Um dia, era mercador nas praças desertasNo outro, foi contabilista das emoções perdidasUm dia, era guarda-livros dos caracteres censuradosNo outro, foi jornalista de missão ao peito Um dia, era varredor de ruas cheias de gente sem nomeNo outro, foi maquinista nos carris dos afectosUm dia, era alfaiate das esperanças cortadas à medidaNo outro, foi navegador ancorado em porto atribuladoHoje, é apenas o fantoche...
A madrugada já vai adiantada, quando a embriaguez entontece as emoções e acelera as partilhas com desconhecidos. As horas desordeiras despedem palavras sentidas. Ela está com pressa, ansiosa pelos reencontros esperados durante semanas. Ele com medo de regressar a casa e ser abraçado pelo vazio. Ela com vontade de abreviar o encontro. Ele a desejar prolongá-lo até ao limite. Um ou outro carro...
Vou pela rua e ouço alguém apregoar a sorte, alguém a quem a sorte não entendeu contemplar. Só tem duas possibilidades que agita nas mãos. O cauteleiro que apregoa alto procura passar o testemunho numa rua apinhada de gente apeada. O vaivém de cima para baixo e de baixo para cima subestima a sua visibilidade. Tenta chamar a atenção com o braço erguido....
Salvador Dali Entre mim e ti, há a distância que vai do início da frase até ao ponto final. As vírgulas são decididas pelas contingências da vida a que nos cingimos. Nos teus vocativos, resplandece a saudade que sinto. Na minha fraca capacidade de síntese, titula-se a falta que te faço. Esta é a verdade: as minhas palavras só encontram sinónimos no dicionário...
Gosto da luz da tua sala, neste estertor da tarde preguiceira. Gosto dos meus cabelos despenteados no reflexo do ecrã do computador. Gosto desta paz de domingo a meio da semana. Gosto desta luminosidade que viaja de fora para dentro sem pertencer a qualquer um dos lados. É da janela, com as persianas enforcadas, que vejo o senhor de cabelos brancos. Veste um...