei enquanto vocês estavam na praia, num avião para algum lado, na eurodisney ou no brasil. Guardei-os para agora porque gosto demasiado do natal (não sei se já tinham reparado) para me contentar com a noite da consoada, preciso de começar a festejar uns dias antes, convenientemente, ou seja, no alentejo. E porque acho que, apesar da escola estar aberta, eles precisam destas pausas, no natal e na páscoa, e, como não temos avós que fiquem com eles, tentamos, sempre que possível, tirar uns dias nestas alturas. Ficamos com menos férias no verão, é certo, mas aproveitamos para fazer coisas diferentes. Coisas assim deste género:
Ir a Óbidos ver a neve falsa, não ficar na gigantesca fila para falar com o pai natal mas gostar mesmo, mesmo das cidades de legos:
Brincar muuuuuuuito (e desarrumar tudo).
Andar de metro (os miúdos adoram), passear na Baixa, comer um gelado no Santini e chatear todos os pombos de Lisboa.
Visitar o castelo de Almourol.
Brincar no fantástico parque de Vila Nova da Barquinha e explorar (ie tentar destruir) as várias esculturas de artistas portugueses contemporâneos que lá estão:
Ainda temos uns dias e, se o sol continuar a brilhar, haveremos de ir à praia, matar saudades do verão. É de facto uma sorte poder ter estas férias de inverno.
Wednesday, December 26, 2012
Saturday, December 22, 2012
Os putos
No carro, damos boleia a um amigo do António que trouxe um cd de música insuportável de dança para ouvirmos. Eu sofro. E os putos conversam. Diz o amigo: sabes, no videoclipe desta música aparecem duas mulheres a beijarem-se. Responde o meu filho com cara de quem está a comer espinafres: Que nojo!
E é assim que a gente vê que, mesmo a cantar i'm sexy and i kow it, eles ainda são umas crianças.
E é assim que a gente vê que, mesmo a cantar i'm sexy and i kow it, eles ainda são umas crianças.
Labels: Filhos
Wednesday, December 19, 2012
Luzes e chaminés
A nossa árvore não é de design xpto mas é adorável. É pequena e tem enfeites vermelhos e dourados, comprados ao longo dos anos, em lojas diferentes, de materiais diferentes, nada combina com nada. Mas não tenho coragem de os deitar fora. Abro as caixas e deixo os miúdos escolherem os que quiserem até a árvore estar cheia. As luzes têm a forma de estrelas e são a única coisa cara que ali está. Pena não piscarem. Ainda assim, acendemo-las sempre que estamos em casa. Temos três pais natais de chocolate que hão de ser comidos no dia dos reis. Um deles é para mim, claro. A base do presépio é feita com uns antigos individuais da cozinha. E por baixo de tudo, para fazer o monte, está a biografia do salazar. O pedro gosta de alinhar os reis magos, assim, em fila, e amua se eu os mudo de posição. O anjo andou a voar pelas mãos dos miúdos e perdeu uma mão. Felizmente, temos outro anjo, feito pelo pedro. E outro presépio desenhado pelo antónio. E mais um cartão de natal feito pelo antónio para dar ao pedro. E o mealheiro da catequese, pintado em família, onde estamos a pôr moedinhas para os missionários. Também temos uma bandolete com uma árvore de natal super brilhante, que me ofereceu a sónia e que eu adoro usar na rua, para grande vergonha do meu filho mais velho. Às vezes também me dá para levar um dos dois gorros de pai natal que neste momento estão enfiados na meia gigante que está pendurada na porta da sala, uma vez que não temos lareira. No outro dia, o antónio, que já não acredita no pai natal, explicou ao pedro, com muita calma, que ele não tinha com que se preocupar, pois quando as casas não têm chaminé o pai natal entra pela janela. Pois é, respondeu o pedro. E o antónio olhou para mim e fez-me um sinal, com o dedo sobre os lábios, para que eu me calasse. Deixa estar, ele ainda é pequenino, murmurou.
Wednesday, December 12, 2012
There will be an answer, let it be
As crianças subiram ao palco, representaram, cantaram, acenaram muito. O Pedro passou a música toda à nossa procura, quase não cantou mas, quando finalmente nos descobriu, não cabia em si de contente, com aquele sorriso enorme. O rei mago lá venceu a timidez, portou-se lindamente e disse todas as suas falas certinhas. Eu emocionei-me um bocadinho, como de costume. A festa terminou com os beatles. Depois houve macdonalds e, já em casa, apesar de mortos de cansaço, ainda se lembraram dos chocolates do calendário do advento.
Monday, October 22, 2012
Anti-depressivo
Os meu filhos fazem pistolas com legos e obrigam-me a pôr as mãos no ar. E deu-lhes para pintar, todos os dias pedem desenhos para colorir. O Pedro já anda de bicicleta sem rodinhas. Cai e levanta-se. Ontem expliquei ao António o que é um umbigo e como é que funciona o cordão umbilical. Isto, depois de ele ler em silêncio, sem fazer comentários nem perguntas, a página sobre "como se fazem os bebés". A seguir, rezámos o pai nosso (sim, agora rezamos o pai nosso todas as noites, ou, pelo menos, nas noites em que nos lembramos).
Labels: Filhos
Monday, September 10, 2012
Sunday, September 09, 2012
Último dia (II)
7.00. O António acorda e vem ter comigo a chorar. Tive um sonho mau, mãe. Sonhei que os meus amigos estavam todos a brincar no recreio sem mim. Quero voltar para a minha escola.
9.30. Apesar do barulho dos primos e do mano, o Pedro continua a dormir. Prevê-se birra monumental para amanhã por esta hora.
9.30. Apesar do barulho dos primos e do mano, o Pedro continua a dormir. Prevê-se birra monumental para amanhã por esta hora.
Wednesday, August 29, 2012
Malas à porta
Uma pessoa adquire várias capacidades depois de ter filhos. Eu, por exemplo, aprendi a fazer malas num piscar de olhos e sem grandes stresses. Não foi sempre assim. Ao princípio, depois do António nascer, começava a fazer a lista do que precisava dias antes de viajar, enchia sacos e sacolas e, mesmo assim, acabava sempre por me esquecer de algo essencial como o biberão. Mas a boa notícia é que, a não ser que se vá para o fim do mundo, há sempre uma loja por perto onde se vende tudo aquilo de que nos esquecemos, de fraldas a chuchas, papas lácteas ou chinelos (Lição número 1). Depois de duas ou três viagens com crianças pequenas, rapidamente percebi que levava sempre roupa a mais, desnecessariamente. A verdade é que, ao contrário do que se sonha, nas férias os programas acabam por ser repetitivos - praia, piscina, campo (não me estou a queixar, praia, piscina, campo está óptimo) - sem variações como sair à noite, jantar num restaurante de luxo ou qualquer outra coisa do género. E as crianças, sobretudo se forem rapazes, acabam por andar quase sempre de fato de banho e t-shirt. Por isso (Lição número 2), é bom levar uma roupinha mais chique, just in case, mas não é preciso mais do que isso, o segredo é levar calções e blusas, para lavar e vestir as vezes que forem necessárias (de preferência, e para quem conseguir, o que não é o meu caso, sem passar a ferro) e uns vestidinhos para mim e pronto. O mesmo se aplica aos sapatos: sandálias para mim, ténis e chinelos para todos, assim como assim eles vão andar descalços a maior parte do tempo. Finalmente, e esta é a lição (número três) mais importante de todas: ter sempre comigo a minha mochila Sport Billy (referência a um desenho animado do meu tempo, quem não souber é procurar no google), onde tenho uma muda de roupa para cada um, casacos, bonés, nesta altura do ano também os fatos de banho e uma toalha, uma garrafa de água e snacks (bolachas, leite com chocolate). Com esta minha mochila estou pronta para tudo. Ir almoçar em casa da avó ou a um restaurante, visitar amigos na sua casa de férias, dar um saltinho à praia ao fim da tarde, qualquer coisa, e responder aos acontecimentos infantis inesperados como um gelado entornado nos calções, uma criança que não chega a tempo à casa de banho, um mergulho na piscina, uma fome a meio da viagem. Tenho a mesma mochila há oito anos e é um dos meus bens mais preciosos. Algumas pessoas acham que eu sou maluca e que com miúdos já tão crescidos não há necessidade de andar sempre com roupa atrás, mas essas pessoas obviamente não conhecem os meus filhos e o seu potencial asneirento. Uma pessoa adquire mesmo várias capacidades depois de ter filhos. Fazer malas e ignorar as opiniões dos outros. Por exemplo.