Valeu a pena?
Não, não vou responder com os versos de Pessoa.
Minha alma é pequena.
Se um dia fora grandiosa, aos poucos a vida tratou de encurtá-la, de humilha-la, de fazê-la pequena, amiúde.
E assim cresci.
A menina que morava perto do mar, perto de um porto e que observava os navios sumirem no horizonte assim como um dia ela faria quando crescesse.Sumir no horizonte daquela vida miserável e mesquinha e aportar onde ela poderia deixar os resquícios dessa infelicidade calada, mas perceptível nos gestos.
E cresci.
A menina pegou um navio, sem dar adeus.Não tinha ninguém para dar adeus, tinha ali uma família, mas acreditava que eles assim como ela não se importariam com a sua ida.Queria ter alguém para quem voltar e abraçar, que chorasse toda vez que ela fosse embora e que chorasse mais quando voltasse.E assim foi sonhando durante a viagem, durante a vida, toda a vida sonhando com isso.
Trabalhou nos primeiros meses, tão jovem ainda, em casa de família.Pai,mãe e 2 filhos homens, mais velhos do que ela.Pouco tempo ali virou forçadamente uma mulher pelas mãos grosseiras do pai e pelas delicadas dos filhos.Aos poucos acabou se acostumando, abafando dentro de si os gritos de dor e de horror ao simples toque deles.Aprendeu também a não chorar, a não se lamentar.Apenas aceitava.Queria ir embora mas a necessidade, o simples pensamento de passar fome a fazia voltar e a novamente abrir sua porta.Deixa-la entreaberta.
Queria que essa não fosse minha vida.
Conto-a como se fosse de alguém muito próximo a mim, como se eu lamentasse por ela, a abrassasse e dissesse que eu estava ali para ajudá-la.
Assim, como eu queria que existisse alguém assim para mim.
A mãe sempre soube.Talvez sentisse prazer em me ver ali humilhada, limpando o chão em que eles pisavam, em ver limpando-me depois que eles pisavam em mim.Ela nunca se importou com o fato de que a empregadinha fosse a amante do pai e dos filhos.Acho que se sentia aliviada por não ter que ser ela a mulher que o marido abrisse violentamente as pernas para saciar as vontades.
Um dia, ela realmente se importou com toda essa história.
Percebeu que minha barriga estava saliente.Perguntou-me a quanto tempo minhas regras não vinham e eu não sabia dizer.Eu realmente não sabia que estava grávida.Fiquei feliz por saber que teria alguém para amar e para me amar, alguém que me faria esquecer de todo o meu sofrimento.O que choraria nas minhas idas e nas minhas voltas.
Arrancaram me esse sonho.
Levaram-me para um médico, "Ele vai cuidar de você Maria. fica quietinha tá?" "Ele vai cuidar do meu bebê?" "Vai sim Maria,vai sim"
Me deu uma injeção e desmaiei.Ao acordar não sentia mais nada dentro de mim, meu filho não estava no meu ventre.Estava ali, num pano enxarcado de sangue.Tão pequeno, tão indefeso.Calado, quieto demais para alguém que acabara de nascer.Tentei pega-lo, abraça-lo, mas o médico me dissera que estava morto.Que ele a pedido da familia, fizera aquilo. "Foi pro bem de todos Maria,foi pro bem de todos viu?"
Me sentia fraca demais para fugir, me sentia enojada ao me ver suja com aquele sangue que eu nem mais sabia se era meu ou do meu filho, me sentia morta.Não chorei.Apenas dormi com a esperança de acordar e estar novamente olhando o porto, os navios.Sonhando.
Acordei e me vi ainda ali.Tudo limpo, meu filho deve ter ido para a lata de algum lixo.Estava melhor.Fugi
Corri para longe daquele inferno, sozinha e cansada.
Pelo caminho, tentei me imaginar atriz.
Eu era uma atriz vivendo aquela personagem.Assim que as luzes se apagarem e o público de retirar, eu voltaria a ser a atriz.Eu teria para quem voltar cansada do espetáculo.Teria alguém para me dizer o quão maravilhosa fui.
Mas estava correndo, fugindo e com fome, e eu não era uma atriz.
E assim fui vivendo fugindo. E quando não consegui mais fugir, virei mulher da vida.Experiência já tinha, o que viria de pior?
As primeiras noites foram as piores até me acostumar com aqueles homens.Descobri que todos eram iguais.O segredo era se entregar achando que ele me amasse,assim eu não me sentiria igual a eles, fazer por fazer.Eu fazia por amor.Amor por alguem que eu sempre sonhara e que tentava acreditar que poderia ser aquele que estaria por cima de mim.Fechava meus olhos e ignorava os palavrões e todo os grunhidos asquerosos vindos deles.Aos poucos fui gostando.Não que me desse prazer ou qualquer coisa assim.Gostava de ser desejada.Gostava de ouvi-los falando de suas familias, ou do sonho de ter uma.
Eu também queria ter uma, mas me era negado esse direito.
Fiquei lá por anos.Sofria humilhações e dores e toda sorte da desgraça, mas para onde eu iria?
Ali eu pelo menos fui feliz, tinha amigos e era tratada com algum respeito.Essa felicidade que sentimos ao nos iludirmos.
Fui envelhecendo e poucos ainda me queriam.Virei chacota entre as mais jovens.Então resolvi partir.
Não houve adeus.Ninguém ali se importava com isso, com o meu adeus.Eu não chorei.
Vaguei.
Voltei para onde nunca mais deveria ter voltado.
Estou aqui,observando os navios chegarem e partirem deste porto.
Um dia eu fui um navio.
Mas sem um porto.
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quarta-feira, 2 de julho de 2008
sexta-feira, 20 de junho de 2008
Por um instante nos olhos de Lola
Não me importa com o que pareces, desde que eu te
ame
(Pablo Neruda)
1º dia.
Estava caminhando desatento como sempre por aquela rua repleta de pessoas que se desdobravam e se esbarravam entre si no desespero e na ânsia de chegarem em seus destinos pontualmente, olhando apenas para o chão e para a dança frenética de todos aqueles pés sobre o preto e branco hipnótico daquela calçada na velha rotina diária que eu seguia a risca até o meu trabalho medíocre de atendente de uma renomada seguradora, quando num relance a vi do outro lado da rua na fila para entrar num ônibus.Foi uma breve visão tão rica em detalhes que aos poucos fui esquecendo e que apenas o seu rosto permaneceu em minha memória.Ela entrou e desapareceu e eu segui adiante como se nada houvese acontecido, como se a minha vida não houvesse se despedaçado naquele instante.Em alguns momentos do meu expediente e da minha noite o seu rosto e somente ele vinha à minha mente.
2º dia
Andando por aquela rua com mais atenção procurei o seu rosto em cada pessoa com quem esbarrava e fui até o ponto de ônibus onde ela havia estado ontem.Em vão perdi 2 horas do meu dia e ganhei uma bronca do meu superior ao chegar atrasado ao meu trabalho.Me senti um total idiota por tamanha asnice, o que me fez ter uma crise de risos seguida de uma tristeza seca.Ao dormir sonhei com ela.Vinha em minha direção vestida de branco e cabelos longos e negros ao vento, num lugar onde eu não reconhecia mas era me familiar.Acordei suando e com um vazio latejante em meu peito.Repetia como se fosse um mantra o quanto aquilo tudo era ridículo.Paixão ou amor à primeira vista não existia.Não existia.Não existia.Não existia...
5º dia
Desde que a conheci sonho com ela.É sempre o mesmo sonho.Ela vindo em minha direção, inicialmente um vulto na distância refratado na névoa, mas que pouco a pouco se aproximava de mim, trazendo em seu sorriso uma luz que dissipava toda aquela escuridão dentro dos meus olhos.Sempre acordava antes de tocá-la e me amaldiçoava por isso.Tenho andado mais ansioso na empresa e relapso com os meus amigos, mas não acho que seja algo assim tão significativo.E não a encontrei pelo meu caminho.
10º dia
Chorei hoje de manhã ao acordar, como a muito não chorava depois que fui criança.Fazem 2 dias que não sonho com ela e 10 dias que não consigo pensar em outra coisa a não ser em seu rosto.Chorei porque me sinto estúpido, porque fui vencido pela irracionalidade e por não ter forças para esquecê-la, por não me conformar com tudo isso.É idiota, eu sei, se apaixonar assim por alguém, sem ao menos saber qualquer coisa sobre ela a não ser que ela possuí o rosto mais perfeito do mundo que destroí meus dias e assombra minhas noites.O que mais me consome, o que mais me faz sofrer é essa fúria de não ter adivinhado que a falta do bem que desejei era apenas o sinal da minha falta.Meu desempenho caiu muito no trabalho e meus amigos vivem me perguntando se realmente estou bem, porque ando melancólico e pálido demais.Acabo sempre respondendo que é uma má fase da minha vida que logo passa.Conheci uma mulher hoje num bar próximo a minha casa, quando eu estava na quarta garrafa de cerveja.Acho que seu nome era Ana.Transamos essa noite.
15º dia.
Tenho transado com Ana há 5 dias mas não sinto prazer algum, apesar de lhe proporcionar alguns orgasmos.Gosto dela,é bonita e inteligente e tem me feito sorrir, mesmo que melancolicamente.Hoje após ter transado exaustivamente com Ana, acabei dormindo e sonhando com a outra, a que eu amo.7 dias sem ela pareciam uma eternidade repulsiva.Dessa vez a toquei, a abracei e gritei o quanto a amava entre lágrimas e soluços.Quando ia lhe beijar, Ana me acordou secando minhas lágrimas, dizendo o quanto achava lindo me ver assim após uma noite com ela.Me beijou e se despediu.Me tranquei no banheiro enojado pelo beijo e por estar com ela.Saí e liguei o rádio.Tocava Lola, do Chico Buarque.Engraçado como me identifiquei com aquela música.Ela realmente rasgou páginas dentro de mim, não páginas claro, mas tudo o que havia dentro de mim, e ela invadiu minha mente, e somente ela permanecia ali, como uma orquestra a tocar a mesma música.Lola...Lola...Vou chama-la de Lola
20º dia.
Voltei a sonhar com Lola regularmente.Agora dançamos,beijamo-nos e fizemos amor ali mesmo,na rua onde nos conhecemos.Ainda assim, ao acordar me sentia mais angustiado e melancólico, amaldiçoando Deus por não ter fundido nossos caminhos.Esse meu caminho que me levava a todos os lugares, menos para aquele em que eu a encontraria.E assim eu vou me completando com a tua imagem, sabendo que a luz que faltar pelos meus dias estará no seu sorriso, que a ternura que sangrar pela minha alma estará em seu olhar, que a alegria que largar a minha noite estará em sua voz, que o prazer que deixar o meu desejo estará em tuas mãos, que a vida que eu não tive estará em sua vida.
25º dia
Ana me deixou alegando que eu achamava de Lola sempre, enquanto transávamos.Eu apenas lhe disse que jamais seria Lola e ela se sentiu ofendida.Tanto faz, Ana não me significou nada.Não sonhei com Lola ontem e quase cortei acidentalmente minha garganta ao me barbear pela manhã.A verdade é que nem coragem eu tenho para me matar.Essa coisa dos suícidas irem para o inferno sempre me assustou, agora ainda mais sabendo que Lola, quando morresse, certamente iria para o céu.Talvez fosse esse o nosso destino então.Me resta apenas essa espera seca e fria sem nenhuma esperança de nos encontrarmos de novo, já tão outros.Ela não precisará dizer seu nome porque já é tão minha e pura Lola,e qualquer outro nome não faria diferença, a que volta pela simples palpitação do espírito de amor dentro de mim.
30º dia.
Estou enlouquecendo.
Pedi demissão e resolvi me trancar em casa.Meus amigos estão preocupados comigo, me ligam e alguns acabam vindo aqui em casa conversar comigo.Até Ana me liga querendo saber como estou.Acabei lhe falando a respeito de Lola e ela simplesmente riu.Riu como se fosse uma piada, algo tão irreal que chega a ser engraçado.É,eu sei.Eu mesmo rio amargamente disso entre doses e mais doses de vodka, enquanto ela me persegue nos meus sonhos.Não quero mais dormir,mas eu sou fraco, me rendo a louca vontade de encontrá-la e senti-la dentro de mim, como se ali fosse seu único lar, como se desde sempre ela existisse ali.
Meus olhos estão inchados e com olheiras enormes.Estou mais magro e mais pálido do que o costume.Não sinto fome ou sede, apenas sono.E quando não sonho com ela, mantenho-a em meus delírios como posso.
Decidi dar uma volta hoje.Não sei, tenho o pressentimento que algo muito bom vai acontecer se eu sair de casa.Fui até aquela rua, onde a vi pela primeira vez.
Estava caminhando desatento como sempre por aquela rua repleta de pessoas que se desdobravam e se esbarravam entre si no desespero e na ânsia de chegarem em seus destinos pontualmente, olhando apenas para o chão e para a dança frenética de todos aqueles pés sobre o preto e branco hipnótico daquela calçada na velha rotina diária que eu seguia a risca até o meu trabalho medíocre de atendente de uma renomada seguradora, quando num relance a reecontrei do outro lado da rua.Ela me sorria e estava com um vestido branco e seus cabelos soltos ao vento.Fui ao seu encontro, sem ao menos dar atenção aos carros que vinham fatalmente em minha direção.Era Lola,não me importava se meu corpo estava ali estirado e estraçalhado pelo asfalto.Eu já me sentia no paraíso.Era Lola.
Lola...
sexta-feira, 30 de maio de 2008
Dançando Descalço
Para João Ricardo
Estamos dançando descalços esta noite e você põe os seus pés sobre os meus talvez para não sentir frio ou apenas para ficar no meu tamanho, enquanto essa estranha música se desenha no ar.Eu te conduzo entre velas espalhadas pelo chão e taças com restos de vinho mesmo sem saber os passos, e você apenas confia em mim com este seu olhar fixo no além desta sala e esse seu sorriso tão espalhado por todos os cantos da minha vida.Eu tenho a leve e certa sensação de que estamos flutuando em nossa última canção, em nossa última dança, em nosso último contato corporal, nas minhas últimas lágrimas que tocarão a sua pele translúcida.E eu estou com medo desta música terminar, de você se despedir e nunca mais voltar.E eu te quero, meu deus, como eu te quero para sempre sobre os meus pés dançando entre essas taças e velas, flutuando.
Eu te abraço e te deito delicadamente no chão mas você não parece se importar.Ainda dança e flutua pelo ar em sua ilusão de felicidade, que afinal eu nunca lhe porpocionei.
Eu vejo morrer o outono em seus olhos da cor da minha morte e incertos como a minha vida, e uma rosa cárnea desabrochar em primavera entre suas pernas embebidas em fel e que eu não posso tocar ou colher.Tentativas inúteis entre seus movimentos delicados conforme a canção que ainda preenche o ar durante nossa última noite.
É fácil pensar em suícidio quando não estou com você e é melhor manter-se ébrio quando você está longe e eu sei que mesmo que volte, ainda estará longe dos meus braços e do meu amor.Minha benção e minha maldição e toda a desgraça da minha felicidade incompleta.
Entre cigarros e papéis nunca surgiram poesias à você por mais sujas e líricas que fossem minhas inspirações noturnas após o sexo, quando eu me sentia sozinho em seu corpo vagando pelo vazio do seu amor.
E você continua pura entre meus braços que se confundem entre os seus, nessa dança frenética sobre o carpete onde você não quer mais ser conduzida e quer que troque a canção, mas eu quero que seja esta e pego suas mãos que antes já foram minhas com tanta calma e as faço percorrer pelo meu corpo em febre.Seus gritos me soam como uma oração a algum Deus muito bom.Gozo sentindo suas lágrimas misturadas a todos os meus fluídos, enquanto você se afasta de mim procurando mudar a canção.
Agora ela é triste, assim como os seus olhos.
Agora ela é desesperadora, assim como o seu adeus entre gritos de ódio e taças quebradas de vinho e sangue pelo carpete.
Agora ela termina, como em breve farei com a minha vida.
Estou dançando descalço mas ainda sinto o peso dos seus pés sobre os meus.
Dancing Barefoot~Patti Smith
Estamos dançando descalços esta noite e você põe os seus pés sobre os meus talvez para não sentir frio ou apenas para ficar no meu tamanho, enquanto essa estranha música se desenha no ar.Eu te conduzo entre velas espalhadas pelo chão e taças com restos de vinho mesmo sem saber os passos, e você apenas confia em mim com este seu olhar fixo no além desta sala e esse seu sorriso tão espalhado por todos os cantos da minha vida.Eu tenho a leve e certa sensação de que estamos flutuando em nossa última canção, em nossa última dança, em nosso último contato corporal, nas minhas últimas lágrimas que tocarão a sua pele translúcida.E eu estou com medo desta música terminar, de você se despedir e nunca mais voltar.E eu te quero, meu deus, como eu te quero para sempre sobre os meus pés dançando entre essas taças e velas, flutuando.
Eu te abraço e te deito delicadamente no chão mas você não parece se importar.Ainda dança e flutua pelo ar em sua ilusão de felicidade, que afinal eu nunca lhe porpocionei.
Eu vejo morrer o outono em seus olhos da cor da minha morte e incertos como a minha vida, e uma rosa cárnea desabrochar em primavera entre suas pernas embebidas em fel e que eu não posso tocar ou colher.Tentativas inúteis entre seus movimentos delicados conforme a canção que ainda preenche o ar durante nossa última noite.
É fácil pensar em suícidio quando não estou com você e é melhor manter-se ébrio quando você está longe e eu sei que mesmo que volte, ainda estará longe dos meus braços e do meu amor.Minha benção e minha maldição e toda a desgraça da minha felicidade incompleta.
Entre cigarros e papéis nunca surgiram poesias à você por mais sujas e líricas que fossem minhas inspirações noturnas após o sexo, quando eu me sentia sozinho em seu corpo vagando pelo vazio do seu amor.
E você continua pura entre meus braços que se confundem entre os seus, nessa dança frenética sobre o carpete onde você não quer mais ser conduzida e quer que troque a canção, mas eu quero que seja esta e pego suas mãos que antes já foram minhas com tanta calma e as faço percorrer pelo meu corpo em febre.Seus gritos me soam como uma oração a algum Deus muito bom.Gozo sentindo suas lágrimas misturadas a todos os meus fluídos, enquanto você se afasta de mim procurando mudar a canção.
Agora ela é triste, assim como os seus olhos.
Agora ela é desesperadora, assim como o seu adeus entre gritos de ódio e taças quebradas de vinho e sangue pelo carpete.
Agora ela termina, como em breve farei com a minha vida.
Estou dançando descalço mas ainda sinto o peso dos seus pés sobre os meus.
Dancing Barefoot~Patti Smith
sábado, 24 de maio de 2008
Sob o céu de maio.
-Seus olhos no céu ácido.
-Sua pele no asfalto que arde
-Seus lábios naquela dose de alguma coisa qualquer
-Sua língua nesse cigarro qualquer que fumei
-Vou chamar o sol de você
-Vou chamar a lua de você
-Encontrei pureza em cada puta quando lembrei de você
-Encontrei amor em cada homem com quem me deitei quando lembrei de você
-Sua boceta em cada pau
-Seu pau em cada boceta
-Seu pulso em meu pulso
-Minhas lágrimas em suas lágrimas
-Bob Dylan ouvindo você
-Beatles ouvindo você
-Você nos meus comprimidos sorridentes
-Você na minha agulha mágica
-Em vida
-Na morte
Estendidos na calçada com o olhar fixo um no outro sob o céu macio de maio.A última palavra em seus lábios prevaleceu
-Sua pele no asfalto que arde
-Seus lábios naquela dose de alguma coisa qualquer
-Sua língua nesse cigarro qualquer que fumei
-Vou chamar o sol de você
-Vou chamar a lua de você
-Encontrei pureza em cada puta quando lembrei de você
-Encontrei amor em cada homem com quem me deitei quando lembrei de você
-Sua boceta em cada pau
-Seu pau em cada boceta
-Seu pulso em meu pulso
-Minhas lágrimas em suas lágrimas
-Bob Dylan ouvindo você
-Beatles ouvindo você
-Você nos meus comprimidos sorridentes
-Você na minha agulha mágica
-Em vida
-Na morte
Estendidos na calçada com o olhar fixo um no outro sob o céu macio de maio.A última palavra em seus lábios prevaleceu
domingo, 11 de maio de 2008
Aquele ontem
Para Rennan.A quem nunca dedico nada,a não ser a minha vida.
Consigo claramente lhe imaginar em frente a este mar que ondeia nossa música com a mesma brisa a lhe desmanchar o cabelo tão loiro,olhando sem entender o motivo pelo qual meu carro está aqui aberto e com uma pequena caixa azul da cor do céu que são seus olhos quase verdes,e com curiosidade você abre e sem surpresa alguma encontra esta carta.E lê e relê e desespera-se em prantos de risos e gritos.Espero que entenda e me perdoe.Doí-me ter que lhe escreve-la.Debaixo da minha escrita há sangue no lugar de tinta.
Por quê?Porque tudo é inexato e confuso.Crescemos juntos e dividimos nossos medos, amores, rancores, dores, dúvidas, feridas, cigarros e bebidas e drogas e a nostalgia de quando éramos puros,de quando chorávamos apenas por motivos fúteis e não por coisas confusas e inexatas.Me é difícil continuar com qualquer certeza depois de ontem,difícil continuar com o que morreu naquela noite,difícil continuar como se nada houvesse acontecido, como se estivéssemos intactos.Porque era puro aquele amor que sentíamos até ontem, porque eu sei que você me ama tanto quanto eu te amo mas talvez não sofra com isso tanto quanto eu sofro.Amor esse que nos levou a essa decandência.Amor não carnal prazer sexual e orgasmos.Amor beijos e abraços e cumplicidade que não se mede em palavras.E mesmo depois de ontem eu só te quero nos meus lábios e nos meus abraços porque o meu corpo palpita pelo teu porque o teu corpo acalma o meu.
Eu tentei de encontrar em outras mulheres, nos beijos e nos abraços delas mas só encontrei transas e orgasmos que eu gosto com o meu sexo de homem em perfeito estado de funcionamento.Eu tentei de encontrar em outros homens mas encontrei apenas nojo e ânsia de vômito e o meu pênis que não endurecia.E o que me restou foram apenas cinzas e faíscas das minhas certezas e mais e mais dúvidas.Dúvidas sobre o que realmente eu sentia por você.Você que era casado e estava com tantas outras mulheres e na minha imaginação paranóica flertava com outros homens enquanto dizia que me amava, e isso me fazia mal e eu sentia ciúmes ou algo como querer você só para mim.Seria você o errado nisso tudo?Não.
Você é o esplendor de eu haver encontrado algo quando desesperava encontrar algo.O meu estar feliz alcançando o infinito para trazê-lo à terra e fundir os dois numa única visão.O que me faz reecontrar comigo a cada vez que a tua imagem suspende o meu caminho porque a cada exata aparição tua me devolve meu próprio eu.Você que está em cada sorriso e que eu respiro.
Ontem.
Ontem.
Como não foi possível reter aquele momento que me separa hoje de você?
Nossos olhos se buscavam como a encontrar-se um no outro como a morrer um no outro.Nossos lábios se cruzavam como a penetrar-se um no outro como a morrer um no outro.Era todo o nosso ser que se entregava como a viver-se um no outro.O teu corpo no meu corpo tão em mim e tão no além.Nosso desejo.O meu delírio.O teu delírio.E no universo havia apenas o espaço e o tempo que ocupávamos nós dois, libertos de tudo sem mágoa e sem medo e livres e serenos e puros.Vibrando todas as fibras dos meus nervos.Vibrando todas as fibras dos teus nervos.Era um desses instantes em que o infinito se concentra num segundo.Era um instante infinito e passou.Passou apesar do absoluto em que vagávamos.Ficou somente a tua imagem que ora se vai ora se vem dançando nua.Nem sequer ficou a estrela que isolava aquela noite mas apenas o apelo do teu olhar sumindo no silêncio, apenas a delícia dos teus carinhos se esvaindo na distância, apenas a magia dos teus gestos desfazendo-se em ausência.E a espera seca e fria sem nenhuma esperança.Porque entre suor e sêmen era em sua esposa e em suas inúmeras amantes que você pensava.Porque entre suor e sêmen era esse meu amor que se afundava e se afogava nessa imundice de sêmen e suor.E você chorava depois.Chorando desesperado me perguntando se aquilo tudo foi real e eu inerte e enojado tentando balbuciar qualquer coisa como foi por culpa do álcool e do extâse que ingerimos.E você me olhando com esses seus olhos tão petrificantes e confusos gritando alguma coisa assim que não deveria ter feito isso com sua esposa e comigo e eu tentando te acalmar dizendo que nada daquilo aconteceu que essa noite logo seria esquecida porque não nos significou nada apesar de me sentir sujo com o seu gozo misturado ao meu por todo o meu corpo.Somos caras normais não somos, você me disse.E eu lhe disse que nada daquilo aconteceu.
Não amigo,ela aconteceu.É desesperador e dilascerante descobrir assim que eu te amava da maneira mais singela que existe e não da maneira mais atrativa,se é que posso me referir a isso dessa maneira.Tudo isso se reduziu a nada e eu me sinto mal e eu ainda sinto você em casa parte do meu corpo e na minha alma como se até nela você houvesse penetrado naquela noite de ontem.Não sei o que fazer, estou perdido e terrívelmente confuso.Não foi nossa culpa, eu poderia dizer.Mas foi mais minha do que sua,mas temos nossa parcela de culpa.Mesmo que não houvesse a porra do álcool e da droga,ela aconteceria a qualquer momento.A saída que encontrei para estar em paz foi esta.Dirigir até esta praia,escrever-lhe estar carta enquanto fumo e observo o mar.O mar que irei lançar esse nosso segredo.O mar que fará afundar comigo todos os vestígios de ontem.Que Deus faça ser doce morrer no mar nas ondas verdes do mar que é a quase cor dos seus olhos azuis da cor do céu.
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sábado, 3 de maio de 2008
Peço que fique&que me ame.
Agora que esta sensação de amargura e de fracasso me dominam,sinto-me despida de qualquer orgulho fútil para lhe dizer com angustia que afoga minha garganta num doloroso e humilhante grito interior,um velho peso despótico em minha alma:Peço que fique e que me ame.
Ame esta mulher de grandes e profundas olheiras provocadas pela insônia,de tez pálida e seca pela má alimentação,de dentes amarelados e podres pelos cigarros,estes,que lhe deram um cheiro forte característico desde as pontas dos dedos até os fios de seu cabelo oleoso com caspa bagunçado e embaraçado.De nariz sempre vermelho de tanto coçar e de interior em carne viva,de olhos também sempre muito vermelhos com pupilas dilatadas e baços.Lábios secos descascados e em sangue.De roupas,as mesmas de sempre,velhas rasgadas e fétidas.De dores estomacais crônicas e prestes a ouvir a qualquer hora de qualquer médico que já possui cirrose.Ame-a desesperadamente.Peço que fique e que me ame.
Ame esta mulher que chama de lar as ruas,que se mistura aos mendigos e se sente como tal.A viciada errante desesperada de cocaína,que vendeu tudo que tinha de valor e se vendeu a tantos homens e que roubou para se manter no controle do seu mundo para se sentir.Sentir a si mesma sem nojo e sem desprezo e sem horror.E no final,quando a chave branca de mármore desfarelada que abre a porta que lhe dá acesso a esse mundo se perde no vento ou se diluí até desvanecer em seu organismo,retorna a fracassada mulher violentada imunda vomitada debilitada ao seu ciclo.Ame-a delicadamente em cada vão detalhe.Peço que fique e que me ame.
Ame essa mulher de tantas tentativas de suícidio sem sucesso obtido.Algumas marcas pelo seu corpo denunciam isso.De tantas lágrimas ácidas que lhe corroíam a face dando lhe como cicatrizes algumas rugas.De ar cansado e infindável tristeza ao se olhar no espelho e ver a imagem do que se tornou e ter plena consciência e certeza disso de ser aquilo e chorar e tentar se matar e ao não conseguir recorrer ao consolo do álcool sempre tão barato e vagabundo ou da cocaína quando por sorte há algum dinheiro ou alguém com piedade.Ame-a por pena.Peço que fique e que me ame.
Ame essa mulher que foi feliz um dia ao lhe ter.A que lhe fazia sorrir com simplicidade e espontâneidade e se sentia quase que honrada por isso.A que contornava seu rosto no escuro silêncio da noite sem errar nenhum traço.A que lhe dedicou único amor intenso puro sincero e eterno.A que se entregou violentamente por isso.A que lhe ofereceu o hímen e sua alma.A que você rompeu com tamanha violência e brutalidade a alma e o hímen.A que você mostrou nos mínimos detalhes todas as dores que uma mulher poderia sentir,várias vezes para que aprendesse.A que você jogou contra um abismo de sombria e impotente resignação,fazendo-a se refugiar em sua solidão.Ame-a por culpa,por regeneração própria.Ame-a sincera e profundamente como nunca amou.Ame-a por tê-la transformado em algo que você é e nega e tenta fugir por medo,medo das pessoas por elas não te aceitarem:Um cadáver em decomposição.Ame-a porque você sabe,sabe que somente ela te amaria e te aceitaria tal como você é.Todos querem amar e serem amados.Peço que fique,fique aqui.E que me ame.Ame
Obs: A partir de hoje comentários abertos
Ame esta mulher de grandes e profundas olheiras provocadas pela insônia,de tez pálida e seca pela má alimentação,de dentes amarelados e podres pelos cigarros,estes,que lhe deram um cheiro forte característico desde as pontas dos dedos até os fios de seu cabelo oleoso com caspa bagunçado e embaraçado.De nariz sempre vermelho de tanto coçar e de interior em carne viva,de olhos também sempre muito vermelhos com pupilas dilatadas e baços.Lábios secos descascados e em sangue.De roupas,as mesmas de sempre,velhas rasgadas e fétidas.De dores estomacais crônicas e prestes a ouvir a qualquer hora de qualquer médico que já possui cirrose.Ame-a desesperadamente.Peço que fique e que me ame.
Ame esta mulher que chama de lar as ruas,que se mistura aos mendigos e se sente como tal.A viciada errante desesperada de cocaína,que vendeu tudo que tinha de valor e se vendeu a tantos homens e que roubou para se manter no controle do seu mundo para se sentir.Sentir a si mesma sem nojo e sem desprezo e sem horror.E no final,quando a chave branca de mármore desfarelada que abre a porta que lhe dá acesso a esse mundo se perde no vento ou se diluí até desvanecer em seu organismo,retorna a fracassada mulher violentada imunda vomitada debilitada ao seu ciclo.Ame-a delicadamente em cada vão detalhe.Peço que fique e que me ame.
Ame essa mulher de tantas tentativas de suícidio sem sucesso obtido.Algumas marcas pelo seu corpo denunciam isso.De tantas lágrimas ácidas que lhe corroíam a face dando lhe como cicatrizes algumas rugas.De ar cansado e infindável tristeza ao se olhar no espelho e ver a imagem do que se tornou e ter plena consciência e certeza disso de ser aquilo e chorar e tentar se matar e ao não conseguir recorrer ao consolo do álcool sempre tão barato e vagabundo ou da cocaína quando por sorte há algum dinheiro ou alguém com piedade.Ame-a por pena.Peço que fique e que me ame.
Ame essa mulher que foi feliz um dia ao lhe ter.A que lhe fazia sorrir com simplicidade e espontâneidade e se sentia quase que honrada por isso.A que contornava seu rosto no escuro silêncio da noite sem errar nenhum traço.A que lhe dedicou único amor intenso puro sincero e eterno.A que se entregou violentamente por isso.A que lhe ofereceu o hímen e sua alma.A que você rompeu com tamanha violência e brutalidade a alma e o hímen.A que você mostrou nos mínimos detalhes todas as dores que uma mulher poderia sentir,várias vezes para que aprendesse.A que você jogou contra um abismo de sombria e impotente resignação,fazendo-a se refugiar em sua solidão.Ame-a por culpa,por regeneração própria.Ame-a sincera e profundamente como nunca amou.Ame-a por tê-la transformado em algo que você é e nega e tenta fugir por medo,medo das pessoas por elas não te aceitarem:Um cadáver em decomposição.Ame-a porque você sabe,sabe que somente ela te amaria e te aceitaria tal como você é.Todos querem amar e serem amados.Peço que fique,fique aqui.E que me ame.Ame
Obs: A partir de hoje comentários abertos
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