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sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Poesias Gratuitas! [2a Edição] - WILLIAM BLAKE (1757-1827)


"To see a world in a grain of sand 
And a heaven in a wild flower,
Hold infinity in the palm of your hand
And eternity in an hour."


Auguries of Innocence




Tenho sorvido com fascinação, em grandes goles, a embriagante poesia do William Blake. Fiquei sabendo da existência do “visionário” Blake, como tanta gente, através de alguns marcos da contra-cultura do século XX: primeiro Aldous Huxley, que evocava versos e imagens poéticas de Blake com frequência, em especial quando falava sobre estados alterados de consciência e êxtases induzidos pelo consumo de estupefacientes (como a mescalina, o peiote e o LSD). O autor de A Filosofia Perene e Admirável Mundo Novo ajudou a transformar um dos versos de O Matrimônio do Céu e do Inferno (1790)  em um dos emblemas de todo o agito Psicodélico que atravessará as gerações beatnik, hippie e além: “se as portas da percepção fossem purificadas, tudo apareceria como de fato é: infinito e sagrado”.
Por outro lado, no âmbito da música popular Blake foi reverenciado por muita gente graúda: Patti Smith, uma “Rimbaud de saias poetizando o rock and roll”, compôs uma longa poesia musicada inspirada pelo “Everything that lives is holy” de Blake. E Jim Morrison e seu The Doors trataram de prestar também seus tributos ao poeta-xamã: o nome da banda homenageava o livro The Doors of Perception, impactante e desnorteante panfleto em que Huxley refletia sobre religião, mitologia, filosofia e misticismo tendo como base as experiências extáticas/místicas que viveu, seja através da leitura das escrituras sagradas das mais variadas culturas, seja através do consumo de substâncias químicas “nirvanizantes”.
“O homem esqueceu que Todas as Deidades residem no peito Humano”, escreve William Blake no encerramento de seus Provérbios do Inferno. Este é um dos poucos emblemas escancaradamente ateus na obra de um poeta que, sob a influência marcante de Milton e seu Paraíso Perdido, povoa sua obra com mitos e criaturas fabulosas e concebe o peito humano como um manancial de onde jorram infindos deuses, demônios, édens, infernos e “imagens poéticas” que procuram decifrar os maiores mistérios. O mais interessante nestes Provérbios Infernais é que eles não são, como seu nome sugere, diabólicos, imorais, sádicos ou terríveis; pelo contrário, são repletos de sagacidade, inventividade, ousadia – e até mesmo (por que não?) sabedoria.
Toda uma filosofia-de-vida desenha-se nestes provérbios: uma perspectiva existencial que põe o valor na ação e não na passividade (“He who desires but acts not, breeds pestilence”), que desvaloriza a temperança e a contenção em prol de uma “ética do excesso” (“The road of excess leads to the palace of wisdom”), que enxerga saúde e força no lado do dinamismo e sustenta que males emergem de tudo o que decide se estagnar, se fixar, se solidificar em dogma (“Expect poison from the standing water“…). Uma certa transvaloração de valores, pra falar nos termos da filosofia de Nietzsche, parece estar em jogo no fazer poético Blakeano. Em um dos raros momentos em que ele adquire ares professorais e ousa ser pedagógico e assertivo, William Blake ataca os Erros causados por “todas as Bíblias e códigos sagrados”.

“All Bibles or sacred codes have been the causes of the following Errors.
1. That Man has two real existing principles Viz: a Body & a Soul.
2. That Energy, call’d Evil, is alone from the Body, & that Reason, call’d Good, is alone from the Soul.
3. That God will torment Man in Eternity for following his Energies.
But the following Contraries to these are True
1. Man has no Body distinct from his Soul for that call’d Body is a portion of Soul discern’d by the five Senses, the chief inlets of Soul in this age.
2. Energy is the only life and is from the Body and Reason is the bound or outward circumference of Energy.
3. Energy is Eternal Delight.”

O poeta herege, promulgando audaz seus conceitos radicais, demolidor de todas as dogmáticas que encerram nosso horizonte na estreiteza, decide-se a reduzir a pó os dogmas e crenças errôneos propagados pelas religiões instituídas: a cisão do homem em Corpo e Alma; a demonização do corpóreo e a idealização do “espiritual”; a promessa de sofrimentos infindos àqueles que “obedecem suas energias”. Um forte elemento anti-platônico marca presença nestas páginas repletas do que poderíamos chamar de um “misticismo xamanístico” onde a sensibilidade é revalorizada e reconduzida a um pedestal onde possa ser cultuada. As “portas da percepção”, afinal, são “nesta vida as cinco janelas da alma” (“This life’s five windows of the soul”) e se existe alguma “redenção”, ela não está em qualquer transcendência, mas na redenção da imanência – na “purificação” de nossa percepção sensível, num alargamento de nossa consciência corporal. Enxergo em Blake uma figura que enaltece a abertura e a atentividade [AWARENESS] em relação aos processos colossais que se desenrolam eternidade afora nesta imensa orgia de energias em transa e em conflito que chamamos (ó miséria das palavras!) de Universo, de Tudo ou de Deus.
Em William Blake, a Energia adquire os contornos da divindade. E os seres vivos são como que as miríades de múltiplas encarnações desta Energia Cósmica que Blake diviniza. Uma via muito interessante de interpretação poética seria, por exemplo, a análise de como aparecem os ANIMAIS na poesia de Blake. No lindíssimo poema “Augúrios de Inocência”, Blake escreve algumas das mais comoventes imagens poéticas em prol do que hoje conhecemos como Libertação Animal: um cachorro faminto, um cavalo maltratado, um pássaro com a asa ferida, uma ovelha diante do facão do açougueiro, uma mosca assassinada por um garoto “que há de sentir a inimizade da aranha”, são todos evocados num mosaico em que Blake defende os direitos dos seres mais ínfimos e critica a arrogância dos humanos em subjugar as outras criaturas.



“A dog starved at his master’s gate
Predicts the ruin of the State.
A horse misus’d upon the road
Calls to Heaven for human blood.
Each outcry of the hunted hare
A fibre from the brain does tear.
A skylark wounded in the wing,
A cherubim does cease to sing.
[...] He who shall hurt the little wren
Shall never be by woman loved.”


Manoel de Barros dizia: “fazer o ínfimo ser prezado me apraz”. Em William Blake também existe este esforço de, através da poesia, realizar na consciência dos homens uma transmutação do ínfimo. O poema “A Mosca”, por exemplo, parte do livro Songs of Experience, traz como eu-lírico um homem que acaba de esmagar um inseto que fazia no ar suas brincadeiras de verão. Tomado por remorsos por ter aniquilado o pequeno artrópode, ele chega a uma “identificação mística” com o bichinho que não é sem-relação àquela retratada por Clarice Lispector em seu A Paixão Segundo G.H., uma obra-prima da inventividade humana que consegue extrair ouro poético e filosófico da maior das trivialidades: o encontro doméstico entre uma dona-de-casa e uma barata.


“THE FLY
Little Fly,
Thy summer’s play
My thoughtless hand
Has brush’d away.
Am not I
A fly like thee?
Or art not thou
A man like me?
For I dance,
And drink, and sing,
Till some blind hand
Shall brush my wing…”


Ao invés de misantropia (“os homens não passam de moscas!”), o que se manifesta nestes versos de Blake é a percepção da fragilidade comum de todos os mortais, humanos ou não. Os processos universais que transcendem o indíviduo, as “energias cósmicas” colossais ao seu redor, são “mãos cegas” que arrancam as asas de moscas e homens. Mas Blake jamais escreve tentando deprimir seu leitor ou fazê-lo “caluniar a existência”, para usar a expressão de Nietzsche. Há em Blake um convite à reconciliação do homem, filho pródigo, com a natureza da qual as religiões instituídas e as moralidades anti-naturais o afastaram. Vai nesse sentido um dos poemas de Blake que mais me comove, que mais “inesgotável” parece em seu jorrar de exuberâncias e belezas, “The Book of Thel“, publicado em meio aos agitos revolucionários de 1789.
Thel é uma moça virgem, inocente, inexperiente e “cheia de temores que a impedem de se engajar na vida”, como diz Woodcock. William Blake cria então uma série de diálogos entre Thel e alguns elementos da natureza: um lírio, uma nuvem, um verme, que “a encorajam a abandonar seu idílio pastoral nos vales de Har e se comprometer a viver”. Encarnação da fragilidade,da ansiedade e da melancolia temerosa, Thel, diz Woodcock, “é incapaz de enxergar que a vida individual é parte de um processo mais amplo”. Neste poema, Blake atinge uma eloquência ímpar na arte de despertar nossas consciências para estes “processos mais amplos” que estão a se desenrolar ainda que vivamos, cegos e tolos, na gaiola estreita de nosso egoísmo e de nossa percepção auto-centrada.
O poema se inicia com Thel entristecida, derramando na beira do rio uma “delicada lamentação que cai como o sereno da manhã”: “Why fade these children of the spring, born but to smile and fall?”, pergunta-se a moça para as flores do campo, destinadas a efemeridade comum a todas as crianças da primavera. Na sequência, conversa com a Nuvem que passa nos céus, também ela cumprindo sua sina de transitoriedade: “O little Cloud, the Virgin said, I charge thee tell to me: Why thou complainest not, when in one hour thou fade away?…” Diante das efemeridades naturais, diante de tudo que nasce e morre sem soltar um pio de reclamação ou um suspiro de angústia, Thel sente-se singularmente aflita ao se descobrir a única que não aprendeu a arte de passar sem reclamar: “I pass away yet I complain…
A melancólica Thel chega ao ponto, enfim, de proclamar sua própria nulidade, de reconhecer sua insignificância cósmica, murmurando queixosa: “Without a use this shining woman lived / Or did she only live to be at death the food of worms?” Thel atinge a noite total no seio da primavera e conclui: não sirvo para nada além de ser, por fim, comida para os vermes. Mas Blake não é poeta que abandone suas personagens e seus leitores nesta desoladora escuridão. Blake então convoca a Nuvem a responder aos queixumes de Thel e constrói assim alguns de seus versos mais comoventes:
“Everything that lives 
Lives not alone nor for itself.”
Como já dizia outro grande poeta, John Donne: “Nenhum homem é uma ilha”. O que Blake destaca é que as fronteiras entre o humano e o animal, e mesmo entre o orgânico e o inorgânico, são construtos culturais que nos cegam para a realidade da inter-conexão entre os vivos. Nenhum vivo é uma ilha: todos dependem uns dos outros e do ambiente no qual se encontram. Não há um só segundo de nossas vidas que não seja composto por dinamismo e interatividade: o dinamismo da respiração, da circulação, da alimentação, da decomposição, da recombinação – em suma, este constante intercâmbio de matéria que constitui, ao que parece, o passatempo predileto da eternidade.
Sem dúvida, esta é uma visão de mundo em harmonia com a noção, tão cara aos ambientalistas, de eco-sistema. Em Ponto de Mutação, o filme baseado na obra de Fritjof Capra, esta perspectiva é exposta com blakeana beleza. No poema de Blake, Thel acaba vivendo uma certa “epifania” em que uma nova concepção de Deus emerge:  um Deus que não tem nenhuma “predileção” específica pelos humanos, um Deus que ama (até mesmo) os vermes e pune o pé malévolo que esmaga de propósito um ser indefeso, um Deus daquele tipo cultuado por místicos e panteístas e que se manifesta nas miríades de criaturas que, animadas de energias móveis, interagem, compartilham e transmutam-se umas nas outras numa eterna orgia cósmica. O efeito poético é avassalador: toda concepção de mundo solipsista, autista, isolacionista, que concebe um ser separado do Todo, independente do Resto, é explodida. E o que emerge é uma mística da interconexão que poderia ter como emblema este verso profundo e misterioso:

“We live not for ourselves.” 

“Ponto de Mutação” (Mindwalk) – baseado no livro de Fritjof Capra
Assista na íntegra. Recomendadíssimo!!!

* * * * *
P.S.: Apreciadores da poesia, se liguem! Estamos tentando agregar poemas bacanas em um único espaço lá na nossa página do Facebook, onde mais de 35 poesias já estão disponíveis para serem sorvidas e compartilhadas à vontade. Incluindo... GoetheBaudelaireMaiakóvskiCecília MeirelesHilda Hilst, Pablo Neruda, Emma Goldman, Théophile de Gautier, dentre muitos outros. Fiquem antenados que a idéia é ir adicionando material novo gradualmente conforme progredirem os bons encontros e os encantamentos... Eis o link >>> http://migre.me/c9Rrq. Quem quiser dar uma sacada nos outros álbuns (incluindo Documentários e Shows Completos, eis-los: http://migre.me/c9RvE).


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segunda-feira, 9 de abril de 2012

Chimes of Freedom: The Songs of Bob Dylan


75 covers de Bob Dylan recheiam esta caixinha de 4 CDs em honra dos 50 anos da Anistia Internacional. Dentre os intérpretes que reciclam composições de Mr. Zimmermann, estão Queens Of The Stone Age, Patti Smith, Tom Morello, My Morning Jacket, Bad Religion, Elvis Costello, Diana Krall e Adele (dentre muitos outros). Baixe já
“The diversity of the musicians and musical genres — from rock, rap, hip-hop to pop, folk, country, jazz and blues — attests to Amnesty’s depth of support in the music community, the universal appeal of the core message of human rights, and the breadth of Dylan’s impact on culture.”
Abaixo, aproveito pra pôr na roda, na íntegra e com legendas em portuga, um dos documentários essenciais para qualquer dylan-maníaco: Don't Look Back, de D.A. Pennebaker. Junto com o No Direction Home de Scorcese e o I'm Not There de Todd Haynes, o filme integra a trinca matadora de obras cinematográficas dedicadas a Dylan.

terça-feira, 27 de março de 2012

Da caixinha de memórias de Patti Smith: o 1º encontro com Rimbaud, um show dos Rolling Stones e o poeta vida-podreira Jim Carroll



Patti Smith abre sua caixinha de souvenirs e nos conta em fina prosa lá no Mate-me Por Favor (A História Sem Censura Do Punk):


O PRIMEIRO ENCONTRO COM RIMBAUD 

“A Poet makes himself a visionary through a long, boundless and systematized
disorganization of all the senses.”
Rimbaud 



Eu estava trabalhando numa fábrica e inspecionando produtos pra bebê, e era minha hora de almoço. Um cara passava por lá com uma carrocinha que tinham aqueles maravilhosos sanduíches de linguiça, e fiquei muito a fim de um. Eles custavam mais ou menos um dólar e quarenta e cinco. Fiquei muito afim de um, mas acontece que o cara só trazia dois por dia. E as duas senhoras que mandavam na fábrica, Stella Dragon e Dotty Hook, pegaram os dois.

Aí não havia nenhuma outra coisa que eu quisesse. Você fica obcecado  por uns certos sabores. Estava com a minha boca salivando pelo tal sanduíche de lingüiça quentinho, então fiquei na maior depressão. Daí caminhei ao longo dos trilhos da ferrovia até uma pequena livraria. Fiquei zanzando por lá, procurando alguma coisa pra ler, e vi Illuminations. Uma edição de bolso barata das Iluminuras do Rimbaud, sabe? Quer dizer, todo garoto teve uma. Tem aquela foto granulada de Rimbaud, e achei que ele tinha um ar muito elegante. Rimbaud parecia muito genial. Peguei o livro no ato. Nem sabia do que se tratava, simplesmente achei que Rimbaud era um nome elegante. Provavelmente chamei-o de "Rimbawd" e achei que ele era muito cool.

Daí voltei pra fábrica. E fiquei lendo o livro. Era em francês de um lado e em inglês do outro, e isso quase custou meu emprego porque Dotty Hook viu que eu estava lendo alguma coisa que tinha língua estrangeira e disse: "Pra que você está lendo coisa estrangeira?!?"

Eu disse: "Não é estrangeira."

Ela disse: "É estrangeira e é comunista. Qualquer coisa estrangeira é comunista."

Ela disse isso tão alto que todo mundo pensou que eu estivesse lendo O Manifesto Comunista [de Marx & Engels] ou coisa parecida. Todos se levantaram, foi um caos completo, é claro, e saí da fábrica muito puta da cara. Fui pra casa e, é claro, dei ao livro a maior importância antes mesmo de lê-lo. Me apaixonei de verdade por ele. Foi por aquele encantador Filho de Pan que me apaixonei... Porque ele era tão sexy.



A MAGNÉTICA PRESENÇA DE MICK JAGGER NO PALCO



O que me fez ter esperança no futuro da poesia foi o concerto dos Rolling Stones que vi no Madison Square Garden. Jagger estava cansado e todo detonado. Era uma terça-feira, ele tinha feito dois shows e estava de fato à beira de um colapso - mas o tipo de colapso que transcende pra mágica.

Jagger estava tão cansado que precisou da energia da platéia. Não foi um roqueiro naquela noite. Ele esteve mais perto de ser um poeta do que jamais estivera, porque estava tão cansado que mal conseguia cantar. Adoro a música dos Rolling Stones, mas o principal não foi a música, mas a performance - a performance visceral. Foi a performance visceral dele, o ritmo, a movimentação, a fala - ele estava muito cansado, dizia coisas do tipo: "Very warm here/ warm warm warm / It's very hot here / hot, hot / New York, New York, New York / band, bang, bang." (Muito quente aqui / quente quente quente / faz muito calor aqui / calor calor / Nova York Nova York Nova York / banda, bang, bang.)

Quer dizer, nada daquela coisa foi genial - foi a presença e a força dele que mantiveram a audiência na palma de sua mão. Havia eletricidade. Se os Rolling Stones tivessem ido embora e deixado Mick Jagger sozinho, ele teria sido maravilhoso como qualquer poeta naquela noite. Teria falado alguma de suas melhores letras e mantido a platéia magnetizada.

E aquilo me entusiasmou tanto que quase me despedacei, porque vi todo o futuro da poesia. Vi e senti de verdade, fiquei tão empolgada que mal cabia em mim, e isto me deu força pra seguir em frente. [...] Apresentação física numa performance é mais importante do que o que você está dizendo. Qualidade dá bom resultado, é claro, mas se a sua qualidade intelectual é alta, seu amor pela platéia é evidente, e você tem uma forte presença física, pode fazer qualquer coisa impunemente.


SEDUZIR PARA UMA CONSCIÊNCIA DE MASSA

Comecei a fazer sucesso escrevendo aqueles poemas longos, quase poemas de rock & roll. E gostava de apresentá-los, mas percebi que, embora fossem maravilhosos, não eram grande coisa no papel. Não estou querendo dizer que os renego, mas existe um certo tipo de poesia que é poesia de performance. É como os índios americanos, que não escreviam poesia conscientemente. Faziam cânticos, faziam linguagem ritual - e a linguagem do ritual é a linguagem do momento.

Mas, na medida em que ficavam congelados num pedaço de papel - não eram inspiradores. Você pode fazer o que quiser, contanto que seja um grande performer, sabe como é, pode repetir uma palavra mais e mais, contanto que seja um performer fantástico. Quer dizer, Billy Graham é um grande performer, muito embora seja um cagalhão. Adolf Hitler era um performer fantástico. Era da magia negra. E eu aprendi daí. Você pode seduzir as pessoas pra uma consciência de massa.

Assim, escrevo pra ter alguém. Há um motivo por trás de tudo que escrevo. Escrevo do mesmo jeito que me apresento. Quer dizer, você só se apresenta porque quer que as pessoas se apaixonem por você. Quer que elas reajam a você.

A outra coisa é que, através da performance, alcanço certos estados nos quais sinto minha mente muito aberta - tão cheia de luz, enorme, grande como o Empire State Building -, e, se consigo desenvolver uma comunicação com o público, um grupo de pessoas, quando minha mente está tão grande e receptiva, imagine a energia, a inteligência e todas as coisas que posso roubar delas.


JIM CARROLL É UM DOS VERDADEIROS POETAS DA AMÉRICA

Jim Carroll (3º da esq. pra direita), autor de The Basketball Diaries, 
adaptado pro cinema como Diários de um Adolescente

Os poetas de St. Mark's são muito insípidos, são umas fraudes, eles escrevem: "Hoje às nove e quinze tomei um pico de speed com Brigid..." São espertos o suficiente pra colocar isso num poema, mas se Jim Carroll entra doidão na igreja e vomita, isto não é um poema pra eles - não é cool. 

Tudo bem se você joga com isso na sua poesia, mas se está realmente nessa, aí já é outra coisa - não é algo que eles queiram encarar. Jim Carroll era a chance do St. Mark's Poetry Project ter algo real lá. Jim Carroll é um dos verdadeiros poetas da América. Quer dizer, é um poeta de verdade. É um junkie. É bissexual. Foi comido por todos os gênios masculinos e femininos da América. Foi comido por toda essa gente. Ele vive por inteiro. Vive uma vida repugnante. Às vezes você tem que tirá-lo de uma sarjeta. Ele esteve na prisão. É um fodido completo. Mas qual o grande poeta que não foi? Pra mim é incrível que aos 23 anos Jim Carroll tenha escrito todos os seus melhores poemas - com a mesma idade que Rimbaud escreveu os dele. Ele tem a mesma excelência intelectual e altivez de Rimbaud. 

Mas o baniram porque ele fodeu com tudo. Não apareceu pra sua leitura de poesia. Estava na cadeia. Bom pra ele. Disseram: "Oh, bem, não podemos mais pedir pra ele ler poesias." Foi ridículo.

tudo isso e muito mais lá no...



Mate-me Por Favor (Uma História Sem Censura do Punk) 
Legs McNeil e Gillian McCain (org.)
Editora L& PM


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Discografia Completa de Patti Smith [1975-2004] - mp3 de 192kps
Documentário "Patti Smith: Dream of Life" (2008), de Steven Sebring

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Patti Smith: Um Rimbaud de saias poetizando o rock'n'roll