Pois que hoje ser gordo é ser-se uma espécie de estrela de cinema, arrependo-me de me ter andado a queixar pelos cantos anos a fio, depressivo e em lamúrias consecutivas. Já que uma nádega pode fazer concorrência à maior abóbora do livro dos recordes, e que uma sessão de ginástica de dez minutos ao martírio de meses de treino a assentar massa e tijolo, o que sei é que não nasci na altura certa, ou melhor, que morri na altura errada. Hoje estava até capaz de soltar a luxúria que há em mim e lançar-me como actor de um filme erótico caseiro. E correr, correr muito. Mas gritar mais ainda do que correr, pois gritar ajuda a perder peso e isso está provado cientificamente.
Pior é que aqui à minha volta, no inferno, estou rodeado de trinca espinhas olheirentos, mortinhos, todos eles, à conta de colesterol em excesso e enfartes de miocárdio. Gordos ou magros, o inferno é um tédio verdadeiramente insuportável. Uma crise pardacenta que nem as labaredas ajudam a esquecer. Sei bem que cá vim parar porque ajudei a descarrilar um comboio, mas, apesar de tudo, uma coisa é castigarem o Bin Laden com um tiro na cabeça e outra, completamente diferente, é andar por aí apregoar a revolução e acabar por voltar a devolver o poder aos mesmos do costume. O que mais sinto é a saudade dos gelados, porque como dizem e está na moda, gordura é formosura.