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domingo, 23 de outubro de 2011

Aimee Mann

"Aimee Mann has always been known for her clever, literate, and dryly witty takes on emotional sabotage and self-destruction. Though happily married to Michael Penn, her fascination continues with 'the freaks who could never love anyone.' With a songcraft often compared with the Beatles and Badfinger, Mann frequently pairs the bleakest of poetry with soaring, infectious melodies." - http://www.aimeemann.com

Bachelor Nº 2 (2000)
http://www.mediafire.com/?ho77ppqdljyf9yq

Magnolia Original Soundtrack (1999)
http://www.mediafire.com/?c2mizxwd03jva2v

I'm With Stupid (1995)
http://www.mediafire.com/?icg6xdzewz3e7od

Whatever (1993)
http://www.mediafire.com/?jfti28jftktqrrp

quinta-feira, 8 de abril de 2010

:: Karina Buhr ::


:: DECOLANDO CONTRA A VONTADE DO CHÃO ::
- Por Eduarco Carli de Moraes -

Karina Buhr está bombando. Apesar de estar longe de ter se alçado de súbito a ao céu duvidoso das estrelas do "Mundo Pop", com estouros cintilantes mas efêmeros no Disk MTV e hit nas grandes FMS, no Universo Paralelo que é o Cenário Independente a moça desponta como uma das figuras nacionais que promete marcar este 2010. Com o lançamento de seu álbum-solo de estréia, "Eu Menti Pra Você", Karina têm recebido muitas loas da imprensa escrita em matérias notáveis na Ilustrada e no Estadão, sem falar de destaque na blogosfera em frequentadíssimos points digitais como o Eu Ovo.

Comadre Fulozinha, Karina ao centro.

A carreira pregressa da baiana Karina, que migrou ainda criança para Pernambuco mas mora há cinco anos em São Paulo, possui duas vivências essenciais. A primeira é sua presença na banda de Recife Comadre Fulozinha, dedicada a manter viva a tradição folclórica e musical local numa mistureba de maracatu, baião, ciranda, cantigas-de-roda e outros ritmos regionais --- coletivo no qual Karina canta, "bate um tamborzinho" e toca rabeca. Apesar de desconhecido nos grandes centros do Sudeste, o Comadre é uma força notável no Nordeste, tendo participado de gravações junto com o Mundo Livre S/A e o Eddie, além de ter gozado da "trutagem" de Chico Science.

A segunda das vivências cruciais da jornada de Karina foi sua vinculação ao Teatro Oficina, revolucionário grupo teatral paulista, idealizado por Zé Celso Martinez Côrrea, que provoca e subverte desde 1958. Karina integrou como atriz-cantante a trupe de Zé Celso em um dos momentos mais gloriosos de sua história: a encenação dionisíaca-tempestuosa de "Os Sertões", de Euclides da Cunha.

Depredando o Orelhão esteve no SESC Pompéia para presenciar e registrar em vídeos exclusivos o show de lançamento do álbum de Karina Buhr --- este "pão quentinho" brazuca que promete vir para integrar o panteão dos Novos Talentos da "MPB" (se usarmos a sigla num sentido bem amplo) que já inclui a Céu, a Mariana Aydar, a Bel "Bluebell" Garcia e a Tiê. O show foi um verdadeiro "acontecimento" que "atraiu legião espantosa da cena musical contemporânea", inclusive Céu e Curumin, como conta a matéria de Lauro Lisboa Garcia pro Caderno 2.

Karina, esbanjando a presença de palco que só mesmo uma atriz do Oficina seria capaz de prodigalizar, está longe de ser uma "show-woman" como estamos acostumados no famigerado "show-business" --- veja abaixo, por exemplo, um trechinho de "Avião Aeroporto" em que a cantora pira e entra num "transe" enquanto canta o mantra sado-masô "se bate de leve dói bate que com força mata":



Ter experenciado sua performance pra lá de idiossincrática me deixou uma persistente sensação de que "algo novo", ainda um tanto inefável e vago, difícil de descrever, aconteceu na música brasileira com seu surgimento. Karina Buhr, com todo seu bicho-grilismo e teatralidade genuína, com seu soteque nordestino charmoso e suas letras bizarras, sua simplicidade alegre e simpatia sem esforço, parece vir a somar algo de precioso a uma cena que, felizmente, tem nos dado cada vez mais "mulheres de personalidade". A banda que a acompanhava foi um show à parte: Edgard Scandurra (Ira!) e Fernando Catatau (Cidadão Instigado) nas guitarras, o sensacional "Miles Davis brazuca" Guizado (no trompete), Mau (no baixo) e Bruno Buarque (na batera).

Abaixo compartilhamos mais dois vídeos exclusivos do showzaço: o já hit "Ciranda do Incentivo", talvez a mais cáustica das composições de Karina, em que ela usa de ironia pesada com aqueles que querem "fazer uma ciranda pra colocar no disco / na lei de incentivo à cultura", tudo sob uma base de pancadão-funk/carioca; e a bela "Esperança Cansa", que conta com fodásticos solos de trompete de Guizado. Voilà:





KARINA BUHR - Eu Menti Pra Você

COMADRE FULOZINHA - 1999

segunda-feira, 5 de abril de 2010

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

:: Janis Joplin ::

O Hippie ruleia!
- Bernardo Santana -

Todo mundo conhece a historinha do "achei um disco na pilha do meus pais quando era criança...", né? Pois é, lá nas priscas eras, entre uns Moraes Moreiras e Cartolas (Valeu, pai!) eu achei o dessa tiazinha bagunçada. Nem rádio eu ouvia ainda e o grunge era só um gametinha quase lá, então dá pra dizer hoje que foi a primeira vez que eu gostei de verdade de um disco de música roque. Eu não sabia que a moça já tinha morrido, nem que Pearl era um disco póstumo... Não sabia que Janis Joplin era o espírito hippie encarnado, nem que suas bolachas anteriores prometiam mais que entregavam... e mesmo assim...

Hoje, ouvindo o disco uns quase vinte anos depois, o bichinho só cresceu. Continua lá com seus clássicões, que dispensam pagação: Move Over, Cry Baby, A Woman Left Lonely, Mercedes Benz, Me And Bobby McGee, My Baby... Seis sons sensacionais em dez. E o melhor é que o que não é perfeito ainda é de alta qualidade. Liberada de suas duas bandas anteriores — meio mambembes —, Janis Joplin se espreguiça na cama cheia de blues/R&B criativo que a Full Tilt Boogie Band arma e ensina pras jovenzinhas criadas com leitinho com pêra da música atual como se engasgar com o próprio coração.

Como pode-se adivinhar, as letras passeiam entre a temática tradicional da música negra americana do século passado e o protesto social antimaterialista do final da década de 1960. Na época, nada fora de contexto, mas ainda assim marginal e contracultural até a medula. E parece que tinha bastante gente disposta a escutar na época: Pearl foi o maior sucesso comercial/de crítica de Janis Joplin e até hoje aparece por aí em listas de "200 melhores qualquer-coisa". Uma pena que antes mesmo do disco ver a luz do dia, a cantora texana tenha finalmente sido derrubada pela heroína.

Vão-se os mitos, ficam os posts.

DOWNLOAD: 58 Mb - 10 faixas

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

:: Casey Dienel ::


CASEY DIENEL
[ ENTREVISTA EXCLUSIVA ]

por Eduardo Carli

Começou como tietagem, e só depois virou jornalismo. Não é que o fanatismo, neste caso, trouxe seus bons frutos? Pois uma das benesses que trouxe a net foi ter facilitado tanto o fluxo de dados e a comunicação global que possibilitou algo inimaginável décadas atrás: que um latino-americano possa tietar, contactar e cortejar seu ídolo gringo, ainda que este esteja a milhares de quilômetros de distância - o equivalente hi-tech do "tirar uma casquinha"...

Casey Dienel foi a primeira artista por quem senti uma admiração e identificação suficientes para vencer minha timidez e desejar entrar em contato, conhecê-la melhor, trocar idéias e impressões, dar um feedback repleto de gratidão... Depois de vários e-mails trocados, em que meus mimos e elogios foram recebidos com muita alegria e cortesia pela pequena, Casey topou me dar uma entrevista mais minuciosa - publicada, anos atrás, na capa da Revista Rabisco. Isso se deu um par de anos atrás, antes dela mudar seu nome para White Hinterland e lançar o segundo álbum; mas nada nas declarações dela soa datado. Pelo contrário: eis aí uma excelente key-hole por onde espiar um pouco da instigante e talentosa mente que criou dois álbuns tão lindos.

Poucos sabem disso, mas Casey Dienel, um dos segredos mais bem guardados da música americana, é uma das mais brilhantes e talentosas das cantoras/compositoras que surgiram nos últimos anos. A moça, que cresceu numa cidadezinha do Massachussets e depois se mudou para Boston para estudar música, foi uma criança de talentos precoces: tocava piano aos 4 anos de idade e beirando os já 10 compunha suas primeiras canções, trancada a sete chaves dentro do quarto, onde também se deleitava afundando o nariz nos livros. Não surpreende que uma garota que cresceu nutrindo um amor simultâneo pela poesia, pela literatura e pela música tenha se transformado numa artista de talento que transborda por todos os poros.

Wind-Up Canary (2006), seu álbum de estréia, lançado pela pequena HUSH Records, teve repercussão mínima dentro do circuito indie – o que é uma pena, já que o disco, absolutamente sublime e encantador, merecia ser recebido com uma salva de palmas mais intensa de público e crítica. Na linha de Regina Spektor, Aimee Mann, Fiona Apple e Nellie McKay, mas incluindo também influências mais ancestrais de Joni Mitchell e Chet Baker, a mocinha cometeu um álbum de doçura e poesia capazes de comover até os corações mais empedernidos. 
 

Ainda com 20 e poucos anos de idade (ela é de 1985), Casey permanece ainda bastante obscura fora do circuito independente e vai lentamente galgando degraus rumo ao devido reconhecimento. Nesta entrevista exclusiva concedida por e-mail, a cantora narra um pouco seu passado como "criança prodígio", destaca sua paixão pela literatura e pela poesia, comenta a respeito do processo de composição das letras, pondera a respeito de seus planos para o futuro e sua relação com o sucesso comercial e a indústria da música, entre outras coisas. Voilá:



Eu: Conta-se que você começou a tocar o piano com 4 anos de idade e já estava compondo canções e escrevendo letras quando tinha 10 aninhos – e é impressionante que você tenha lançado um álbum como “Wind-Up Canary” com vinte e poucos anos! Você foi considerada uma “criança especial” que desenvolveu incríveis talentos bem cedo na vida? E seus pais desempenharam um papel grande no sentido de te direcionar a aulas de música e coisas do tipo, ou foi seu próprio amor precoce pela música que te levou a começar a tocar tão jovem?

CASEY: Se eu fui uma “criança” especial, eu nunca fiquei sabendo! Mas eu de fato penso que eu fui uma espécie de “sabe-tudo”, apesar de meus pais terem criado a mim e à minha irmã para sermos bastante auto-depreciativas e h
umildes em relação a assuntos como arte. Mas eu definitivamente não era uma criança-prodígio, e, pior, sempre fui bastante tímida... Então eu não costumava falar muito sobre os meus interesses – eu achava que escrever canções era como qualquer outro tipo de ofício que a pessoa cultiva privativamente... Eu sempre fui um tanto reservada, misteriosa. Fui às aulas por minha própria vontade quando eu tinha 4 anos – e eu me sentia realmente atraída pelo piano e pelo violão, mas o violão era grande demais para uma menina de 4 anos! E desde então eu acho que eu sempre fui bastante auto-motivada sobre música, em parte porque eu estou fazendo música para mim mesma, e não tanto para o público... A parte do público é uma das últimas coisas que eu penso quando me ponho a fazer música.


E: Li sua confissão de que você cresceu com “o nariz enterrado nos livros” – e adivinho que foi daí que você retirou seu grande talento com as palavras... Acho que uma das grandes qualidades da sua música é o fato de ela possuir um “sabor literário” - eu posso considerá-la quase como “declamação de poesia”... Você diria que sente mais carinho pela literatura do que pela música? E quais dos grandes letristas você diria que admira mais? Você lê bastante poesia e tem alguns poetas favoritos que descreveria como inspiradores?

CASEY: Estas são questões bastante extensas! Eu acho que a literatura é a mais elevada das formas das belas artes, e, na minha opinião, a mais desafiadora de ganhar domínio sobre. Eu desde muito nutro uma profunda admiração pelo modo como as palavras são encadeadas. Na escrita, você não pode apelar para os sentidos para criar imagens ou personagens ou histórias - você tem apenas a sua esperteza para evocar emoções e visuais. É como alquimia, o verdadeiro sentido de "criar alguma coisa do nada". Eu não diria que minhas canções são particularmente "literárias", mas eu realmente dedico um bom bocado do meu tempo para as letras, tentando criar imagens que são imediatamente visuais para o ouvinte, ainda que seja algo ou alguém que eles não estejam familiarizados com. Outros letristas que conseguem me transportar para outro tempo e espaço são provavelmente Leonard Cohen e Bob Dylan, mas eu também penso, em termos mais simples, nos Beatles.

Cohen e Dylan usam detalhes sem serem arbitrários, para aprofundar a pintura do retrato - ao mesmo tempo que criam incríveis melodias e estruturas de canção. Lennon & McCartney podiam pegar linguagem simples e revivê-la com uma idéia de sentido completamente nova. Eu acho que as canções dos Beatles são tão clássicas porque as letras são tão honestas e permitem que as melodias carreguem as músicas. Algumas vezes músicas só precisam ser músicas! E é importante ser cauteloso quanto ao que a música significa pra você, ao invés de tentar empanturrá-la com frases ou versos exóticos.


Quanto aos poetas, eu tenho um pouco de vício em relação a livrinhos e panfletos de poesia! Gosh! eu acho que meu favorito é o Frank O'Hara, apesar de eu estar passando por uma coisa grande com a Gertrude Stein... sem falar que um amigo meu acabou de me passar coisas do James Tate para folhear. Eu acho que o que me interessa atualmente são os ritmos sintáticos criados pela colocação de certas vogais/consoantes/sílabas lado a lado.


E: É fácil de notar, ao ouvir as suas letras, que você freqüentemente utiliza um monte de personagens fictícios, de um modo que me lembra um pouco o método de composição do Bob Dylan ou do Bruce Springsteen, diferenças postas de lado... Frankie e Anette, o Doutor Monroe, Baby James: de onde saíram todos esses personagens? Eles são puros produtos da sua imaginação ou são construídos com partes de pessoas que você conhece? Talvez alguns deles sejam pessoas de verdade? O que eles são: alter-egos, amigos imaginários, talvez fantasmas...? Fale um pouquinho dessas tuas “crianças”! :)

Casey: Eu aho que os personagens se originam de uma base de dados de observações pessoais cotidianas - coisas que eu noto em pessoas que amo ou pessoas que não conheço. Eles também têm a tendência de derivar de eventos ou lugares - acho que muitas vezes quando estou escrevendo sobre uma pessoa estou na realidade escrevendo sobre muitas pessoas ao mesmo tempo. Mas eu não tenho muita certeza sobre de onde eles vêm - algumas vezes certos personagens são imediatamente visualisados, outros precisam de tempo para serem filtrados e se materializarem fora da névoa da minha memória. Eu procuro não analisar demais isto, pelo medo de que um dia estas visões possam desaparecer! Eu não sei se você está se referindo a eles como crianças porque eu os tive nos passado - mas essa seria uma comparação adequada. Eu acabo vinculada e conectada a eles de um modo tal que é difícil pra mim separá-los de mim mesma. Eu unicamente tento "criá-los" de um modo que eles possam ficar de pé por si mesmos, e dar a eles o máximo que posso antes que eles sejam lançados para o mundo.



E: Falemos um pouco sobre os teus planos para o futuro. A música é realmente um projeto de longo-prazo pra você, ou seja, você tem a intenção de criar dúzias de álbuns e ter uma carreira que se estenda por décadas?


CASEY: Putz! Eu dediquei praticamente o ano todo para fazer outras coisas que adoro – pintar, cozinhar, fazer bolos e melhorar na bicicleta e na yôga. A música eu acho algo tão intrínseco ao modo como eu me viro na vida do dia a dia, que neste momento eu não vejo qualquer razão que me impeça de estar fazendo canções até a terceira idade. Mas o tempo algumas vezes tem outros planos em mente, e eu não tenho a menor vontade de arranjar briga com o tempo. Minha esperança é que eu possa continuar fazendo isso e que possa continuar a me perguntar as Questões Duras e Assustadoras. Eu realmente não tenho expectativas concretas – ideais de sucesso e coisas assim. Eu só me certifico de perguntar a mim mesma enquanto vivo: “você está feliz?” Se eu acabar sendo uma velhinha trabalhando numa livraria no Maine com um pequeno jardim de vegetais, não me sentirei decepcionada!


E: Li uma crítica (na Pitchfork) chamando suas letras de “nonsense espertinho” – se me lembro bem, você foi comparada com o Stephen Malkmus, o cara do Pavement. Isso te incomoda? Suas letras e versos são “repletos de sentido”, mesmo que alguns deles sejam claros somente para você, ou você acredita que há muito jogo de palavras e que você usa as palavras como “brinquedos”? Há realmente um pouco de “clever nonsense” aqui e ali?


CASEY: Eu me pergunto às vezes se é responsabilidade do escritor e do artista tornar tudo claro para o leitor – ou se um pouco de material nebuloso é saudável e nos lembra de pensarmos por nós mesmos. Falando geralmente, eu me enquadro nesta última categoria. Eu não me importo de me sentir desorientada se isso me faz questionar as coisas – e acho que como uma cultura nós deveríamos ser muito mais céticos e questionadores daquilo que as pessoas fazem ou dizem. Não sei se isso soa cínico – mas eu acho que é saudável questionar algo antes de você digerir e arquivar na tua enciclopédia mental. Nós devemos isso à nossa psique! Eu sugeriria a qualquer pessoa que questione qualquer coisa que eu digo, inclusive isso que estou propondo agora. O que é que eu sei?! Então será que é mesmo “nonsense espertinho”? No passado, eu acho que tinha sim muito mais linguagem arbitrária [nas minhas letras], palavras e expressões se concatenando simplesmente porque eu curtia o jeito como elas soavam ou como eu as sentia na minha boca. Atualmente eu tento conciliar esse prazer com algo mais coeso. Na minha experiência, uma canção pode ser sobre muitas e muitas coisas diferentes. Eu escrevo baseada em tópicos, mas também de um modo meio caleidoscópico. Então eu sempre sei sobre o que fala a música, e isso é tudo o que me importa, mesmo que seja a respeito de três eventos, pessoas ou lugares díspares que, quando listados numa página, conectam-se na minha mente para formar um quadro mais vasto. Seria uma extrema perda de tempo, energia e paz mental me deixar aborrecer e sair do sério por causa das interpretações que as pessoas fazem das minhas canções – eu aprendi a não levar a coisa tão pessoalmente. Enquanto eu sei das minhas intenções, me sinto ok.


E: Agora uma pergunta mais filosófica, talvez um tanto difícil de responder! Em algumas das suas letras, eu posso sentir uma espécie de “angústia”, talvez, em relação à passagem do tempo e ao fato de que a alegria sempre parece ser efêmera – a alegria e tudo o mais que existe, na verdade. Como quando você canta: “assim que nos acostumamos com uma estação ela se vai, e é somente com isso que podemos contar...” (em “Cabin Fever”), ou no lindo verso de “Better in Manhattan” que diz que “o paraíso é um lugar que se visita, mas não um lugar pra se morar”, ou mesmo no triste finalzinho de “Fat Old Man” em que você diz: “nada muda quando você se vai, tudo prossegue...”). Você realmente percebe o mundo como um “oceano de impermanência”, por assim dizer?

CASEY: Hmmmm... Bom, eu não diria que eu sinto qualquer sensação de “angústia” em relação à mortalidade. A mortalidade é a nossa verdade como humanos, e acho que a verdade nos libera de sermos só ‘alegres’ ou só ‘tristes’. Nós somos máquinas complexas, e frequentemente sentimos ambas essas emoções, tudo ao mesmo tempo, às vezes uma mais que a outra, mas eu considero quase impossível realmente separá-las. Não gosto de dissecar e esclarecer os sentidos das canções para os ouvintes – em parte porque eu fico realmente super curiosa para ver como os outros as interpretam! Eu coloco elas pra fora com esperanças de que elas se tornem mais do que somente canções minhas. Mas eu acho que apesar do tempo nos lembrar freqüentemente de que é ele quem está no comando, há uma boa razão que explica porque nós o marcamos com aniversários, feriados, festivais, estações etc. A transformação do mundo é bonita, mesmo que ele não seja permanente.



E: Apesar de não dar pra dizer que você escreve “canções autobiográficas” (do jeito que a Fiona Apple escreve, por exemplo), eu realmente sinto como se eu pudesse te conhecer muito bem depois de ouvir seu disco muitas vezes. Será isso uma ilusão ou será que essas músicas realmente podem servir como uma espécie de “portal para a sua alma”, um pequeno buraco na fechadura através do qual nós podemos desvendar ao menos um pouco de quem você realmente é?

CASEY: Eu tenho a tendência de me intimidar para longe do confessionalismo [I tend to shy away from confessionalism] – algo nele não se adequa muito bem à minha personalidade. Eu não me sinto como um livro aberto, talvez, e também não sou incrivelmente fascinante como pessoa. Minha vida no dia-a-dia é (não tanto...) chocantemente mundana. Minhas canções são veladamente autobiográficas, se o forem, mas eu hesitaria em dizer que existam quaisquer conclusões sobre mim como pessoa a serem tiradas depois de ouvi-las. Eu suponho que eu não sou realmente a pessoa certa para você perguntar esse tipo de coisa, mas eu não sei se é realmente possível realmente CONHECER um artista através de sua arte...



E: Estou curioso para saber um pouco sobre a repercussão da sua música fora dos Estados Unidos. Em quais países você diria que a resposta do público foi mais intensa e gratificante? E você já chegou a tocar ao vivo no exterior?

CASEY: Eu estou bastante alheia e ignorante a toda a resposta internacional. Ainda não toquei no exterior ainda, exceto no Canadá, embora eu esteja ansiosa para fazer isso no futuro. Eu realmente ainda não procurei como fazer tudo isso ainda, mas acho que a partir do próximo álbum eu gostaria de começar a viajar através dos oceanos. Eu recebo e-mails muito simpáticos da Escandinávia, e, é óbvio, do Brasil! Isso me faz divagar sobre como as pessoas descobrem sobre todos esses diferentes artistas! Eu sinto como se minha coleção de discos estacionou em 1979, e eu nunca sei quem é ninguém desses artistas novos, embora eu provavelmente deveria. Eu sequer ouço CDs! Tudo é em vinil pra mim. Eu vivo na Idade Média!

E: Você deseja se tornar uma cantora-compositora de alta vendagem ou está satisfeita sendo um tanto obscura, como um pequeno segredo que poucas pessoas compartilham?


CASEY: Eu não tenho a mínima idéia sobre como me sinto sobre o futuro – mas enquanto as coisas acontecerem de modo orgânico, vou estar contente. Não estou com pressa para chegar ao “próximo estágio” ou qualquer coisa que seja... Nem sei o que é isso. Eu nunca realmente me senti muito “romantizada” pela indústria da música. Eu respeito a necessidade que ela tem de transformar minha arte numa carreira – mas além disso eu acho que a indústria é um pouco superestimada, e isso é parte do porquê eu me rodeio com pessoas que estão fora dela. Talvez eu poderia ser mais ambiciosa, mas eu acho que estou muito mais preocupada com as músicas em si mesmas e em ser uma pessoa serena e feliz. Eu não me oponho a ter um público mais vasto ou poder me sustentar através da música, ao invés de trampar em [barista jobs] etc. Eu acho que eu tento não me concentrar muito nessas coisas – se acontecer, aconteceu. É que eu realmente não quero gastar meus 20 anos correndo por aí a ponto de não poder curtir meus amigos, família e vida cotidiana. Não vejo o sentido. A celebridade não chega nem perto de ser tão preciosa pra mim quanto estes três itens que citei. Pode soar sentimentalóide, mas é verdade!


E: Não posso resistir: vou fazer a famosa pergunta da Ilha! Quais são os 5 discos, 5 filmes e 5 livros que você levaria para uma ilha deserta para passar na companhia deles o resto da tua vida?


DISCOS:
1. Beatles—Revolver
2. Bob Dylan—Live at Albert Hall ’65
3. Joni Mitchell—Blue
4. Debussy String Quartet
5. Thelonious Monk- Monk’s Time

FILMES
1. Five Easy Pieces (Vi pela primeira vez outro dia, e acho que nunca vou conseguir me cansar dele! Parece simples no começo, mas é repleto de complexidade na essência!)
2. Harold and Maude, de Hal Ashby
3. qualquer dos curtas-metragens mudos do Buster Keaton (para serem assistidos ouvindo o disco do Thelonious Monk!)
4.
Annie Hall – Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, de Woody Allen
5. My Fair Lady, de George Cukor

LIVROS

1.
Beneath the Wheel do Herman Hesse
2.
A Insustentável Leveza do Ser do Milan Kundera
3. I Capture the Castle do Dodie Smith
4. O Tambor do Gunther Grass
5.
Chez Panisse Cooking da Alice Walters (Eu sei que parece doidice, mas eu adoro ler sobre comida quase tanto quanto curto comê-la! Esse livro de receitas é clássico.)



E: Algumas vezes eu suspeito que vocês artistas possam ficar bravos com os entrevistadores quando eles não perguntam aquilo que vocês gostariam de responder... Então vou propor um pequeno jogo bobo: faça uma questão a si mesma e a responda!

questão: Quando você se sente mais inspirada e feliz por estar viva?

resposta: Nos primeiros momentos da manhã ao nascer do Sol – a luz me faz desejar estar de pé e cantando. É luminosidade inadulterada – nova e um tanto insegura de si mesma, mas que se espalha sobre tudo até você sinta como se estivesse vendo o mundo pela primeira vez. Isso me faz cair apaixonada mais uma vez [It makes me fall in love all over again].

: D


myspace


DOWNLOADS:


Wind-Up Canary (2006)
http://www.mediafire.com/?mcyo1roz3wh





Phylactery Factory (2008)
http://www.mediafire.com/?v421ymmgdtc

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

:: Bluebell ::


:: BLUEBELL ::
Slow Motion Ballet (2005)

A pequena Bel Garcia, mescla de endiabrada Betty Boop e afinada Fada Sininho, ao cantarolar seus encantadores blues, me faz pensar que estou diante duma dessas musas raras que surgem tão raramente na música brasileira. Com seu primeiro álbum, o magnífico Slow Motion Ballet (de 2005), cometeu já em seu debut um dos grandes discos nacionais da década, arrancando elogios entusiasmados de gente importante, de Marisa Monte a Fernando Meirelles.

Certos pop-rocks bastante radiáveis, como "Ordinary Life", renderam a ela o apelido, entre nós depredadores, de Natalie Imbruglia paulistana, mas uma que não se tornou - pobrecita! - uma one hit wonder. Mas o álbum traz muito mais do que popices cantadas em inglês por uma indie-chick adorável em seus all-stars e roupas pretas: Bel prova aqui ser a única mina brasileira que consegue soar como a cópia fidedigna da Regina Spektor ("The Fight In The Cafe"), da Aimee Mann ("Pack and Go" ou "Translation") e da Fiona Apple. E tudo isso sem soar nem um pouco como um plágio ou como um item de segunda categoria, mas sim como um genuíno talento em seus primeiros florescimentos.

O disco tem até uns grunges de menininha ("Who's The Freak?" e "It's Out There"), cantados com uma sensibilidade e uma finesse que deixam Pitty parecendo uma caminhoneira truculenta. Sem falar de algumas bonitezas folk, como "I Could Have Been", "Bolas de Sabão" e o semi-hit "Dull Routine", que nos fazem questionar se Mallu Magalhães é realmente a princesinha folk do Brasil ou se isso é só exagero da hype machine, que esqueceu de nos avisar do quanto Bel é material mais fino, apesar de não ter tchubarubado seu caminho rumo à fama.

E, para não dizer que não falamos de covers, Bel (que já tem anos e anos de estrada cantando róque em bandinhas de garagem - saca só ela mandando "Remedy" dos Crowes em 2001) também manda bem em suas escolhas para Slow Motion Ballet. Ela se apossa de modo adorável de "Junk", musiqueta solo do velho Macca, que não soará mal aos ouvidos de nenhum beatlemaníaco. Insere ainda o refrão de "La Vie En Rose", um dos mais célebres itens do cancioneiro popular francês, em sua genial "La Vie en Close", cantando-o três vezes em três inflexões completamente diferentes: primeiro serena, depois histérica e aos prantos, e finalmente libidinosa e sedutora. Esta música, aliás, talvez seja o ponto alto do lirismo de Bel, que descreve alguns "prazeres Amélie Poulain", brinca sacana e sexymente com a pronúncia do francês e cria um hino luxurioso e irresistível sobre fossas, porres e hedonismo que vale citar na íntegra:

Me deixa quieta no meu canto que eu sei me virar
As mágoas da vida serviram pra me vacinar
Eu aprendi que não importa o mal é possível curar
Dançando tango, comendo pastel ou no banho a cantar

Às vezes um porre de vodka pode ajudar
A vida pode ser melhor pra lá de Badgá
Outras vertentes holísticas recomendam meditar
Ou aceitar que você está na fossa e nela mergulhar.

E se depois disso tudo nada adiantar
Se lembre: o que não tem remédio remediado está.
Erga a cabeça, mude de estação e vá se aprumar.
Tome alguns goles e saia de casa disposto a flertar.

Je vois la vie en rose, mon amour!



Quatro anos depois do lançamento de seu Balé em Câmera Lenta, a sumida Bluebell está prestes a reaparecer com um novo EP, fruto de anos e anos tocando em pubs do underground paulistano acompanhada por uma jazz-band fabulosa. A julgar pelo show recente que Bel deu no Studio SP, em que o público foi docemente judiado por um trompete matador, o futuro do Bluebell será repleto de frutos doces.

Cada vez mais longe do pop-rock, Bel agora aderiu à pira de ser a nossa mini-Ella Fitzgerald, a Edith Piaf sul-americana, a Nina Simone do nosso indie. Vestida como se quisesse homenagear Betty Boop, a ninfeta do desenho animado que cantava como uma russa embriagada de vodka, Bel Garcia surgiu quase como uma criaturinha do Noiva Cadáver, de Tim Burton, se ele se passasse na Jazz Age.

Bel, sobre o palco, está cada dia mais confiante. O domínio espantoso que possui sobre sua voz, que pode até ser magra e fininha, mas tem um timbre adorável e autêntico, faz com que perdoemos com facilidade a relativa timidez de seu corpo. Afinal, não estamos frente a uma cheerleader nem uma pretendente a pop-star, mas a uma mocinha sensível, serena e que parece ter imensos mananciais de talento que só estão começando a desabrochar...

Hoje em dia, a destemida Bel não teme atacar standards do jazz de modo dilacerante. E canta como se estivesse tentando realmente quebrar nosso coração - e mais à maneira de Chet Baker do que de Jeff Tweedy. E consegue fácil, como provam as lagriminhas que derrubei na caipirinha ao ouvi-la cantar uma sequência mortífera de uns 3 ou 4 blues sobre corações estraçalhados, madrugadas solitárias e mágoas afogadas no álcool.

Pra continuar com confissões constrangedoras, revelo que depois do show, com o meu CDzinho original em mãos, fiquei ali, zanzando pelos bastidores, querendo chegar perto da criatura, querendo beliscá-la para conferir se ela é mesmo de verdade e não uma criatura de fábula... E, pela primeira vez em anos, me vi recorrendo a essa bestice de tiete que é ir atrás de um autógrafo, com as mãos trêmulas e o coração palpitando... Taí: quer elogio melhor à música de Bel do que dizer que testemunhá-la, ao vivo e com surround sound, me deixou feito um menininho trepidando em admiração frente à visão da musa?...


DOWNLOAD (192 kps, 60 mb):
http://www.mediafire.com/?mjmn1myyend

ENTREVISTA:
http://musicapoesiabrasileira.blogspot.com/search?q=bluebell

LA VIE EN CHOSE no MÚSICA DE BOLSO:

quinta-feira, 16 de julho de 2009

:: Ella! ::


ELLA FITZGERALD

por Arthur Nestrovski
(Folha de S. Paulo, 13/3/99)


"Get happy!" - nem sempre é tão fácil. A alegria é uma forma de sabedoria: toda alegria é sábia, mas nem toda sabedoria é alegre, e, se uma já é difícil, imagine-se a outra. Alegria e sabedoria se cruzam, imprevistamente, na voz dessa mulher, capaz de fazer qualquer um feliz, ou pelo menos mais feliz, se não mais sábio.

Seu nome não podia ser mais apropriado: Ella. Uma voz como essa, com todas as metamorfoses para cima e para baixo de três oitavas, escapa a qualquer definição. Toda palavra, afinal, é uma generalização, a média do significado. Mas uma voz - qualquer voz, e essa de modo mais marcante que as outras - é o que existe de mais específico no mundo: seu sentido não pode ser traduzido, embora seja muito bem compreendido. É a voz dela. Não tem descrição, mas tem nome: Ella.

Não é um acidente, então, que Ella Fitzgerald (1917-96) seja nossa maior intérprete de canções de amor. O que há de repetitivo nessas músicas, nessas letras, torna-se específico como nunca, peloa força da voz e pela inteligência da paixão. Talvez não haja outro modo mais imediato de alimentar a presença do afeto fora do próprio afeto senão nessas palavras tão engenhosamente simples e nessas melodias tão simplesmente engenhosas, que a voz dela faz flutuar no ar. Só ar no ar, afinal: que mistério é a música...

Assim como os terrores do amor não estão nunca completamente ausentes de uma alma que já se apaixonou antes, também as sombras de um passado vivido e de um futuro imprevisível cercam as canções, mesmo ali onde menos se espera. As inúmeras façanhas de scat-singing, que Ella exibe como se tivesse virado um trompete humano, ou sobre-humano, não deixam de fazer escutar um lamento entre as notas que, por sua vez, deixa escutar o quanto não foi vivido e vencido para chegar até aqui..."
* * * * *
Disponibilizamos abaixo um ótimo ponto de partida para quem quer começar a se aventurar no Universo Ella: 2 CDs dElla cantando clássicos de Cole Porter. Como diz a AMG, "a striking two-CD set featuring arguably history's finest jazz singer singing some of the best-written American pop standards on one of jazz's most prolific labels." Essencial!

segunda-feira, 8 de junho de 2009

:: Dusty ::


DUSTY SPRINGFIELD,
Dusty In Memphis (1969)

Tinha se tornado mais do que evidente para toda a gente desde 1968: o pop tinha se convertido em rock e as vocalistas femininas tinham grandes dificuldades em chegar aos postos mais elevados das listas de vendas. Dusty não era uma exceção: os seus últimos êxitos mais significativos datavam do Verão de 1968. Apesar diso, Ahmet Ertegun, a mente visionária da Atlantic Records, sabia que ela era uma intérprete tão estupenda quanto Aretha Franklin e quis que a cantora gravasse em estúdio com a mesma banda que tinha ajudado a lançar para a fama Franklin, Wilson Pickett e The Box Tops. Quando Dusty chegou em Memphis, ficou horrorizada com o material que lhe era oferecido (baladas adultas e elegantes em vez de funk pedregoso) e pediu que todos os arranjos se fizessem antes de gravar, adicionando apenas a sua voz à mistura final (os músicos e os produtores pretendiam algo espontâneo e livre, uma base rítmica sober a qual Dusty poderia cantar). A cantora teve um ataque de nervos, discutiu com todos os membros do pessoal e acusou os produtores de serem prima-donas; cinzeiros voaram pelo estúdio e a sessão de gravação foi cancelada. Dusty apanhou o avião de volta para Nova York, na esperança de gravar numa atmosfera mais calma. O resultado, sem dúvida, não poderia ter sido melhor. O material é de grande qualidade, composto por autores de primeira no melhor momento das suas carreiras. Os arranjos são incríveis; e a voz, impetuosa. O primeiro single, "Son Of A Preacher Man", posicionou-se entre os 10 primeiros lugares do top. Dusty teve que esperar um ano para escutar o álbum. Mas os compradores de discos não foram tão condescendentes e Dusty In Memphis foi um fracasso comercial. Apesar das críticas terem sido excelentes, o disco conseguiu apenas ocupar o 99º lugar da lista de vendas americana. A sua carreira nunca viria a se recuperar. --- 1.001 DISCOS PARA OUVIR ANTES DE MORRER

DOWNLOAD (192kps - 45 mb -11 faixas):
http://www.mediafire.com/?xnv2zimzgdw

crássico!



Dusty cantada por Jack White em clipe de Sofia Coppola!

segunda-feira, 4 de maio de 2009

:: Riot Grlll - parte 01 - KATHLEEN HANNA ::


REBEL GIRRRRL

- Kathleen Hanna mistura punk rock, new wave e tecno tosco para espalhar seus protestos políticos e disseminar o feminismo -

por Eduardo Carli de Moraes


"You learn that the only way to get rock-star power as a girl is to be a groupie and bare your breasts and get chosen for the night. We learn that the only way to get anywhere is through men. And it's a lie." --- Kathleen Hanna

Cantora, compositora, zineira, fotógrafa, punk-rocker, ativista política, feminista militante e garota-problema, Kathleen Hanna foi uma das garotas mais notáveis do rock independente americano dos anos 90 pra frente. Ela hoje é considerada um dos maiores nomes no Levante das Calcinhas ocorrido no punk dos anos 90, o maremoto riot que trouxe feminismo e engajamento para o centro do foco - junto com 3 ou 4 power chords socados com fúria e versos berrados por verdadeiras pimentinhas com fogo no rabo e veneno na língua.

Kurt Cobain, que tanto fez para propagar as bandas pequenas que achava merecedoras de maior atenção (como os Pixies, os Vaselines ou os Meat Puppets), prestou homenagenam indireta à Kathleen Hanna ao escolher o título do maior hino da década. Conta a lenda que Hanna um dia pichou com spray vermelho na parece de Cobain uma gracinha que ele jamais esqueceu ("Kurt Smells Like Teen Spirit"). Ela se referia, na verdade, a um desodorante - o tal do "Espírito Adolescente" - mas acabou gerando uma expressão que Kurt deve ter adorado: feder à espírito adolescente. Quem diria que daí nasceria o grande hit nirvanesco, retrato de uma geração, muito bem batizado por esta pastora da seita punk que tanto fez pela "cena"!

Hanna, antes de transformar-se num dos lumiares do riot grlll e militante feminista, foi antes de mais nada uma fodida na vida: sempre mandada pro diretor no ginásio, por fazer zona ou por ser pega usando drogas, foi obrigada a pagar um aborto, na adolescência, com grana arrancada de um trampo no McDonalds. Ela mesma confessa que, quando adolescente, só queria saber de três coisas: ir a shows (de punk e reggae), fumar maconha e ficar bêbada. Poderia também dizer: "brincar de mudar o mundo - e o maligno american-way-of-life - empunhando um microfone e berrando punk-rock". E vejam só o simbolismo: ela faz aniversário no mesmo dia - 12 de Novembro - que Gandhi e Charles Manson! O que (ela brinca...) talvez explique como ela pode ser, ao mesmo tempo, uma militante política pacifista e uma completa psicopata berrante ("Maybe this explains my freakishly dualistic, hot-headed, Scorpio personality", explicou ela na sua mini auto-bio digital).

Kathleen Hanna é nada mais, nada menos, que uma heroína do rock contemporâneo. É inimaginável o tamanho da influência dessa menina dentro deste movimento musical, político e comportamental - o riot grrrl - que procurou realizar uma mescla entre punk rock cru e incendiário com ativismo político e discurso feminista. Liderando o Bikini Kill, Hanna ajudou a acender a chama do riot como um gênero importante da contracultura musical na década passada, juntando uma atitude confrontacional e anti-capitalista com a obstinação em permanecer de pés cravados no underground. Foi a primeira vez que toda uma cena, baseada nos preceitos clássicos do punk - do-it-yourself e live-fast-die-youg - foi bolada por dúzias de garotas através da América, e capitaneada por Hanna em Olympia, W.A. (cidade imortalizada pelo Rancid numa das mais fodásticas canções do And Out Come The Wolves).

O riot grrrl sempre procurou confrontar os estereótipos do que uma garota poderia ou não fazer, questionando toda uma série de temáticas relacionadas com o feminismo ("estupro, abuso doméstico, sexualidade [inclusive lesbianismo], dominância masculina na hierarquia social e formas de libertação e potencialização da mulher", segundo a síntese da AMG). Dentre as principais bandas que simpatizavam com o "movimento" e que acabaram por ganhar o rótulo riot (querendo ou não) estão o Sleater-Kinney, o Bratmobile, o Seven Year Bitch, o L7, o Babes in Toyland e as bandas e projetos paralelos de Kathleen Hanna (o Bikini Kill, o Julie Ruin e o Le Tigre).

O Bikini Kill lançou apenas dois álbuns de estúdio ('Pussywhipped' [94] e 'Reject All American' [96]) e duas coletâneas ('The CD Version of the First Two Records' [92] e 'The Singles' [98]) antes de encerrar suas atividades em 1997. Como introdução ao universo barulhento e estridente da banda, o álbum 'The Singles' talvez seja a melhor pedida, reunindo as músicas mais clássicas (incluindo "Rebel Girl", "Anti-Pleasure Dissertation" e "I Like Fucking") em um disquinho rápido de 9 faixas, algumas delas produzidas por Joan Jett.

Após o fim do Bikini Kill, Kathleen assumiu seu alter-ego Julie Ruin e gravou o tosquérrimo álbum homônimo em 1998, onde tocava quase todos os instrumentos (mesmo sem ter muita noção de como fazer isso) e começava a experimentar com eletrônica caseira. Na hora de sair em turnê, precisava arranjar uma banda de apoio para acompanhá-la e foram chamados Johanna Fateman e Sadie Benning. Ao invés de prosseguir com seu alter-ego, Hanna resolveu parir uma nova banda. Estava formado o Le Tigre.

O primeiro disco, lançado em 1999 pela gravadora comandada por Hanna (a Mr. Lady), é uma belezura de disco new wave conjugado com experimentos toscos com eletrônica. Fazendo uso de samplers, sintetizadores e bateria eletrônica, e misturando isso com a simplicidade tradicional dos power chords e riffões básicos do punk, a banda criou um mini-clássico do lo-fi moderno. É o tipo de disco que parece ter sido gravado num dormitório de garota equipado com alguns equipamentos baratos. É a velha idéia punk: você num precisa ter milhares de dólares na mão pra ir prum puta estúdio bem equipado, pagando um produtor renomado no mercado, comprando Fenders, Gibsons e amplificadores do tamanho de caminhões pra fazer sua música. Uma idéia na cabeça, uma vontade irreprimível de se expressar, e um pouco (bem pouco mesmo) de apetrechos técnicos (que nem é necessário saber operar direito) já é o bastante.

Certamente o Le Tigre não é pra todos os gostos: há quem irá falar mal só porque é simples, caseirão e não tem "virtuosidade" musical. É verdade que essas garotas não manjam nada de teoria musical e de escalas e arpejos e modos gregos e modulações e o caralho. E Kathleen também não está nem um pouco interessada naquilo que costuma se chamar de "cantar bem" (no sentido Elton John da coisa). Mas e daí? Precisa? "Nós favorecemos a expressão simples do pensamento complexo", ouve-se em "Slideshow At Free University", e é esse o caminho de Hanna. Pra que complicar as coisas? A "música em si" não é o que importa. E um berro desafinado dado com emoção vale mais do que uma performance vocal perfeita e afinada que é pura ostentação exibicionista.

A banda possui uma grande diversidade temática e muitos "links" - é a música-punk da Era Digital, enfim. Em "Hot Topic", música que dispara referências pra todos os lados, a banda vai enumerando toda uma série de heroínas do feminismo e do "rock feminino" (incluindo Yoko Ono, The Slits, Sleater-Kinney, Cibo Matto, The Butchies e mais uma pá de gente que nunca ouvi falar). Em "What's Yr Take on Cassavettes?" colocam em questão a genialidade ou não de um dos heróis do cinema independente americano (John Cassavettes). "The Empty" traz uma certa insatisfação com a lógica mainstream da música pop atual, com "as estrelas entrando e saindo dos automóveis e nós continuando a nos perguntar quando vamos sentir algo real":

The stars are getting in and out of automobiles
And we keep wondering when we're gonna feel something real
Keep waiting for a Santa that'll never come
A real party not just for people who're faking fun.
But everything gets erased before it's even said
And all that glitters isn't gold when inside it's dead.


"Deceptacon" é a mais bikini-killesca do disco, com o seu maravilhoso refrão nonsense ("Who took the bomp from the bompalompalomp? / Who took the ram from the ramalamadingdong?") e uma série de provocações a um certo personagem roqueiro vazio ("Your lyrics are as dumb as the linoleum floor") e que não enxerga a política nas letras hannianas ("Let me hear you depoliticize my rhyme"). Em "Let's Run", deliciosa tosqueira new-wave, Hanna declara-se a fim de espalhar sua demência ("I wanna spread my dementia / I wanna knock it off the line / Give me attention / Every day and every night...") com seu tradicional vocal nervoso e estridente.

Dançante e punky ao mesmo tempo, divertido e militante em iguais doses, transpirando vitalidade e espírito independente, esse disco é uma das inúmeras provas de que a mulherada rocker está muito viva. É provável que Hanna nunca venha a atingir de novo o grau de visceralidade punk do Bikini Kill, mas o Le Tigre continua expandindo seu legado com respeitabilidade. Não só musicamente falando, já que Hanna transcende o próprio domínio da música: é ativista política, zineira, dona de gravadora, pacifista, anti-Bushista, nova-yorkina moradora das proximidades do antigo WTC, sempre colocando a música a serviço de suas espertíssimas críticas sócio-político-culturais.

Atualmente, com todo o legado do riot grrrrl espalhado pelos anos 90 e 00, só mentalidades superficiais e restritas ao que é imposto pela mídia mainstream podem acreditar que as mulheres na música se restringem a ninfetas siliconadas e fabricadas ao estilo de Britney Spears - e suas dúzias de clones. Kathleen Hanna é um dentre muitos exemplos de garotas que pegaram em armas - ou empunharam microfones e guitarras - para criar alternativas e protestar contra a "bosta do jeito capitalista-cristão de fazer as coisas", como diz o próprio Manifesto de Hanna (cujos trechos notáveis compartilhamos na sequência).


RIOT GIRLL MANIFESTO, por Kathleen Hanna [excertos]

we recognize fantasies of Instant Macho Gun Revolution as impractical lies meant to keep us simply dreaming instead of becoming our dreams AND THUS seek to create revolution in our own lives every single day by envisioning and creating alternatives to the bullshit christian capitalist way of doing things.

we know that life is much more than physical survival and are patently aware that the punk rock "you can do anything" idea is crucial to the coming angry grrrl rock revolution which seeks to save the psychic and cultural lives of girls and women everywhere, according to their own terms, not ours.

we are interested in creating non-heirarchical ways of being AND making music, friends, and scenes based on communication + understanding, instead of competition + good/bad categorizations.

we are unwilling to let our real and valid anger be diffused and/or turned against us via the internalization of sexism as witnessed in girl/girl jealousism and self defeating girltype behaviors.

we hate capitalism in all its forms and see our main goal as sharing information and staying alive, instead of making profits of being cool according to traditional standards.

DOWNLOADS:

The Singles
http://www.mediafire.com/?ndmmfmg0iom



The CD Version Of The First 2 Records
http://www.mediafire.com/?au3ncxg0nyy


Reject All American
http://www.mediafire.com/?m1wwniqdzuy


Pussy Whipped
http://www.mediafire.com/?jbmrfcetyyx


Le Tigre - 1999
http://www.mediafire.com/?gzqzwrdtuzv


Feminist Sweapstakes - 2001
http://www.mediafire.com/?mtgnihmtmmz


This Island - 2004
http://www.mediafire.com/?yfzzjgzvzmw

LEIA MAIS: Kathleen Hannah por ela mesma - Wikipedia - Hanna fala sobre seu aborto em matéria para o SALON - Entrevista na INDEX Magazine - Bio - Treta com Courtney Love - Ms Magazine - Fan Page.

sexta-feira, 20 de março de 2009

:: Nina Simone ::

Viagem Bipolar
- Por Bernardo Santana -


Nina Simone era o nome artístico da cantora, compositora, pianista e arranjadora norte-americana Eunice Kathleen Waymon, nascida em 1933 e, por um azar dos diabos, morta setenta anos depois, em 21 de abril de 2003. Influente como poucas cantoras populares no mundo da música, Nina (o apelido vem da palavra espanhola “niña”, pequena) fez a cabeça de gente como John Lennon, Peter Gabriel, Jeff Buckley, Alicia Keys, David Bowie, Muse, Cat Power e até mesmo de divas muito mais conhecidas que ela, como Aretha Franklin.

Talento precoce revelada no maior revelador de talentos precoces do mundo, as igrejas cristãs do sul dos Estados Unidos, Nina alcançou logo no início de sua longa carreira, um status de respeitabilidade e influência impressionante, não só por seu talento musical, mas também pela personalidade forte e ativismo social raivoso.

I Put Spell On You é um dos clássicos discos que a moça pôs na praça durante o auge de sua carreira, que durou até meados dos anos 1970. “Clássico”, aliás, é até um adjetivo fraco. Spell deveria é ser ensinado nas escolas ou aparecer sobre o verbete “interpretação musical” nas enciclopédias por aí, se é que elas ainda existem.

Se Nina Simone é conhecida por sua busca constante por expressar em música as emoções, este disco, lançado em 1965, periga ser o maior exemplo dessa atitude. Indo da melancolia frágil à alegria sacana, passando por tristeza trágica e deboche safado, o disco não só mostra como a voz é um instrumento perfeito de manipulação sensorial (quer dizer, pelo menos pra ela…) como também expõe o lado arranjadora genial da High Priestess of Soul.

Com Ne Me Quitte Pás você chora sem entender a letra. Em seguida, Marriage Is For Old Folks faz pensar: “cara, como eu sou estúpido por ter chorado na música anterior. Que se dane o amor!”. Aí vem July Tree e a montanha-russa te joga lá embaixo de novo… E assim o disco inteiro age como uma amostra grátis de transtorno bipolar do bem. Tente ouvir a penúltima canção, You’ve Got To Learn, sem sentir que, puxa vida, você tem mesmo muita coisa a aprender…

A carreira de Nina Simone tem muito mais que só I Put A Spell On You, com certeza. Mas como nós aqui do Depredando gostaríamos de ter logo mais colegas viciados, prescrevemos uma dose que cause dependência imediata de uma vez. Não diga que não avisamos. E não precisa agradecer.