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quarta-feira, abril 04, 2012

Phylosophya


Um dia, Toniano Arclos proclamou:

- O mundo não existe, sou eu que o invento. E talvez mesmo eu não exista, se aquele que me inventou se contenta em me imaginar.

- Oh, discípulo infame, oh degenerado! - respondeu-lhe, com pesar, o severo
Mestre Rinotiv. - Julgas, pois, que em semelhantes formas de forma obtusa se pode verter o mel que te destinei?

Toniano Arclos tremeu, perante a ira do mestre. Mas Rinotiv prosseguiu:

- Julgas tu, discípulo ingrato, ter o hálito divino por guia das tuas caminhadas intelectuais? Abre a mente e não mintas ao teu próprio âmago. Isto é, se queres saber! O mundo só existe, para ti, se o quiseres. Mas isso pouco lhe adianta. Não queiras, e o mundo continua a ser o que é, tu pouco lhe importas.

- Mas, Mestre... - atreveu-se o relutante Toniano - acho em seu discurso a contradição fundamental, aquela que existe no meu medo de existir não existindo, de não existir existindo. Se eu invento, como podeis vós, minha invenção, falar assim? Se me inventais, como posso eu sentir que sou não inventado?

- Pequena cousa é essa contradição...

- Não termina neste ponto, ó meu mestre. O difícil é ter o mundo na cabeça, se quiser, e no entanto ele continuar a existir, como vós afirmais, e, existindo, existir mesmo que eu o não queira...

- É essa a tua dúvida, discípulo hesitante?

- Sem dúvida, Mestre, que esta é a minha primordial e infinita dedução do indizível.

- Inefável se diz, oh desvairado! E quanto ao teu não saber do mundo, ele em si é já um pouco sábio; é sábio pelo que tem de inefável, sábio é pelo que tem de precipício, ou princípio de contradição. Perturbo-te, discípulo temeroso? Mas explico. Conheces aquele velho e brejeiro dito "se a pedra no deserto é desconhecida da minha pessoa, será lícito eu crer que ela exista?" e conheces o outro, quiçá não menos brejeiro porém superlativamente assertivo, "a pedra no meio do deserto não existe enquanto eu dela não tomar conhecimento"?. Conheces?

- Sim, Mestre, deveras conheço.

- Pois bem. Aquilo a que se chama realidade é por nós entendida segundo diversas alegorias. Há quem lhe chame labirinto, alguns preferem configurá-la como uma espiral; outros ainda dizem ser a realidade uma estória arbitrária e compulsiva, tal um diálogo interminável da mão direita do criador com o seu órgão criativo; e outros inventam... eu sei lá... Tal como o nosso computador central admite e proclama, também eu confesso que só sei nada saber. Mas, ao contrário do nosso computador central, conheço bem que a percepção das cousas que existem neste mundo é uma percepção fisiológica, logo, material, logo, o processo da percepção começa antes de a própria percepção se ter manifestado em todos e em cada um de nós. Entendes isto?

- Difícil é de entender, ó meu Mestre...

- Mas, pobre discípulo, qualquer livro básico de dialéctica psicologico-materialista te informa sobre estas cousas.

- Então, Mestre, somos apenas máquinas de perceber, e o mundo joga e brinca com as nossas fraquezas e imperfeições biológicas?

- Se assim o preferires entender, pode ser uma verdade. Mas lembra-te de entender isto: somos nós, és tu, quem faz o mundo. A pedra que vês, se a vês, não é a mesma que tocas, se lhe tocas. Porque já os átomos de pele e pedra se cruzam, se misturam. E, se a pedra é assim, tocas-lhe com os dedos e já não é; quebras e são duas pedras; imaginas e as pedras para ti se multiplicam. Afinal, a matéria do cérebro, e da mão, e da pedra, é matéria igual. Só a sua organização específica difere em pedra, mão e cérebro. Por fim, ao moldares as pedras que multiplicaste em novas pedras, crias um corpo diferente do teu, feito da mesma matéria, mas diferente por ser realidade nova.

- E a pedra que não vejo, por estar perdida no meio do deserto?

- De essa se pode dizer que tem a felicidade de não conhecer criatura tão terrível para com as pobres pedras dos desertos deste mundo.

- E devo crer que ela existe?
- E ela, deve crer que tu existes?

- Devo, então, Mestre, duvidar?
- Exacto.

- Como ela de mim duvida?
- Sem dúvida!

- Então, duvidar sempre, e de tudo?
- Sempre. E de tudo.

- De tudo?
- E sempre.

- Sempre?
- E de tudo!

- Uau!!!


Affonso Gallo

Texto publicado no poezine Debaixo do Bulcão
editado em Almada, no mês de setembro de mil novecentos e noventa e oito.

Nota: este é o único texto em prosa que se conhece desse obscuro autor almadense que assina com o pseudónimo de Affonso Gallo. De resto, pouco se sabe sobre este autor. Fernão Lopes, na primeira parte da Crónica de El Rei Dom João Primeiro de Boa Memória e dos Reis de Portugal o Décimo menciona um Affonso Gallo que, em 1384, sendo regedor da vila de Almadaã, foi capturado pelo exército castelhano e levado diante dos muros da fortaleza por um cavaleiro gascom de nome Mosse Ymam, muito homem de prol e bom homem de armas, que exigiu aos sitiados a entrega da vila pois, caso contrário, o regedor havia de morrer. E responderam-lhe os de dentro que bem os podia elRei de Castela matar se quisesse, mas que a vila não dariam por cousa alguma que fosse. E como o cavaleiro gascom não lhes deu ouvidos e continuou exigindo a rendição da vila, os de dentro fizerom prestes um trom pequeno e tiraram-lhe dantre as ameias. E foi tal sua ventura que o tiro deu com ele morto por terra e ficou Affonso Gallo vivo de pé (supõe-se, aliás, que é deste episódio que deriva a conhecida expressão popular portuguesa "grande galo!"). Além disto, existe, na toponímia almadense, uma Rua Affonso Gallo. Contudo, os estudos científicos até hoje realizados, bem como as especulações filosóficas sobre o assunto não comprovaram que se trate do mesmo Affonso Gallo - e há, de resto, razões bem fundamentadas para supor que o não seja.

segunda-feira, abril 02, 2012

Polissemia nas imagens (ou na visão dos espectadores?)



Olhemos para estes dois pares de imagens (que andam a circular na internet) . São iguais ou diferentes?

O texto é complemento da imagem? Ou faz parte da imagem?

De que forma a substituição de uma palavra por outra (e a inclusão de cores - às quais associamos significados específicos - nas palavras) altera (ou não altera?) a percepção da mensagem?

E, já agora, qual é a mensagem?

Há, a este respeito, uma frase de Roland Barthes muito citada: "toda a imagem é polissemica e pressupõe, subjacente aos seus significantes, uma “cadeia flutuante” de significados, podendo o leitor escolher alguns e ignorar outros".

Talvez por isso mesmo, o primeiro pensamento que me ocorreu quando vi o primeiro par de imagens foi qualquer coisa como: "disparate! de um lado conceitos culturais, de outro uma visão idílica da natureza... qual é a ideia?".

E só entendi (mas entendi mesmo?) ao ver, depois, o segundo par - que julgo ser o original, pelo que o outro será uma alteração (para não dizer deturpação). As imagens são as mesmas. Mas a legenda (que é imagem, também, ou não? - ou melhor: a imagem é também texto, ou não?) permitiu-me (ou possibilitou-me) uma percepção (leitura) diferente da que tivera em primeiro lugar.

EGO e ECO - o trocadilho, de alguma forma "desdramatiza" a mensagem; mas, por outro lado, torna-a (a meu ver) mais legível. ECO, de ecologia, em vez de "natureza". Ecologia, ciência que estuda as relações dos organismos com o seu meio ambiente (não apenas com os outros seres vivos... mas esqueçamos esse pormenor, para não complicar) em vez de uma "natureza" idealizada (na qual, a levar aquilo à letra, nenhum ser humano sobreviveria durante muito tempo).

Ah, pois, há também a questão de homens e mulheres separados, com o homem em cima na estrutura piramidal e ambos misturados indiscriminadamente com a restante bicharada na estrutura circular. Sim, percebi a ideia, estejam descansados. Essa era a parte mais fácil.

Num mundo em que estamos expostos (e nos expomos) a um fluxo constante de mensagens, e em que somos cada vez mais tanto emissores como receptores, há que ter atenção (ou cuidado) com as imagens que emitimos - e que podem, muito bem, ter o efeito contrário ao desejado. Nunca devemos dar como garantido que o "público alvo" da nossa mensagem tem as mesmas referências que nós e que, portanto, a vai entender tal como nós a entendemos. A descodificação é uma coisa tramada.

E isto é válido para as imagens que escolhi para ilustrar este artigo, tal como é válido, por exemplo, para cartoons que comparam vândalos urbanos com vândalos financeiros, ambos a incendiar coisas; imagens com supostas criancinhas africanas desnutridas que são postas a circular com a legenda "partilhem, pode ser que assim as multinacionais se comovam e ajudem"; ou as fotos (e vídeos) de cargas policiais e outras violências, espontâneas ou encenadas, aqui, no México, na Ucrânia ou no Cú de Judas (que, na internet, é já ali adiante).

A overdose de imagens está a fazer de nós espectadores acríticos? Confusos, sem capacidade de descodificar? Defensivos, procurando, na multiplicidade de ofertas (veja-se o caso da televisão por cabo ou das "redes sociais" da internet) apenas o que nos interessa e nos conforta (ou, alternativamente, o que nos interessa porque nos horroriza e desconforta), ignorando tudo o resto?

Não sei. Mas nunca fiando...

sábado, janeiro 28, 2012

Pois é...

Ao fim de 5 anos, decido finalmente mudar o nome deste blogue. Chamava-se coisitas do vitorino, porque originalmente não era mais do que isso mesmo: um blogue onde metia esporadicamente umas coisitas em forma de poesia. Era pouco mais que uma brincadeira para complementar o blogue onde pretendo divulgar e manter vivo o meu principal projecto: o Debaixo do Bulcão.

Mal adivinhava eu que este acabaria por suscitar mais interesse que o do bulcão.

Mas pronto, foi isso mesmo o que aconteceu. O interesse suscitado por este blogue levou-me também a colocar aqui outro tipo de conteúdos. E assim, mais tarde ou mais cedo, teria que mudar também o título. Isto já tinha deixado de ser apenas um espaço para floreados poéticos ou desabafos pessoais.

A mudança acontece agora, mais tarde que cedo. Hesitei muito, porque este blogue já era conhecido - e mencionado - como coisitas do vitorino. E não tenho muito jeito para desenrascar títulos porreiros para blogues, confesso.

A nova designação pode não ser grande coisa. Mas, pelo menos, deixa de induzir em erro. Penso que a partir de agora ninguém virá aqui parar por ter procurado qualquer homónimo que tenha ganho notoriedade já depois de eu começar a assinar os meus trabalhos literários e jornalísticos como António Vitorino.

Só vantagens, portanto.

sexta-feira, dezembro 23, 2011

três poemas de natal


RESPOSTA DA VAIDADE HUMANA AO MENINO JEJUM

o menino jejum nasceu a 25 de dezembro desse ano
e veio a falecer (morreu portanto) a 25 de dezembro desse mesmo ano.
a sua fugaz passagem por este mundo breve
apenas serviu para confrontar a vaidade humana
com as humildes perspectivas de quem muito poderia fazer
neste mundo se aqui tivesse vivido mais tempo.
a vaidade humana encolhe os ombros
e diz que viver neste mundo mais tempo
sem fazer nada
é bem melhor que morrer apressadamente
sem fazer tudo aquilo que poderia vir a fazer
e ainda por cima em jejum.



RESPOSTA DO MENINO JEJUM À VAIDADE HUMANA

aqui do alto assunto a que ascendi
vejo bem o quanto és vã ó vaidade humana
e só não te perdoo porque tu lá sabes
muito bem aquilo que fazes.
(aliás é essa a única coisa que tu sabes.)
muito eu te poderia ensinar sobre o não ser
mas sei também que tu não queres aprender
porque aprender implica trabalhar, como bem sabes.
apenas te digo que já não estou em jejum
pois agora que ascendi a um alto assunto
aqui me alimento com todas as palavras do mundo:
sou um poeta.
e mais não digo
porque no alto assunto a que ascendi o meu latim é muito caro.
ó vaidade humana que te contentas em ser apenas
a vaidade humana:
continua a dormir bem vaidade humana
que eu fico acordado a aprender
e a escrever
mas sei que quando me for deitar
também dormirei bem
embora sonhe sonhos um bocado bem diferentes
dos sonhos que tu sonhas ó vaidade humana.



RESPOSTA DA VAIDADE HUMANA À RESPOSTA DO MENINO JEJUM À VAIDADE HUMANA

a inveja exacerbada (companheira de quarto da vaidade humana)
acordou ao meio dia e vinte e três a vaidade humana
do sonho hiperactivo no qual como habitualmente hiperagia
para lhe dizer que do planeta alto assunto a que ascendeste
recebera uma comunicação urgente do menino jejum.
a vaidade humana refilou um pouco não muito com a inveja exacerbada
(a vaidade humana refila sempre com qualquer um
ou qualquer uma que a acorde ao meio dia e vinte e três)
e por uma vez na sua hiperactiva vida
dispôs-se a fingir que ouvia uma comunicação
vinda do planeta alto assunto a que ascendeste.
depois disse eu quero é que te vás f*der
e voltou para o seu sonho hiperactivo
onde sempre hiperage
queira ou não queira o menino jejum
ou qualquer outro habitante do planeta alto assunto a que ascendeste.



A.V., 2003

Imagem: "Um theatro de marionettes no parque de Vienna"
(Jornal do Domingo, Lisboa 1887)

domingo, junho 19, 2011

O cartaz da Festa da Amizade de 1985


Durante muitos anos, o PCP realizou, em Almada, uma versão local da Festa do Avante: era a Festa da Amizade (e sobre ela já escrevi aqui).

Em 1985, a Concelhia de Almada - organizadora do evento - abriu concurso público para o cartaz de divulgação da festa desse ano.

Aos concorrentes, pedia-se um trabalho a 3 cores, que incluisse a frase-lema dessa edição (Alegria, Confiançe e Luta!) e, naturalmente, a identificação da entidade organizadora.

Eu concorri e ganhei, com o cartaz que agora vos apresento e que é, evidentemente, inspirado nos arraiais populares desta época do ano.

É um trabalho em tricromia (azul, amarelo, magenta) todo feito à mão (o fundo e as letras brancas são a lápis de cera sobre papel com textura; as outras letras e elementos gráficos são recortes de papel colorido).

Com o fundo a azul, porque é a cor que melhor resiste quando exposta ao sol, nas paredes. Com o símbolo do PCP integrado no conjunto de instrumentos musicais populares, para reforçar a ideia de alegria e confiança na luta, conforme era sugerido pelo regulamento do concurso. E com o nome da entidade organizadora por extenso, porque era assim mesmo que eu gostava (e gosto) de a ver designada: Comissão Concelhia de Almada do Partido Comunista Português!

A intenção era que o cartaz resultasse em exposição "individual" mas também em sequência. Assim:


E resultou!

Para mim que - embora fizesse já há vários anos trabalhos gráficos no atelier do Centro Cultural de Almada - não estava habituado a ver coisas minhas nas paredes da cidade, foi muito gratificante. Mais que o prémio... que, sinceramente, já nem me lembro o que era - mas suponho que incluia livros, da Caminho ou da Avante. Outros tempos, não é?

terça-feira, junho 14, 2011

1985: uma colaboração para o DN-Jovem


Em 1985, vagamente inspirados pelo Zig Zag, programa da televisão portuguesa apresentado pelo lendário Luís Pereira de Sousa - Programa semanal transmitido pela RTP na primeira metade dos anos 80, nas tardes de Domingo. Diversos convidados demonstravam habilidades nas suas respectivas artes e ofícios. A rubrica dedicada aos jogos de computador do ZX Spectrum tornou-se muito popular, na época. (Wikipédia dixit) - eu e o meu amigo e colega do Centro Cultural de Almada, Jorge Figueira, decidimos fazer o que acima vos mostro (cliquem na imagem para ampliar, ver os bonecos e, se tiverem paciência, ler o texto).

Fizémos e enviámos para o não menos lendário Dn-Jovem (suplemento semanal do Diário de Notícias).

Enviámos, e eles publicaram.

Só depois de publicado, alguém na redação do DN-Jovem reparou que "este aqui parece o Luís Pereira de Sousa"... Olharam melhor e acabaram por desconfiar também das semelhanças entre o Dr. R.A. Betta Motta e um na época badalado - e badalador - jornalista e comentador político chamado Francisco Sousa Tavares.

- Seus malandros! - disse, entre sorridente e encavacado, o grande Manuel Dias, director da publicação.

E, a partir daí, começou a ter mais cuidado com o que enviávamos.

Um boneco vagamente parecido com Daniel Proença de Carvalho ainda passou à justa (Olha o Proença! E nós: Não! Nããããoooo ééé o Proooença!!!).

Mas outro, em que um jornalista chamado Manolo de Cadavez Mata entrevistava uma senhora chamada Sallete Magna (que tinha ligeirissimas semelhanças com a cantora Collete Magny) não passou, de todo.

"Porque" - justificou o Manuel Dias - "o Cadafaz de Matos não está no país e era incorrecto estar a publicar um boneco dele sem pelo menos lhe dar conhecimento!"

"Mas não é o Cadafaz! É o Cadavez!"

"Pois, pois..."

PS: O texto tem, como é evidente, muitas piadas datadas. "É verdade que se vai candidatar?" - é uma referência às "pré-candidaturas" às eleições presidenciais de 1986. "Bloco central" - governo PS/PSD que então estava no poder. "Dizeria" é uma expressão que ficou célebre num debate televisivo sobre ensino em Portugal. O "sketch" com a personagem "Derrota Secundária" é uma piada a uma publicidade protagonizada pela então muito famosa actriz Victoria Principal. O Salazar mencionado no texto é Alberto salazar, atleta que ficou em 2º lugar na maratona dos Jogos Olímpicos de 1984, ganha por Carlos Lopes."Heróis do Mar, Nobre CLIC" porque naquele tempo a televisão não emitia, como hoje, 24 horas por dia e, no encerramento, passava sempre o Hino Nacional - que ninguém ouvia até ao fim, obviamente.

quinta-feira, dezembro 30, 2010

29 de Dezembro de 1990: a minha primeira exposição de fotografia


Há 20 anos estava eu a expor alguns trabalhos de fotografia numa colectiva de apoio à candidatura presidencial de Carlos Carvalhas, no Ritz Club, em Lisboa.
Essas fotos andaram perdidas até 2008. Nessa altura, decidi fazer este vídeo, para ficar com um registo da coisa, antes que se volte a perder. Divirtam-se.

domingo, março 21, 2010

"Néctar e poesia", no Dia Internacional da dita!


LIRISMO INSUPORTÁVEL


lenta, a corrosão.
pingo a pingo
desdobra-se o estertor da pedra. lenta
a definição das áreas mais favoráveis ao corpo.
penso
rapidamente a pétala prossegue
a fundamental contradição dos lírios.

néctar e poesia.


Poema meu, de
O Ciclo da Serpente - premonições deveras líricas
edição Poetas Almadenses, colecção Índex Poesis, caderno 76.
Almada, dezembro de 2009

segunda-feira, dezembro 28, 2009

Vade retro


quando olhas pela janela do metropolitano entre anjos e socorro
desconfias que por trás do veloz muro
lá bem entranhado na laboriosa terra há um resto
de fenícios já tardios que ali na terra tombaram.
deixaste atrás de ti um capitel grego em arroios
e uma bexiga de porco medieval em alvalade.
apontas para pontinha. mas vais suspeitar de mouros no saldanha
e de peste que só mata castelhanos lá no rato.
entopes-te toupeiramente mesmo em baixo do marquês
e sais ofuscado de luz em campo grande.
então finalmente pensas:
no tempo em que alexandre o'neill pisava o chão da cidade
era bem mais pequena a rede: era ridícula
e hoje finalmente já não é.

António Vitorino (eu)


Poema publicado em Debaixo do Bulcão poezine
número 20 - Almada, Dezembro de 2002

recordado agora a propósito do aniversário do Metropolitano de Lisboa
(e sim, foi influenciado pelo "slogan" de Alexandre O'Neill "vá de metro satanás" - proposto pelo poeta/propagandista, mas nunca aceite - vá-se lá saber porquê - pela empresa do Metro de Lisboa; a foto, que documenta a inauguração de uma das primeiras linhas do metro lisboeta, foi recolhida algures na internet - mas infelizmente já não me lembro de onde a tirei)

sexta-feira, dezembro 18, 2009

O Ciclo da Serpente em Almada





Quero agradecer a todos os que fizeram questão de não faltar a este evento. Foram poucos mas bons. E tiveram a oportunidade de assistir a um grande recital de poesia, pelos actores (e poetas, também eles) João Vasco Henriques e José Vaz.
(Fotos de Rui Tavares)

quarta-feira, dezembro 16, 2009

ÍCARO


atormentaste a solidão do impossível e os castigos
da poesia.

muito cedo se fez corpo em teu dia. muito cedo
amaste outro labirinto.

ícaro,
caiste para salvar a humanidade. ora pro nobis.


António Vitorino

O Ciclo da Serpente - premonições deveras líricas (1989)
Edição Poetas Almadenses, colecção Index Poesis.
Almada, Dezembro de 2009

É hoje!


Depois de quase três décadas a guardar papelada em gavetas, publico finalmente um livrito que se veja. Chama-se "O Ciclo da Serpente - premonições deveras líricas". Foi escrito em 1989, mas só vai ser editado em livro agora - muito devido ao incentivo e à insistência (no bom sentido, claro!...) do professor Alexandre Castanheira (que, de resto, escreve um notável prefácio a este livro - e à minha "obra literária" não editada, que ele conhece como poucos).

O lançamento é hoje - quarta-feira, 16 de Dezembro de 2009 - a partir das 21h30, na Sala Pablo Neruda do Fórum Municipal Romeu Correia (biblioteca central de Almada).

A edição é do colectivo Poetas Almadenses (associação informal de autores cá do burgo).

A seguir à apresentação do livro, José Vaz e João Vasco Henriques farão a leitura dos poemas, num recital sonorizado pelo projecto "O Burro e o Cigano". Se os meus estimados amigos e potenciais leitores quiserem, também posso dar autógrafos no final (apesar de não ter jeitinho nenhum para essas coisas). Infelizmente não vos posso oferecer um copito com qualquer coisa dentro. A menos que água vos satisfaça.

Aproveito o ensejo para lembrar que, no sábado à noite, farei a apresentação deste livro em Moura, no Teatro Fórum.

Não quero deixar de agradecer, também, à directora da colecção Index Poesis, Ermelinda Toscano (como e óbvio, sem a sua colaboração e empenho seria impossível publicar este livro), ao Rui Tavares (autor da capa e contra-capa do livro), à Sofia Chanoca (a modelo que, sem saber muito bem como, se viu metida nesta "alhada"), aos actores que vão fazer a leitura dos poemas. E, por último mas não menos importantes, a Andreia Egas e Jorge Feliciano - que me vão receber (receber bem, espero...) em Moura!

quinta-feira, outubro 01, 2009

Vampiros bem vestidos e bem falantes

Às vezes penso que este país (Portugal) ficou à mercê de "vampiros". Muito apresentáveis, é certo: bem vestidos e bem-falantes. Mas vampiros.

Vem isto a propósito, ainda, da notícia do DN que nos deu a conhecer: o caso de um belga que, apresentando-se como "Príncipe da Transilvânia" (província romena, mundialmente famosa por ser a "terra do Conde Drácula") vigarizou três câmaras do Alentejo. Entre elas, a de Évora (presidida pelo muito prestigiado - porque competente, suponho) autarca do PS, José Ernesto Oliveira.

Escrevi sobre isso um texto de reflexão, para o "meu" Facebook. Decidi partilhá-lo com todos. Está na caixa de comentários deste "post".

sexta-feira, maio 29, 2009

Obrigado pela preferência e voltem sempre!

Nos últimos 12 meses este blogue teve mais de 10 mil visitas. Quero agradecer a todos os que por aqui passaram, aos que deixaram opiniões e outros comentários - e, especialmente, aos que se tornaram já visitantes habituais.



Depois deste agradecimento politicamente correcto, quero também esclarecer duas ou três coisas.

A saber: sim, é muito agradável verificar que temos quem nos leia - mas eu não vim para a "blogosfera" com a intenção de ser muito popular nem de participar em nenhum "concurso de beleza". Comecei este blogue como uma brincadeira, ou melhor, como uma forma de me incentivar a escrever poesia ou coisas aparentadas com poesia (aliás, o meu "site" principal era - e não deixou completamente de o ser - o Debaixo do Bulcão).

Não queria fazer muita publicidade a mim próprio. Nunca fui muito de o fazer.

No entanto, a partir de certa altura (ou seja: quando certas mentes supostamente muito esclarecidas "descobriram", entre outras coisas, que eu nunca fiz nada de jeito na vida...) achei que não seria má ideia divulgar aqui algumas... coisitas da minha actividade profissional (enquanto jornalista) e artística (em várias áreas).

Espero ter contribuido para esclarecer quem, aparentemente, precisava de ser esclarecido.
E se isso for útil também a todos os restantes leitores deste blogue, melhor ainda!

A avaliar pelo número de visitas, talvez tenha valido a pena. (Desculpem lá a eventual falta de modéstia, ou qualquer outra coisinha).

quinta-feira, novembro 20, 2008

Brasil-Portugal? Para mim dá (quase) sempre empate!


O que eu quero dizer com o título desta crónica é que, entre selecções de Portugal e do Brasil, pode vencer uma ou a outra que, normalmente, eu fico satisfeito. Se Portugal vencer, melhor. Se vencer o Brasil, não fico triste.

(Lembro-vos que nasci no Rio de Janeiro, mas a minha família vive toda em Portugal. E só recentemente adquiri a nacionalidade portuguesa. Logo, "torço" pelos dois países. E não apenas nestas coisas do futebol.)

Asim sendo, gostei muito do jogo de ontem. Portugal fez asneiras das que se pagam caro e o Brasil deu "show de bola" (ou, como se dizia antigamente em terras lusas, "deu um baile").

Claro que, não fosse um jogo "a feijões" talvez eu estivesse a apoiar mais a selecção das quinas. Como aconteceu, por exemplo, em 1991, no Mundial Sub-20, em Lisboa. Lembro-me que estava a trabalhar, a passar som nas Festas do Barreiro, a ouvir o relato do jogo na rádio - mas quando chegou a vez dos penáltis, qual trabalho qual quê: larguei tudo, fui a um café ali perto ver a coisa na TV e fartei-me de pular de alegria.

Já em 1994, nessa chatíssima final do Mundial entre o Brasil e a Itália, estava a torcer incondicionalmente pelo Brasil - e, em particular pelo goleiro Taffarel.

Em 1998 foi para esquecer... Aliás, nem vi o jogo: estava em Setúbal, na redacção da Sem Mais, sozinho, a fechar a edição do Jornal da Região, com um olho no écran do computador e o outro no écran da TV. Mas parece que não perdi grande coisa (humpf!...).

Enfim, a minha intenção não é estar aqui a maçar-vos com episódios da minha monótona vidinha.

O que eu quero mesmo é chamar a atenção para o "fair-play" e sentido de humor manifestado pela Embaixada de Portugal no Brasil. Lê-se no blogue da instituição (de onde, a propósito, retirei a imagem que encabeça este artigo):

«Confirmando a tradição de ser sempre o primeiro no Brasil, Portugal fez o golo inaugural na história no novo Estádio Bezerrão, na cidade do Gama, nos arredores de Brasília, no jogo amigável entre as selecções de futebol dos dois países, que inaugurou aquela instalação desportiva.»

O texto completo econtra-se aqui:

sábado, novembro 17, 2007

A lebre fumadora e a tartaruga desportista


Hoje, dia em que se assinala uma data qualquer contra o tabaco, eu (que sou um ex- fumador, mas ainda não muito convicto) lembrei-me de uma estória, passada num outro dia contra o tabaco (porque existem dois, sabiam?), neste caso, em 31 de Maio de 1993.
Aviso já que a estória não é nada de especial, nem sequer tem muita piada (logo, talvez não dê para rir - desculpa lá, ó Luís Milheiro...).


Então... era uma vez...

... o António Vitorino, ainda modesto aprendiz de jornalista, na Rádio Baía. Que, precisamente por ser um modesto aprendiz de jornalista, queria fazer coisas que lhe dessem experiência. Vai daí, oferece-se para, fora do horário de serviço, ir ao Jardim de Almada fazer a reportagem de uma iniciativa anti-tabagista, no “Dia Mundial do Não Fumador”, 31 de Maio desse ano de 1993.

E foi mesmo.

Assim, nesse dia, entra em directo no noticiário da Rádio Baía (às 17 horas), editado a partir do estúdio por uma jornalista, ainda “tenrinha” mas já competente, chamada Susana André (esclareço já que sim, é a Susana André que está agora na SIC – e não, não estou a brincar quando digo que ela já era competente, apesar de ainda profissionalmente “tenrinha”). E entra com a seguinte estória (a tal que não tem piada), tque aqui transcrevo, quase literalmente, a partir dos registos magnéticos dessa época (alguns dos – poucos – que consegui salvar...):

Depois de explicar - tipo lied da notícia, como lhe tinham ensinado a fazer - que aquela actividade reunia no Jardim de Almada crianças e jovens dos ATL do município almadense, das escolas secundárias e preparatórias de Almada, e também a Escola Secundária de Amora e técnicos do CIAC (Centro de Informação Autárquica ao Consumidor) de Almada, o aprendiz de jornalista afirma (e passo a citar):

«A doutora Graziela» (acentuando bem o Graziela, que é um nome bonito e agradável de dizer em rádio...) «do Centro de Saúde Ocupacional de Almada, pôs esta questão: se fumar faz mal,e toda a gente sabe, então, porque é que se começa? E a resposta poderá ser mesmo esta:»

(entra então um RM – abreviatura usada em rádio para “registo magnético” - ou, se preferirem, uma gravação, com a voz da doutora Graziela a dizer o seguinte)

«Um dia interroguei à volta de quinhentos jovens e perguntei-lhes porque é que fumavam. Esses jovens tinham entre 14 e 19 anos. Eles sabiam que o tabaco causava problemas de saúde. A maior parte deles, à medida que iam crescendo, tinham-se esquecido desses problemas e tinham sido vencidos pelos seus grupos, pelos pares, pelos pseudo-amigos, que os levavam a fumar. A maior parte deles diziam que fumavam única e simplesmente porque os amigos fumavam, e não era possível pertencerem ao grupo se não fumassem.
Mais uma vez vos digo: é acima de tudo necessário muita coragem, muita inteligência. Demonstrem-no não fumando, mesmo junto daqueles que fumam.
Viva a vida sem tabaco!»

(O RM acabava aqui. A seguir, entra novamente, em directo, o Vitorino)

«
Ora aí está: “viva a vida sem tabaco!” (...) Depois, subiram ao palco jovens dos ATLs da Câmara de Almada, recriando a fábula da lebre e da tartaruga. A tal corrida que a lebre tem todas as as condições para vencer, e... E daí, não sei... É que a lebre, ultimamente, anda a fumar tanto!..»

E pronto, o Vitorino calava-se aqui. Dava por concluída a sua hããã... “reportagem”, não?

Estranhamente, do estúdio só saiu silêncio, durante alguns momentos.

Fiquei a saber, depois, que a coisa deu-lhes para rir. É que, nessa altura, o Vitorino fumava que nem uma chaminé (só não fumava no estúdio porque não podia, mas na redacção fazia dos outros pobres fumadores passivos). E a jornalista de serviço achou melhor não se rir em directo – portanto, desligou o microfone enquanto dava a tal gargalhada.

E é claro que, durante algum tempo, eu fiquei conhecido, na Rádio Baía, como a “lebre fumadora”.

Portanto a propósito do dia não sei quantos contra o tabagismo (um dos pelo menos dois que existem), não me lembrei de coisa melhor que esta estória insonssa (mas eu avisei que não tinha piada, não avisei?).
E podia ser pior: podia não ter nada para contar, e limitar-me... sei lá, a criticar os outros.... Há gente assim, e eu até conheço alguns. Vocês não conhecem?

(Para esclarecer eventuais confusões, sobre datas de iniciativas anti-tabagistas, esta página talvez ajude:
www.minerva.uevora.pt/publicar/wq_fumar/ )

Foto: estátua em Boston, EUA, retirada daqui:
ja.northrup.org/photos/boston/turtle-and-rabbit-statues.htm

quarta-feira, outubro 10, 2007

Um ano sem tabaco. (A sério!...)

Pois é: faz hoje um ano que fumei o meu último cigarro (último até ver...).
Então, vai daí... olha, apeteceu-me comemorar!
Claro que podia comemorar, amanhã, o primeiro aniversário do primeiro dia sem fumar. Mas eu sei lá se amanhã não me dá uma coisinha má! Assim, o melhor é aproveitar enquanto ainda cá ando. Não vos parece?

Para assinalar a data não descobri nada melhor que este poema, publicado na edição 28 do Debaixo do Bulcão poezine. Não tanto pelo poema (não tem nada a ver...) mas pelo desenho no qual ele está “enrolado”. É que, assim, mato dois coelhos de uma só cajadada: alimento o meu ego (é para isso que servem os blogues, não é?) e chamo a atenção para o novo projecto internético do autor desse desenho, que é o Jorge Feliciano, e que tem mais bonitos rabiscos feitos por ele próprio sem pedir ajuda a ninguém, no sítio a que podem aceder clicando em

jorgefeliciano.blogspot.com

Vejam também o que ele anda a fazer profissonalmente, no blogue do Teatro Fórum de Moura. E, quando puderem, visitem Moura. (Eu cá, quando puder, hei-de fazer isso mesmo: é uma das minhas cidade preferidas, garanto-vos!)

terça-feira, junho 19, 2007

O último cliente deste bar




são horas de fechar: vamos embora
abrir mais um capítulo da noite
lançar a outro vento a nossa sorte
esquecer essa verdade que demora

a olvidar. já sei que está na hora
de pôr na rua alguém que mais se afoite
mas minha tibieza faz-se forte
para mostrar firmeza enquanto chora

só por dentro da sua própria máscara:
que ao transpor a porta deste bar
ainda grito e bebo às gargalhadas

como se assim escondesse esta lástima
de saber que sair é mais que errar
que estas palavras são todas falhadas.


Affonso Gallo
(Junho 2003)
affonsogallo.blogspot.com

Foto: Miguel Nuno Vargas
"Closing Time"

wiguelnuno.blogspot.com

segunda-feira, maio 21, 2007

Profeta?

não te baste afirmá-lo
melhor é mesmo sê-lo
e ainda que o sejas
melhor é calá-lo.
a tua verdade
te deve bastar:
afirma tão-só
a tua verdade.
sê para o tempo presente
um poeta
(o que já não é pouco
no tempo presente)
e deixa que o tempo
se encarregue de mostrar
e demonstrar
se a tua verdade
além de ser hoje a tua verdade
(o que já não é pouco)
virá também a ser uma outra
verdade.

ninguém é profeta
no seu próprio tempo.



António Vitorino
poema publicado em Index Poesis,
colecção dirigida por Ermelinda Toscano
(caderno nº14 - Cacilhas, 2003)

um pequenino poema - "prosaico", como são quase todos os meus poemas - que hoje decidi meter neste blog só para desenjoar de tanta "realidade"...

quinta-feira, março 22, 2007

André, ou uma fábula para os nossos tempos









andré (que em tempos foi um jovem escritor
mas hoje já não o é) procura
emprego (ou talvez mesmo trabalho)
nestes tempos conturbados & de crise acerrimamente cerrada.
ele (que julga ter ainda "o dom da palavra")
já procurou nos jornais regionais
e a seguir nas rádios regionais
mas os jornais e as rádios regionais só aceitam
(poucos) recém-licenciados de preferência daqueles que pensam
que abu dhabi é uma piada dos desenhos animados que os pais viam
que um falacioso é alguém qua fala fluentemente (está-se mesmo a ver)
e que escrevem
com cê aquilo que o victorino usa
nos (raros) dias em que se enforca com uma gravacta.
é um fato
que vivemos hoje muito mais esfomeados
ó meus caros predatórios concorrentes, diz andré.
por isso (sua triste conclusão) apenas lhe resta
inscrever-se no concurso público da câmara
alimentar-se talvez do lixo municipal
e de vassoura na mão
ser um "escrivão da pena grande"
(como certamente não lhe chamaria alexandre o'neill).



António Vitorino


Cf. o poema "Formas da Violência", de Alexandre O'Neil,
num outro blog:
spectrum.weblog.com.pt/arquivo/2004/11/formas_de_viole.html