Há memórias que nunca saram.
“Como lidar com a morte de alguém quando o seu corpo não aparece? Esta é a história de Dong-ho, um rapaz que não resistiu a seguir o melhor amigo até à manifestação, mas, quando ouviu os tiros, largou-lhe a mão, procurando-o agora entre os cadáveres de uma morgue improvisada. E é também a história dos que cruzaram o caminho de Dong-ho antes e depois dessa noite infame – os que caíram por terra desarmados e os que foram levados para a prisão e torturados; os que sobreviveram ao terror mas nunca mais conseguiram falar do assunto e os que, tantos anos passados, sabem, tal como Han Kang, que a história pode repetir-se a qualquer momento e que é preciso lembrar os atos brutais de que os humanos são capazes.”
Coreia do Sul, Maio de 1980.
Estudantes protestaram em todo o país contra o prolongamento da lei marcial, o encerramento de universidades e maiores restrições à liberdade de imprensa.
Na cidade de Gwangju a repressão contra os estudantes foi tão violenta que a população e os sindicatos se juntaram a eles no protesto contra o ditador Chun Doohwan, sucessor do presidente assassinado Park Chung-hee, que durante quase duas décadas governou o país com mão de ferro.
A brutalidade da polícia e do exército, que até usou lança-chamas contra cidadãos desarmados, provocou 165 mortos, segundo fontes oficiais. Nunca foram divulgados os números de presos, torturados e desaparecidos.
Han Kang nasceu e viveu em Gwangju até aos nove anos. Não presenciou o massacre. A família tinha-se mudado para Suyuri, nos arredores de Seul, quatro meses antes.
Em 2013, quando tomou posse como presidente a filha de Park Chung-hee, “o passado veio ao de cima e arrancou as ligaduras que cobriam feridas antigas para os habitantes de Gwangju, entre eles, Han Kang”.
Serão os seres humanos cruéis? Será a experiência da crueldade a única coisa que partilhamos enquanto espécie? Não passará a dignidade a que nos agarramos de uma ilusão para disfarçarmos, perante nós, esta simples verdade: que cada um de nós pode ser reduzido a um inseto, um animal voraz, um pedaço de carne? Que ser aviltado, magoado, esquartejado... é o destino essencial da humanidade, um destino cuja inevitabilidade a História confirmou?
“Atos humanos", misto de ficção e realidade, é um comovente e corajoso relato do massacre de Gwanjiu e um alerta para “os atos humanos de que todos nós somos capazes, atos brutais e atos generosos, atos básicos e atos sublimes”.
A sinopse prepara-nos para o que vamos ler, mas... não é fácil, não!
Tal como em “A vegetariana” - o primeiro romance de Han Kang, vencedor do Man Booker International Prize - a trama é complexa, com muitas personagens (algumas existiram mesmo), e vários narradores (alguns também personagens) a desenvolver em saltos constantes entre passado e presente uma história de dor e violência, que dá voz aos mortos, aos desaparecidos, aos brutalmente torturados. Dor e violência que se lê e vê na limpidez de uma escrita rigorosa e poderosa.
Como disse “The Independent” - «Atos Humanos é de tirar o fôlego.»
Quando morreste, não pude fazer-te um funeral,
e, assim, a minha vida tornou-se um funeral.
Para ler e reflectir sobre a capacidade destrutiva e sombria da humanidade.
Atos humanos, de Han Kang
Tradução de Maria do Carmo Teixeira
Ed. D. Quixote, 2017
227 págs.
“Como lidar com a morte de alguém quando o seu corpo não aparece? Esta é a história de Dong-ho, um rapaz que não resistiu a seguir o melhor amigo até à manifestação, mas, quando ouviu os tiros, largou-lhe a mão, procurando-o agora entre os cadáveres de uma morgue improvisada. E é também a história dos que cruzaram o caminho de Dong-ho antes e depois dessa noite infame – os que caíram por terra desarmados e os que foram levados para a prisão e torturados; os que sobreviveram ao terror mas nunca mais conseguiram falar do assunto e os que, tantos anos passados, sabem, tal como Han Kang, que a história pode repetir-se a qualquer momento e que é preciso lembrar os atos brutais de que os humanos são capazes.”
Coreia do Sul, Maio de 1980.
Estudantes protestaram em todo o país contra o prolongamento da lei marcial, o encerramento de universidades e maiores restrições à liberdade de imprensa.
Na cidade de Gwangju a repressão contra os estudantes foi tão violenta que a população e os sindicatos se juntaram a eles no protesto contra o ditador Chun Doohwan, sucessor do presidente assassinado Park Chung-hee, que durante quase duas décadas governou o país com mão de ferro.
A brutalidade da polícia e do exército, que até usou lança-chamas contra cidadãos desarmados, provocou 165 mortos, segundo fontes oficiais. Nunca foram divulgados os números de presos, torturados e desaparecidos.
Han Kang nasceu e viveu em Gwangju até aos nove anos. Não presenciou o massacre. A família tinha-se mudado para Suyuri, nos arredores de Seul, quatro meses antes.
Em 2013, quando tomou posse como presidente a filha de Park Chung-hee, “o passado veio ao de cima e arrancou as ligaduras que cobriam feridas antigas para os habitantes de Gwangju, entre eles, Han Kang”.
Serão os seres humanos cruéis? Será a experiência da crueldade a única coisa que partilhamos enquanto espécie? Não passará a dignidade a que nos agarramos de uma ilusão para disfarçarmos, perante nós, esta simples verdade: que cada um de nós pode ser reduzido a um inseto, um animal voraz, um pedaço de carne? Que ser aviltado, magoado, esquartejado... é o destino essencial da humanidade, um destino cuja inevitabilidade a História confirmou?
“Atos humanos", misto de ficção e realidade, é um comovente e corajoso relato do massacre de Gwanjiu e um alerta para “os atos humanos de que todos nós somos capazes, atos brutais e atos generosos, atos básicos e atos sublimes”.
A sinopse prepara-nos para o que vamos ler, mas... não é fácil, não!
Tal como em “A vegetariana” - o primeiro romance de Han Kang, vencedor do Man Booker International Prize - a trama é complexa, com muitas personagens (algumas existiram mesmo), e vários narradores (alguns também personagens) a desenvolver em saltos constantes entre passado e presente uma história de dor e violência, que dá voz aos mortos, aos desaparecidos, aos brutalmente torturados. Dor e violência que se lê e vê na limpidez de uma escrita rigorosa e poderosa.
Como disse “The Independent” - «Atos Humanos é de tirar o fôlego.»
Quando morreste, não pude fazer-te um funeral,
e, assim, a minha vida tornou-se um funeral.
Para ler e reflectir sobre a capacidade destrutiva e sombria da humanidade.
Atos humanos, de Han Kang
Tradução de Maria do Carmo Teixeira
Ed. D. Quixote, 2017
227 págs.