Este blogue é o local onde guardo os meus poemas para serem cantados e também uma homenagem a todos os que amam o FADO.
quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
Lembro-me de ti
Eu lembro-me de ti, chamavas-te saudade
Vivias num moinho, ao cimo dum outeiro
Tamanquinha no pé, lenço posto à vontade
Nesse tempo eras tu, a filha dum moleiro
Eu lembro-me de ti, passavas para a fonte
Pousando num quadril, o cantaro de barro
Imitavas em graça, a cotovia insonte
E mugias o gado, até encheres o tarro
Eu lembro-me de ti, que às vezes a farinha
Vestia-te de branco, e parecias então
Uma virgem gentil, que fosse à capelinha
Num dia de manhã, fazer a comunhão
Eu lembro-me de ti, e fico-me aturdido
Ao ver-te pela rua, em gargalhadas francas
Pretendo confundir, a pele do teu vestido
Com a sedosa lã, das ovelhinhas brancas
Eu lembro-me de ti, ao ver-te num casino
Descarada a fumar, luxuoso cigarro
Fecho os olhos e vejo, o teu busto franzino
Com o avental da cor, e o cantaro de barro
Eu lembro-me de ti, quando no torvelinho
Da dança sensual, passas louca rolando
Eu sonho eu fantasio, e vejo o teu moínho
Que bailava também, ao vento, assobiando
Eu lembro-me de ti, e fico-me a cismar
Que o nome de Lucy, que tens, não é verdade
Que saudades eu tenho, e leio no teu olhar
A saudade que tens, de quando eras saudade
Agradeço a Teorispa a publicação deste clip
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Bêbado pintor
A voz e o estilo inconfundível de Alfredo Marceneiro
Letra de Henrique Rego e música de Alfredo Marceneiro-Alexandrino da Laranjeira
Encostado sem brio ao balcão da taberna
De nauseabunda cor e tábua carcomida
O bêbado pintor a lápis desenhou
O retrato fiel duma mulher perdida
Impudica mulher, perante o vil bulício
De copos tilintando e de boçais gracejos,
Agarrou-se ao rapaz, cobrindo-o de beijos,
Perguntou-lhe a sorrir, qual era o seu oficio,
Ele a cambalear, fazendo um sacrifício,
Lhe diz a profissão em que se iniciou,
Ela escutando tal, pedindo alcançou
Que então lhe desenhasse o rosto provocante,
E num sujo papel, o rosto da bacante
O bêbado pintor com um lápis desenhou.
Retocou o perfil e por baixo escreveu,
Numa legível letra o seu modesto nome,
Que um ébrio esfarrapado, com o rosto cheio de fome,
Com voz rascante e rouca à desgraçada leu,
Esta, louca de dor, para o jovem correu,
Beijando-lhe o rosto, abraça-o de seguida...
Era a mãe do pintor, e a turba comovida,
Pasma ante aquele quadro, original e estranho,
Enquanto o pobre artista amarfanha o desenho:
O retrato fiel duma mulher perdida.
domingo, 1 de fevereiro de 2009
Moinho desmantelado
A letra deste fado é do seu letrista predilecto Henrique Rego e a música do próprio Marceneiro.
Moinho desmantelado
Pelo tempo derruído
Tu representas a dor
Deste meu peito dorido
É grande a tua desgraça
Ao dizê-lo sinto pejo
Porque em ti apenas vejo
A miseranda carcaça
Perdeste de todo a graça
Heróica do teu passado
Hoje ao ver-te assim mudado
Minha alma cora e descrê
E quem te viu, e quem te vê
Moinho desmantelado
Moinho pombo da serra
Que triste fim tu tiveste
Alvas farinhas moeste
Para o povo da tua terra
Hoje a dor em ti se encerra
Foste votado ao olvido
Foi-se o constante gemido
Dessas mãos trabalhadoras
Doce amante das lavouras
Pelo tempo derruído
Finalizas tua vida
Ás tristes aves sombrias
Hoje serves de dormida
No teu seio dás guarida
Ao horrendo malfeitor
Tudo em ti causa pavor
É bem triste a tua sorte
Sombria estátua da morte
Tu representas a dor
Junto de ti eu nasci
E do meu terno avozinho
Quantas histórias ouvi
Agora tudo perdi
Sou pela dor evadido
Vivo no mundo esquecido
Moinho que crueldade
És o espelho da saudade