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quinta-feira, 3 de junho de 2021

OS ÚLTIMOS FILHOS DOS RINCÕES DO INTERIOR

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Cabeço da Argemela
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Iam e vinham, sem parar, não descurando qualquer metro quadrado. Tiravam o chapéu, sorriam, apaparicavam. E as pessoas, confiantes, assinavam o papel. 
Depois de eles saírem, embrulhados em gentilezas mil - ainda havia uma ponta de reserva, rebuscada lá no fundo de quem pouco percebeu, mas acreditar fazia parte da sua herança - parecia que o mundo ia mudar para muito melhor. Mas não. Era apenas um plano estratégico a avançar, imune a qualquer sentimento humano.
Quando se deram conta, feitas as mudanças convencionadas, havia uma barragem, uma mina de lítio a céu aberto, uma zona privada de caça, ou outra coisa qualquer, no lugar onde dantes eram as suas casas e os seus terrenos de cultivo. Apareceram algumas organizações a contestar, é verdade, mais uns políticos candidatos a qualquer coisa, mas tudo se esqueceu depois das fotografias e das filmagens da praxe. Já tinham o que queriam.
Alguns, moldados na dureza da vida, choraram pela primeira vez desde que se sabiam adultos. Tinha-se esboroado a fé na palavra de honra dos homens, cultivada, desde sempre, no seu rincão natal, cavando um abismo irremediável na tranquilidade da sua velhice. Acabara-se o olhar de frente, com um discreto brilho nos olhos, instalara-se a luz mortiça de quem baixa a cabeça. Para sempre.
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