Sei que o público que segue este blog é em sua maioria de mulheres, peço licença a vocês, pois entrarei no tema futebol, mesmo sabendo que a maioria não gosta ou não suportam ouvir falar disso. Mas prometo que a leitura vai valer a pena. Essa história foi vivida por mim e fala um pouco desse cara que estou reencontrando depois de algum tempo, um cara que tinha uma força de vontade gigantesca e superava barreiras enormes. Esse cara foi se perdendo neste mundo, mas acho que aos poucos estou retomando contato com ele e sabe de uma coisa, estou gostando. Vou compartilhar como forma de exercício, espero que gostem.
Questão de Honra
Quando criança eu era sempre o último a ser escolhido para o time de futebol, eu era ruim, mas nunca era o pior, sempre tinha um ou outro pior que eu, mas era batata eu seria o último escolhido ou seria o "próximo". Sempre fui gordinho, não me abatia muito com isso, sentava e esperava minha vez.
Na escola sempre me perguntavam se eu agarra no gol fixo, sempre dizia que não e era deixado de lado. Até um dia que resolvi dizer que agarraria. Não fui muito bem, mas insisti, pois tinha vaga garantida e era melhor jogar no gol que não jogar. Um certo dia, a aula de educação física estava cheia, tinham três ou quatro turmas juntas. Naquele dia entendo que foi uma mudança nos olhares sobre aquele "gordinho que agarrava no gol". As turmas eram misturadas e tinha turmas da quinta, sexta e sétima série, nessa idade a diferença de força é muito grande quando se tem um ou dois anos a mais e eu era da quinta série. Naquele dia eu lembro até hoje, foram vários jogos e eu sai de quadra sem tomar nenhum gol. Tinha um cara, o nome dele era Paulinho, ele tinha uma patada atômica, sempre fazia muitos gols e não era bom entrar na frente dele quando chutava. Mas naquele dia foi diferente, foram várias tentativas, um chute mais forte que o outro e eu estava lá defendendo todos. Lembro como se fosse hoje, no final do último jogo que já tinha acabado ele gritou "segura essa então gordinho"e deu um chute fortíssimo no ângulo, como se fosse em câmera lenta, lembro de ter dado uma ponte, aquelas que o Ronaldo, goleiro do Corinthians dava, e tirei a bola do gol. Os amigos dele tiraram sarro e pela primeira vez me sentia parte daquela coisa de educação física. Pois na época eu achava sortudo quem tinha atestado médico para não passar por tudo aquilo.
Com isso percebi que tinha uma arma em minhas mãos. Na rua a molecada fazia a seleção para jogar os chamados "contra", que consistia em formar um time com os melhores da rua para jogar contra os times de outras ruas. Adivinha que não era nem cogitado para isso. Era uma coisa que tinha vontade, mas nunca pensei em ser chamado, mas a fama da escola chegou na rua e recebi o tal convite. Fiz charme, disse que não era tão bom, mas por dentro pulava de alegria e gritava como louco. Com o tempo eu era peça fundamental do time, não podia faltar. Sempre voltava desses jogos com a parte de trás das perna sangrando, pois jogávamos no asfalto, era raro jogar em quadra e dar ponte e carrinho era e ainda é uma delícia, fazer igual aos jogadores da TV para mim era uma vitória a mais, era literalmente dar sangue pelo time. Lembro quando não podia mais jogar pelo time, por causa de trabalho e os meus amigos me imploravam para jogar e lembrava de quanto eu queria aquilo, deixar de ser ignorado e fazer parte de algo normal, tanto que demorei para deixar de jogar.
Depois de um tempo, já grande, me deparei novamente com está coisa de selecionar os melhores e eu ser deixado de lado. Fazia um curso técnico, e o pessoal organizou um campeonato, e na sala montou-se o time, não fui consultado, tinha uma amizade legal com a galera, não fiquei chateado, pois ali eu já não era um gordinho somente, estava beirando os 110 quilos então a visão sobre meu estado físico parecia ter que ser essa, mas não engoli essa história. Lembro que os rejeitados até tentaram montar um time, mas não deu muito certo, pois por incrível que pareça eu era o melhor do time, mas jogava no gol.
Na época eu fazia dois cursos, então arquitetei um plano. Marquei um contra e levei a turma da minha outra escola para jogar. O time que me rejeitou era bem melhor, entrosado e tinha dois caras que jogavam muito. Naquele dia não sai sem tomar gols, mas os caras demoraram pelo menos uns quinze minutos para fazer um gol, ai depois a diferença entre os times se fez maior, mas ali já tinha fechado o meu plano, conquistado o respeito e provado para aqueles caras que mesmo sendo gordo não seria fácil me derrubar. Acho que conquistei de vez o respeito deles quando fui buscar uma bola que quase entrou no gol, mas eu dei um mergulho e a tirei batendo a cabeça na trave, mas salvando o gol. Bem no fim do jogo fui convidado para ser o goleiro do time e no final dessa história fui premiado com uma camiseta de goleiro dada de presente por todos do time, com o meu nome.
Tenho essa camiseta guardada até hoje, ficou meio apertada, mas terei o prazer de usar ela quando eu for retomar as partidas de futebol, um dos meus objetivos ao perder peso. Pois com o peso que estava, não dava para arriscar. E esse dia está chegando, está bem próximo.
Gordinhos em educação física, sei como é.