É próprio do moralismo destilar
maldições sobre as mais autênticas alegrias humanas. Instalou-se, há muitos
séculos, em certas correntes do cristianismo e reaparece, periodicamente, como
se fosse a sua versão mais genuína pelo seu “desprezo do mundo”. É, na verdade,
uma importação estranha à poética pregação de Cristo que respira, em cada gesto
e em cada parábola, o gosto da plenitude da vida ( Jo 20,30-31).
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domingo, 2 de junho de 2013
sábado, 19 de janeiro de 2013
Anselmo Borges: "A regra de ouro e a empatia"
Texto de Anselmo Borges no DN de hoje (tirado daqui):
Na Inglaterra, foi de tal modo valorizada que aí recebeu, nos inícios do século XVII, o nome por que é conhecida: "regra de ouro" (golden rule), com duas formulações, uma negativa: "não faças aos outros o que não quererias que te fizessem a ti", e outra positiva: "trata os outros como quererias ser tratado". Frédéric Lenoir faz, com razão, notar que a maior parte dos moralistas prefere a versão negativa, pois o perigo de auto-projecção sobre os outros pode levar a esquecer que cada um tem os seus gostos e a sua própria visão do que é bem. Neste quadro, Bernard Shaw escreveu com o seu sentido de humor: "Não façais aos outros o que quereríeis que vos fizessem; talvez não tenham os mesmos gostos que vós!"
É uma regra tão universal que o filósofo R.-P. Droit perguntava recentemente no Le Monde: "Existem regras morais presentes em todos os tempos e lugares, seja qual for a cultura ou a época? Isso é posto em dúvida a maior parte das vezes. No entanto, há uma excepção notável face ao relativismo generalizado." E apontava precisamente a regra de ouro.
De facto, ela encontra-se em todas as áreas culturais e religiosas do mundo. Apresentam-se exemplos, segundo Olivier du Roy, que acaba de publicar: La règle d'or. Histoire d'une maxime universelle.
sábado, 10 de novembro de 2012
Bernard Häring nasceu há 100 anos
Bernard Häring (1912-1998), o grande moralista do século XX, moralista no sentido de teólogo da moral, nasceu há 100 anos. Completam-se hoje. Alemão (por alguma razão que não sei explicar, estava convencidíssimo de que era holandês), esteve no II Concílio do Vaticano como perito.
O Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura recorda-o aqui.
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
Direitos e deveres
A moral ensina-nos que se um homem vê o seu filho morrer de fome, pode servir-se do padeiro. O mesmo se passa com a habitação; um chefe de família tem o direito de se instalar numa casa vazia. Não contesto do direito de propriedade mas, se não temos o direito de roubar, também não temos o direito de deixar morrer.
Abbé Pierre, 1990
Abbé Pierre, 1990
terça-feira, 16 de outubro de 2012
Má tradução
Traduzimos «Amarás o teu próximo como a ti mesmo» por «Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti». Por outras palavras, «Não lhe faças mal». Que abominação! Como se dois esposos, dois amigos, dissessem: «Vês bem que te amo, pois não te atiro ao tapete...»
Abbé Pierre, 1970
Abbé Pierre, 1970
segunda-feira, 8 de outubro de 2012
Leis
Acreditamos que nenhuma sociedade, nenhuma nação pode viver se as leis não forem respeitadas. Mas travaremos a batalha precisamente para que as leis sejam respeitáveis.
Abbé Pierre na década de 1950
Abbé Pierre na década de 1950
sexta-feira, 1 de junho de 2012
Noutro mundo
Se o esforço de praticar o bem, de agir segundo a lei moral, tem que ter um sentido, é preciso que se possa esperar racionalmente que o bem (isto é, a união da virtude e da felicidade) se realize noutro mundo, visto que neste, manifestamente, não se dá.
Gianni Vattimo, "Acreditar em acreditar", pág. 11.
domingo, 25 de março de 2012
Bento Domingues: O grande sermão desta Quaresma
Texto de Bento Domingues no "Público" de hoje. Sobre as propostas de Serge Latouche, ler aqui.
sexta-feira, 23 de março de 2012
A causa dos incêndios
Gerard W. Hughes, padre jesuíta, conta em “Deus de Surpresas”
(ed. AO) como o moralismo católico (também o haverá noutras fés e religiões)
pode fazer mal às pessoas sensíveis e imaginativas, o que, além de trágico, é
uma perversão do Evangelho. E relata:
Após ter escutado, de modo especial, uma pessoa que sofrera uma tortura interior devido a tais ensinamentos, não fiquei nada surpreendido quando, em resposta à minha pergunta «Se estivesse completamente livre de todas as obrigações morais, o que é que mais gostaria de poder fazer?», ela respondeu: “Incendiar Igrejas”.
segunda-feira, 12 de dezembro de 2011
Médicos aconselham freiras a tomar a pílula
A notícia de “The Lancet” ecoada pelo “Público” de hoje, em si, não
tem nada de contraditório segundo os padrões morais da oficialidade católica.
Por razões médicas e não com o objectivo da contracepção, qualquer mulher pode
tomar a pílula. Mas não deixa de ser curioso que os médicos aconselhem as
freiras a tomar a pílula, tendo em vista, claro, os efeitos hormonais. Não
estou a ver qualquer bispo ou teólogo moralista a dizer que não. Dá-se assim a
curiosa situação de, segundo a moral oficial católica (que, presumo, será
seguida por uma pequeníssima minoria de mulheres e casais), as mulheres que
querem regular a fertilidade não o podem fazer com a pílula, enquanto as que
não precisam de a regular devem tomar a pílula.
Sobre esta questão li aqui que os próprios
autores do artigo em «The Lancet» recordam que a Igreja católica “condena toda forma de contracepção, seguindo as indicações contidas na encíclica «Humanae vitae» de Paulo VI”, mas também que a mesma encíclica aceita os meios terapêuticos que têm efeito contraceptivo, se forem necessários para curar uma doença. “Se a Igreja católica permitisse o livre uso da pílula anticoncepcional às Irmãs, se reduziria o risco” que elas possam contrair o câncer.
Segundo a revista médica, “já em 1731 o médico italiano
Bernadino Ramazzini fez notar a maior incidência do câncer no seio entre as
monjas”.
quinta-feira, 3 de novembro de 2011
Padres que não sabem os Dez Mandamentos
Um programa satírico da tv italiana (o canal é de Berlusconi, mas isso é irrelevante) andou pela rua a perguntar aos padres se sabiam os dez mandamentos. De certeza que muitos sabiam. E esses não passam na peça. Mas espanta-me que alguns não saibam. E, ainda mais, os rodeios que fazem para se safarem de os nomear em concreto. E há transeuntes que ajudam os padres. Ver aqui.
sexta-feira, 12 de agosto de 2011
Back to basics
Ao ver os distúrbios de Londres e de outras cidades inglesas, lembrei-me de uma frase de João Maria Vianney que diz que numa paróquia sem padre, numa geração, a pessoas transformam-se em bestas. Quando comecei a escrever estas linhas foi confirmar a frase do pároco de Ars. E o que diz é outra coisa: “Deixai uma paróquia durante vinte anos sem padre, e lá adorar-se-ão as bestas”. Mas continua a servir para esta reflexão.
Isto é despropositado em relação ao que passa na Inglaterra? Será somente um caso isolado e fruto da crise económica? Penso que não ao ver o que move os que causam distúrbios. Não há ideologia (que não desculparia os distúrbios) nem causas ou valores. Aliás, a ausência de valores morais em todo aquele caos talvez explique o panorama – o que leva José Manuel Fernandes a escrever hoje no “Público”, que “se não existir um sentido moral nas nossas regas de vida em comum, não haverá ordem nas nossas cidades”.
É sabido que muitos daqueles jovens passaram a nada ter que fazer devido ao fecho de clubes e outras organizações que viram os seus orçamentos diminuídos por causa da austeridade imposta pelo governo. Mas já não é tão dito – isso geralmente não entra nas reflexões dos sociólogos e comentadores políticos – que é uma geração sem qualquer referência religiosa. E aqui entra, em dúvida, o pensamento do cura d’Ars, mesmo que não se simpatize com o seu estilo pastoral (duvido que tê-lo proposto como modelo para os padres actuais, coisa que fez bento XVI em 2009, tenha servido para algo).
Ouvi há tempos que um responsável prisional português disse que, no percurso dos que estão nas prisões portuguesas, geralmente faltou a catequese. Não o disse certamente por beatice.
Ainda está por provar que uma sociedade consegue viver sem uma ou várias religiões que lhe dêem um substracto moral. As tentativas voluntariosas de construir comunidades sem Deus nunca resultaram. Mas em sociedades em que a irreligiosidade é resultado da liberdade individual – a Inglaterra é dos países onde as liberdades individuais há mais tempo são respeitadas e dos mais descristianizados, onde hoje se discute se o cristianismo não estará a chegar ao fim, principalmente na versão anglicana –, fica por saber se restará espaço para os valores humanos. Temo que não.
Isto é despropositado em relação ao que passa na Inglaterra? Será somente um caso isolado e fruto da crise económica? Penso que não ao ver o que move os que causam distúrbios. Não há ideologia (que não desculparia os distúrbios) nem causas ou valores. Aliás, a ausência de valores morais em todo aquele caos talvez explique o panorama – o que leva José Manuel Fernandes a escrever hoje no “Público”, que “se não existir um sentido moral nas nossas regas de vida em comum, não haverá ordem nas nossas cidades”.
É sabido que muitos daqueles jovens passaram a nada ter que fazer devido ao fecho de clubes e outras organizações que viram os seus orçamentos diminuídos por causa da austeridade imposta pelo governo. Mas já não é tão dito – isso geralmente não entra nas reflexões dos sociólogos e comentadores políticos – que é uma geração sem qualquer referência religiosa. E aqui entra, em dúvida, o pensamento do cura d’Ars, mesmo que não se simpatize com o seu estilo pastoral (duvido que tê-lo proposto como modelo para os padres actuais, coisa que fez bento XVI em 2009, tenha servido para algo).
Ouvi há tempos que um responsável prisional português disse que, no percurso dos que estão nas prisões portuguesas, geralmente faltou a catequese. Não o disse certamente por beatice.
Ainda está por provar que uma sociedade consegue viver sem uma ou várias religiões que lhe dêem um substracto moral. As tentativas voluntariosas de construir comunidades sem Deus nunca resultaram. Mas em sociedades em que a irreligiosidade é resultado da liberdade individual – a Inglaterra é dos países onde as liberdades individuais há mais tempo são respeitadas e dos mais descristianizados, onde hoje se discute se o cristianismo não estará a chegar ao fim, principalmente na versão anglicana –, fica por saber se restará espaço para os valores humanos. Temo que não.
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
8 de Agosto de 1746. Morre o teólogo e filósofo Francis Hutcheson
Francis Hutcheson, pai do iluminismo escocês, morreu no dia 8 de Agosto de 1746, em Glasgow, precisamente no dia em que fazia 52 anos. Hutcheson foi quem mais influenciou Adam Smtith. O fundador da economia moderna assistiu às suas aulas com entusiasmo.
Hutcheson foi o primeiro professor de Glasgow a abandonar o latim e a dar aulas em inglês e opunha-se ao tráfico de escravos, tal como também Adam Smith veio a opor-se. Não apreciava a metafísica continental, pelo que o seu curso de filosofia moral versava sobre religião, ética, estética, leis e economia. Também não apreciava Hobbes e a luta de todos contra todos, Defendia antes o progresso comum baseado na cooperação de todos - uma ideia base em Adam Smith.
sábado, 30 de julho de 2011
Ele disse isto?
Tudo o que esteja relacionado com moral remete, logicamente e em última análise, para a teologia, nunca para fundamentos seculares.
Max Horkheimer (1895-1973)
Max Horkheimer (1895-1973)
sexta-feira, 15 de julho de 2011
Pessoa como autopropriedade, uma noção que explica muito
John Locke (1632-1704)
Diz Radcliffe, o dominicano, não o feiticeiro:
"(...) Desde o século XVII absolutizámos virtualmente os direitos de propriedade. De facto, John Locke elaborou a sua compreensão da pessoa humana sobre a noção de «autopropriedade», «uma propriedade da sua própria pessoa»" (pág. 141 de "Ser cristão para quê?").Tantas vezes li Locke, ou melhor, li sobre Locke, com alguma simpatia pela seu pensamento empírico, liberal e tolerante, mas nunca tinha dado com esta definição de pessoa.
Pensemos em todos os problemas de moral pessoal, sexual e familiar. Esta noção de pessoa e de corpo como autopropriedade está omnipresente naquela a que poderíamos chamar "visão do mundo" em confronto com a visão cristã.
segunda-feira, 11 de julho de 2011
O especulador e o inovador
"O especulador assume como objectivo maximizar o lucro; para ele, os negócios são apenas um meio para um fim, e esse fim é o lucro. Para o especulador, construir estradas e estabelecer hospitais ou escolas não é o objectivo, mas meramente um meio para a meta do lucro máximo. Deve ficar imediatamente claro que o especulador não é o modelo de líder de negócios que a Igreja sustenta como um agente e um construtor do bem comum".
Cardeal Tarcisio Bertone, num encontro promovido pelo Pontifício Conselho "Justiça e Paz". O cardeal disse ainda que um bom líder de negócios não é um especulador, mas sim um inovador. Li aqui.
Convém recordar que, em linha com a doutrina social da Igreja, o lucro é uma condição, não um objectivo, tal como respiramos (ou comemos) para viver. Levam uma vida triste aqueles que vivem para respirar (ou comer).
Na perspectiva cristã, quais os objectivos das actividades económicas e do trabalho? Basicamente, sem dúvida, a satisfação de necessidades, mas também, e mais do que isso, a realização humana.
sábado, 9 de julho de 2011
Anselmo Borges: Os Dez Mandamentos
Wim Wenders também acha que os Dez Mandamentos continuam actuais
Texto de Anselmo Borges no DN de hoje (aqui):
Em todas as épocas, há quem julgue estar-se num momento decisivo. Também para se dar importância.
Desta vez, porém, é mesmo a sério: encontramo-nos num cotovelo, num momento obscuro e decisivo, imprevisível, da História. A crise é imensa, de contornos não bem definidos, global. O que se segue pode ser pura e simplesmente o caos. As suas causas são múltiplas. Aliás, quanto aos fenómenos sociais, deve-se desconfiar das explicações monocausais.
A crise é, evidentemente, financeira, económica, política, social, religiosa, moral, de valores. Sim, de valores. De valores vinculantes.
Implantou-se o princípio do ter e do prazer e impera o individualismo descomprometido e consumista. Como já aqui escrevi, o célebre sociólogo Zygmunt Bauman, professor jubilado da Universidade de Leeds, caracterizou a situação como "modernidade líquida". Os laços, íntimos e sociais, são frágeis. Há o receio de compromissos a longo termo. Tudo deve ficar em aberto, para não fechar possibilidades.
Baumann dá o exemplo do amor e da sua vivência contraditória, dolorosa. Por um lado, num mundo incerto e instável, " tem-se mais necessidade do que nunca de um parceiro leal e dedicado, mas, por outro, fica-se aterrado com a ideia de compromisso (para já não falar de compromisso incondicional) com este tipo de lealdade e dedicação". Há o receio de perder a liberdade e oportunidades. "E se o parceiro/a fosse o/a primeiro/a a decidir que está farto/a, de modo que a minha entrega acabasse no caixote do lixo? Isto leva então a tentar realizar o impossível: ter uma relação segura, mas permanecendo livre, para poder acabar com ela a cada instante. Melhor: viver um amor verdadeiro, profundo, durável, mas revogável a pedido... Tenho o sentimento de que muitas das tragé- dias pessoais derivam desta contradição insolúvel."
No fundo, é a recusa do sacrifício. De facto, querer salvar o amor do turbilhão da 'vida líquida' é inevitavelmente custoso, como é custosa e difícil a vida moral. Entregar-se a outro ser humano no amor traz felicidade real e duradoura, mas "não se pode recusar o sacrifício de si e esperar ao mesmo tempo viver o 'amor verdadeiro' com que sonhamos".
Na nossa sociedade, tende-se a substituir a noção de 'estrutura' pela de 'rede'. É que, "ao contrário das 'estruturas' de outrora, cuja razão de ser era vincular com laços difíceis de desfazer, as redes servem tanto para ligar como para desligar". Por isso, Baumann contrapõe 'liquidez' e 'solidez' das instituições. Afinal, "instituições sólidas, no sentido de duráveis e previsíveis, constrangem, mas ao mesmo tempo tornam possível a acção dos agentes".
Pessoalmente, mais do que a imoralidade preocupa-me a amoralidade. Porque, quando tudo vale, nada vale, pois tudo é igual. Uma sociedade sem convicções e valores comuns partilhados não tem futuro, porque lhe falta horizonte e sentido. Por isso, fonte maior de mal-estar hoje está na falta de critérios de valor e de orientação.
Neste contexto, a revista alemã Stern publicou um dossier subordinado à pergunta: "Os Dez Mandamentos estão ultrapassados?" Significativamente, políticos como o actual ministro federal das Finanças, W. Schäuble, realizadores como Wim Wenders, filósofos como Peter Sloterdijk, declararam que eles continuam vivos e actuais. De facto, quem negará actualidade a preceitos como: "Não farás imagens de Deus, mas respeitarás a dignidade de todos os seres humanos, sua imagem", "Não matarás", "Não cometerás adultério", "Amarás os filhos e respeitarás os pais", "Não roubarás", "Não viverás à custa dos outros", "Serás justo com todos", "Protegerás a natureza", "Assumirás as tuas responsabilidades"?
Referindo-se-lhes como um compêndio da sabedoria humana, acumulada ao longo de séculos, o grande escritor Thomas Mann disse que eles são "manifestação fundamental e rocha da decência humana", "o ABC da conduta humana".
terça-feira, 7 de junho de 2011
"Um homossexual terá de viver sempre só?"
O Fórum Europeu dos grupos cristãos de lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros vai enviar, no dia 10 de Junho, uma carta ao Papa com um pedido:
"Vossa Santidade, que não se dê mais como indicação que as pessoas homossexuais se devem submeter a terapias, mas sim que tenham direito a uma vida que preveja também uma relação afetiva no sinal da fidelidade".
A notícia veio no jornal “L'Unità” (li aqui). Interroga-se o jornal ligado ao Partido Comunista Italiano se “o Papa sabe que algumas dioceses começaram uma pastoral de acolhimento para os grupos gays”. E adianta-se que “não chegou do alto nenhuma de ordem para parar”. “Isso significa que está sendo dada autonomia aos bispos sobre o assunto? Se o povo católico vir, nas Igrejas, lésbicas e gays activos como todos os outros, o efeito será a dissolução de parte dos preconceitos”.
Em Portugal, a questão praticamente não se põe. Há tempos lia notícia de uma paróquia lisboeta que acolhe um grupo de reflexão de homossexuais. Mas tendo em conta o que diz o Catecismo sobre a homossexualidade, compreendo o silêncio de uns, as perplexidades de outros e os lamentos de mais alguns.
Timothy Radcliffe, a propósito deste assunto e do recasamento, lança questões em que vale a pena pensar e, mais do que uma resposta, sugere um processo:
“Se uma pessoa está divorciada e encontra alguém por quem se apaixona, deve ou não voltar a casar? Um homossexual terá de viver sempre só? Dado que é assustador ter de pensar o seu caminho, através destes problemas, rezar a respeito deles, estudá-los à luz do ensino dos Evangelhos e da Igreja, a tentação passa por fazer o que nos apetece ou, para a Igreja, despachar a questão com uma resposta rápida” (pág. 62 de "Ser cristão para quê?").
quarta-feira, 1 de junho de 2011
Moral cristã em tempos de autonomia e liberdade
Aprecio a sensatez com que Timothy Radcliffe expõe a sua visão da Igreja, a sua fé, pessoal e comunitária, católica. Ele não é um apaixonado que prega “a propósito e a despropósito”, segundo a expressão paulina. Na sociedade em que vivemos, quem prega a despropósito é tomado como louco e não é ouvido sequer, nada de bom acrescentando à realidade. A sensatez e o ser comedido recomendam-se.
Onde estas qualidades estão claramente presentes é nas páginas em que fala do ensino moral católico e da autonomia e liberdade dos europeus.
“As pessoas não serão atraídas à Igreja, se o ensino moral for visto apenas como mostrar-lhe o que deve ser feito. Com razão ou sem ela, isso seria visto como uma violação da sua autonomia”.
Esta frase seria suficiente para pensar nos modos de exposição do ensino moral católico. O Papa Pio X dizia que o padre deve ser um leão no púlpito e um cordeiro no confessionário. Dificilmente se aceita esta dimensão leonina, mesmo agora que os tradicionalistas querem reabilitar o púlpito a par da missa tridentina, com o apoio de Bento XVI. O leão falará para cada vez menos pessoas.
“Prezamos a liberdade de escolher os nossos valores morais. Isto implica a rejeição de excessiva interferência de qualquer instituição, seja a Igreja ou o Estado”, escreve o antigo mestre dominicano. E acrescenta: “Uma religião em conflito com a autonomia pessoal será rejeitada pela maioria dos europeus e, pelo menos implicitamente, por muitos católicos”.
Uma boa área para pensar este conflito com a autonomia será a da moral sexual. Quantos solteiros e casados católicos vivem a sua sexualidade segundo os preceitos da Igreja? Não há dados. As impressões dizem que são uma minoria. Neste campo, o rugido do leão nem ridicularizado é. Não há ouvidos que o ouçam. E o cordeiro poucas oportunidades terá de ser meigo perante pecados não confessados porque não interiorizados sequer. Radcliffe não questiona a matéria do ensino moral da Igreja, ao contrário de outros teólogos, mas antes a sua pedagogia – o que não é de modo nenhum despiciendo:
“Mesmo quando o ensino cristão parece claro e inequívoco, devemos estar preparados para entrar na complexidade da vida das pessoas, no seu esforço para descobrir o que é recto”.
Sem baixar a fasquia nem entrar em concessões, há um longo caminho a percorrer de escuta e diálogo. Talvez contra o dominicano, arrisco a pensar que, uma vez percorrido o caminho, algum ensino cristão não será o mesmo. E o leão cordeiro talvez passe a ser simplesmente pessoa.
"A verdade é simples, mas se essa simplicidade não passou pela complexidade da experiência humana é uma simplicidade infantil, uma simplicidade estridente e desumana, não a simplicidade que vislumbramos indistintamente em Deus. Aqueles que pensam que a verdade do nosso ensino deve ser protegida por difamação e ataques violentos aos outros, podem muito bem estar inseguros das suas convicções, com medo de ouvir a outra posição e começar a duvidar. Precisamente, quando estamos mais confiantes no ensino da Igreja, devemos estar mais livres para ouvir e aprender, para abrir as nossas mentes e corações aos que chegaram a conclusões com as quais não concordamos".
Frases de Timothy Radcliffe retiradas as páginas 61-63 de “Ser Cristão para quê?” (ed. Paulinas)
domingo, 8 de maio de 2011
Maus costumes
A pior coisa que têm os maus costumes é serem costumes. Ainda é pior que serem maus.
Padre António Vieira (1608-1697)
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Sinodalidade e sinonulidade
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