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Saturday, July 22, 2006

Outras palavras #1 - A arte moderna ante a sociedade actual (4)

Mas dir-me-ão que nada disso têm feito os artistas contemporâneos. Antes: que só têm feito arabescos, caprichos, bizarrias, exotismos. Tudo o que nos aparece pela primeira vez tem um ar de exótico. Quem não se sorrirá quando alguém afirmar que debaixo dos seus pés, trilhando um matagal, está um caminho? Quem não chamará a isso uma bizarria? E, todavia, se o matagal for desbravado, o caminho aparecerá. E principiará a ser uma coisa normal, uma odiosa coisa normal -- uma coisa para a maioria.
[...]
É isso que estão fazendo os artistas modernos -- os artistas da vanguarda. Deslumbrados pela luz, pela vertigem do século, mas aproximando-se da porta que dá para o futuro. Da porta para além da qual vive o espírito de amanhã.
Dir-me-ão que muitos não são sinceros. É verdade. Muitos não são sinceros! Muitos aproveitam-se da confusão desta hora em que vivemos, confusão de todas as horas de combate, para se fazerem passar como modernos, como precursores, eles que são nulidades!
[...]
Mas apesar de tudo eles não são absolutamente inúteis. A sua acção aumentará o tumulto, o ruído que é necessário fazer, para que a burguesia, para que as academias, para que os cadáveres animados saibam que há um mundo novo brotando das cinzas do mundo velho. Porque é preciso que se faça sobre a terra uma grande expectativa. Essa muda expectativa que precede os grande fenómenos.
Conferência proferida na Associação dos Empregados de Escritório, Fevereiro de 1926
In A Batalha -- Suplemento Semanal Ilustrado, n.º 118, 1 de Março de 1926, p. 6.
Juan Miró, Estátua, 1926
MoMA -- Museu de Arte Moderna, Nova Iorque

Sunday, July 16, 2006

Outras palavras #1 - A arte moderna ante a sociedade actual (3)

[...]
E digo um pouco de Beleza Nova, porque não creio que que a Beleza da Arte Moderna seja definitiva. Mas nem por isso a devemos considerar menos. Ela é a legenda do pórtico que dá para os maravilhosos jardins da Nova Renascença.
Os artistas modernos, são, é certo, elementos de intervalo -- desse intervalo que vai desde o crepúsculo de uma Arte até à alvorada duma outra.
Mas são eles também que preparam o ambiente para aqueles que hão-de vir gravar as novas lápides eternas.
Na inquietude que nos rodeia, na vibração que nos envolve, pressentem-se já os passos, ainda subtis, daquele que há-de demarcar para sempre os novos caminhos a trilhar. Daquele que há-de escrever a epopeia do espírito moderno. E será uma epopeia universal. Porque de universalismo está feita a Arte Moderna. Os escritores mais representativos da vanguar são escritores internacionalistas. Esse desdém que eles mostram pela chamada pureza do idioma, pela pontuação convencional e até pelas regras gramaticais, significa indiferença pela língua nativa, atitude que um clássico não teria, pois ela muito concorre para a desnacionalização dos motivos artísticos.
Procurai uma página de bom francês em Paul Morand, em Max Jacob, em Cocteau... Não a encontrareis.
Procurai uma pontuação regular em Apollinaire, em Reverdy, em Tzara... Não a encontrareis também.
-- Se para se escrever alguma coisa de novo for necessário escrever mal o nosso idioma, não se deve hesitar.
Este lema, adoptado por todos os escritores da vanguarda artística, leva-os à detruição desse convencional respeito que até hoje se tributava a essa coisa não menos convencional, que é um idioma. É dizer: leva-os a despedaçar uma das mais fortes couraças do nacionalismo.
E um espírito verdadeiramente moderno só pode ser um espírito verdadeiramente internacionalista. Um espírito ou uma obra artística.
(continua)
A Batalha -- Suplemento Semanal Ilustrado, nº 118, Lisboa, 1 de Março de 1926
desenho: Apollinaire por Picasso