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domingo, 10 de outubro de 2021

Do meu regresso à terapia... E à psiquiatria... E à medicação...

 


Assinala-se hoje o Dia Mundial da Saúde Mental. E eu, que já queria ter vindo escrever este post há demasiado tempo, achei que não podia passar de hoje.

Foi há quase 4 meses que eu regressei a uma consulta de psiquiatria. E, consequentemente, à medicação. E foi há 3 meses que eu regressei a uma consulta de psicologia.

Não foi um caminho fácil, até marcar as consultas. Nem tem sido um caminho fácil, nas consultas que tenho tido.

Há já muito tempo que eu sabia que devia fazer terapia. Mas fui adiando... Foi só mais uma das coisas que eu fui adiando por causa da Covid. Fui adiando, adiando, adiando. Até ser inevitável.

Já o regresso à psiquiatria, começou a fazer-me sentido também há já bastante tempo, mas foi mais difícil de aceitar. Sobretudo, porque seria o reconhecer daquilo que temia, e sabia que seria sinónimo de voltar à medicação.

Os dois regressos foram difíceis. São sempre. Começar a ser acompanhada por um novo psiquiatra e/ou psicólogo é sempre difícil. É começar do zero. É ter de abrir muitas portas e todas as janelas. É falar do que vai cá dentro com alguém que não conhecemos. É ganhar coragem e vontade para o fazer. É conseguir encontrar um sítio em que nos sintamos confortáveis, mas onde vamos para que nos tirem da nossa zona de conforto. É remexer no passado e no que tanto trabalho nos deu a enterrar. É falar do que não falamos com mais ninguém. É duro. Dói. Custa. E é um processo longo e que vai continuar a prolongar-se no tempo.

Ainda tenho dúvidas, ainda me questiono se preciso mesmo disto, ainda tenho dias em que não quero tomar a medicação. Mas vou andando, um dia de cada vez, à espera de me sentir melhor. Um dia.


Este post tem apenas dois objectivos: para mim, servir de registo para memória futura (como tudo neste blogue); para o mundo, num dia como o de hoje, relembrar que a saúde mental é tão importante como a saúde física, que também se trata, e que não é vergonha nenhuma querermos curar a mente, como curamos o corpo.

quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Das portas que se fecham e das janelas que não queremos que se abram...

Ontem fechou-se uma porta que eu há muito queria ver fechada. Foram dois meses de vida em suspenso. Dois meses de incertezas, de dúvidas, de receios. Dois meses de espera. E eu não sou pessoa de estar, simplesmente, à espera. Foram dois meses duros, que incluíram um dos dias mais duros da minha vida. Se ao menos tivesse valido a pena, mas não valeu. A espera e as incertezas continuaram, depois desse dia. Mas, ontem, tudo isso acabou. Ontem, a porta fechou-se de vez. E eu posso voltar a respirar, posso fazer as pazes comigo, posso apanhar os cacos e retomar a minha vida, no ponto em que ela ficou há dois meses. Finalmente.

domingo, 7 de março de 2021

Dos pensamentos que me ocupam às cinco da manhã...

Não sei se tenho mais saudades das coisas que a Covid me tirou, se das coisas que a maternidade me tirou. Dadas as circunstâncias actuais, ambas confundem-se e é difícil identificar quais são quais. Pouco importa, na verdade.

Mas tenho saudades. Tenho saudades de restaurantes. De esplanadas. De ficar na praia até ao pôr do sol. De ir à Davvero comer um gelado. De ir a um concerto ou a um espectáculo. Tenho saudades das minhas pessoas. De estarmos juntos só porque sim. De respirarmos o mesmo ar sem medo do que daí pode vir. De nos abraçarmos. Eu, que nem sou de abraços. Porra. Tenho saudades de um abraço. Tenho saudades de tudo ser simples e fácil. De ir a algum lado, ser apenas ir a algum lado. Sem medos, sem paranóias, sem máscaras e sem desinfectantes. Tenho saudades de almoços de horas. De visitas inesperadas. De dias sem planos e sem horários. De dormir até tarde. De dormir, no geral. De me sentir leve e feliz. Tenho saudades da vida que tinha e que sei que nunca voltará. Com ou sem covid. Tenho saudades de correr nos trilhos. Das provas. A dois ou em equipa. Da sensação boa que vinha no final, que fazia esquecer o cansaço e eventuais maleitas. Tenho saudades de viajar. Daquela excitação boa que surgia sempre que entrava num avião, fosse qual fosse o destino. Ou num carro, pouco importa. Tenho saudades de Lagos. Dos percebes. Dos gelados. De Porto de Mós e do Zavial. Da pizzaria debaixo do prédio. Da mini varanda que aqui não temos. Tenho saudades dos pés descalços e dos chinelos. Do não ter pressa. Das caminhadas na marginal e nos passadiços. Tenho saudades de tanta coisa a que antes não dava o valor suficiente. Tanta.

É pena, é mesmo pena, que na maior parte dos casos, só demos valor às coisas quando deixamos de as ter. Seja por culpa da covid, seja por culpa da maternidade. 

Se tudo isto não servir para mais nada, que sirva para que eu aprenda a dar valor às pequenas coisas. 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Do parto da Isabel...

O parto da Isabel não foi nada do que eu queria, sonhara ou idealizara. Em parte, já sabia que assim seria, desde que ficou decidido que seria cesariana. Mas, ainda assim, foi muito diferente do que esperava.

Não consigo dizer que foi o momento mais bonito da minha vida. Se bem que também não consigo dizer qual foi o momento mais bonito da minha vida. O problema está em mim, certamente. 

Quando penso no nascimento de um bebé, no acto de trazer um novo ser humano a este mundo, penso em algo muito carnal, muito animal, muito natural. Penso no regresso aos nossos instintos mais básicos e ao que faz de nós aquilo que somos. Penso na vida a gerar vida. Penso no milagre da natureza. 

Ora, numa cesariana não há nada disso. Uma cesariana é um procedimento cirúrgico. Numa cesariana não há nada de animal, de instinto, de vida a gerar vida. Numa cesariana há alguém inerte deitado numa mesa de operações, há muitos e variados profissionais de saúde em redor, há uma barriga que é cortada e de onde é extraído, contra a sua vontade, um pequeno ser. Não consigo ver grande beleza nisto. O problema está em mim, certamente. 

Achei o procedimento frio. Senti-me meio perdida naquele bloco operatório, até o Pai se ter juntado a mim. Foram minutos que pareceram horas. Tive medo. Senti-me ansiosa. Achei que tudo podia correr mal. Senti-me impotente e inútil, incapaz de trazer a minha filha ao mundo. 

Foi estranho sentir tudo. Sentir o frio do desinfectante a ser esfregado na minha barriga. Não senti o corte, mas senti a pele a ser afastada, a barriga como que esventrada, os movimentos dentro de mim, tudo demasiado real. Sem dor, mas sentindo perfeitamente o que se passava. Foi rápido. Muito rápido. 

Em poucos minutos, o choro da nossa filha. Da nossa Isabel. Nesse momento, já tinham baixado o campo cirúrgico e o Pai pode vê-la vir ao mundo. Eu, só podia ouvi-la. E que bem que ela se fez ouvir! Guardo na memória aqueles primeiros gritos. Vi, depois, as primeiras imagens que o Pai fez questão de captar. A nossa filha no mundo, gritando desalmadamente, mostrando a garra que traz consigo.

Quando ma mostraram, não pude não chorar. No meio de toda aquela estranheza, as lágrimas caíram, ao ver a nossa filha pela primeira vez. Era real. Ela estava ali, junto a nós, a iniciar a sua longa jornada, nesta viagem que é a vida. E nós, ali, a iniciar a nossa longa jornada, nesta viagem que é a parentalidade. 

Senti-me assoberbada por tudo. Custou-me não poder reagir, não lhe poder pegar, mal a conseguir ver. Parecia tudo demasiado surreal e eu continuava a sentir-me mais num procedimento cirúrgico do que naquele que se queria que fosse o momento mais bonito da minha vida. 

Eventualmente, levaram-na. E ele foi com ela. E eu fiquei ali, sozinha e perdida, no meio de estranhos, a ser suturada. Acho que só quando cheguei ao recobro e os reencontrei aos dois, é que respirei de alívio e me caiu a ficha. Só quando ficámos ali os três, em namoro completo, com ela junto a mim, comigo a querer examinar cada centímetro do corpo dela mas sem me conseguir mexer, é que eu percebi o que estava a acontecer. 

Eventualmente, ficámos só as duas. A conhecer-nos. A reconhecer-nos. A cheirarmo-nos mutuamente. A ver ao vivo o que imaginámos durante meses a fio. Não sei quanto a ela, mas eu, o que senti, é que era tudo infinitamente melhor do que eu poderia ter imaginado. 

O parto da Isabel não foi uma experiência bonita, ou memorável, ou o melhor momento da minha vida. Mas o que é que isso importa, com tudo o que virá depois?... 



[Texto escrito a 9 de Julho, duas semanas depois de a Isabel nascer. Não o publiquei na altura, por ter sido escrito a quente. Mas, hoje, o sentimento não melhorou. Sobretudo, porque tenho agora a certeza de que fui sujeita a uma cesariana desnecessariamente. Talvez um dia eu ultrapasse isto. Talvez eu tenha outro filho e o parto que idealizei. Ou talvez não. Mas teremos sempre a terapia, não é verdade? Foquemo-nos na última frase e em tudo o que já veio e o que ainda está para vir.]

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Das formas que temos de baixar os braços...

 

Hoje cancelei a subscrição da newsletter da Easyjet.



(ando a limpar a minha vida, a minha casa, e a minha alma, estendendo esta limpeza à poluição visual que recebo no digital - já cancelei as subscrições de várias marcas de roupa [no seguimento da decisão de um 2021 mais sustentável], e agora cancelei esta, resignando-me à ideia de que não voltarei a voar tão cedo)

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

Dos 6 meses da Isabel...


Seis meses de Isabel.

Meio ano. Uma metade de um ano. Já passou meio ano desde que a Isabel chegou a este mundo, e virou as nossas vidas de cabeça para baixo. Seis meses que voaram, respeitando o cliché que toda a gente nos repetiu até à exaustão: aproveitem, que passa depressa. E passou. Passou tão depressa que ela, não tarda, vai para a creche. Vai ser do Mundo, a minha filha. Vai deixar de ser minha e do Pai, para ser de quem a agarrar. Cresceu tanto nestes 6 meses. A última novidade foi ter conseguido rebolar sozinha. Claro que a gracinha aconteceu enquanto eu estava a trabalhar. Claro. Vai ser sempre assim, não vai? A partir de agora, vou ter de me habituar à ideia de poder perder muito do que acontece na vida dela. Chama-se crescimento, dizem. Independência, autonomia, vida para além da minha. Ela vai crescer e eu nem sempre vou lá estar. Mas vou lá estar sempre, quando ela quiser repetir as gracinhas. O rebolar, o agarrar os pés, os ruídos novos que todas as semanas explora com a boca. Agora aprendeu a imitar um toiro enraivecido. Do alto dos seus seis meses, faz um misto de rosnar com zurrar, e põe um ar de fazer chorar as pedras da calçada... De riso. Continua uma bem disposta. Ri-se que nem uma perdida. Por tudo, e por nada. Ri-se cada vez mais para o gato quando ele passa por ela. Passou aí uma fase muito crítica nas noites, mas parece estar ligeiramente melhor. Resta saber por quanto tempo. Vai começar a comer nos próximos dias. Fez um sucesso tremendo no Natal. Como faz sempre, aliás, nas raras vezes em que está com outras pessoas. É uma bebé Covid. Estranha barulhos e confusões. Mas distribui sorrisos e ninguém lhe resiste. Gostava que ela tivesse estado com mais pessoas este Natal, que tivesse andado em mais colos, em mais casas. Mas um dia vou contar-lhe o quão estranho foi o seu primeiro Natal. Hoje, para celebrar os seis meses, fui dar com ela a chuchar no dedo... Do pé. Acho que ela o fez apenas para calar as más-línguas que dizem que ela é gordinha. Pode ser gordinha, mas agilidade não lhe falta e vá de comer os pés. Outras más-línguas talvez digam que ela passa fome e, por isso, come os pés. Mas, olhando para aquelas bochechas, ninguém acredita. A minha filha faz hoje seis meses. Caramba. Seis meses. E eu que ainda não consigo olhar para mim como mãe. 

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Das coisas que a pandemia nos roubou...

Esta manhã, enquanto trabalhava, calhou em estar a passar uma música dos The National. E eu emocionei-me. Foi a segunda vez que isto aconteceu, em cerca de uma semana. Emocionei-me com algo tão simples como uma música dos The National (pouco importa qual).

A última vez que vimos os The National ao vivo foi há um ano e uns dias, no Campo Pequeno. Lembro-me de sair do escritório a correr, ir buscá-lo ao aeroporto (no tempo em que era normal as pessoas viajarem em trabalho), e irmos directos para o Campo Pequeno, onde comemos qualquer coisa num instante, e nos sentámos naquelas cadeiras estupidamente desconfortáveis.

O concerto começou e esquecemos o desconforto. O concerto começou e eu deixei-me levar pelas músicas. Com uma mão na tua mão e a outra na barriga (que ainda nem existia), eu quis guardar aquele momento para sempre. Fomos felizes, ali. Nós e a nossa sementinha, que ainda era segredo para a maioria das pessoas. Não me lembro, mas é provável que tenha chorado. Pelo menos, podia culpar as hormonas. Sei que gostei muito do concerto. Só podia, aliás.

Hoje, ao ouvir aquela música, voltei a esse concerto. E não pude deixar de me emocionar, ao pensar que não sei quando voltaremos, verdadeiramente, a um concerto. A pandemia tem-me levado tanta coisa boa, e a cultura é uma delas. Não sei quando voltaremos aos concertos, aos teatros, ao cinema. Não sei. E eu sei que eles continuam a existir. Eu é que não sei quando serei capaz de lá voltar. A pandemia levou-me a cultura e deixou-me o medo. E isso é uma grandíssima merda. 

terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Das fotografias que dão alegria... - Day 336



Não tenho cozinhado tanto quanto gostaria. Pergunto-me, diversas vezes, o que raio é que eu fazia com o meu tempo, antes de a Isabel nascer. Nada, aposto. Eu não fazia nada. É a única explicação que encontro. 

Hoje acordámos mais tarde que o habitual (a noite foi má e "obriguei" a Isabel a dormir mais um bocadinho de manhã). Fiz panquecas para o pequeno almoço. Fomos para a expo. Eu corri, enquanto ele caminhou com ela. Eu peguei nela, voltei para casa, e ele fez o treino dele e voltou a correr para casa. Tomei banho e fiz o almoço. Almoçámos. A Isabel fez a sesta. Eu arrumei a cozinha e fiz estas bolachas. Pelo meio, trocar fraldas, dar de mamar, brincar e palrar. Recebi uma notícia menos boa que me deixou a pensar. Falei com o meu Pai. Ainda fiz sopa. Estivemos a fazer testes para a sessão fotográfica de Natal. Demos banho e deitámos a Isabel. Jantámos. A Isabel acordou e eu voltei a adormecê-la. Comemos bolachas e chocolates da árvore de Natal. Vegetámos. Eu escrevo este post. Não tarda, vou dormir que amanhã é dia de trabalho.

E dizia eu antes que não tinha tempo... 

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Do meu nível de senilidade... Ou do meu quase regresso ao trabalho...

Hoje tinha pensado vir aqui escrever um post super inspirado sobre o facto de faltar, precisamente, uma semana para regressar ao trabalho.

A meio da manhã, o louco mais louco do que eu, veio ter comigo ao quarto da bebé e pergunta-me:

- Quando é que tu voltas ao trabalho mesmo?

- Daqui a precisamente uma semana...

- Então mas não era quarta-feira?

- Oh... Pois é... Eu pensava que era quinta e que ainda faltava uma semana. Já me deprimiste para o resto do dia... - e lá fiquei eu a pensar com os meus botões, que já não faltava uma semana inteira.

Pois não. Falta menos de uma semana para eu regressar ao trabalho. Como?! Não sei.

Também não sei o que andei a fazer nos últimos quatro meses e meio. Também não sei onde foi parar o tempo. Também não sei como é que, de repente, estamos a chegar ao fim de Novembro e deste ano memorável. 

Não sei se foi da pandemia, se foi de mim e da minha inércia, mas tenho a clara sensação de que não fiz nada este ano. Nada. Eu sei que gerei, trouxe ao mundo e cuidei de um pequeno ser. Mas foi só isso. "Só". Sim, eu estou ciente da grandeza do que fiz. Mas... Sabe-me a pouco. Este ano não viajámos. Não convivemos. Não estivemos com as nossas pessoas. Não fomos a concertos. Não experimentámos restaurantes novos. Não fomos a provas. Estamos a pouco mais de um mês do final do ano, e eu vivo sentimentos agridoces: 2020 foi o ano em que veio ao mundo a nossa maior obra, mas foi também o ano em que toda a nossa existência esteve em suspenso.

É também com sentimentos agridoces que regresso ao trabalho. Precisamente devido a este sentimento de inutilidade no que a este ano diz respeito, tenho uma necessidade tremenda de voltar a trabalhar e sentir-me útil. Ao mesmo tempo, assusta-me pensar que está a chegar ao fim uma altura que nunca se irá repetir: o poder estar 100% dedicada à Isabel. Em breve, muito em breve, a Isabel deixa de ser apenas nossa e passa a ser do mundo. E isso tem tanto de incrível como de assustador. Caramba, que ainda ontem ela nasceu, e não tarda está na escola!... 

domingo, 8 de novembro de 2020

Dos dias que marcam o mundo...

 


Hoje voltei a correr. 317 dias depois da São Silvestre de Lisboa, onde tinha corrido pela última vez. Pelo meio, uma gravidez, uma cesariana, e um pós-parto chato. 

Foram só quatro quilómetros e feitos a um ritmo miserável, mas souberam-me a uma maratona. Quando hoje comecei a correr, estava em crer que nem um quilómetro seria capaz de fazer, e contava ir alternando corrida e caminhada. Afinal, foram quase 11 meses parada. Fui fazendo caminhadas, fui fazendo algum treino funcional, mas só isso. Quando o primeiro quilómetro acabou, pensei que era giro fazer mais um. E quando o segundo acabou, achei que três eram uma bela conta. Mas depois acabou o terceiro, e já só faltava um para o carro. E foi assim que eu fiz quatro quilómetros. Quatro míseros quilómetros, que me souberam a tanto, que me deram tanto. 

Estava a precisar disto. Muito. Tanto. Durante quase meia hora, sozinha com a minha música e o rio como pano de fundo, eu voltei a ser eu. Eu deixei de ser só a mãe da Isabel, e voltei a ser a Inês. Eu não pensei em nada. Eu pensei na passada, na respiração, na música que me inspirava, nas dores boas que voltaram a surgir. Quando cheguei ao fim, estava cansada, mas sentia-me incrivelmente bem e orgulhosa de mim mesma. Superei-me. E já não me lembrava da última vez em que isso tinha acontecido. 

Agora é não parar. 

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Dos altos muito altos e dos baixos muito baixos desta vida...

 


Há dois anos estávamos em Nova Iorque, naquela que foi uma das viagens das nossas vidas.


Há um ano estávamos no Porto, a viver dias muito felizes, a gozar um segredo que ainda era só nosso.

Este ano, estamos fechados em casa há 9 meses, num confinamento sem fim à vista. Um confinamento que nos consome, que nos suga as energias positivas, que nos arrasta numa espiral de desespero.

Tenho muita curiosidade em saber como vai ser o fim de tudo isto. Já nem me pergunto o quando, porque já sei que essa resposta não existe. Mas o como. Como é que vamos voltar à normalidade? Como é que vamos voltar a dar beijinhos e abraços? Como é que a nossa sanidade mental vai recuperar? Como é que eu vou ser capaz de voltar a uma sala de espectáculos? Como? Como? Como?... Parece uma realidade ainda tão distante e impossível, que eu não consigo sequer imaginá-la.

Tenho demasiado medo do impacto que esta pandemia teve em mim. Não me revejo na pessoa que sou agora. Não me revejo nestes medos e paranóias. Não me revejo na ansiedade que certas idas ao exterior me provocam. Nos raros momentos de lucidez que vou tendo, sei que, talvez, esteja a exagerar. Mas, depois, assisto às notícias, leio relatos, vejo o caos no SNS, vejo os números a aumentar, e fico a perguntar-me se estarei mesmo a exagerar. Porque também não me revejo nos comportamentos à minha volta. Porque também não me revejo nas teorias da conspiração. Porque também não me revejo em quem acha que está tudo bem e continua com a sua vida social habitual. Não consigo. Não sou capaz.

Sanidade mental procura-se.

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Da Gravidez... - XV (ou do dia em que eu soube que ia fazer uma cesariana...)

Corria o longínquo dia de 2 de Junho de 2020 quando, depois de mais uma CTG, a minha obstetra me disse, definitivamente, que a Isabel iria nascer de cesariana.

E eu tive, mais uma vez, a confirmação daquilo que já vinha a descobrir nos últimos meses na gravidez: nada é como tínhamos imaginado. Podemos ler, fazer cursos, sonhar, planear, tudo e mais alguma coisa. Mas a maioria das coisas fogem do nosso controlo, e resta-nos aceitar.

Lembro-me de me ter sentido particularmente inútil. Eu não servia para trazer a minha filha ao mundo. Dramático, eu sei. Exagerado, eu sei. Mas foi o que senti naquele momento.

A opção da obstetra pela cesariana era discutível e, apesar de ela já ter falado nisso uns meses antes, eu achei que era apenas uma possibilidade e que continuaria a haver a hipótese de se tentar um parto natural. Naquele dia, eu percebi que não. E fiquei sem chão.

Questionei tudo. Questionei-me a mim. Muito. Falei com várias pessoas e pedi várias opiniões, que se dividiam.

Eu não queria fazer uma cesariana. E não era um mero capricho meu de quem acredita em fadas e unicórnios. Eu não queria fazer uma cesariana porque eu não tinha a certeza de que a cesariana fosse a única opção, ainda que a minha obstetra achasse que era a melhor opção, para minha segurança e da bebé.

Mas a opinião da minha obstetra não era consensual, não era completamente objectiva, não era a única. E, com 36 semanas de gravidez (quase 37), eu só tinha duas opções: aceitar o que a obstetra dizia e queria fazer, ou mudar de obstetra (o que implicava mudar também de sítio onde a bebé ia nascer). Ainda consegui que uma amiga falasse com uma obstetra que seria uma hipótese para mim, e que achava que não era linear que eu fizesse uma cesariana, mas que não estava a aceitar novas grávidas. 

Foram tempos confusos em que, na verdade, não tinha muito tempo para uma decisão. Se, por um lado, uma parte de mim achava que eu devia ir à procura de outro obstetra que me desse uma hipótese, uma parte de mim já estava contaminada pelo grilo falante que iria estar sempre a perguntar-me se insistir num parto normal não seria um erro e se não estaria a pôr em causa a minha segurança e a da bebé. Conhecendo-me, eu sabia que mesmo que mudasse de obstetra, iria ter sempre aquela dúvida de saber quem é que teria razão e do que seria realmente melhor no meu caso. Até podia ter avançado para um parto normal, mas era provável que passasse o tempo todo com medo de uma eventual complicação (que podia ser muito complicada). Ou então não, e eu podia ter tido um parto natural espectacular. 

Nunca vou saber. Na altura, decidi manter-me com aquela obstetra. Hoje? Arrependo-me profundamente. Já aceitei e já quase me perdoei. Sei que tomei a decisão que me fez sentido na altura, com a informação que tinha. Também sei que me faltou alguma força e coragem, mas, às 36 semanas de gravidez, eu tive medo de bater o pé e pôr em risco a bebé. Também sei que não seria fácil arranjar novo obstetra naquela fase da gravidez. E sei que nunca me perdoaria se alguma coisa tivesse corrido mal, porque eu tinha mudado de obstetra de repente. Na altura, mesmo sabendo que talvez a opção pela cesariana não fosse a melhor, eu decidi como me fez sentido. Agora, já não há nada a fazer em relação a isso. No futuro, já sei quem será a minha nova obstetra.

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Da Gravidez... - XIV (ou do meu primeiro breakdown... e de todos os outros...)

Uma das coisas boas da gravidez, é que podemos culpar as hormonas por 99% das coisas que nos acontecem. Têm as costas muito largas, as pobres hormonas.

Curiosamente, eu não me senti muito "hormonal". Bom, talvez alguém cá em casa discorde. Mas foi o que eu achei.

Claro que tive os meus momentos e as minhas crises. Claro que chorei pelas coisas mais tolas e me emocionei por coisas que antes talvez ignorasse. Mas podia sempre culpar as hormonas, e estava tudo bem.

Culpa das hormonas, ou não, lembro-me perfeitamente do meu primeiro breakdown a sério. De repente, já não sei a propósito de quê, eu dei comigo na casa de banho a chorar convulsivamente. De repente, eu pus tudo em causa.

Naquele momento, eu perguntei-me se seria capaz de ser mãe, se estaria à altura do desafio, se teria nascido para ser mãe, se não seria tudo um grande erro. Chorei, chorei, chorei. Depois enfiei-me na banheira, chorei, chorei, chorei, e, eventualmente, passou. Podia sempre culpar as hormonas.

Mas culpa das hormonas, ou não, ao longo da gravidez fui tendo diversos momentos de dúvidas e medos.

O meu principal medo? Aquele que mais me assaltou, que mais me tirou o sono, que mais me fez chorar? O mais óbvio: serei eu capaz de ser melhor mãe do que a minha mãe foi para mim? Se, por um lado, a resposta parece evidente: não é difícil ser melhor mãe do que ela foi. Por outro lado, é difícil eu conseguir acreditar que posso ser melhor mãe, quando não tenho grandes referências ou exemplos. Houve muitos momentos em que eu me questionei se seria capaz de, não tendo tido uma boa mãe, ser uma boa mãe.

Ainda me faltam muitos anos de terapia para resolver e arrumar de vez aquilo que foi a minha relação com a minha mãe. Com ela morta, a coisa fica ainda mais difícil. Mas um dia eu hei-de lá chegar. Enquanto não chego, é inevitável que isso condicione a minha experiência enquanto mãe. Claro que, de forma muito racional, eu sei perfeitamente o impacto que isso pode ter e uso todas as estratégias possíveis para que isso não me influencie negativamente. Posso não ter as coisas bem resolvidas, mas tenho consciência delas e, lá está, sendo muito racional, sei perfeitamente que posso fazer diferente. Muito diferente. O problema são aqueles momentos em que eu não consigo ser muito racional, e em que eu me vejo condenada ao fracasso, incapaz de ser uma boa mãe para a Isabel. São poucos esses momentos, são cada vez menos, mas, de quando em vez, ainda me assaltam os pensamentos.

Para além de todos os grandes desafios que a maternidade nos traz, para mim, trouxe este muito difícil: o obrigar-me a olhar para mim, para a relação que tive com a minha mãe, para o que fui enquanto filha e o que (não) quero ser enquanto mãe. E tem sido uma luta monstruosa!...

sexta-feira, 31 de julho de 2020

Da Gravidez... - XIII (ou da forma como toda a gente te diz que te deves sentir, que nem sempre corresponde à forma como te sentes...)

O tema da maternidade está, todo ele, envolto em muitas e variadas opiniões, que são, muitas vezes, extremadas e radicais. Isso, só por si, já me cansa. Pior ainda quando, na maior parte dos casos, as minhas opiniões não condizem com as da maioria.

Comecemos pelo princípio. 

Para a larga maioria das mulheres, ser mãe é algo relativamente óbvio e natural. Para algumas, é mesmo algo com que sonham desde crianças. Para umas e outras, é algo que faz parte dos planos, do caminho natural da vida, dos passos que pretendem ir dando e dos objectivos que querem alcançar. Não conseguem sequer conceber a vida sem filhos. E está tudo bem.

Depois, há as outras. As que não querem ter filhos. As que não se imaginam com filhos. As que acham que também pode haver vida sem filhos. E já não está tudo assim tão bem.

Eu fiz parte do segundo grupo durante muitos anos. Nunca me imaginei como mãe, nunca pensei que as crianças fossem o melhor do mundo, nunca me derreti particularmente com bebés, nunca me senti "mãezinha", nunca achei que me faltasse essa peça na minha vida para ser feliz. Mas quis a vida que, um dia, eu mudasse de opinião, e eu passei a querer ter filhos. Mas essa foi a única coisa que mudou. Não baixou em mim todo um instinto maternal, nem passei a adorar criancinhas de um momento para o outro, ainda que possa vir a achar que a minha criança é o melhor do mundo (mas só a minha, sorry!).

Eu sou uma pessoa (relativamente) racional. Pouco emocional e fria, até, em algumas coisas. Calhou (ou não calhou porque fui eu que escolhi assim) ter ao meu lado uma pessoa igual ou ainda pior do que eu. Não era por acaso que, nos inícios da relação, eu lhe chamava cubo de gelo. Somos os dois assim, e está tudo bem.

Daí que, ao longo de toda a gravidez, eu tivesse dificuldade em lidar com perguntas como "estão super felizes?", ou afirmações como "aproveita a gravidez que é uma experiência única e vais ter saudades", ou ainda "ser mãe é a melhor coisa do mundo". Também é comum vermos e ouvirmos relatos de quem diz que amou os seus filhos desde o momento em que soube que estava à espera deles, num amor gigante e crescente. E eu, confesso, senti-me meio alien por não ter sentido isso. Na nossa racionalidade, a verdade é que acho que sentimos os dois dificuldade em criar relação com um ser que não víamos e que ainda não era bem real para nós. Até ao momento em que a Isabel nasceu, eu tive dificuldade em acreditar que ela era mesmo real, e tive dificuldade em sentir esse amor de que toda a gente me falava.

Também tive dificuldade em adorar a gravidez, mas já falámos sobre isso.

Agora, que a Isabel nasceu, eu continuo a sentir-me alien, por continuar a não me identificar com muitas das coisas que oiço e leio por aí. Não devia, mas fico a questionar-me se haverá algo de errado em mim, se não nasci mesmo para ser mãe, se terei algum defeito. Talvez daqui a uns anos se venha a descobrir que sim, que tenho, e já fica aqui o registo da minha consciência do facto.

Nestas 5 semanas (fez ontem!), eu já me afastei da Isabel algumas vezes. Três, se não estou em erro. Todas para ir ao médico e cerca de 2 horas de cada vez. Em momento algum eu me senti culpada ou preocupada. Não me custou, não fiquei a sofrer, não morri de saudades. A Isabel estava com a pessoa que, a par de mim, melhor pode cuidar dela. E eu não vi qualquer razão para estar preocupada. Mas fiquei preocupada por não ficar preocupada. O que é só parvo, mas é o que toda a pressão em torno deste tema me faz sentir.

Hei-de voltar a falar nisto, noutra perspectiva, mas confesso que é algo que me preocupa: não estar a sentir a maternidade como a generalidade das pessoas a sentem.

Também já me perguntaram coisas como "estás a adorar ser mãe?" ou "apaixonaste-te pela tua filha assim que a viste"?. E eu fico sempre na dúvida se dou a resposta verdadeira, ou a resposta politicamente correcta. 

No caso da primeira pergunta, depende da hora a que me perguntarem. Neste momento, em que tenho a Isabel envolta no pano, em pele com pele, encostada ao meu peito, sem chorar há uma hora, e lhe vou dando beijos na testa enquanto escrevo este post, sim, estou a adorar ser mãe. Se me perguntarem às duas da manhã, quando ela berra desalmadamente, quando nada a acalma, e quando ninguém neste prédio dorme, talvez eu responda que não estou a adorar assim tanto. 

No caso da segunda pergunta, não, não me apaixonei pela Isabel assim que a vi. Peço desculpa por isso, mas a verdade é que não acredito em amor à primeira vista (desculpem, não resisti!). A seu tempo, hei-de pôr aqui o texto sobre o nascimento dela, o que poderá ajudar a explicar isto.

No fim do dia, estou a adaptar-me a esta nova condição da minha vida, a esta nova realidade, a este novo ser que me desafia e apaixona em medidas (quase) iguais. E está tudo bem.

domingo, 26 de julho de 2020

Do primeiro mês desta aventura que é a maternidade...


Um mês de Isabel.

A fotografia é muito representativa do que têm sido estes 30 dias: uma montanha russa de emoções, um caos e muitos altos e baixos. 

Correndo o risco de me tornar repetitiva: ninguém nos prepara para isto. É incrivelmente duro. Mas (quase) ninguém fala nisso. Há uma pressão constante para que digamos o quão maravilhoso é tudo isto, como é único, como é a melhor coisa da nossa vida, como o amor e a felicidade nos inundam. 

Voltando à fotografia que ilustra este post: meia hora antes de a tirar, tinha estado a chorar baba e ranho. Mas, depois, porque a miúda completa um mês e senti a obrigação de imortalizar o momento, que uma pessoa não pode deixar de assinalar estas datas porque senão é pior mãe por isso, vá de pôr um sorriso (falso) na cara e fingir que está tudo bem, e que é tudo espectacular e que o babywearing é uma coisa muito gira (e é... sobretudo, quando é a maneira mais eficaz de fazer parar a berraria deste pequeno ser que nasceu com uns belos pulmões).

Eu sei que vejo sempre as coisas de forma meio fria e racional. Ou talvez realista, diriam alguns. Também sei que quando a miúda entrar para a faculdade, só me vou lembrar dos momentos bons, dos sorrisos que já esboça, dos sons deliciosos que faz e do deslumbramento que sinto de cada vez que olho para ela e me pergunto como é que fui capaz de fazer algo tão perfeito. Mas nem tudo são rosas. E há dias (e noites) que custam. 

Post escrito às cinco da manhã, com ela ao meu colo, depois de ter tido de trocar a roupa dela e a minha, após uma sessão simpática e bastante exemplificativa da arte de bolsar. Dêem um desconto e tenham um bom Domingo! 

terça-feira, 21 de julho de 2020

Dos tempos estranhos que vivemos e que levam a posts inusitados neste blogue...

Hoje entrei num centro comercial.

Este blogue faz este mês 11 anos e jamais me passou pela cabeça que um dia iria escrever um post para dizer "hoje entrei num centro comercial".

Mas a verdade é que, dadas as circunstâncias, o facto de eu hoje ter entrado num centro comercial, é algo a assinalar.

Estou em casa desde o início de Março e, desde então, não voltei a ir às compras, ao supermercado, a centros comerciais. Tenho usado e abusado das compras online (coisa que já fazia antes), e vivo feliz assim. As minhas saídas resumiram-se, basicamente, a saídas por motivos médicos (diz que tive uma filha entretanto, e esse tipo de coisas...), ou saídas para caminhar.

Hoje, no entanto, como tinha de comprar uns óculos, acabei por ser mesmo obrigada a voltar a entrar num espaço desses.

E foi estranho. Muito estranho. Para quem continuou a andar na rua e a fazer compras, esta nova realidade foi-se entranhando aos poucos. Foi-se tornando normal. Para mim, que estive quase 4 meses em casa, foi um choque. Senti-me quase que a visitar um país novo. Mas, afinal, estava só no Vasco da Gama.

Ainda não tinha contactado verdadeiramente com este novo mundo em que toda a gente anda de máscara, em que as lojas têm uma entrada e uma saída, em que em toda a parte vemos dispensadores de desinfectante.

E foi estranho. Muito estranho. Tive algum receio, confesso. Não me senti completamente confortável e não me imagino a ir às compras tão cedo, confesso. Se, por um lado, sei que temos de nos adaptar e habituar a esta nova realidade, por outro, ainda não me sinto preparada para isso.

Esta pandemia mexeu connosco de formas que vão muito para além do que poderíamos imaginar... E estar a criar um pequeno ser neste contexto, é ainda mais assustador. Temo pela minha sanidade mental mas, sobretudo, temo pelo impacto que isso terá nela.

Só o tempo nos trará respostas...

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Da Gravidez... - X (ou da minha relação com o meu corpo...)

Não é exagero dizer que há, pelo menos, 20 anos que eu não tenho uma relação particularmente saudável com o meu corpo. Já houve momentos melhores e momentos (muito) piores. Já houve alturas em que eu não suportava olhar-me ao espelho, e já houve alturas em que eu até conseguia gostar do que via.

Naturalmente, a gravidez e as inevitáveis alterações que provoca no corpo de qualquer mulher, voltaram a trazer este tema à baila. 

Houve vários momentos em que tive dificuldade em lidar com a imagem que via ao espelho e com os números na balança, e fui passando por várias fases ao longo dos meses.

Tinha para mim que não queria engordar muito na gravidez, que me queria manter activa, controlar o peso e manter-me relativamente elegante (para uma pequena lontra, entenda-se). 

Nos primeiros tempos, e por causa dos enjoos, cheguei mesmo a perder peso. E percebi que não podia continuar assim... De todas as alturas da vida em que eu podia estar preocupada com dietas, a gravidez não devia ser uma delas. E comecei a obrigar-me a comer, tentando contrariar os enjoos e a falta de apetite.

Depois veio o Natal e a passagem de ano (fomos tão felizes em Lagos!), depois veio o deixar de correr, vieram jantares e almoços, veio Berlim, os meus anos e o confinamento... E eu fui engordando. E o meu corpo foi crescendo. E os números na balança foram aumentando.

Com 5 meses, quando levei suspiros cor de rosa para o escritório, para anunciar que vinha uma menina a caminho. 

A juntar a isto, uma opinião externa a criticar o quanto eu já tinha engordado e eu a sentir-me um pequeno cachalote. Pessoas, não se comenta o peso dos outros, muito menos de uma grávida! Vá lá... Não é assim tão difícil. Na altura, por mil e um motivos, isso mexeu demasiado comigo. Feliz ou infelizmente, coincidiu com a época em que eu tive indicação para começar a fazer as minhas caminhadas. Entre o regresso à actividade física, e a neura por me acharem gorda, a verdade é que o meu peso estabilizou e pouco engordei nos últimos meses.

Também me dediquei aos treinos de força em casa.
Aqui, com quase 7 meses. 

Foi difícil para mim ver o meu corpo mudar. Ver a barriga crescer, as ancas e o rabo (ainda) maiores, a perda de mobilidade, a incapacidade de fazer uma série de coisas. Desde cedo, fiquei meio em choque quando me faltava o ar ao subir dois lanços de escadas. Como é que eu já tinha feito duas maratonas, e agora ficava cansada com as escadas do metro?... Foi uma luta para mim ir aceitando as minhas crescentes limitações, com o passar do tempo. Uma parte do meu cérebro deve ter achado que eu engravidava mas que ia continuar tudo igual, a fazer na mesma tudo o que já fazia antes, como se nada se passasse. O meu corpo fez o favor de, rapidamente e sem margem para dúvidas, me mostrar que não ia ser assim.

Com quase 8 meses. 

Foram meses de adaptação a esta nova realidade, de sentimentos estranhos e confusos, de alguma frustração e de muito espanto. Tanto dava por mim a olhar para o espelho e a sentir-me disforme, como dava por mim a olhar para o espelho e a sentir-me maravilhada com a minha barriga gigante, casulo da nossa filha.

Agora, precisamente duas semanas depois do parto, continuo com dificuldade em ver-me ao espelho. Se antes procurava consolo na ideia de carregar em mim uma nova vida que viria a este mundo, agora não há consolo possível que advenha destes quilos a mais aqui instalados. Já perdi 8 quilos, faltam 5,5. E eu conto os dias para poder voltar a treinar...

terça-feira, 23 de junho de 2020

Da Gravidez... - VII (ou de como a gravidez não é doença mas...)

Gravidez não é doença,

Quem nunca ouviu isto?...

De facto, gravidez não é doença, mas... 

Mas eu sinto-me muito pouco saudável, na maior parte dos dias.

Ou estou enjoada, ou estou com azia, ou estou com alguma dor, ou fico sem fôlego se subo dois lanços de escada. Gravidez não é doença, mas é cansativo e pode ser exasperante, para alguém que estava habituada a um certo nível de actividade.

Chego ao final da gravidez em modo repouso e a tomar 10 comprimidos por dia.

Se isto é estado de graça, eu não vejo onde está a graça (perdoai a piada óbvia).

Comecemos pelo princípio: os enjoos. Eu não vomitei uma única vez ao longo da gravidez, felizmente. Sei que há mulheres que passam muito pior do que eu e talvez nem me devesse queixar. Mas eu passei tanto tempo tão enjoada, Senhores!... Os enjoos começaram logo no início e esqueçam lá a conversa dos enjoos matinais. Eu tinha enjoos de manhã, à tarde e à noite. Eu tinha enjoos com chá, eu fazia um esforço tremendo a lavar os dentes, eu cheguei a correr para a sanita algumas vezes, eu sofria horrores no caminho de e para o trabalho (entre o percurso a conduzir e o percurso no metro em hora de ponta, não sei o que era pior). Mais ou menos no final do 1º trimestre, eu comecei a tomar o Nausefe. E a minha vida melhorou. Ligeiramente, mas melhorou. Quando comecei a ser acompanhada no privado, a obstetra mandou-me alterar a forma como tomava o Nausefe, e a quantidade. E a minha vida melhorou. Ligeiramente, mas melhorou. Quando comecei a trabalhar a partir de casa, mais ao menos aos 5 meses de gravidez, a obstetra aumentou-me ainda mais a dose. Não o quis fazer antes porque, em teoria, o Nausefe dá imenso sono, e ela não me queria a conduzir com sono. Quando aumentei a dose, a minha vida melhorou mais significativamente. Os enjoos diminuíram e eu comecei a sentir-me melhor. Curiosamente, há 3 ou 4 semanas, eu achei que era boa ideia reduzir a dose do Nausefe. Pensei eu para mim que, em estando no final da gravidez, já não haveria de ter enjoos. Pois... Má ideia. Bastou o primeiro dia, para eu chegar a meio da tarde terrivelmente enjoada, e perceber que hei-de tomar o Nausefe até entrar para a sala de partos. E está tudo bem.

Não me posso esquecer de uma conversa telefónica que tive com o meu Pai, em que eu comentava os enjoos e ele me dizia:
- Oh, deixa lá! Dizem que isso depois dos 3 meses passa.
- Sim, Pai. O problema é que eu já faço 5 meses para a semana!...
- Ah! Então fazes parte da excepção que há sempre em todas as regras...

Podia ser pior, eu sei.

A juntar às coisas chatas da gravidez que, não sendo doença, pode fazer-nos sentir doentes, resolvi arranjar mais uma coisa gira: Síndrome do Tunel Cárpico.

Diz que é coisa que afecta 25% das grávidas. Não é tão raro assim, portanto. Surge graças às maravilhosas alterações hormonais que o corpo sofre durante a gravidez e ao inchaço natural deste estado.

Desde cedo na gravidez que eu sentia as mãos mais dormentes do que o normal. Com coisas simples e básicas (como estar mais tempo ao telemóvel), eu ficava com as mãos dormentes. Achava que era normal, e desvalorizava. E andei assim uns tempos. Até que ali pelos 6/7 meses de gravidez, a determinada altura, eu comecei a acordar a meio da noite cheia de dores na mão direita. A sensação que tinha era de que os dedos estavam a arder e dedos e mão estavam inchados. Estávamos em plena pandemia, e eu não queria ir ao médico por causa disso. Fiz uma teleconsulta e disseram-me que devia ser o dito Síndrome. Mandaram fazer gelo, repouso e ver se passava. A coisa melhorou, mas ao fim de umas semanas voltou a piorar, já me afectava as duas mãos, e eu achei melhor marcar uma consulta de ortopedia. Confirmou-se o diagnóstico e vim de lá com uma tala, para usar durante a noite, que imobiliza a mão e impede o pulso de dobrar (que é o que provoca as dores, ao comprimir o nervo). E é assim que eu estou há mais de um mês a dormir com uma linda tala, que dá imenso jeito (só que não). É chato. Não é nada do outro mundo, mas é chato. Voltei a conseguir dormir, só acordando com um ou outro desconforto pontual, e durante o dia tenho algumas dormências e dores nas articulações, mas estou bem melhor. Diz a médica que, depois do parto, pode demorar até 2 meses a passar completamente... O que vai dar imenso jeito com uma recém-nascida para cuidar. Mas tudo bem.

Mas... E porque nem tudo é mau... Há uma série de outras coisas que são comuns na gravidez e das quais não me posso queixar: não tenho grandes dores nas costas, não estou particularmente inchada, ainda consigo andar sem parecer uma pata, não tenho grande sono (antes tivesse)... 

Não, nem tudo é mau. Mas a verdade é que me custa lidar com estas limitações que o meu corpo me auto-impõe, sinto-me meio inútil na maior parte dos dias, e não estou a adorar esta fase. Mas diz que está quase a acabar...

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Do 13 de Maio e da peregrinação e d'O Caminho e de como tudo isto se une à corrida...

Eu não sou uma pessoa religiosa, como já devo ter dito por aqui.

Não acredito num qualquer deus supremo, não sou grande fã da igreja católica, e não me lembro da última vez em que assisti a uma missa (tirando as habituais e inevitáveis em casamentos e funerais).

O que não é o mesmo que dizer que desprezo ou não respeito a religião dos outros. Pelo contrário. Há, até, momentos em que quase que invejo os mais crentes, por conseguirem encontrar na sua religião um amparo, uma fé, uma força invisível que os guia, apoia e encaminha. Eu não tenho nada disso, e estou condenada a aceitar os desígnios da vida, que é como é, só porque sim, sem qualquer propósito superior.

Ao ver as imagens do Santuário de Fátima completamente vazio, sem a habitual procissão das velas, não pude ficar indiferente. Tal como não fiquei indiferente às imagens da Praça de São Pedro na Páscoa. Qualquer pessoa que já tenha estado naquela praça, sempre cheia de turistas, dificilmente fica indiferente.

O 13 de Maio não me diz nada. Tal como Fátima não me diz nada. Mas a peregrinação que todos os anos milhares de peregrinos fazem para lá chegar, diz-me muito. Não que algum dia a tenha feito. Ou que pense algum dia fazê-la. Mas porque admiro muito quem a faz, sejam quais forem os seus motivos, as suas crenças, a sua fé.

Como também já disse por aqui, um dia quero fazer O Caminho. Se não tivesse conseguido engravidar, era muito provável que o fizéssemos este ano. E não teria nada a ver com religião. Porque cada um tem os seus motivos para fazer a peregrinação a Fátima ou para fazer os Caminhos de Santiago.

Para mim, fazer o Caminho de Santiago, representa a oportunidade de voltar ao básico, ao essencial da vida, ao despojamento, a uma forma de meditação e de viagem ao nosso interior, que na vida actual é difícil, se não mesmo impossível. Representa um desafio físico e mental tremendo, que, suponho eu, se deve consagrar numa sensação única e indescritível ao ser atingido o objectivo.

Diz, quem o fez, que O Caminho não se explica, não se descreve, não se compara. Mas eu, na minha habitual arrogância sem, no entanto, querer ofender ou desrespeitar quem quer que seja, acho que talvez se possa comparar um bocadinho, só um bocadinho, a certas provas que certos loucos das corridas fazem por aí. Não sou a única a achar que certas provas de trail têm em si um pouco de peregrinação, de viagem espiritual, de meditação. A mim já me aconteceu, em provas em que passei quilómetro após quilómetro sozinha, perdida no meio dos trilhos, sem ver vivalma, dar comigo embrenhada nos meus pensamentos, nos meus dramas e dúvidas existenciais, e chegar ao fim da prova a sentir-me mais leve, mais viva, mais lúcida em relação ao que me rodeia.

Nunca fiz uma ultra (ainda), muito menos uma prova daquelas assim mesmo, mesmo grandes, mas acredito que tenha muitas semelhanças com o que se sente numa peregrinação ou n'O Caminho. Para algumas pessoas, pelo menos. Porque, tal como na Peregrinação a Fátima, cada um que começa uma prova fá-lo pelos seus motivos, fá-lo com os seus objectivos, fá-lo com um propósito e com vontade de atingir uma determinada sensação ao cortar a meta. Não há motivos certos ou errados. Não há sensações melhores ou piores. Há desafios individuais.. Há superações individuais. Há, em comum, uma certeza: ninguém acaba uma Peregrinação, um Caminho, ou uma prova, da mesma forma que a começou. Todos aprendem. Todos crescem. Com sorte, todos se tornam pessoas melhores. E, só isso, já valeu a pena. Que nos mova a religião ou a loucura, é só um pormenor de somenos.

Os devaneios Agridoces mais lidos nos últimos tempos...