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segunda-feira, 1 de setembro de 2025

O Jazz sempre tem algo a ensinar sobre liderança compartilhada




A organização que improvisa*

Por Frank. J. Barrett**

Como seria uma organização que procurasse aprender com bandas de jazz? Os gerentes, para começo de conversa, teriam grande respeito pelas estratégias emergentes e teriam o cuidado de não separar aqueles que estão formulando a estratégia dos responsáveis pela sua implementação, porque a ação cria o feedback que fundamenta o próximo passo. Para isso, a alta gerência estaria com a mão na massa, aprendendo sobre as mudanças no ambiente e obtendo regularmente experiência prática e concreta.

A organização que improvisa criaria estruturas fluidas que se formam, se dissolvem e voltam a formar à medida que surgem novas situações e novos desafios. Grupos d projeto não seriam formados como resultado de sessões de de planejamento abstratas a priori, mas sim à medida que as situações exigissem. Grupos seriam formados e dissolvidos, reunidos para abordar determinados assuntos e servir a funções específicas e, em seguida, seriam dissolvidos.

A estratégia seria criada de forma retrospectiva, à medida que as pessoas experimentassem algo, formassem grupos para discutir a questão e, em seguida, articulassem qual seria a estratégia. Pessoas de diferentes áreas funcionais conversariam regularmente, compartilhariam insights e expertise de acordo com o que a situação exigisse. Expressões de espanto seriam comuns quando surgissem insights de lugares improváveis em momentos imprevisíveis e à medida que os empregados chegassem a novos acordos por meio de processos colaborativos.

As organizações criariam diretrizes mínimas, permitindo que os empregados se orientassem para situações concretas e seguissem seus palpites, dando contribuições necessárias. A energia oscilaria, à medida que indivíduos e grupos seguissem suas paixões ou reagissem a um desfio adaptativo. Haveria uma noção de descoberta comum à medida que as pessoas deparassem com situações de difícil solução, explorassem ideias e considerassem opções, descobrissem novas possibilidades apenas depois de ações experimentais já terem sido iniciadas. Mandatos de cima para baixo seriam recebidos com desconfiança, ou até mesmo ignorados, por medo de que pudessem atrapalhar as negociações de baixo para cima e os processos de análise.

Em vez de ficarem isolados em seus estilos, os funcionários trabalhariam em vários projetos ao mesmo tempo e pertenceriam a diversas equipes. Conversas e interações entre os silos criariam um modo de diálogo fundamentado na curiosidade. Perguntas surgiriam: De onde vem isso? Como você descobriu aquilo? Por que sou o único que não sabia disso? Por que não percebemos isso antes? Por que? Não porque todos quisessem bancar os especialistas, mas porque os empregados nunca estariam muito satisfeitos com o que sabem, nunca completamente confiantes de que estariam preparados para o que acontecesse a seguir.

Já que significados e cenários seriam fluidos, as pessoas utilizariam menos a clareza cognitiva e ficariam mais à vontade com a incerteza e a ambiguidade. Seria mais fácil admitir o que você não sabe e sentir livre para buscar a ajuda dos outros para obter informações; seria mais fácil também assumir qualquer papel solicitado quando surgisse a necessidade. Uma cadeia hoteleira que quisesse enfatizar o serviço quatro estrelas, em que todos os empregados seriam responsáveis por deleitar o cliente, se livrou de todos os títulos dos cargos. Todos os funcionários passaram a ser, a partir de então, “associados”, e era igualmente esperado d todos que respondessem aos pedidos independentemente de fazerem parte das exigências de departamentos específicos.

Assim seria uma organização que improvisa. Na Roadway Trucking, onde os empregados da linha de frente participam ativamente do planejamento estratégico, os motoristas de caminhão não esperaram ter aprovação para usar o celular para comunicar informações importantes sobre as remessas de carga e horários de entrega. Ao contrário, tomaram a iniciativa de comprar celulares e começaram a usá-los para demonstrar que esse importante recurso deveria ser financiado pelo departamento.

“Todos fazem de tudo” – esse é um bom lema para bandas de jazz e para organizações que querem aprender a improvisar. As apresentações de jazz não são aleatórias nem acidentais. Os músicos se preparam para serem espontâneos, afinal como dizia o lendário baixista de jazz, Charles Mingus, “ninguém improvisa do nada”.

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*Excertos adaptados do capítulo 8 do livro, "Sim à Desordem, de Frank J. Barrett, editora Elsevier, 2013, Rio de Janeiro

**Frank J. Barrett é professor de Administração e Políticas Públicas Globais, doutor em Comportamento Organizacional , músico e pianista de Jazz.


segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Improvisação, uma ousada ferramenta nas tomadas de decisões


Backstage A Kind of Blue



Quem alguma vez na vida não passou por uma situação inusitada na qual foi preciso improvisar, seja na vida pessoal ou principalmente no trabalho? E será que a improvisação foi bem sucedida ou não? O ato de improvisar tem várias aspectos, o termo tem origem do latim “improvisus”, repentino, imprevisto. Grosso modo, tomar uma decisão sem planejamento prévio, à queima roupa. Na música, é a habilidade de criar texturas melódicas dentro ou não de parâmetros harmônicos. Não há como falarmos de improvisação sem que isso nos remeta de imediato ao Jazz. Vejamos então como podemos colocar em prática essa ousada ferramenta como fazem os jazzistas e sem medo de errar.

Bem, podemos errar ao tomar uma decisão de improviso? Isso depende, a improvisação é uma ferramenta que sempre utilizei no trabalho e confesso, nem sempre obtive sucesso, na maioria das vezes sim, fui bem sucedido, mas depende muitas vezes das circunstâncias, ou seja, nem sempre é possível aplicá-la.  Se o trabalho for em equipe é preciso conhecer muito bem e a fundo o perfil de cada membro dessa equipe. Por exemplo, como cada membro da equipe reage quando ocorre uma situação atípica, inusitada e não prevista?

Como disse o saudoso baixista músico de jazz Charles Mingus, “não se pode improvisar sobre o nada, é preciso partir de algo”. Exatamente! Vamos tomar como exemplo os grandes retóricos e mestres do improviso em suas oratórias. Suas improvisações exigiram anos de treinamento e estudo, anotações em cadernos e fichas de situações exaustivamente estudadas, analisadas e memorizadas que somente com a prática os tornaram mestres no improviso tendo as respostas perfeitas nos momentos mais cruciais. Esses retóricos não improvisam do nada, existe todo um repertório armazenado e já estudado de respostas corretas para serem colocadas em prática quando a situação assim exigir.

Dois exemplos arrebatadores de improvisação que deram certo.

Em 1959, o músico de jazz Miles Davis entrou no estúdio para gravação de mais um álbum com o seu quinteto que era formado por: Bill Evans (Piano), Paul Chambers (Baixo), Jimmy Cobb (Bateria), John Coltrane (Sax Tenor) e Julian “Cannoball” Adderley (Sax Alto). Para a surpresa dos músicos, Miles forneceu poucos detalhes sobre o que iriam gravar, entregou apenas alguns rascunhos de escalas e linhas melódicas para os músicos e praticamente sem nenhum ensaio partiram para o início da seção musical. O resultado? "A Kind of Blue", eleito como o mais belo e mais importante álbum de jazz de todos os tempos e reconhecido como um dos melhores e perfeitos álbuns da história da música independente do estilo, ganhador até hoje de infinitos prêmios.

Muitas pessoas ainda dizem: Ah, mas também com um time de músicos desse calibre não tinha como errar. Mas foi exatamente isso que eu disse acima, é preciso conhecer a fundo quem está trabalhando com você. Miles, um gênio como ele só, conhecia minuciosamente cada membro de seu quinteto, ele sabia do que cada um deles seria capaz em seus instrumentos, do mesmo modo que cada membro conhecia o estilo do parceiro numa cumplicidade e confiança assustadoras. Esses caras praticamente estavam juntos o tempo todo, treinando, estudando, improvisando, fazendo jam sessions, respiravam música, cada qual conhecia o outro na palma da mão. Todos correram risco, porém o resultado sabemos qual foi, uma obra prima inigualável feita em apenas dois dias em sessões de 3 horas cada, totalizando 9 horas! Nunca mais um álbum musical foi gravado assim no improviso e nessas condições.

Exemplos de improvisações que deram certo na história e até mesmo salvaram vidas não são poucos. O comandante Chesley Sullenberger III (mais conhecido como “Sully”) improvisou ao aterrissar um Airbus-A320 no Rio Hudson salvando a vida de 150 passageiros a bordo. Foi um procedimento fora dos padrões recomendados pela aviação, mas o experiente e habilidoso comandante, bem como o seu não menos experiente co-piloto Jeff Skiles sabiam o que estavam fazendo. Ambos foram condecorados como heróis nacional e homenageados no filme “Sully” “O Herói do Rio Hudson”, com Tom Hanks no papel de Sully e dirigido pelo gênio Clint Eastwood.

Bons improvisadores têm um talento especial para saber quando e como violar regras. O pianista de Jazz e professor de Administração e Gestão, Frank Barret em seu livro “Sim à Desordem”, editora Campus, diz o seguinte: “O excesso de consenso é tão perigoso quanto sua inexistência, porque afasta a variedade e diversidade de ideias. Em vez de se proteger da discordâncias e do debate, você deveria avalia-los pelo potencial que apresentam. O segredo é haver consenso suficiente em torno de algo realmente relevante, em vez de buscar clareza e concordância em todos os princípios. A ambiguidade pode se produtiva”.

Portanto, a improvisação exige a capacidade para estar no meio de dúvidas e incertezas, exige estudo ininterrupto e perene, aprimoramento exaustivo e permanente das habilidades profissionais, implacável aprendizado, imaginação disciplinada e aguçada, forte percepção da realidade de tudo e de todos que estão no entorno. Por tudo isso é que a improvisação fornece a resposta para agirmos à queima roupa diante do imprevisto e justamente por isso é importante dizer: use-a com moderação!



segunda-feira, 22 de novembro de 2021

Aprendendo liderança e motivação com Duke Ellington




O Jazz é um gênero musical que nos traz infinitas e inestimáveis lições de liderança, motivação e principalmente insights de improvisação, sobretudo, nas circunstâncias que exigem tomadas de decisão diante de desafios.  E quem vai nos passar uma importante lição sobre motivação hoje é um dos maiores músicos de Jazz da história, Edward Kennedy “Duke” Ellington (1899-1974), bandleader, maestro, compositor, arranjador e que atuou proficuamente em sua banda até o seu falecimento em 1974.


Na banda de Duke Ellington, passaram músicos que também se sagraram como gênios absolutos em seus estilos característicos, bem como, no domínio total em seus instrumentos, entre eles, Johnny Hodges, Ben Webster, Jimmy Blanton, Paul Gonçalves, Charles Mingus, John Coltrane entre tantos outros. Duke, ele próprio um exímio pianista, tinha a preocupação de adaptar as suas composições e arranjos de acordo com o talento de cada músico de sua banda para que todos se destacassem extraindo de cada um deles o melhor que eles poderiam dar. E aqui já temos uma importante lição a ser seguida: detectar o talento de cada membro de sua equipe e extrair o melhor de cada um deles sem ficar tripudiando sobre seus erros.


Duke era um gentleman, elegante, dono de um suave humor e sabia lidar muito bem com os seus músicos. Sendo músicos que tocavam nas noites, alguns tinham problemas com alcoolismo, outros eram indisciplinados, mesmo assim, Ellington soube lidar muito bem com os egos inflados de cada um desses excelentes músicos. Jamais demitiu um músico sequer de sua banda, os que o deixaram, era para seguir carreira solo e muito gratos ao mestre pelo incomensurável aprendizado.


Existem centenas de exemplos a serem dados de situações pelas quais o mestre Duke passou com seus músicos dando verdadeiras lições de liderança e motivação. Chega até ser difícil escolher uma, mas aqui vai uma situação espetacular que ocorreu entre Duke e um de seus músicos, no caso o fenomenal trompetista Clark Terry.


Certa vez, antes de um ensaio, Duke chamou o trompetista Clark Terry e disse a ele o seguinte: “Hoje quero que você toque igual ao trompetista Buddy Bolden”. Clark ficou surpreso, pois jamais havia ouvido falar nesse músico chamado Buddy Bolden, então ele respondeu a Duke: “Mas, maestro, quem é esse tal de Buddy Bolden que eu nunca ouvi antes?”. Duke então lhe respondeu: “Mas como você nunca ouviu falar de Buddy? Ele é o melhor trompetista do momento, fantástico, disputado a tapas pelas mais importantes bandas de jazz, o som de seu trompete é único, autêntico, quem o escuta já sabe que se trata de Buddy Bolden. Buddy tem o som mais volumoso de trompete da cidade, usa notas dobradas ao extremo, tem a fama de quando afina o instrumento em New Orleans, os copos se quebram em Argel”. Clark, já atônito pediu a Duke que providenciasse então alguns discos de Buddy para que ele pudesse ouvir o estilo desse músico. Foi então que Duke, com seu sorriso habitual, disse para Clark: “Relaxa, Clark, para falar a verdade, você é o Buddy Bolden!”.


Que show de motivação! O nome dessa tática em comportamento organizacional é competência provocativa em ação. Ellington estava falando o tempo todo sobre o próprio Clark, ainda que este não houvesse percebido. Foi uma poderosa injeção de estimulo e inspiração para que Clark desse tudo de si e todo o seu potencial criativo naquele ensaio e ir além do que ele estava habituado.


Assim então atua um verdadeiro líder, como atuou Ellington nessa ocasião entre muitas outras. Liderança não se resume em autoridade do tipo só eu mando e você apenas obedece. Um bom líder sabe provocar com maestria, ele tem o dom de enxergar nas pessoas o seu melhor desempenho ainda que ele esteja abaixo do esperado, e mais, ele enxerga as qualidades positivas delas muitas vezes muito mais do que elas próprias. Duke tinha esse dom e além de dar show com as suas composições e arranjos, o mestre também deu show em suas lições de liderança e motivação, lições essas tais como o seu legado musical, serão sempre perenes. Take a Train!

Truques e dicas são termos usados por amadores, técnicas são termos profissionais

Quem ainda não se deparou com vídeos ou artigos cujos títulos diziam: “truques para que seu computador não trave ‘mais” ou “dicas para fazer...