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sexta-feira, dezembro 23, 2011

três poemas de natal


RESPOSTA DA VAIDADE HUMANA AO MENINO JEJUM

o menino jejum nasceu a 25 de dezembro desse ano
e veio a falecer (morreu portanto) a 25 de dezembro desse mesmo ano.
a sua fugaz passagem por este mundo breve
apenas serviu para confrontar a vaidade humana
com as humildes perspectivas de quem muito poderia fazer
neste mundo se aqui tivesse vivido mais tempo.
a vaidade humana encolhe os ombros
e diz que viver neste mundo mais tempo
sem fazer nada
é bem melhor que morrer apressadamente
sem fazer tudo aquilo que poderia vir a fazer
e ainda por cima em jejum.



RESPOSTA DO MENINO JEJUM À VAIDADE HUMANA

aqui do alto assunto a que ascendi
vejo bem o quanto és vã ó vaidade humana
e só não te perdoo porque tu lá sabes
muito bem aquilo que fazes.
(aliás é essa a única coisa que tu sabes.)
muito eu te poderia ensinar sobre o não ser
mas sei também que tu não queres aprender
porque aprender implica trabalhar, como bem sabes.
apenas te digo que já não estou em jejum
pois agora que ascendi a um alto assunto
aqui me alimento com todas as palavras do mundo:
sou um poeta.
e mais não digo
porque no alto assunto a que ascendi o meu latim é muito caro.
ó vaidade humana que te contentas em ser apenas
a vaidade humana:
continua a dormir bem vaidade humana
que eu fico acordado a aprender
e a escrever
mas sei que quando me for deitar
também dormirei bem
embora sonhe sonhos um bocado bem diferentes
dos sonhos que tu sonhas ó vaidade humana.



RESPOSTA DA VAIDADE HUMANA À RESPOSTA DO MENINO JEJUM À VAIDADE HUMANA

a inveja exacerbada (companheira de quarto da vaidade humana)
acordou ao meio dia e vinte e três a vaidade humana
do sonho hiperactivo no qual como habitualmente hiperagia
para lhe dizer que do planeta alto assunto a que ascendeste
recebera uma comunicação urgente do menino jejum.
a vaidade humana refilou um pouco não muito com a inveja exacerbada
(a vaidade humana refila sempre com qualquer um
ou qualquer uma que a acorde ao meio dia e vinte e três)
e por uma vez na sua hiperactiva vida
dispôs-se a fingir que ouvia uma comunicação
vinda do planeta alto assunto a que ascendeste.
depois disse eu quero é que te vás f*der
e voltou para o seu sonho hiperactivo
onde sempre hiperage
queira ou não queira o menino jejum
ou qualquer outro habitante do planeta alto assunto a que ascendeste.



A.V., 2003

Imagem: "Um theatro de marionettes no parque de Vienna"
(Jornal do Domingo, Lisboa 1887)

quarta-feira, março 23, 2011

Dois poemas de Rui Tinoco, publicados no Debaixo do Bulcão 39 e lidos na Festa da Poesia de Almada (Incrível Almadense, 21 de Março de 2011)




O LOCUTOR


achei curioso: depois da notícia
surpreendi um certo olhar de
tristeza ao Locutor. os factos não
eram para menos: a desgraça
abatera-se sobre a família
de Domodedonova durante
as recentes chuvadas tropicais.
o seu telejornal era diferente, ele
não acreditava no rigor da máxima
«uma imagem vale mil palavras»
e insistia em acrescentar uma outra,
a de si mesmo, profundamente
combalido com as misérias do mundo.
felizmente, o dia é longo, tem vinte
e quatro lo-o-o-ongas horas e um nosso
atleta conquistou uma rara
medalha. depois do jantar, o tom
era de festa – assim o ditava
o alinhamento. pobre Locutor!
teve de mascarar a negra sombra
que lhe pairava sobre o coração
e, afirmo-o sem receio, o seu
rosto exalava então a mais profunda
a mais pura e radiosa
alegria! foi nesse momento
que se interrompeu a transmissão
em virtude de compromissos
publicitários.



O ECONOMISTA

o Economista pensa com
índices, afirma x
ou bate-se pela ideia oposta
conforme o que lhe dizem os mercados.
ninguém ouve tão bem os mercados
como o nosso Economista. é
preciso que todos se calem, que os professores
ensinem mais baixinho, que os
maestros não rodopiem demasiado
ao conduzir majestosas orquestras,
que o poeta não chocalhe tanto
as metáforas. é a partir deste
momento que ficamos suspensos
a todo o pequeno gesto
à mais insignificante hesitação
do Economista. ele ouviu os mercados,
aquilatou e alinhou os mais misteriosos
índices. afirmou: «o vosso destino
está sujeito a uma OPA hostil,
o Dinheiro não gosta que estejam
aqui a ler poesia».



Rui Tinoco (poemas) e Jorge Figueira (fotos)

sexta-feira, março 18, 2011

Debaixo do Bulcão no no Dia Mundial da Poesia



O cartaz da Festa da Poesia, a realizar dia 21, no Salão de Festas da Incrível Almadense, e a capa da nova edição do Debaixo do Bulcão poezine - mais informação sobre este projecto editorial alternativo aqui:
http://debaixodobulcao.blogspot.com

A Festa da Poesia de Almada é uma organização da Sociedade Filarmónica Incrível Almadense, em parceira com a SCALA - Sociedade Cultural de Artes e Letras de Almada, Associação Poetas Almadenses, O Farol - Associação de Cidadania de Cacilhas, e Debaixo do Bulcão. Durante o evento haverá uma sessão de "poesia vadia" (aberta à participação de todos os que desejem dar a conhecer os seus poemas, ainda que não editados) e serão distribuídas 3 publicações de poesia (cadernos das associações Poetas Almadenses e SCALA, bem, como a já mencionada edição 39 do Debaixo do Bulcão poezine).

A entrada é livre, e estão todos convidados!

quinta-feira, novembro 11, 2010

"Mi Mundo" - poesia do Sahara Ocidental


"Poemas de autores do Sahara Ocidental, lidos por refugiados sarahuis nos campos de refugiados da Argélia", em 2006. Em castelhano, que é a língua da antiga potência colonial daquele território - e que nós em Portugal entendemos muito bem (ainda que às vezes façamos de conta que não...).

quinta-feira, outubro 14, 2010

soneto incompleto em memória de sísifo


se quero levar água ao meu moinho
a baldes a carrego desde a fonte
e devagar penoso subo o monte
tropeçando nas pedras do caminho

que aqui alguém as pôs como empecilho.
tropeço entorno a água volto à fonte
e novamente vou subindo o monte.
ainda bem que é água em vez de vinho!

Affonso Gallo (poema)
André Antunes (ilustração)

Na edição 38 do Debaixo do Bulcão poezine.
http://debaixodobulçcao.blogspot.com/

sexta-feira, outubro 08, 2010

dia de chuva na cidade



Dia de chuva na cidade
triste como não haver liberdade.
Dia infeliz
com varões de água
a fecharem o mundo numa prisão.
E alguém a meu lado com voz múrmura que diz:
"está a cair pão"
Ah! que vontade de gritar àquela criança seminua
sem pão nem sol de roupa:
"Eh! pequena! Deita-te na rua
E abre a boca..."
Dia em que urdo
este sonho absurdo.

José Gomes Ferreira


(Muitas foram as razões que me fizeram recordar hoje este poema de José Gomes Ferreira,
o "poeta militante" e um dos que mais influenciou as minhas primeiras tentativas literárias, há coisa de 3 décadas atrás...)

sábado, março 27, 2010

No Dia Mundial do Teatro... poesia!

Actores e declamadores dizem poesia de autores lusófonos, na abertura de um dos painéis do 1º Encontro de Poetas do Mundo em Almada, que está a decorrer no Convento dos Capuchos. É lá, também, que está a ser distribuída a mais recente edição do mais vetusto poezine de Almada - quiçá do país... - Debaixo do Bulcão.

domingo, março 21, 2010

Dia Mundial da Poesia, da Árvore e da Floresta. No hemisfério sul é Outono...


De um calendário poético colectivo - editado pelo blogue Teorias Impossíveis - que a escritora paulistana Madalena Barranco me enviou do Brasil, eis o poema do mês de Março.

Canção de Outono

Talvez eu encontre flores no caminho
e nelas eu possa tecer o meu sorriso.
Foi entre ondas e areias
que descobri o invertido paraíso.

Eram pessoas vazias de si mesmo,
solitárias, desesperadas e sem canções.
E entre folhas secas caídas no chão
não entendiam a beleza das estações.

Elas partiram e voaram para longe,
inerte as minhas lágrimas de solidão!
Ventos, chuva, tempestades
eram as folhas caídas no chão.
O coração chora em súplicas:
Se mereço, perdoa-me!

Eu sou a folha caída
que de saudade chora.
Tantos outonos cantados,
das folhas que voaram
dos verões que se foram
e das primaveras que choraram.
Perdoa-me folha seca!
Minhas lágrimas não foram em vão
se chorei, foram lágrimas de solidão.


Suzana Martins

http://www.sumartins.wordpress.com/

sábado, março 20, 2010

Começa hoje, no Convento dos Capuchos


O 1º Encontro de Poetas do Mundo em Almada começa hoje, no Convento dos Capuchos. Debates, recitais de poesia e espectáculos diversos, exposições, apresentação de livros e de outras publicações - são algumas das actividades agendadas. O encontro traz, também, poesia às ruas de Almada cidade, e ao Metropolitano do Sul do Tejo: intervenções poéticas a realizar durante o dia de domingo, 21 de Março.

Criei um blogue (não oficial) do evento, onde irei colocando informação e alguma reportagem. Encontram lá, também, o programa completo.

domingo, fevereiro 28, 2010

O "novo" livro de Alexandre Castanheira é um "Tributo a Almada"


Alexandre Castanheira comemora hoje 82 anos. Poeta, dramaturgo, ensaista, dirigente associativo, professor universitário, grande divulgador das Artes e letras que se fazem por terras almadenses - Castanheira praticamente dispensa apresentações, tal é a amplitude e importância da sua obra.
(No que diz respeito às Letras, então, é mesmo um caso excepcional, num concelho como o de Almada, onde há muita gente a escrever - isso é certo - mas onde poucos se têm distinguido nesse ofício. É a minha opinião.)
O livro apresentado no dia 27 de Fevereiro é uma reedição (via Poetas Almadenses, na colecção Índex Poesis) de textos escritos para o catálogo da exposição de pintura de Albino Moura, "Almada do meu olhar"
Não serão, certamente, do mmelhor que Alexandre Castanheira escreveu até hoje. Mas, ainda assim, vale a pena lê-lo. E vê-lo a declamar a sua poesia.
Ou, também, ver e ouvir Francisco Naia - que adaptou, destra forma, a poesia de Alexandre Castanheira:


(Sessão de lançamento de "Tributo a Almada (Assim aprendi a olhar Almada)", poesia de Alexandre Castanheira, editada pela associação Poetas Almadenses. Le Bistro Café, Almada, 27 de Fevereiro de 2010)

segunda-feira, janeiro 18, 2010

"Espectáculo de Homenagem a ARY DOS SANTOS - POETA DE CANÇÕES"

"Espectáculo Musical interactivo da Vida e Obra de Ary dos Santos, com projecção de imagens. 4 Artistas fazem uma passagem pelo autor desde a música ligeira ao fado, desde o início ao fim da sua vida. Este é um Espectáculo Cultural que pretende recordar e ensinar, mas acima de tudo, viver ao Vivo as emoções dos poemas cantados com os quais Ary dos Santos se deu a conhecer." - informação copiada do canal do Youtube de onde copiei este vídeo.

José Carlos Ary dos Santos "nasceu na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, a 07 de Dezembro de 1936 e faleceu a 18 de Janeiro de 1984 na mesma cidade", diz a Wikipédia (aqui).

Mais dados biográficos e poemas, em

http://users.isr.ist.utl.pt/~cfb/VdS/ary.dos.santos.html

http://www.citi.pt/cultura/literatura/poesia/ary_dos_santos/

terça-feira, dezembro 22, 2009

Um círculo de poesia, em Moura


Regressei a Moura, para visitar amigos e fazer a apresentação do meu livrito, O Ciclo da Serpente - premonições deveras líricas. Na Sala da Salúquia (Teatro Fórum de Moura), dia 19, sábado, à noite, aproveitando o acolhedor espaço da exposição/instalação "Objectos da Nossa Casa", de Andreia Egas, reunimos pouco mais de uma dezena de pessoas (alguns/algumas muito jovens!), para falar de poesia - e, principalmente, para ler poesia.




O lançamento do livro era só um pretexto. A ideia - bem concretizada, de resto - era lançar a semente para o que, esperamos, virá a ser um grupo de dinamização de Poesia naquela cidade. Jorge Feliciano, feito anfitrião, dissertou aos jovens sobre a importância do Debaixo do Bulcão (projecto que iniciei, em Almada, há 13 anos) e sobre o exemplo de "democratização dos meios de produção" (leia-se, neste caso, "edição" e "publicação") que tal projecto constitui.


Eu sou suspeito para avaliar se ele tem ou não razão. Mas espero, sinceramente, que o "exemplo" seja seguido, e que os "alunos" de Moura consigam (como é natural) vir a superar este "mestre" de Almada. Não "espero", apenas: estou, convictamente, convosco - e disposto a ajudar, sempre que necessário!


Avante, pois, jovens poetas!

quarta-feira, dezembro 16, 2009

ÍCARO


atormentaste a solidão do impossível e os castigos
da poesia.

muito cedo se fez corpo em teu dia. muito cedo
amaste outro labirinto.

ícaro,
caiste para salvar a humanidade. ora pro nobis.


António Vitorino

O Ciclo da Serpente - premonições deveras líricas (1989)
Edição Poetas Almadenses, colecção Index Poesis.
Almada, Dezembro de 2009

É hoje!


Depois de quase três décadas a guardar papelada em gavetas, publico finalmente um livrito que se veja. Chama-se "O Ciclo da Serpente - premonições deveras líricas". Foi escrito em 1989, mas só vai ser editado em livro agora - muito devido ao incentivo e à insistência (no bom sentido, claro!...) do professor Alexandre Castanheira (que, de resto, escreve um notável prefácio a este livro - e à minha "obra literária" não editada, que ele conhece como poucos).

O lançamento é hoje - quarta-feira, 16 de Dezembro de 2009 - a partir das 21h30, na Sala Pablo Neruda do Fórum Municipal Romeu Correia (biblioteca central de Almada).

A edição é do colectivo Poetas Almadenses (associação informal de autores cá do burgo).

A seguir à apresentação do livro, José Vaz e João Vasco Henriques farão a leitura dos poemas, num recital sonorizado pelo projecto "O Burro e o Cigano". Se os meus estimados amigos e potenciais leitores quiserem, também posso dar autógrafos no final (apesar de não ter jeitinho nenhum para essas coisas). Infelizmente não vos posso oferecer um copito com qualquer coisa dentro. A menos que água vos satisfaça.

Aproveito o ensejo para lembrar que, no sábado à noite, farei a apresentação deste livro em Moura, no Teatro Fórum.

Não quero deixar de agradecer, também, à directora da colecção Index Poesis, Ermelinda Toscano (como e óbvio, sem a sua colaboração e empenho seria impossível publicar este livro), ao Rui Tavares (autor da capa e contra-capa do livro), à Sofia Chanoca (a modelo que, sem saber muito bem como, se viu metida nesta "alhada"), aos actores que vão fazer a leitura dos poemas. E, por último mas não menos importantes, a Andreia Egas e Jorge Feliciano - que me vão receber (receber bem, espero...) em Moura!

terça-feira, novembro 24, 2009

Evocando o poeta António Gedeão (e o cientista e multifacetado artista Rómulo de Carvalho), no dia do seu nascimento...



«Professor de Química e Física, poeta, investigador, historiador, escritor, fotógrafo, pintor e ilustrador, Rómulo Vasco da Gama de Carvalho, filho de um funcionário dos correios e telégrafos, José Avelino da Gama de Carvalho e de uma dona de casa, Rosa das Dores Oliveira Gama de Carvalho, que tinha como grande paixão a literatura apesar de contar somente com a instrução primária, nasceu a 24 de Novembro de 1906 na Rua do Arco do Limoeiro (hoje Rua Augusto Rosa) na lisboeta freguesia da Sé.» - é assim que começa a nota biográfica no site http://www.romulodecarvalho.net/
(o mais completo e rigoroso entre os que pesquisei na net).


Mas, porque um poeta vale pelos poemas que escreve, e porque a melhor forma de o homenagear é ler a sua obra, aqui fica:




Lágrima de preta


Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio."


António Gedeão, in Máquina de fogo

terça-feira, novembro 10, 2009

"Tomar Partido" - poema de José Carlos Ary dos Santos, dito pelo próprio

No dia em que se assinalam 25 anos sobre a morte de José Carlos Ary dos Santos, eu lembro aqui uma faceta incontornável do poeta: o militante comunista! Claro que Ary foi muito mais que um panfletário. Mas foi, também, isto: autor corajoso, que tomava partido!

Biografia e mais poemas no site As Tormentas:

http://www.astormentas.com/din/biografia.asp?autor=Ary+dos+Santos

sábado, abril 25, 2009

LOUVOR AO SANTO CONDESTÁVEL E A TODOS OS QUE SEGUEM O SEU VIRTUOSO PORÉM VARONIL EXEMPLO



o santo condestável assassino
dos inimigos desta pátria audaz
muitos matou como é bom e se faz
quando é justificado o morticínio:

ainda hoje um alto patrocínio
para a guerra louvar a musa traz.
de o pôr no altar alguém lá foi capaz:
não sei se o vaticano ou o destino.

por muita insistência dos devotos
o vaticano certamente foi
mas eu para o destino mais me inclino:

porque os fracos acabam nos esgotos
e é predestinado só quem põe
do inimigo à mostra o intestino.


Affonso Gallo

quarta-feira, abril 15, 2009


DEBAIXO DO BULCÃO


Gente muito sábia
Anda a discutir os crimes
Que cometemos contra a natureza…

E dizem-me que ela anda apavorada
Vingando-se muitas vezes
Por meio de calamidades terríveis

Estão a ver, não estão?
Tremores de terra, inundações, fogos…
É ela a vingar-se

Mas ela avisa primeiro
Avolumando nimbos, aglomerando-os
Por cima das nossas cabeças distraídas

É o bulcão a exprimir o seu desgosto
E a sua ira
Antes de nos mergulhar nas trevas

E tudo isto porque eu deixo a torneira a pingar
E não apago a luz quando já dela não preciso
E abro muitas vezes a porta do frigorífico…

Criminoso! O que tu andas a fazer!
Gritam-me. E o escuro bulcão entra em mim
Sou só negrume, só tristeza…

Eu que já ando há tanto tempo numa fase
Lúgubre, de desempregado desesperado,
Doente e sem assistência…

Debaixo do bulcão
Sou alvo de um crime anti-homem
Que alguém vil comete impunemente

Se eu pudesse fazer como a natureza!...
E vingar-me! Desmoronando governos
Em tremores de terra só para eles!...

Não digam nada a ninguém, peço-vos,
Mas vou perguntar ao Vitorino como é
Que ele prepara os bulcões poéticos

Pode ser que eu consiga na base da Poesia
Modificar a fórmula bulcónica
E desagravar os pobres “criminosos” que somos
Tornando logo visíveis os que cometem o crime
de não nos deixar viver em paz com a nossa natureza,
e depois … apetece-me dizer: seja o que Deus quiser!


Alexandre Castanheira
Em "Tempo Meu"
edição Poetas Almadenses, colecção Index Poesis,
Almada, Fevereiro de 2008
(embora esta seja uma versão ligeiramente diferente, publicada no Debaixo do Bulcão poezine, nº31, em Dezembro de 2007...)

Ilustração: cartoon publicado no jornal Avante! em 1991.

A propósito, e para que ninguém se melindre: bulcão e vulcão são palavras distintas.
Bulcão é isto:

(clique na imagem para ampliar e ler a definição de bulcão)

terça-feira, abril 07, 2009

"A Força das Palavras"


A Associação Cultural Ecos D'art promoveu, em 2008, o prémio literário "A Força das Palavras", destinado aos alunos das escolas do ensino básico e secundário do concelho de Sesimbra. Foi a primeira de muitas edições (suponho eu, e espero que assim seja).

«Este evento, que se pretende ser anual, tem como objectivo fomentar na camada estudantil o gosto pela escrita, desenvolver a imaginação, despertar a criatividade nas modalidades poesia e conto», explica Artur Vaz, presidente da Ecos D'art. Nesse sentido, está já a ser preparada mais uma edição do concurso, para o corrente ano lectivo de 2008/2009. Com o apoio da Câmara de Sesimbra e do Montepio Geral, que dá a guita (o graveto... os euros... essas coisas).

Ora, isto tudo é muito bom: é bom haver quem se interesse em incentivar os jovens a escrever, e - melhor ainda? ou menos mal? - é bom que exista uma instituição financeira que ajude a concretizar as boas intenções dos agentes culturais.

Oxalá fosse sempre assim! Parabéns, Artur Vaz e Ecos D'art, parabéns Câmara de Sesimbra e parabéns Montepio (com essa boa acção já tiveram direito a duas referências à borla aqui no blogue das vitorinices, hein?).

Eu tive o prazer de colaborar na primeira edição do evento. Foi assim: há coisa de um ano, o Artur Vaz convidou-me para fazer parte do júri (ser um dos avaliadores dos poemas entregues a concurso); a minha primeira reacção foi dizer que não tenho competência para avaliar poemas de ninguém; a minha segunda reacção foi pensar que seria muito estimulante ter a oportunidade de ler novos poemas de novos autores; aceitei, e fiz muito bem, se querem que vos diga.

Fiquei a conhecer, então, poemas de jovens muito talentosos e - eventualmente - com capacidades para desenvolverem as suas aptidões literárias. O concurso tinha 3 escalões: dos 7 aos 10 anos, dos 11 aos 15 anos, e dos 16 aos 18 anos. Em todos encontrei poemas muito interessantes. E, como receava, tive alguma dificuldade em cumprir a função de "avaliador" que me foi incumbida.

Agora a Ecos D'art editou o livro do concurso (edição 2008). Eu aproveito para começar a divulgar, nos meus blogues, os textos de alguns autores que participaram no evento. Para já, estimadíssimos leitores deste blogue, deixo-vos um poema que se intitula, mesmo a propósito, "A Força das Palavras" (no "post" abaixo deste). Outros poemas (e prosas) da mesma colheita estarão disponíveis em breve no Debaixo do Bulcão.

A força das palavras


Palavras...
As palavras têm força,
têm a força que têm.
Começamos a guerra com palavras,
fazemos a paz também.
Há palavras que são de todos,
palavras que não são de ninguém,
as que me dizem os outros
e as palavras de minha mãe
As palavras têm força.
Há que diga que não têm!
Que a força está na espingarda,
na ponta de uma navalha.
Mas no tribunal é que vêem...
que isso não vale nada,
e são presos só pela força da palavra.
As palavras têm força,
a força que nós lhes damos.
Essa é a força que têm.
A força das palavras.


poema de
Bruno Ricardo dos Santos Clemente
aluno da Escola E.B.2,3/S Michel Giacometti
premiado no concurso
A Força das Palavras - Prémio Literário Sesimbra Jovem,
edição 2008