Pense nas criancinhas
A frase "Pense nas criancinhas" (ou "Pense nas crianças") é um clichê que evoluiu para uma tática retórica.[1][2][3] Literalmente, refere-se aos direitos da criança (como nas discussões sobre trabalho infantil).[4][5][6] Porém, ao entrar em qualquer outro debate, visa aprofundar a sensibilidade das pessoas em relação a estes e, assim, tentar convencer o contrário, por meio de argumentos enganosos, a fazer o que o emissor ou o grupo da frase realmente pretende, sempre com a intenção de "não prejudicar as crianças."[1][2][3]
De acordo com o livro Art, Argument, and Advocacy (2002) argumentou que o apelo substitui a razão pela emoção no debate.[1] O eticista Jack Marshall escreveu em 2005 que a popularidade da frase deriva de sua capacidade de prejudicar a racionalidade, particularmente o discurso sobre a moralidade.[2] A frase também é usada por defensores da censura com o pretexto de defender as crianças de certas coisas, consideradas "perigosas".[7][8] Em Community, Space and Online Censorship (2009) é argumentado que classificar as crianças como bebês inocentes que precisam de proteção, é uma forma de obsessão sobre o conceito de pureza.[7] Um artigo de 2011 no Journal for Cultural Research observou que a frase surgiu de um pânico moral.[9] Segundo o jornalista Jerônimo Teixeira, em artigo para a revista Veja, "a frase soa como um ramerrão demagógico, com notas de sentimentalismo hipócrita."[10]
A frase foi dita por David Tomlinson interpretando Sr. Banks no filme Mary Poppins de 1964, onde ele pediu à personagem homônima interpretada por Julie Andrews para não desistir e "pensar nas crianças".[11] No entanto, não foi até o início de 1996 na série Os Simpsons, quando a personagem Helen Lovejoy popularizou a frase.[12][13][14] De acordo com o professor de direito Charles J. Ten Brink, da Universidade do Estado da Geórgia, o uso de Lovejoy de "pense nas crianças" é um bom exemplo de paródia. De fato, essa retórica foi chamada de "lei de Lovejoy",[14] "argumento de Lovejoy" ou "síndrome de Helen Lovejoy".[15]
Referências
- ↑ a b c Meany 2002, p. 65.
- ↑ a b c Marshall 2005
- ↑ a b Borschke 2011, p. 17
- ↑ National Child Labor Committee 1914, pp. 39, 73.
- ↑ Boyce 2003
- ↑ Perry 2010, p. 498.
- ↑ a b Beattie 2009, pp. 165–167.
- ↑ Keenan (October 1, 2014), p. GT4.
- ↑ Coleman 2011, p. 99.
- ↑ Teixeira, Jerônimo (24 de outubro de 2017). «Ninguém pensa nas criancinhas?». Veja. Consultado em 30 de setembro de 2021
- ↑ Laity 2013, pp. 118–119, 128.
- ↑ Ten Brink 2012, p. 789.
- ↑ Shotwell 2012, p. 141.
- ↑ a b Keenan (April 26, 2014), p. IN2.
- ↑ Hunt 2014, p. 27.
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- MEANY, John (2002). Art, argument, and advocacy: mastering parliamentary debate. New York: International Debate Education Association. ISBN 978-0-9702130-7-5. OCLC 438996525
- Marshall, Jack (16 de fevereiro de 2005). «'Think of the Children!': An Ethics Fallacy». Ethics Scoreboard (em inglês). Proethics, Ltd. Consultado em 30 de setembro de 2021. Cópia arquivada em 22 de fevereiro de 2014
- Borschke, Margie. «Rethinking the Rhetoric of Remix». Escola de Jornalismo e Comunicação da Universidade de Queensland. Media International Australia Incorporating Culture and Policy. 141: 17. doi:10.1177/1329878X1114100104
- COLEMAN, Rebecca; FERREDAY, Debra (2011). Hope and Feminist Theory. [S.l.]: Routledge. ISBN 978-0-415-61852-6
- BEATTIE, Scott (2009). Community, Space and Online Censorship. [S.l.]: Ashgate. pp. 165–167. ISBN 978-0-7546-7308-8
- Keenan, Edward (26 de abril de 2014). «Won't somebody please think of the children!». Toronto Star: IN2 – via LexisNexis
- Keenan, Edward (1 de outubro de 2014). «Thinking of the children is no laughing matter». Toronto Star: GT4 – via LexisNexis
- Penny, Laurie. «This divorce tax is emotional terrorism». New Statesman (em inglês). Consultado em 30 de setembro de 2021
- Hunt, Carol. «Don't use our children as shields to protect status quo; The Helen Lovejoy argument against gay adoption is simply discrimination in a 'caring' guise, writes Carol Hunt». Independent Newspapers Ireland Limited. Sunday Independent: 27 – via LexisNexis
- Laity, Kathryn A. (2013). «Chapter Nine: 'Won't somebody please think of the children?' The case for Terry Gilliam's Tideland». In: Birkenstein, Jeff; Froula, Anna; Randell, Karen. The Cinema of Terry Gilliam: It's a Mad World. Col: Directors' Cuts. [S.l.]: Wallflower Press. pp. 118–119, 128. ISBN 978-0-231-16534-1
- Shotwell, Mikaela (2012). «Won't Somebody Please Think of the Children?!». Cidade de Iowa: Universidade de Iowa. The Journal of Gender, Race & Justice. 15: 141 – via LexisNexis
- Ten Brink, Charles J. (2012). «Gayborhoods: Intersections of Land Use Regulation, Sexual Minorities, and the Creative Class». Universidade do Estado da Geórgia. Georgia State University Law Review. 28: 789 – via LexisNexis
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Teixeira, Jerônimo (24 de outubro de 2017). «Ninguém pensa nas criancinhas?». Veja. Consultado em 30 de setembro de 2021