Não evito cruzar-me contigo por aí, mas a tua presença chega a incomodar-me. Somos independentes um do outro, quase completos desconhecidos. Temos círculos de amigos diferentes e posições remotas perante a vida. Ainda assim, nos sítios mais improváveis, nas circunstâncias mais estranhas acabamos sempre por nos encontrar. E entre nós não há sequer uma palavra e só muitos olhares cruzados, à revelia. Mesmo...
Depressa me habituei a ti e pensei que me cansaria. Desejei até que isso acontecesse, a curto prazo. Hoje, volvidos os dias e desalinhadas as emoções, expirou essa vontade inexistente. Percorro o dicionário das vivências com o indicador, em busca das palavras certas. Todas as orações que possa construir serão sempre escassas para te fazer chegar o que pensei em dizer-te. Gerhard Richter...
A luz coada pelas frinchas da persiana perturba a escuridade do quarto quieto. O despertador não toca, de propósito. Reina um silêncio apaziguador de todos os cansaços. E sabe bem esticar pernas e braços, demoradamente... O almoço (de improviso ou confeccionado com todos os vagares e cuidados) chama à mesa os corpos ainda em pijama, com os pés enfiados em meias largas e os cabelos por pentear....
(imagem retirada da Internet) Repousas no meu colo, despreocupado. A esse sono profundo não lhe incomoda a familiaridade ou a falta dela. Apenas, sossegas. A tua respiração é calma e segura. Tranquilizante para quem a pode observar. Esses pequenos lábios, repuxados para um sorriso inconsciente, acompanham as mãos minúsculas. Os dedos encolhem-se sobre si como se guardassem o maior segredo do mundo. Embalo-te...
Entre mim e o mundo lá fora, há uma parede com duas cores. Vista de dentro é bem luminosa. Do lado de lá, não sei ao certo. Dizem-me que depende da perspectiva de olhá-la de baixo, de frente ou de soslaio. E eu gosto desta liberdade de imaginá-la apenas… Ouço o que me contam: os outdoors que lá colocam, a poluição que lá...
Vladimir Kush A vida corre normal, desembaraçada e ronceira. Os passos que te vigio são assim: vagarosos e inconscientes nesse rumo por definir. Eis que te sentas e recostas no banco de madeira carcomida pela passagem de tantos outros corpos amorfos. Repousas das fraquezas que não admites e respiras com lentor. Reparas nos miúdos que dão vida ao parque. Ouves sem querer o...
Salvador Dali De ti não quero mais do que as cumplicidades que chegam com a manhã. Enfeitamos as palavras com gargalhadas antes de partirmos para as cruzadas do quotidiano. De mim não terás menos do que uma ternura disfarçada. Erguemos os ideais e abanamos os pilares para nos orgulharmos com a sua solidez. Do armário de duas portas, puxamos os extractos das importâncias...