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quinta-feira, dezembro 18, 2008

Alterações climáticas e financeiras


Resolvi interromper a série de posts sobre ordenamento e gestão de áreas protegidas para falar de dois assuntos de que percebo pouco: alterações climáticas e finanças.
E é por perceber muito pouco que tenho algumas perplexidades face à actual crise económica que gostaria de trazer aqui.

Há já algum tempo que me pergunto o que deveria ser uma leitura ambientalista da actual crise económica. Infelizmente não tenho tido grande ajuda do que passa nos jornais onde não me lembro de ter visto qualquer perpectiva ambiental do que se está a passar, com excepção da opção por investimentos públicos na eficiência energética e, eventualmente, nas infra-estruturas de transporte ferroviário.

Ao contrário da perspectiva ética, de que tenho ouvido ecos, nomeadamente situando a origem última da crise na perda de valores essenciais, o que acabou por minar a confiança de toda a gente em toda a gente e, consequentemente a confiança nas instituições.

Com o consequente efeito de fazer desaparecer a circulação do dinheiro no sistema financeiro. Para se ter a ideia do que isto significa, um destes dias um responsável de um dos grandes bancos explicava que os depósitos que cativava representam cerca de 60 a 70% do dinheiro que o banco tem emprestado. O restante teria de vir dos capitais próprios e de empréstimos do exterior. Como ninguém empresta com medo da exposição a activos tóxicos porque ninguém acredita nas contas de ninguém, implica que o banco tem de reduzir a sua exposição, cortando o crédito.

Se eu tiver uma empresa de sapatos com uma encomenda interessante mas precisar de pagar os salários dos trabalhadores até poder satisfazer a encomenda e receber o valor contratado, ou tenho capitais próprios (e consequentemente só posso aceitar encomendas até ao limite das minhas disponibilidades financeiras próprias) ou vou ter problemas graves porque o banco não tem para emprestar.

O estímulo directo para este post foi o artigo que li ontem no Público de Paul Krugman, prémio Nobel da economia em 2007.

O que me chocou foi o facto de toda a ênfase do artigo estar centrada na necessidade dos Estados apoiarem a economia estimulando o mais possível o consumo, indiscriminadamente.

E no entanto, numa perspectiva ambiental (e, no meu caso, de ignorante em economia), tal significa menos aforro e poupança (curiosamente um dos riscos das políticas de disponibilização de capitais públicos aos bancos para evitar a falta de liquidez do sistema que é apontado pelos eeconomistas é o risco dos bancos reterem o dinheiro em vez de o fazerem chegar às empresas e às famílias) o que, a prazo, nos impede de ter disponibilidade de investimento.

A resposta clássica dos economistas é a de que no longo prazo estamos todos mortos, portanto para já é preciso injectar capital e confiança na economia e depois se verá.

Há de facto alguma razão nesta postura já que as consequências sociais do abrandamento económico serão muito dificeis para muita gente.

E é aqui que me parece que poderia entrar uma perspectiva ambiental e, já agora, social.

Eu ganho 2000 euros por mês (a partir do próximo acho que passo a cerca de 1000). Faço parte de uma classe média que se incomodará muito se deixar de ganhar 2000 euros e passar a ganhar, digamos, 1 200. Mas perco alguma coisa de essencial com esta redução? Passo fome? Não tenho dinheiro para o aquecimento? Se calhar tenho de mudar para uma casa pior, mas de básico perco alguma coisa? Provavelmente não.

E há muita gente que ganha mais do que eu.

Por outro lado há muito mais gente que ganha bem menos que eu e para quem a redução de rendimento, mesmo marginal, é dramática e são muitas destas pessoas as mais vulneráveis ao desemprego decorrente do arrefecimento económico.

Aparentemente têm pois razão os economistas em defender o estímulo ao consumo como motor para assegurar o status quo que permite limitar os efeitos sociais da crise.

Mas e se resolvêssemos deixar a crise ir fundo?

Se na verdade esta não fosse apenas uma crise financeira mas uma verdadeira crise de escassez de recursos (os preços altos da alimentação e do petróleo que precederam a crise poderão ter alguma coisa relacionada com a perda de rendimentos dos sectores mais vulneráveis, aquelas que exactamente eram os clientes do sub-prime) não faria sentido estimular o consumo, sobretudo o consumo da classe média dos países industrializados, que somos nós.

Na discussão sobre o que fazer prioritariamente face às alterações climáticas podem ter-se duas perspectivas: a aparentemente mais racional, diminuir as emissões e a aparentemente mais pragmática que defende a lógica de mitigação dos efeitos das alterações climáticas, onde se for justificando. Todos sabemos que nestas dicotomias não existem posições puras de cada uma das perspectivas mas sim diferentes misturas das duas posições, mas para ilustrar o que pretendo é mais fácil assumir as posições extremadas. O que me interessa é que na posição mitigadora se vai incoporando racionalmente o custo associado às alterações climáticas, o que permite que a própria economia se vá adaptando.

Ora se as consequências sociais da crise são o verdadeiro problema (isto é, se a economia em si mesma não for o foco mas sim as pessoas) o que faria sentido não seria estimular o consumo de toda a gente mas mitigar os efeitos sociais de um abrandamento económico que, do ponto de vista ambiental, tem muitos aspectos virtuosos, começando exactamente pela diminuição de emissões (provavelmente o efeito será muito mais rápido e eficaz que todos os protocolos de Quioto que pensássemos).

Isso significaria apoiar todas as pessoas que fosse necessário para que tivessem um rendimento mínimo definido como alvo.

Dir-me-ão que o efeito económico seria desatroso. Penso que sim, que implicaria um longo processo de readaptação a uma economia mais próxima dos recursos efectivamente disponíveis. Sim é verdade que neste processo seria destruído valor, como dizem os economistas. Que os rendimentos de muitas pessoas seriam profundamente afectados. Que seria necessário muito bem senso e sensibilidade para dosear mitigação social e estímulo económico em cada momento.

Mas há anos que o movimento ambientalista reclama da insustentabilidade da economia que temos. E há anos que prevê um reajustamento em que todos ficaremos um pouco mais pobres.

Do ponto de vista ambiental é isto uma crise ou uma oportunidade?

henrique pereira dos santos

segunda-feira, maio 15, 2006

A grande farsa

Um relatório hoje divulgado pela Comissão Europeia revela que as quotas de emisões de dióxido de carbono concedidas pelos diferentes Estados, incluindo Portugal, não foram esgotadas durante o ano passado. Apenas os ingénuos julgarão que esta é uma boa notícia; na verdade, é uma péssima notícia, pois demonstra, como se sabia desde o início, que este tipo de mercado de emissões era um «salvo-conduto» para as indústrias continuarem a poluir, sem qualquer esforço de redução.

Claro está que este esquema, ao beneficiar as indústrias, prejudica os cidadãos, porque estamos perante a situação do «cobertor» que se se puxa para um lado descobre o outro. Ou seja, ao se ter cedido uma maior margem às indústrias, isso não significou qualquer alteração nas quotas totais de cada país. Significa isto que os Governos dos Estados-membros - leia-se os contribuintes - têm de assumir todo o esforço (logo, os encargos...) do Protocolo de Quioto. Isto não é mais do que, na prática, uma concessão de subsídios encapotados que os Estados dão às empresas. Era tão-só isto que, por exemplo, o empresário Patrick Monteiro de Barros pretendia com a «sua» refinaria, que afinal também trazia acoplada uma central térmica. Ele e os seus sócios queriam apenas que fossem os contribuintes a pagar aquilo que eles poluiam... Eles ficavam apenas com os lucros.