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sábado, maio 11, 2013

A ALMA VÍTIMA...


A alma vítima vê-se coberta e responsável de todos os crimes



Ontem, não sei dizer como foi dolorosa a minha viagem para o Horto. A noite era escuríssima, e eu fui tão ligada aos sofrimentos; não digo a este nem àqueles; foi a todos; era um mundo deles, sentir mesmo que arrastava o mundo, que ele me esmagava. Era tal a minha união à dor, eram tão inquebráveis as prisões que a ele me prendiam, que nem um só momento dela me podia libertar, nem um só membro, nem um mínimo bocadinho de carne podia ser da dor, dos espinhos libertada. Que dureza tinha para mim a humanidade! Senti e vi Jesus a tremer, a chorar e a suar sangue, e até pelos ouvidos o derramava. Senti-O a estender os braços, e a oferecer ao Pai o cálice, amargurado. E dali fui com Ele, de mãos atadas, para a prisão; e, de novo, levei comigo o mesmo mundo e arrastava-me, a esmagar-me.

Esta manhã, não podia respirar; não podia viver estava tomada de pavor; sentia os olhos colados pelo sangue, que brotava do grande capacete de penetrantes espinhos, que me cingiam à cabeça. Assim segui às escuras e estreitas ruas do Calvário, e sempre a cair sobre mim uma chuva de maus-tratos e de ferros cortantes, que me dilaceravam as arnês. Vi tantos pedacinhos com grandes rastos de sangue perdidos por entre as lajes. Oh! como foi dolorosa a viagem! Quanto me custou chegar ao Calvário! E quanto me custou ver feras, medonhas feras, em tão grande número, a beberem o sangue, que de Jesus corria; eram com certeza feras só na aparência, porque Jesus murmurou e deixou gravado na minha alma: melhor era para Mim, não sofria tanto, se o Seu divino sangue fosse, na realidade, bebido pelas feras; são piores do que elas. Senti que em muitos corações aumentava o ódio, o aborrecimento contra Jesus, um desejo de O ver desaparecer dos seus olhares venenosos, fosse como fosse, custasse o que custasse. Jesus, que via e penetrava no íntimo de todos mais sofria, e mais aumentava a Sua agonia; e num brado fortíssimo chamou pelo Pai. Ao ver-se por Ele abandonado, aumentou a amargura e o Seu desfalecimento. Como homem, já não podia viver, era mortal, eu sentia-O em mim, a dar os Seus últimos arrancos. Mas como era suave e doce a agonia do Seu espírito, os últimos momentos de Jesus na terra. Expirei com Ele. Ah! Se com a mesma doçura, a mesma semelhança, eu expirasse na morte verdadeira, na morte que será a vida, que se dará a vida Eterna! Veio Jesus, deu luz a toda a minha alma e disse:

― Minha filha, Minha filha, Minha Alexandrina, Alexandrina das dores, deixa-Me que te dê mais este título de Minha esposa, Alexandrina das dores. Tem coragem! A alma pura posso compará-la à água pura, à água cristalina, em vidro de cristal fino, posta aos raios de sol a ser observada. Quantas coisas aparecem; o que descobrem esses raios de sol! A alma és tu; o sol, observador sou Eu que tudo em ti descubro, e a Meus divinos olhos, tudo aparece. Esse tudo que Eu vejo e faço que tu vejas é o meio de que Me sirvo para purificar a tua alma para poderes passar deste Calvário, deste leito de dores ao Céu. Faço que vejas em ti todas as manchas, para delas te purificares, para te ver tão pura, tão pura, Minha pomba querida, para que esta pureza em ti transpareça e a possas comunicar às almas. São tuas as manchas que ao sol da Minha pureza e grandeza aparecem mas não são tuas, filha querida, atende bem ao que te digo, as maldades, os crimes, esse mundo de horrores, que em ti sentes e descobres. Ó maravilhas, ó maravilhas, tão pouco conhecidas e compreendidas! A alma vítima vê-se coberta e responsável de todos os crimes, e, ao mesmo tempo, possuidora do Seu Deus com todas as Suas grandezas. Quanto ela sofre ter que aguentar e enfrentar o imundo com o que há de mais puro e santo! Confia, filha querida; és vítima, mas não são teus esses crimes. Entreguei-te o mundo, para o salvares, mas não é tua a maldade dele. Acode-lhe, acode-lhe.

Sentimentos da alma, 9 de Maio de 1947 - Sexta-feira.

domingo, abril 15, 2012

O PEITO PARECIA LEVANTAR-SE…

Quero o que Jesus quiser

Nesta noite, não sei as horas, apareceu-me o demónio vestido de sacerdote, com batina até aos pés. Era grande, muito grande, gordo – parecia um monstro. Atravessava diante de mim, mas não me fez outra coisa a não ser fazer-me sentir como se estivesse o fogo pegado na minha cama; parecia-me as labaredas estarem alastradas debaixo de mim. Fazia-me estremecer de medo. Quero o que Jesus quiser, mas, se houvesse a minha vontade, preferia mil vezes isto do que quando ele usa de outras manhas. Sinto todo o meu corpo dilacerado e em sangue. os espinhos penetram-me a alma, o coração, o corpo e todo o ser. Não posso abrir nem fechar meus olhos sem espinhos; não posso pensar sem espinhos, não posso mover-me sem espinhos. O meu leito e o quarto, onde habito, são de espinhos, e tudo está banhado em sangue. Pobre do meu coração, sangra de dor. E os meus lábios parecem estarem fechados, não posso ter um queixume, morro, morro abafada. Assim, nesta dor e amargura, fiz a minha preparação para a visita de Jesus ao meu coração, nesta manhã. Recordar-me que era o primeiro sábado causava-me tanta tristeza que me fazia pensar assim:
— Meu Jesus, não posso viver sem dúvidas. Que receio o meu! Vede as minhas preocupações, compadecei-Vos delas! Enganar não quero; o Vosso divino amor, as almas, isso, só isso me basta, meu Jesus.
Chegou a hora de O receber. À entrada de Jesus no meu quarto, pareceu-me que me cravaram uma punhalada no peito e foi ferir o coração. Tinha ânsias, tantas ânsias de O receber, mas o medo que tinha d’Ele, o horror ao êxtase não se explica. Momentos depois de Jesus baixar a mim, principiei a sentir a Sua divina presença e a dilatar-se o coração. O peito parecia levantar-se, ao mesmo tempo que o coração se dilatava. O meu amantíssimo Jesus principiou a dizer-me:
— Quero, minha filha, dilatar-te o coração, quero fazê-lo grande, grande como o meu divino amor. Recebe-o com toda a abundância, envolve-o no mundo que nele te  depositei. Transforma-o no meu divino amor. Dei-te e dou-te o meu divino amor, entreguei-te o mundo, quero tudo numa só coisa: quero amor, só amor. Resgatei-te com o meu sangue, és a nova resgatadora da humanidade. Escolhi-te para comigo continuares a obra mais bela, mais sublime, a obra do resgate, a salvação das almas.
*****
(Beata Alexandrina : Sentimentos da alma, 3 de Março de 1945 – Primeiro Sábado)

domingo, dezembro 11, 2011

A VISÃO DO PRESÉPIO...

Descansa, dorme, recebe de Mim toda a abundância de amor

Passei algumas horas neste sentimento e visão. Pouco depois da Sagrada Comunhão, uni-me de tal forma a Jesus Menino neste presépio que com Ele compartilhei, logo desde a manhã, de todo o sofrimento do Horto e do Calvário.
Vieram de encontro ao presépio todos os preparativos para a ceia, a entrega de Judas, o suor de sangue, o romper das veias, o Horto completo cheio de amargura e por fim o Calvário com a cruz. Eu sentia tudo, mas todo este sofrimento caía sobre Jesus pequenino. Foi este o meu Horto de ontem, Horto que durou todo o dia e parte ainda da noite.
Na madrugada de hoje, fui assaltada pelo demónio; foram quatro os ataques. Com aflição e bater do coração tive a impressão que por algum tempo perdi, ou quase os sentidos. Que maldade infernal! Vi-me tão entregue ao demónio! Pedi tanto a Jesus para O não ofender, mas que era sempre a Sua vítima! No último combate, quando o maldito me afirmava levar-me ao prazer veio Jesus e disse:
― Aparta-te, maldito; já tirei da vítima a reparação desejada.
Ele com uma tromba como de elefante, lambia-se de contentamento, como se tivesse conseguido de mim o que desejava. Depois, já longe, uivava desesperado. Jesus uniu ao meu o Seu Santíssimo peito, e, cheio de doçura, disse-me:
― Minha filha, alma com alma, coração com coração, amor com amor. Passo para o teu coração o bálsamo do Meu divino amor para suavizar a tua dor. Coragem! Tirei destes combates muita reparação para os grandes crimes que nesta noite se praticaram.
Esteve por algum tempo à minha frente o Sagrado Coração de Jesus, em tamanho natural; era formoso, todo Ele era doçura e amor. Quando assim me apareceu nada me disse. A Sua divina presença encheu-me, deu paz e tranquilidade à minha alma. Quando O recebi sacramentado, esqueci por muito tempo toda a luta do demónio.
A visão do presépio, a pouco e pouco, tem-se ido apagando, mas alguma coisa ainda seguiu hoje comigo os caminhos do Calvário. Senti como se me viessem abrir o peito e a ele unir a cruz, toda a tragédia dos caminhos da amargura e do Calvário. O peito fechou-se, e lá dentro ficou, unido ao presépio, todo este sofrimento que sinto ter que me acompanhar na vida e até ao momento da morte: Aqui fui crucificada, aqui agonizei com Jesus. Não sei como O pude sentir pequenino no presépio e na cruz crucificado. Neste estado de alma e união, entreguei ao Pai o meu espírito. Esperei por alguns minutos a nova vida e união com Jesus. Ele veio, pôs-me a nadar num mar de fogo, e disse-me:
― Minha filha, vem descansar, vem dormir em Mim o sono do amor, é conforto para a tua alma, é vida para a tua dor, é vida, é amor que podes e Eu quero comuniques às almas; vive, fá-las viver. Descansa, dorme, recebe de Mim toda a abundância de amor, enquanto que Eu de ti também o recebo. O Meu divino amor é para ti o bálsamo, a força do teu inigualável martírio, assim como o teu é para Mim o bálsamo para as Minhas feridas e esquecimento para tantos crimes com que sou ofendido. Tu amas-Me, tu amas-Me, confia que Me amas; tu sofres e sabes sofrer, confia em Mim. O não saberes dizer quando sofres não te entristeça, pois já disso estavas prevenida, e, de dia para dia, menos saberás dizer. Tu sofres, sabes sofrer, Eu to afirmo; ai do mundo sem o teu indizível sofrer. Se não fosse a tua dor e a reparação que nesta noite te pedi, repara em que estado vias o teu Jesus.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 26 de Dezembro de 1947 – Sexta-feira)

segunda-feira, dezembro 05, 2011

NÃO VOS POSSO VER SOFRER !

Repete-Me os teus actos de amor...

— Quero mais não de ti, porque não podes, mas por ti. É por ti que as almas se salvam, é por ti que Eu quero que elas Me amem. Pede-lhes, pede-lhes amor, pede-lhes reparação; é urgente, venha depressa esse amor, essa reparação; é preciso aplacar a justiça de Meu Eterno Pai, é preciso fazer-Me esquecer os crimes com que sou ofendido. Ai do mundo, o pobre mundo, o que o espera, o que ele vai bem depressa sofrer e gemer! Não quer ouvir-Me, não atende aos Meus pedidos. Quanto sofre com isso o Meu divino Coração!
― Ó meu querido Jesus, estou triste, humilhada e confundida. Queria prostrar-me aos Vossos Santíssimos pés para com lágrimas e verdadeiro arrependimento dos meus pecados Vos bendizer e agradecer pelos dons e graças que me tendes dispensado, sem atenderdes à minha indignidade e extrema miséria. Muito obrigada, meu Jesus. Eu queria na mesma posição receber de Vós todos os sofrimentos e de Vós implorar e obter o perdão e a misericórdia para o mundo. Não Vos posso ver sofrer nem ver as almas perderem-se. O que quereis que eu faça Jesus? Vejo que sofro tanto e tento Vos vejo sofrer! Quero sofrer eu sozinha e evitar os Vossos sofrimentos.
― Minha filha, Minha pomba branca, quando Me vires caminhar com a cruz, renova a tua oferta de vítima, repete-Me os teus actos de amor. Eu é em ti e não sozinho que caminho, sofro e levo a cruz. Estas visões que te dou é porque assim mais te levo à compaixão e posso melhor pedir-te a reparação. Leva a tua cruz, dá-Me a tua dor, o teu amor, dá-Me os combates do demónio, só eles podem reparar a gravidade de tão grandes crimes.
― Ai, meu Jesus, que medo eu tenho, aceito-os por vosso amor, velai Vós, velai sempre para eu não Vos ofender.
― Confia, confia, filhinha amada: nunca permitirei que Me ofendas. Vem receber agora a gota do Meu divino Sangue, a grande e única maravilha do Meu divino amor. Recebe, é vida; recebe, é força; recebe é amor, amor, amor!
Jesus introduziu o tubo no meu coração e sobre ele colocou o Dele; a gotinha do Sangue passou vagarosamente, foi um bálsamo para todo o sofrer do meu pobre coração. Senti-o tanto no íntimo! Aquela fortaleza e suavidade do sangue divino de Jesus fez-mo crescer tanto, não cabia no peito, respirava profundamente. Jesus passou sobre a abertura a Sua divina mão, bafejou-me repetidas vezes e disse:
― Vai para as trevas, vai para a cruz, repara, repara o coração do teu divino Esposo. Leva este conforto, leva a vida que te dou, a vida do que vives. Tem coragem! O teu Céu está perto. Eu espero os homens descuidados das coisas de Deus. Venho falar-te para confortar-te e até que eles venham. Vai, esposa Minha, vai, jardim de encantadoras flores, espalha o bem, espalha o aroma, o perfume de tão heróicas virtudes. És Minha, leva o que é Meu, vai levá-lo às almas, vai acudir ao mundo. Conto contigo. Conta com o teu Jesus.
― Obrigada, obrigada, meu doce amor. Já fugiu a luz que neste colóquio de Vós recebi. Mergulha-me na dor, mergulho-me nas trevas por Vós e pelas almas.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 19 de Dezembro de 1947 - Sexta-feira).

AS VISITAS EM CAUSA

Não sei como poder resistir ao horror, ao nojo que me causam as visitas

Dia de muitas visitas à Beata Alexandrina
Parece-me sentir e ouvir que uma voz me chama para a eternidade; sinto que é o fim que se aproxima e que essa voz é a voz de Jesus. Eu não O vejo, mas sinto que Ele me espera, de braços abertos, para me receber e pedir contas. Eu não sei como Lhas hei-de dar. Eu anseio por esse momento de ir para Ele, e sinto que não posso demorar-me mais tempo aqui, mas tenho medo de comparecer na presença de Deus, de mãos vazias, só cheia de misérias; é só o que tenho, é só o que vejo. É tremendo o meu sofrimento, é horrorosa a minha dor.
No dia 8, no dia da querida Mãezinha, apesar de me lembrar muito Dela, de querer amá-La, honrá-La, dar-Lhe todo o louvor, passei todo o dia morta, sepultada numa sepultura, na maior profundidade das minhas trevas. Só à noite ressuscitei, e saí dessa sepultura, para ver que nada tinha feito e só a minha miséria e nojenta podridão me apareceram. Depois de contemplar bem o meu horroroso estado, voltei a morrer e a sepultar-me na mesma sepultura. E, todos os dias, mais de uma vez, ressuscito e saio dela só para ver e contemplar o que me causa horror. Não passo daqui, da morte à vida horrorosa e da vida horrorosa à morte. Vejo-me sozinha, inútil para mim, inútil para todos, sem o mais pequenino amor a Jesus e o menor bem para as almas e para a humanidade.
Não sei como poder resistir ao horror, ao nojo que me causam as visitas, quero fazer-me compreender; este horror, este nojo não são as visitas que mo causam, sou eu que sinto nojo de mim mesma e causa-me horror ver a podridão vergonhosa e nojenta que as visitas vêm contemplar. Não sei dizer o que sou e o que sofro com o que sou. Meu bom Jesus, minha querida Mãezinha, amparai-me, tende dó de mim, sou a Vossa vítima. Eu aceito e quero todo este sofrimento, mas quero amar-Vos e ver salvas as almas. O meu viver é entre espinhos, é um martírio contínuo de alma e corpo, os espinhos atravessam-me a alma e não deixam o mais pequeno bocado do meu corpo sem ser ferido; sinto-me sempre a derramar o meu sangue.
No meio de tudo isto, sem querer nem querer libertar-me do sofrimento, nada faço daquilo que o meu pobre coração anseia; fazer o bem; praticar só o bem, acudir a todos, remediar todos os males, assemelhar-me a Cristo, seguir em tudo os passos de Jesus. Nada sinto que se realiza e é de utilidade para a humanidade porque apesar de tanto sofrer, nada é meu, nenhum bem eu faço. Sou tão nada, como hei-de levar a minha cruz! Neste mar de sofrimento, envolvida nas ondas mais furiosas, vi por vezes o Menino Jesus caminhar à minha frente com um grande madeiro aos ombros. Ele era tão pequenino, não sei como o podia levar; só a força de um Deus. Causava-me dó e grande impressão vê-Lo tão pequenino com tão grande cruz. Ele olhava para mim, fitava-me docemente e caminhava sorridente, como se nada levasse. A vista de Jesus dava conforto à minha alma, dava-me amor à cruz.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 12 de Dezembro de 1947 - Sexta-feira).

segunda-feira, novembro 28, 2011

TANTO VOS QUERIA AMAR...

Contra este sol vinham nuvens negras...

Não posso ver sofrer Jesus, não posso sentir a Sua dor nem a ingratidão. E eu sou do número que O ofende gravemente, sou do número dos ingratos, muitos ingratos. Como posso proceder assim, ó meu Jesus? Parece que não tenho coração para Vos amar; se eu Vos amasse não Vos ofendia. Ai de mim, pobre de mim, que tanto Vos queria amar. Dar o meu sangue, a minha vida pelo Vosso divino amor é pouco; queria todo o sangue, todas as vidas e depois de tudo isso eu ainda dizia que não vos amava e nada tinha para Vos dar. Remediai este mal, Jesus, saciai os meus desejos. A vida foge, o fim aproxima-se, e eu morro de pavor, sozinha, em trevas, de mãos vazias. Existiu porventura algum dia, por algum tempo, em mim a luz? Sei o que é a luz, compreendo os efeitos, que a luz produz? Não, meu Jesus, tudo morreu para mim sem me deixar sinal algum da sua existência, dos seus efeitos. Bendito sejais.
Na tarde de ontem, parecia-me aparecer do Céu uns raios de sol, que davam vida à terra e a iluminavam de tantas trevas, que a submergiam. Contra este sol vinham nuvens negras, assustadas a encobri-lo. Parecia que tinha Jesus dentro de mim a contemplar, a fitar este sol e as nuvens formadas de todas as maldades, que tentavam encobri-lo. Jesus lançava-se às nuvens para as abraçar, embora que apavorado com elas; o Seu divino Corpo cobria-se de suor e sofria sozinho. De longe a longe fitava o Céu e bendizia a Seu eterno Pai.
Durante a ceia, eu queria poder mostrar o rosto de Jesus, tal qual O vi, inflamado de amor. Queria poder fazer sentir a todos os corações o que é o amor de Jesus para com a alma que verdadeiramente O ama. Como se uniram tão docemente o Coração divino de Jesus ao coração do discípulo amado! Jesus consolava-se no Seu discípulo e este no seu Mestre. Esta união suavizou a dor angustiosa de Jesus. Vi-O depois tomar em Suas divinas mãos uma bacia grande, redonda, cingir o Seu pescoço com uma toalha e seguir o lava-pés. Depois de sair da sala e se despedir da Mãezinha, um pouco já retirado, fitou-a novamente, como que a dar-Lhe um novo adeus. Ela fitava o Seu Jesus, no cimo da escadaria. Ele desapareceu, mas ficaram sempre unidos. À saída da cidade, ao principiar a subir, Jesus viu todo o sofrimento que O esperava; banhou-se novamente em suor, e á a cair desfalecido. A Sua vida divina fez que não caísse, e forçou-O a caminhar.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 5 de Dezembro de 1947 - Sexta-feira)

sexta-feira, novembro 25, 2011

JESUS QUERIA ABRAÇAR O MUNDO

Sentia mesmo no meu rosto o Rosto de Jesus, bem gravado

Na terça-feira, dia 25, quando estávamos a fazer o mês das almas, sem nada pensar nem se tratar do Senhor dos Passos, eu vi-O, por três vezes, a caminhar, aparecendo aqui e além, desfiguradíssimo, coroado de espinhos, com um grande madeiro aos ombros. Não posso dizer o que senti; comoveu-me tanto em assim ver Jesus! Não soube falar-Lhe, quase nada Lhe disse. Pedi-Lhe para que não sofresse e passasse para mim todo o Seu sofrimento e a cruz.
Esta visão causou-me tal sentimento e foi tal a pena de não saber oferecer e falar a Jesus, que parece-me, ou melhor, sinto que se me abriu no coração uma ferida tão profunda que o vazou, dum lado ao outro. Esta ferida sangra sempre, desde esse dia, todos os dias, em algumas horas, não são horas certas; eu sinto sobre os meus ombros aquele pesado madeiro, que Jesus levava, e na cabeça a coroa de espinhos que cingia a Sua sacrossanta Cabeça. Quantas vezes me parece ter os cabelos ensopados em sangue e este mesmo sangue saído das feridas, a correr-me pelas faces.
Ontem de tarde, sentia mesmo no meu rosto o Rosto de Jesus, bem gravado. A princípio, depois de fitar o mundo, cobriu-se de suores; depois derramava copiosas lágrimas de sangue e este saía-Lhe também pelos ouvidos. Jesus queria abraçar o mundo, mas a maior parte dele não queria aceitar o Seu abraço. Passei pela sala espaçosa da ceia, pela sala do grande amor. Jesus dava do Seu divino Coração para cada um dos Seus discípulos o Seu divino amor, em raios luminosos, como sol aparecer no horizonte; todos os discípulos o receberam e deixara-se por ele iluminar, apenas Judas se fechou e recusou o Seu brilho e luz.
Passei para o Horto para todas as cenas dolorosas e comovedoras; nele vi todo o martírio que me esperava, ou que esperava a Jesus. Entre grandes e muitos espinhos, que se enleavam em meu coração, enchi o cálice da amargura. Fui presa e levada aos tribunais, e destes para a prisão.
Durante a noite, depois de grandes ameaças do demónio, combati com ele, por três vezes. Causa-me grande horror a forma como ele pinta e consegue as coisas. Parece-me que sou eu só a causa de tanto mal. De um combate ao outro, fiquei presa sempre ao demónio e sobre a boca do inferno. Ouvia uivos raivosos e grandes leões tentavam engolir-me. Dizia-me o maldito que por mim se ia povoar o mundo de demónios. O que eu sofri! Eu queria e não queria pecar. Chamei por Jesus; Ele veio em meu auxílio; dum demónio que eu era transformei-me em serenidade e paz.
― Aparta-te, maldito; não exijo mais da Minha vítima. Minha filha, Minha filha, não pecaste; deste-Me nestes combates, maior reparação do que com um ano de sofrimento, jejum e penitência. É um cordeirinho a imolar-se sem perder a vida, no fogo sem se queimar.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 28 de Novembro de 1947 - Sexta-feira)

quinta-feira, novembro 24, 2011

MUITOS FUGIAM DA LUZ...

A minha alma viu o Céu descer sobre a terra

Nos três ataques ao espírito, teve que lutar também o corpo; o maldito tratou comigo como se fosse um mudo. Eram só gestos e pinturas maldosas. Isto foi motivo de maior tormento; mais me parecia que não era influência dele, mas sim minha, só minha. Pareceu-me que o coração, no auge da dor, veio palpitar para fora do peito; não cabia em mim. Ensopada em suor, chamei por Jesus e pela a Mãezinha, e fiquei libertada.
Chamaria a tempo? Não chegaria a pecar? Que medo eu tenho! Ai a minha vida tão cheia de misérias e tão falha de virtudes e merecimentos. Que cegueira, que mortandade! Vivo sem viver, ou vivo sem sentir que vivo. Ó Jesus, sou a Vossa vítima, imolai-me ao Vosso gosto.
Ontem, ao cair da tarde, a minha alma viu o Céu descer sobre a terra; vinha dar-lhe luz, porque estava em trevas, vinha dar-lhe vida, porque estava morta. Era Jesus que vinha dar esta luz e esta vida, mas oh! como foi rejeitada. Eu via uma massa grandiosíssima fugir à luz e à vida de Jesus. Que dor dolorosíssima me causou na minha alma; conduziu-me logo ao Horto esta dor. Jesus foi dentro em mim e dentro em mim Ele orou com o Seu Santíssimo peito sobre uma pedra dura, e cercado de grandes varas de espinhos, que se enleavam umas nas outras, estava o cálice, que recebia o sangue e toda a amargura de Jesus.
Eu sentia que só ele sofria; era tal a Sua dor, que causava espanto e admiração aos Anjos, que do sofrimento, como se fossem estrelas, O contemplavam. Só o Céu compreendia a dor de Jesus. Depois do Céu, era a Mãezinha a compreendê-la e a vivê-la. Como Jesus e a Mãezinha se amavam e viam, um através do outro. Toda a terra ignorava, mesmo os discípulos de Jesus, a dor de tão amantes corações. Faz enlouquecer tanta dor, tanto amor. Ó meu Deus, que mal Vos tenho correspondido!
Hoje, segui o Calvário. A minha cabeça esteve com a de Jesus, por algum tempo, pousada na terra nua com o desfalecimento do corpo que, nesta ocasião, mais barbaramente recebia os maus-tratos. O sangue corria pelos olhos e ouvidos. Toda chagada, fiquei na cruz crucificada. Estava no alto para escárnio de quase todos que ocupavam o Calvário. Vi a Mãezinha subir a montanha; foi o meu pobre coração que sentiu e a alma que viu a Sua dor e olhares angustiosos, que mal A deixavam arrastar-se. Quanto isto custou a Jesus! Foi a união dos Seus divinos corações e o amor que A conduziram ao Calvário. Não sei dizer o que senti que Eles sofreram e amaram. Se fosse possível eu falar desta dor e amor por toda a eternidade, podia dizer que nada dizia. Sofro por só isto saber dizer. Formou-se um Calvário de espinhos; subiram tanto que encobriram a cruz. Entre eles como num só coração, num só amor e numa só alma estava Jesus, a Mãezinha e eu a darmos a vida, esmagados pela justiça divina. Eu sentia e via a mãezinha por Jesus; não era em mim que Ela estava, era Jesus em mim e Ela em Jesus. Foi para os três o mesmo Calvário, a mesma agonia. Senti-me morrer e morta ficar, por um espaço de tempo.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 21 de Novembro de 1947 - Sexta-feira)

segunda-feira, novembro 21, 2011

SENTIA JESUS A FITAR O MUNDO

A visão das lágrimas da Mãezinha

Ontem de tarde, no mar do meu sofrimento, parecia-me ter vindo ao mundo, mas não ser do mundo, vivia nele não para cuidar de mim, mas sim das coisas de Deus. De vez em quando, o meu coração ia para o Horto, mas logo fugia, ou fingia fugir para tratar das mesmas coisas.
Logo à noitinha, para concluir esses trabalhos, passei à ceia. Mas oh! que amargura tão cheia de amor e disfarçada! Senti a consolação, que Jesus sentiu, quando tão carinhosamente ao Seu lado se encostou o discípulo amado. Logo a seguir, foi grande a dor do Seu divino Coração com a visão das lágrimas da Mãezinha, lágrimas que para Jesus foram antecipadas, assim como a lança que, num rápido momento, Lhe abriu o peito e o divino Coração, deixando-o a sangrar. Depois, segui, passo por passo, as cenas dolorosas e tristíssimas do Horto e da agonia de Jesus. Eu em mim sentia ter que morrer e queria morrer; sem a morte não poderia terminar os trabalhos, a que tinha vindo à terra. E, nesta altura, sentia Jesus a fitar o mundo e com profunda tristeza dizia o seu divino Coração: tanta ingratidão para tanto amor. Não eram bem aceites os Seus padecimentos, o Seu divino Sangue, a Sua morte.
Hoje, longe de aparecer o dia, muito desfalecida, no mesmo desfalecimento, fui encontrar Jesus na prisão; estava sozinho sem ter quem O confortasse e fizesse um carinho e Lhe provasse amor. Quase não era Jesus; era um moribundo. Compadecia-me Dele, disse-Lhe muitas coisas, mal, porque melhor não sabia, para O consolar. Disse-Lhe muito, e muito Lhe pedi. Entre esses pedidos, o principal foi que não me deixava iludir nem enganar os outros. A verdade, a verdade, só a verdade, meu Jesus. O que dizia e pedia na minha dor, nas minhas ânsias ardentes de consolar Jesus e Lhe provar amor sem por sombra pensar numa resposta; mas logo do íntimo do coração uma vez muito terna e doce me disse:
― É esta a verdade pura, minha filha, pura, mais pura que a água cristalina! Confia, confia, em Mim.
Senti e vi que Jesus se sentia e via Ele mesmo preso à coluna e depois na cruz, mas isto ainda na prisão. Não pude saborear nada as palavras doces de Jesus; tive que sofrer com Ele.
Mais tarde, vi-O então meio despido, já solto da coluna, mas todo banhado em sangue, e, depois, tomar a cruz, seguir o Calvário. No meio dos espinhos do meu viver, no Calvário das minhas dores, segui com Ele. Na viagem não me foram poupados os maus-tratos e na cruz fui com Ele crucificada, sempre a sentir que estava a cuidar as coisas de Deus, muito unidinha a Ele com Ele compartilhava da mesma agonia. Como Ele eu queria enxugar as lágrimas da Mãezinha, consolá-La na Sua dor, tirar as setas do Seu Santíssimo Coração, tomá-La para o regaço, abraçá-La, fazer-Lhe o que Ela bem depressa ia fazer a Jesus, mas com Ele já morto. O coração ia morrendo lentamente e aquela vida que me tinha trazido à terra ia-se avizinhando novamente do Céu. Jesus expirou. Toda a vida me fugiu, e expirei com Ele.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 14 de Novembro de 1947 - Sexta-feira)

domingo, novembro 20, 2011

A FERIDA DO AMOR

Eu tenho sede dos corações

Passou-se algum tempo, desapareceu toda a treva, o sol dissipou para longe as nuvens, iluminou-se brilhante e claramente a minha alma, um fogo abrasador me incendiou o coração, fazendo passar o calor das labaredas a todo o corpo; gozava duma grande paz, mas sem ouvir ainda Jesus. Um pouco mais, e Ele disse-me:
― Minha filha, até aqui bateram sobre ti as ondas do mundo, as ondas horrorosas do pecado, de grandes maldades e crimes e cobriam-te as suas trevas, porque és vítima. Agora veio a ti a paz e o amor do Meu divino Coração e toda a luz do divino Espírito Santo. Coragem! Eu quero ser amado; faz que as almas me amem. Eu tenho sede dos corações; repara-Me, conduze-os a Mim. Coragem, minha filha, nada temas. A dor e o amor são as moedas mais caras, são os selos com as quais selo as almas roubadas a Satanás. Coragem, filha querida! Tu és o prado mimoso, onde produzem as virtudes e desabrocham as flores plantadas por Mim. Levanta-te, anima-te, não temas a cruz. No alto da montanha, no cimo dela, Eu farei cair pelo teu coração todas as bênçãos e graças de salvação para as almas. A tua vida será para elas o perfume das flores, o gorjeio das avezinhas duma manhã primaveril. Custa-te subir? Custa-te chegar ao cimo do teu Calvário? Não estranhes. O remate das obras, o seu enfeite são sempre o mais difícil. Mas, ó minha filha, a obra não cai, confia em Mim. Principiei com alicerces tão firmes, que nada há que a faça estremecer, a pontos de vir a terra. É a obra das obras, é a obra mais sublime, é a missão das almas.
― Meu Jesus, ó amor meu, quero e não posso, desfaleço e caio; amparai-me Vós. Não me importo de caminhar de rastos e sempre de rastos ser humilhada, o que eu quero é estar na verdade e em tudo fazer a Vossa divina vontade. Dai-me graça, dai-me graça, meu Jesus, e fazei-me confiar cegamente. Quero sofrer tudo pelo Vosso divino amor, mas custa-me, a mais não poder, ser causa de grande sofrimento, de grande dor para os outros.
― Confia em Mim, alegra-te, Minha louquinha; estás na verdade, és minha, vives de Mim. Que felizes e ditosos são aqueles que Eu escolhi e associei ao teu martírio, ao teu grande, mas vitorioso Calvário. Coragem, coragem! A tua dor dá vidas, as tuas trevas são luz, que alumia as almas e vão brilhar aos confins do mundo. Recebe agora a gota do Meu divino Sangue. Hoje não cairá duma só vez; vai recebê-la, saboreá-la, como a abelhinha que sofregamente saboreia nas florzinhas o néctar.
Jesus tomou em Suas mãos o Seu divino Coração; pelo centro saíam labaredas que formavam uma só labareda; uniu ao meu coração e fez que nele se introduzisse o pequenino tubo; senti-me como que adormecer docemente. Assim demoramos, por um pouco. Depois, Jesus retirou o Seu Coração divino, bafejou-me o peito e passou-me sobre ele a Sua bendita mão como quem acaricia.
― Vai, Minha filha, a ferida que te fez o amor já está cicatrizada. Vai, leva para as almas estas chamas, abrasa os corações que têm fome de Mim; por ti Me dou a eles. Leva estas chamas, arrasta com elas a Mim as almas presas pelos laços infernais. Vai para a tua cruz, para a tua dor, não deixes correr mais pelos rastilhos o fogo, que faz rebentar a bomba divina, a justiça do Meu Pai. Coragem, coragem; nada temas, sorri a tudo!
― Obrigada, meu Jesus. Sede comigo; tudo espero do Vosso divino coração.
Passaram-se umas horas, o fogo de Jesus ainda me queima o coração; custa-me, por vezes, a aguentá-lo sem saber ele deitar panos frescos. Sinto-me mais forte; estou no fogo, mas em trevas, e o corpo num mar de dores. Ó minha cruz, ó meu Amor, ó meu Jesus!


(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 7 de Novembro de 1947 - Sexta-feira)

sábado, novembro 19, 2011

BUSCAR-ME É QUERER-ME

― Meu Jesus, quero e não posso, não sei viver, não sei sofrer, não sei reparar-Vos.

Vejo-me sempre coberta de misérias; causa-me confusão e horror. Em tudo vejo maldade, em tudo vejo pecado. Só ao fazer o meu exame de consciência, para purificar a alma pela santa absolvição, não encontro pecados. Vejo em todos os meus actos, em todas as minhas coisas, imperfeições, mas, não aquelas maldades e crimes de que estou sempre sobrecarregada. Causa-me profunda dor, encho-me de medo, não conheço os meus erros e grandes defeitos, não sei fazer o meu exame de consciência. Será assim? Ó meu Deus, tende piedade de mim.
Na minha grande dor esperei a vinda de Jesus à minha alma com grande ansiedade. Não fazia nada, e tudo queria fazer para bem O hospedar em mim. Ele veio, baixou ao meu coração e ficou silencioso, ficou como se não entrasse. A dor aguda continuava e toda a noite me envolvia. Eu não me importava de deixar de ouvir Jesus, o que eu não queria é que fosse por eu O ter desgostado, obrigando-O a Ele não viver. De repente, acendeu-se como que uma luz brilhante em minha alma, inundou-me a Sua paz divina e ouvi dizer-me:
― Minha filha, minha filha, buscar-Me é querer-Me, querer-Me é já possuir-Me. Ansiar amar-Me com sinceras ânsias é amar-Me louca e apaixonadamente. Confia que Me amas e Eu te amo. A tua alma é um jardim celeste entre o qual à sombra de mimosas flores Eu Me escondo para não ser atingido pelos pecadores; e deliciado pelo teu perfume aromático vou esquecendo a gravidade com que sou ofendido. Minha filha, flor angélica, dá-Me a tua dor, dá-Me o teu amor, repara-Me, repara-Me. Falo-te de amor, de dor e de almas, por ser esta a tua missão. Sem a dor, sem o amor elas não podem ser salvas. O mundo está em grave perigo, é necessário, é urgente almas vítimas, almas justas, mas elas fogem-Me, poucas são as que Me amam com amor verdadeiro, mas muitas menos as que aceitam a imolação do sacrifício. Os sacerdotes, os sacerdotes que mal Me fazem, que grande número tão gravemente Me ofendem. Repara-Me, minha filha, não só pelos combates do demónio, mas com muita penitência, muitos e muitos sacrifícios. Eu não quero que façam penitências graves, porque não podes, mas daquelas que com tão belas artes costumas inventar e fazer-Me. Repara-Me, minha filha, repara-Me, tem dó de Mim.
― Meu Jesus, quero e não posso, não sei viver, não sei sofrer, não sei reparar-Vos. Tenho medo de mim mesma, de tudo e de todos.
― Nada temas. Diz tudo o que te digo, dita tudo, mesmo quando te parecer que nada sabes ditar. Faz assim, para cumprires a Minha divina vontade; faz assim, porque assim Me amas e fazes amado. Diz ao teu Paizinho que o Meu divino amor, as Minhas divinas graças são para ele superabundantes. O mestre de almas precisa de graças divinas, precisa de amor para as conduzir a Mim. Quantas mais almas Me entregar, mais enriquecido será por Mim. Diz-lhe que o confiar e esperar sinceramente em Meu divino Coração é já ter em suas mãos a realização de todas as Minhas promessas. Confiança, confiança. Dá-lhe todo o Meu amor divino. Diz ao teu médico que estou sempre ao lado e dos seus. As minhas bênçãos e protecção estão sempre sobre ele. Diz-lhe que em tudo Me deve ter sentido e bem representado o Meu poder divino. Para todas as coisas já tem tido e terá doravante a luz do Divino Espírito Santo. Diz-lhe que, em Meu nome diga ao Meu queridíssimo Cardeal Patriarca que o Meu divino Coração ferve de amor por ele como panela de água em vivas chamas. Que lhe diga que confio e espero tanto dele para as Minhas coisas, como ele confiou e esperou em Mim até ao fim. Eu não atendi aos seus desejos, porque na Minha sabedoria infinita vi tudo. Quis premiar aquele que tanto fez por Mim, e se avizinham laços infernais para o fazerem cair. Há no mundo veneno mais perigoso para as almas do que a víbora para os corpos. Satanás trabalha tanto com os seus obreiros!

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 1º de Novembro de 1947 - Sexta-feira)

sexta-feira, novembro 18, 2011

“COM O CEU NÃO ACABA A TUA MISSÃO...”

Quem sofre não sou eu, quem sofre no meu corpo sois Vós.

Hoje tomei com Ele a cruz com o corpo todo chagado e a cabeça cheia de espinhos; seguimos o Calvário. Em todo o trajecto, caímos por tantas vezes desfalecidos; eu sentia o rosto de Jesus, poisado na terra dura; respirava contra ela e os Seus lábios divinos pareciam beijá-la, ao mesmo tempo que nova chuva de pancadas caíam sobre o Seu Santíssimo corpo. No Calvário senti e vi que, ao despir Jesus, o fizeram com toda a crueldade. O Seu divino corpo, coberto de sangue e feridas, não comoveu os seus duros corações. Aumentaram com isto a amargura de Jesus. Foi nesta amargura que Ele ficou todo o tempo da agonia até expirar. Custou-me tanto a aguentar este sofrimento de Jesus! Custou-me tanto suportar as palpitações fortíssimas do Seu divino Coração! Palpitava de amor pelo mundo endurecido e culpado, e palpitava de dor, quando o Pai pedia compaixão.
Era noite, noite tremenda. Senti o meu peito rasgar-se como fino pano; foi talvez no momento que Jesus expirou, não porque eu sentisse Ele expirar, mas pelo silêncio, noite e morte que em mim passava. Que sofrimento, que noite tão assustadora! De repente, iluminou-se toda a minha alma com uma luz que iluminava o mundo. Ouvi como quem bate palmas e ao mesmo tempo a voz terníssima de Jesus disse-me:
― Minha filha, minha filha, quem bate, quem te chama é Jesus. Repara; é a minha luz divina que te ilumina, para que saibas que sou Eu, para que compreendas a luz celeste e saibas distingui-la das trevas que Eu permito. Sou Eu, está atenta para bem sentires e gozares da Minha paz, a paz que te dou, a paz que vem de Mim, a paz que conforta e dá vida para sofreres. Coragem, um pouco mais. A tua vida, aqui neste desterro, é brevíssima; confia, vem o Céu, a tua Pátria, a eternidade de gozo. Ao terminar o teu exílio, a tua dor, principia, Eu to prometo, Eu to prometo, como recompensa, a cair para a terra uma chuva de graças constantes que vão penetrar nas almas. Não acaba a tua missão, a tua bela e sublimíssima missão. Enquanto que no mundo houver almas para salvar, não cessará de chover essa chuva de graças e maravilhas prodigiosas. É o prémio da tua dor.
― Meu Jesus, dizei que é o prémio da Vossa dor, que é a chuva das Vossas maravilhas e prodígios. Quem sofre não sou eu, quem sofre no meu corpo sois Vós. Muito obrigada pela promessa que me dais; alegro-me com ela, porque me alegro na salvação das almas. Sou Vossa, Jesus, para Vos amar, sou Vossa para com o que é Vosso as salvar.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 31 de Outubro de 1947 - Sexta-feira)

quarta-feira, novembro 16, 2011

QUERO-O PARA MIM !

Eu queria o milagre, mas já orava pela boa morte do moribundo.

Era grande, muito grande a dor e a angústia da minha alma, quando assim falava a Jesus. Na minha grande aflição, repetia-Lhe muitas vezes sem pensar obter uma resposta Sua: dais-Lhe a saúde, dais, meu Amor? E Jesus, na Sua bondade infinita, muito doce e suavemente, disse:
― Quero-o para Mim, quero coroá-lo do Meu divino amor, da Minha glória.
Sempre na minha dor, sem atender ao que Jesus dizia, insisti no meu pedido. Jesus, por três vezes, repetiu-me sempre o mesmo.
Passaram-se quase dois dias; a mesma pessoa de toda estima, de novo, me recomendou o doente, já quase em agonia. Que punhaladas na meu pobre coração! Que dor, que posso dizê-lo, quase irresistível! Em vez de oferta de vítima por um mês, fiz uma de três meses.
Chorei, chorei, fiz penitência, pedi para ser posta no chão, por algum tempo, para maior sofrimento, o que me não foi concedido. Mas, esta vez, Jesus não falou, fez-se surdo; em todas as minhas súplicas de tantas horas, não tive um raiozinho de luz, tudo se me apagava e desaparecia neste mundo; nem ao menos no memento da Sagrada Comunhão eu senti outra vida. Confiava que Jesus podia fazer o milagre, mas esta confiança não tinha lugar, ficava na superfície, tudo o mais é que era realidade.
Senti no meu íntimo a noite e o silêncio da morte. Eu queria o milagre, mas já orava pela boa morte do moribundo. Que medo aterrador pela vida de sofrimento se entranhou em todo o meu ser; foi um martírio, que se veio juntar ao martírio do Horto e do Calvário. Só depois de mais de 24 horas é que eu soube que o doente tinha partido para o Céu, se bem que já assim o pensava pelo meu colóquio com Jesus.
Tenho tido tanto medo do demónio! Receei tanto os seus assaltos! Há dois dias e noites que ele andava furioso, à volta de mim: uivava raivosamente, queria assaltar-me; atormentava-me com várias coisas o meu espírito. Apesar de todo o meu receio, Jesus não permitiu que ele viesse com os seus ataques. Que conjunto de sofrimentos, meu Jesus; contudo eu sou e serei sempre a Vossa vítima!
Na tarde de ontem, principiou o meu Horto. Primeiro que tudo, veio um sol do Céu que parecia iluminar todo o mundo; veio e envolveu em si toda a terra. O Calvário, o Horto juntou-se àquele sol, formou-se tudo numa massa. Desapareceu todo o brilho; toda a maldade, todo o erro lho encobriu. Jesus, dentro de mim, fitava tudo aquilo, e, curvado sobre aquela massa mundial, chorava; choravam os olhos do Seu corpo, chorava a Sua alma Santíssima.
Logo depois, vi a cruz e Jesus nela crucificado, a derramar sangue, muito sangue que Lhe atravessava a cintura. Ao senti-Lo e vê-Lo assim, passei-me com Ele para o Horto, ali veio representar-se todo o Calvário. Que aflição! Rolávamos pelo solo duro, o qual tremia e nos fazia tremer. Falo assim porque Jesus ia comigo; sofríamos os dois. Ali mesmo, Jesus suou sangue e falava a Seu Eterno Pai e Lhe oferecia o cálice tão amargo; amargo para Jesus e amargo para mim. Foram dois Hortos. Sofria com Ele, sofria por Ele e sofria por mim. Como eu desabafei com Jesus e Lhe pedi para as consolar! Ó noite, tremenda noite! Que todo este meu sofrer seja para honra e glória do Senhor e bem das almas. Não sei, não sei traduzir a minha dor.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 24 de Outubro de 1947 - Sexta-feira)

O FOGO DAS PAIXÕES...

Ó dor, ó dor, ó dor salvadora!

Veio a prisão e eu segui Jesus, sempre a ser com Ele maltratada; e, hoje, logo de manhãzinha eu, à prisão O fui encontrar, sempre acompanhada do mesmo sofrimento que era um martírio triturante. Voltei a ver a cruz de Jesus e com Ele andei a caminhar entre o alarido e grande algazarra do povo. Os sofrimentos de Jesus eram para todos grande festejo. Não se comoveram ao vê-Lo chagado, ferido. Caminhamos para o Calvário, suportei a Sua amargura e a minha. Custou tanto a chegar ao cimo! O meu peito serviu de montanha e o meu coração de cova da cruz onde Jesus estava crucificado. Ele regou com o Seu divino Sangue o solo duro, que eu representava. Com ser eu o Calvário sento-me abraçada a ele, abraçada à cruz. Queria sofrer, queria morrer. O sangue de Jesus caía, os corações dos que O rodeavam com rancor não se comoviam. Um grande número tinham em suas mãos chicotes e finas varas com os quais, mesmo na cruz, tentavam satisfazer mais seus gostos, ferirem a Jesus. Quantos escarros Lhe queriam ainda lançar em rosto. O meu coração via tudo aquilo. Oh! como Ele sofria! O meu brado unia-se ao de Jesus, a pedir socorro ao Pai. Quando Jesus expirou, com que amor, bondade e doçura Ele Lhe disse: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito; é para ti o Meu último suspiro. Tudo se calou, tudo ficou por algum tempo em silêncio. Jesus tinha morrido, mas veio depressa; ressuscitou, deu-me a Sua vida e falou-me:
― Coragem, coragem, minha filha! Oh! commo são belos e prodigiosos os caminhos dos escolhidos do Senhor. Oh! como é bela, luminosa e atraente a vida da esposa mais fiel, a vítima mais generosa que Jesus escolheu para Si. Coragem, coragem, minha filha. Não é só pedir-te a dor para ouvir dos teus lábios um sim cheio de amor e generosidade; peço-te a dor e quero a dor, peço-te a dor e busco todos os meios para te fazer sofrer. Ó dor, ó dor, ó dor salvadora! O fogo das paixões incendiou-se no mundo, não há quem o apague; em vez de água a apagá-lo, dentando-lhe a lenha das maldades, crimes hediondos, as maiores iniquidades a incendiá-lo; subiram ao seu auge as labaredas criminosas. Dá-me a tua dor, filha querida, e diz tu ao mundo que Jesus o ama e quer; diz-lhe que se converta depressa, depressa. Se assim não for, quanto ele terá que chorar e gemer. O fogo já corre pelos rastilhos, a bomba divina não demora a explodir.
Jesus dizia isto com lágrimas, suspirava em profunda tristeza. Não pude vê-Lo assim.
― Meu Jesus, meu Jesus, não consinto nas Vossas lágrimas. Para que sofro eu? Para que quereis Vós a minha dor, a minha tão pobre e sofrida dor! Ponde-lhe os Vossos méritos, ponde-lhe o Vosso amor e consolai-Vos nela e dela fazei o que bem Vos aprouver. Quero eu chorar, sofrer e estar triste, contente só por fazer a Vossa divina vontade.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 24 de Outubro de 1947 - Sexta-feira)

quarta-feira, novembro 09, 2011

ACODE AO MUNDO

Eu fiquei sozinha ligada ao princípio dessa montanha.


Na manhãzinha de hoje, sem pensar encontrá-Lo, lá O fui encontrar quase moribundo. Tomei a cruz, depois dos açoites e todos os maus-tratos com os quais perdi muito sangue. Senti o caminho do Calvário, mas logo no princípio senti que o sangue de Jesus fervia em Seu divino Coração como panela que ferve sobre chamas. Ele atirava-se de braços abertos para os sofrimentos, como quem se atira às ondas para nadar. Em todo o caminho da amargura, e no Calvário, e já no alto da cruz, Jesus levantou por muitas vezes os Seus divinos olhos como que a pedir auxílio; sentia-os na minha alma como que abrirem-se e a fecharem-se. Cravaram-se-me no coração todas as feridas do corpo Santíssimo de Jesus e bem gravadas ficaram e todos manchados de sangue os caminhos que percorremos. Já lá vai muito tempo e ainda os sinto em mim, como se fosse agora! Não foram só os caminhos dolorosos que me fizeram sofrer, surgiram espinhos postos por mãos humanas a ferirem-me também; levaram-me a fitar a cruz com Jesus, a pedir-Lhe forças para os suportar. Quanto custa este viver!
Quando estava assim no Calvário, a cruz e Jesus levantaram-se em meu peito, a montanha foi subindo, subindo, levou a cruz e nela Jesus, desapareceu tudo, sumiu-se o Céu. Eu fiquei sozinha ligada ao princípio dessa montanha. Levantou-se um mar de crimes, das maiores iniquidades, e as ondas desse mar batiam em mim, membro dessa montanha, como batem as ondas num cais. Quanto mais batiam, mais cegueira eu tinha, mais ó me sentia. Sem luz, sem auxílio para aguentar tão0 grande mar de crimes, pior imensamente pior do que a fúria da mais tremenda tempestade, senti-me morre, mas sem Jesus a acompanhar-me. Não O senti a Ele a expirar. Assim fiquei por um bom espaço de tempo, morta sem morrer, nas trevas sem ser noite. Veio, depois, Jesus; não me trouxe logo a luz, trouxe-me a vida e um fogo que me incendiou o coração; pegou o fogo e disse-me:
― Minha filha, minha filha, tu não estás só; eu estou contigo. E sabes quem Eu sou? Sou aquele Jesus a quem escolheste e preferiste para Esposo. Como Eu te quero e amo! Anima-te, anima-te; tem coragem. Tu não és trevas, és luz; as trevas são para ti, para viveres nelas e a luz, a luz, que tu és, é para as almas. Criei-te para elas, não és do mundo e vives para o mundo, não estás no Céu e vives do Céu. Desde o primeiro instante da tua existência, desde que te criei vi sempre em ti a missão que te confiei, a missão mais bela, a missão mais nobre, a missão das missões, a missão das almas; criei-te para elas, delas és vítima. E à Minha semelhança, vítima do Calvário, vítima do Gólgota. Como prova de que o és, foi por isso que te uni ao princípio da montanha e sobre ti fiz bater o mar das iniquidades.
A montanha subiu, a cruz desapareceu, e eu com ela fui para o Céu. Mas os crimes continuaram, e eu continuei a dar a prova do Meu amor e a derramar sobre o mundo as Minhas graças. Foi aquela chuva de oiro, que do alto da cruz viste das Minhas chagas, de todas as Minhas feridas brotar. E a prova desse amor foi fazer continuar a obra da redenção. O Calvário, o Meu divino Sangue foi desprezado; desprezadas foram as Minhas graças, o Céu fechou-se para a maior parte da humanidade, perdeu-se para ela o sofrimento da cruz. Foi preciso continuar essa obra, através das Minhas vítimas. És a maior vítima, és a maior depositária das riquezas de Jesus. Acode ao mundo. Eu continuo a dizer que ele está em perigo, grave perigo, urgente perigo. A maldade desafia a justiça do Eterno Pai. Escuta o mendigo que bate, dá a esmola a Jesus que te pede; aceita a cruz, leva-a com alegria, dá-Me a dor, dá-Me o fruto do teu Calvário; quero-o para as almas; dá-Me o combate do demónio. Que grande reparação eles Me dão! Dá-Me as almas, acode-lhes. Faz tua a Minha dor, faz teus os Meus suspiros, faz teu o Meu amor e as ânsias do Meu divino Coração.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 17 de Outubro de 1947 - Sexta-feira)

sábado, novembro 05, 2011

ESTE SANGUE LUZ, LEVAVA AMOR...

Os Seus olhos divinos estavam nos meus...

Passam os dias, passam as noites e eu num martírio de alma e corpo, mas sem aumento de graça e amor, sem dar um passo por Jesus, cheio das maiores misérias. Não posso ver-me; que nojo ao ver-me assim! A eternidade aproxima-se, corre para mim, em marcha apressada, vem colher-me a morte e só colhe maldades, não encontra nada que satisfaça a Jesus. Meu Deus, que horror!
Na tarde de ontem, senti mais o esmagamento e a justiça do Céu; não podia aguentá-la. Debaixo deste esmagamento, senti os olhos vendados e o rosto esbofeteado; o que sentia o rosto sentia o coração. A seguir, ficou ao alto, junto de mim, uma cruz; senti-me de pé, abraçada a ela; nunca mais a deixei. Via os caminhos, que atravessava, ficaram marcados com o sangue que do coração me saía. Este sangue luz, levava amor, mas não era meu, era de Jesus. Era uma grande atracção e convite que Ele fazia para todos O seguirmos com a cruz até ao Calvário. Caminhei para o Horto; lá cheguei, de lá vi a querida Mãezinha em cuidados, em amargura, em ânsias. Onde estava o Seu Jesus? Que sofria Ele àquelas horas? Estava a suar sangue; de todas as Suas veias ele corria a ensopar a terra. Senti que todo o solo estremecia e toda a terra se movia para mais se ensopar no sangue inocente de Jesus. Toda a justiça divina desceu, a todo o descer; envolveu-se o divino com o humano, o amor com a ingratidão. Eu fiquei ali naquele esmagamento, entre a terra e o Céu, a dar o meu sangue, a beber o cálice amargo, até à última gota. Jesus é que a bebia, é que derramava o Seu divino sangue, é que era esmagado, mas utilizou-se do meu corpo. Se eu soubesse acompanhá-Lo em toda a Sua Paixão! Mas oh! pobre de mim, nada sei.
Hoje, de manhãzinha, muito cansada, quase sem vida, muito ferida, tomei a cruz; caminhei pelas ruas estreitas que davam para o Calvário. Oh! que tristeza, que escuridão! Sentia que Jesus com os olhos colados pelo sangue não via para caminhar. Os Seus olhos divinos estavam nos meus e neles senti como que o sangue de Jesus a coalhar. Cheguei ao Calvário, ali passei pelos demais sofrimentos.
Uma onda mundial, toda criminosa, levantou-se contra mim e contra o Céu; era uma revolta, uma tremenda batalha. Jesus, todo misericordioso, com todos os meios lançou-se a essa onda para a acalmar; queria o mundo que Lhe pertencia; deu-lhe todos os meios de salvação. Logo a seguir a isto, senti, dentro de mim, um suspiro de Jesus e do alto da cruz, de dentro do Seu peito Santíssimo, como se fosse uma pomba branca a esvoaçar, pareceu-me voar o Seu divino Coração; voava, voava, mas sem se poder poisar. Queria abraçar, não só os que com graça e amor rodeavam a cruz, mas sim todos os que com crueldade e ingratidão Lhe formavam o Calvário; sim, nesses é que Ele queria poisar, é que Ele queria abraçar. Repelido, sem poder consegui-lo, suspirava e a Sua agonia chegou ao auge. Senti dois abandonos, um, como sempre de costume o tenho, que me pertencia a mim e outro que pertencia a outro; eu, que não era eu, parecia sê-lo, mas era Jesus. E neste abandono completo, Ele expirou e eu também, ou pareceu-me que expirei. Depois de um bom espaço de tempo, veio Jesus, veio sem luz, deu-me vida, mas em dor.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 10 de Outubro de 1947 - Sexta-feira)

VEJO QUE TODO O MUNDO É NOITE

Jesus inclinou-me para Ele e acariciou-me.


― Vou, agora, dar-te a gota do Meu Sangue. Pela chaga bebeste amor e pelo tubo de oiro rompe das veias, do Meu Coração, para o teu a gotinha do Meu divino Sangue. É o sangue que te dá vida, é a vida do que to vives, é a vida que dás às almas, é o sangue que gera as virgens. Com toda a razão Eu posso dizer: minha esposa, virgem louca, Eu sou o Esposo das virgens. Oh! como Eu as amo, sobretudo como Eu te amo!
Quando o sangue de Jesus passou para mim, o coração cresceu, cresceu, levantou-me o peito, fiquei sem poder respirar; sem poder aguentar, parecia-me morrer. Jesus inclinou-me para Ele e acariciou-me.
― Coragem, minha esposa amada; toda a tua vida, toda a tua força dá-ta Jesus, vem-te do Céu. Confia, vives de Jesus e para Jesus, vives de Jesus e para as almas. Vai para a dor e para a cruz, sorri-lhe sempre, abraça-a sem temor. Coragem, coragem! É teu o mundo, são tuas almas, salva-as. Combate, minha heroína, combate e vencerás.
― Obrigada, obrigada, meu Jesus.
Vim para a cruz e não sei o que sinto. Vejo que todo o mundo é noite, que todo o mundo é revolto. Quero acudir-lhe, quero salvá-lo e não posso. Como é grande a minha dor! Quero levá-la com alegria. Jesus, vinde e vencei em mim.


(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 10 de Outubro de 1947 - Sexta-feira)

domingo, outubro 30, 2011

VI JESUS PREGADO NA CRUZ

Pobre coração, penetrado de espinhos tão penetrantes!

Nem vida para viver, nem coração para amar.
Não vivo, não vivo, não; de mim, do meu pobre corpo ficou a dor, a dor que me tritura, a dor que, dia e noite, me consome; consome-me, e não é no meu corpo que ela vive; sim, não é em mim que ela existe, ela trespassa em todo o meu ser, como vento que em todo o lugar penetra. Onde estou eu? Onde é que eu vivo? Ó Jesus, ó Jesus, eu sou como uma aragem, que passa nos ares, nos ares vive e em todo o lugar existe, tudo observa, vê penetra. Sou eu e não sou, vivo eu e não vivo, penetro tudo e nada sei. Mas, ó meu Deus, se eu não vivo nem tenho coração para amar, como posso ter ânsias de amor, mas de um amor que se perde e enlouquece, e sentir que um coração dentro de mim é tão mal tratado, tão ofendido e calcado aos pés; é todo um mundo contra ele. Pobre coração, penetrado de espinhos tão penetrantes! Se eu pudesse mostrar, se pudesse copiar todos os ferimentos deste coração para ver se conseguia evitá-los, para, em vez de sofrimentos e ingratidões, fazê-lo receber consolação e amor! Ai de mim, meu Deus; eu pertenço ao número destes ingratos e para vergonha e confusão minha sou a pior de todas, sou a que mais mal trato este terno e doce coração. Meu Deus, como os dias passam e a vida foge e eu sem nada para Vos dar, pobre de tudo, sem amor e pureza para me apresentar diante de Vós. Valei-me, valei-me meu Jesus; ouvi o meu brado aflitivo e contínuo. Vede que o meu espírito anda como a abelhinha de flor em flor à procura de néctar que a satisfaça. Ele voa, voa, poisa aqui, poisa ali, e, mais das vezes, não tem onde poisar, não encontra satisfação, não encontra onde possa descansar. Estou cansada, meu Jesus, de Vos procurar sem Vos encontrar; parece que errei o caminho. Morro sem Vos ver, sem Vos possuir. Vinde socorrer-me; apressai-Vos, eu Jesus. Oh! que desalento e trevas as minhas! Tenho medo, tenho medo! Eu quero luz, meu Jesus; dai-me alguém que me ilumine, dai-me quem me ajude a formar o meu voo para o Céu, para Vós, só para Vós. O mundo, oh como eu aborreço o mundo com o que é dele; aborreço-o e dele tenho compaixão; aborreço as suas maldades, mas amo-o a ele; abracei-o e quero-o todo dentro do Coração do divino Jesus.
Ontem, logo de manhã, vi Jesus pregado na cruz e pregado na cruz do meu corpo; gravou-se em mim. Como fiquei a senti-Lo tanto ao vivo! Como na cruz, Ele inclinou para o meu peito a Sua Santíssima Cabeça; senti todo o Seu Santíssimo Corpo gelar e expirar.
Esta visão com o sentimento preparou-me um Horto dolorosíssimo; tinha-o sempre diante de mim, sentia a dor angustiosa de Jesus. A minha alma via-O caminhar para um lado e para o outro, a olhar o mundo, a chorar; na sua angústia levantava os olhos para o Céu e o Seu divino rosto cobria-se de suor. Eu tinha o rosto de Jesus e o Seu suor no meu coração e na minha alma. Estive bem unida aos sofrimentos do meu Jesus. Passei pelas cerimónias da ceia, o adeus à Mãezinha e por fim o Horto real com todas as cenas; o suor de sangue, a prisão.

(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 3 de Outubro de 1947 - Sexta-feira)