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Wednesday, May 30, 2012

Ferreira de Castro e Reinaldo Ferreira -- Nota sobre a viagem do Repórter X à Rússia (3)

Reinaldo Ferreira e Ferreira de Castro. Não houve jornalistas mais amigos e mais diferentes -- nos temperamentos e nos processos. Ao sensacionalismo quase doentio perseguido por Reinaldo, Castro contrapunha uma seriedade na escolha e no tratamento dos temas, que, contudo, não deixavam de ter impacte. Enquanto que o X se disfarçava de mendigo ou pasmava Lisboa e o país com a investigação do assassínio da actriz Maria Alves -- temas que por vezes lhe serviam para novelas, peças de teatro e até filmes --, Castro preocupava-se com a situação dos presos no Limoeiro (2), dos vagabundos nos albergues nocturnos (3), as condições de trabalho nas Minas de S. Domingos (4), entrevistava o chefe republicano irlandês Eamon de Valera (1886-1975) (5), dava a conhecer aspectos da sociedade e da cultura corsas (6).

(2) Ferreira de Castro, «O segrêdo das nossas derrotas. Como eu fui preso... no Limoeiro», Uma Hora de Jornalismo, Lisboa, Caixa de Previdência do Sindicato dos Profissionais da imprensa de Lisboa, 1928, pp. 85-92 -- «Além do jornalista havia em mim o curioso; eu amo tanto a liberdade, que desejava averiguar como podiam viver aqueles que a não tinham» (p. 88).

(3) Ferreira de Castro, «A noite dos miseráveis -- Como se dorme num albergue nocturno», in António Valdemar e Jacinto Baptista, Repórteres e Reportagens de Primeira Página, vol. II, Lisboa, Conselho de Imprensa, 1992, pp. 276-278.


(4) Censurada na época, a reportagem seria alçada à categoria de evocação literária, ficando para a posteridade como um dos texto mais notáveis de Ferreira de Castro: «Historial da velha mina», Os Fragmentos, 2.ª edição, Lisboa, Guimarães & C.ª [1974], pp. 17-41.


(5) O Museu Ferreira de Castro exibe um autógrafo, em gaélico, de de Valera, que o escritor entrevistou para O Século, peça publicada na edição de 22 de Novembro de 1930: Por intermédio do "Século", saúdo afectuosamente o povo de Portugal, velho amigo da Irlanda». «Dev», abundantemente citado no capítulo sobre a Irlanda, em Pequenos Mundos e Velhas Civilizações, o mais marcante político irlandês deste século, fundador do IRA, foi opositor ao tratado com a Inglaterra que deixou sob a coroa britânica os seis condados que formam o Ulster. Quando Castro se encontrou com ele -- entrevista de que resultou um impressivo retrato dum homem determinado e absolutamente seguro da sua causa --, estava na oposição, após ter liderado uma das facções da guerra civil de 1922-23. Formaria governo pela primeira vez em 1932, chefiando o executivo em várias ocasiões. Foi eleito presidente da República da Irlanda por duas vezes, entre 1959 e 1973. Segundo Ferreira de Castro, o estadista era «um dos descendentes de Juan de Valera -- o célebre escritor e diplomata espanhol do século passado.» (Ferreira de Castro, Pequenos mundos e Velhas Civilizações, 5.ª edição, vol. II, Guimarães & C.ª, 1955, p. 257). desconhece-se qual a fonte do escritor. Juan de Valera y Alacalá Galiano (1825-1905) -- que se correspondeu com Oliveira martins (1845-1894) --, poeta, historiador e diplomata, ministro da Espanha em Lisboa entre 1881-83, seria o avô paterno de Eamon. os biógrafos oficiais deste referem-se de passagem ao avô como tendo estado envolvido nas negociações sobre o comércio de açúcar entre a Espanha e os Estados Unidos, que envolviam Cuba. Em 1886, ano do nascimento de «Dev», nos Estados Unidos, Juan de Valera representava o seu país em Washington. Ver Tim Pat Coogan, De Valera -- Long Fellow, Long Shadow, London, Arrow Books, 1995, pp. 6-7. 


(6) Ver capítulo dedicado à ilha em Pequenos Mundos e o opúsculo Canções da Córsega [1936], 2.ª ed., Sintra, Câmara municipal / Museu Ferreira de Castro, 1994.


Vária escrita #5, Sintra, Câmara Municipal, 1998, pp. 257-268.
  imagem

Tuesday, August 26, 2008

O Museu Ferreira de Castro (5)

4. O Último Vagamundo (1929-1939)

«[...] a verdade é que, por cima da minha condição de europeu, de latino e de português, sinto na minha alma uma grande identidade com a alma de todos os outros povos. Creio, aliás, que isso acontece com quase todos os homens, mesmo sem eles darem por isso, mesmo sem eles o saberem...» FERREIRA DE CASTRO, carta particular (1953)

Como autor de literatura de viagens, Ferreira de Castro faz parte duma linhagem com tradição nas letras portuguesas.
Pequenos Mundos e Velhas Civilizações (1937), escrito com base numa viagem pelo Mediterrâneo, em 1935, a que se juntaram notas de uma visita a Andorra (1929) e outra à Irlanda (1930), deveu-se à simpatia de Castro «por todos os que vivem isolados no planeta» e também à conjuntura política interna, que lhe não permitiu ou, inclusive, censurou livros que tinha em mãos.
Pela mesma razão, realizou uma volta ao mundo, em 1939, com a pintora Elena Muriel, sua mulher, viagem que testemunha essa mesma fraternidade à escala planetária e documenta uma realidade geo-política que seria profundamente alterada no pós-guerra. O visitante poderá observar alguns desenhos originais, resultado desse périplo.

imagem: bilhete dos Caminhos-de-Ferro turcos