| MOHAMMED SALEM / Time Palestinianos junto à sua casa destruída, em Jabalia, no norte da Faixa de Gaza 3 fevereiro 2025 |
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quarta-feira, novembro 26, 2025
A IMAGEM: Mohammed Salem, 2025
terça-feira, novembro 25, 2025
quarta-feira, novembro 05, 2025
domingo, novembro 02, 2025
A herança de Hannah Arendt
| Fotograma do filme Vida Activa: O Espírito de Hannah Arendt (2015) |
O que é o espaço público da vida política? Dentro dele, que lugar existe (ou não) para os cidadãos que somos? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (17 outubro).
A revista francesa Philosophie Magazine acaba de lançar um número especial dedicado a Hannah Arendt (1906-1975). Nele encontramos uma antologia multifacetada, incluindo citações, textos de análise e entrevistas com estudiosos da obra de Arendt, celebrando a extrema e perturbante actualidade da sua obra. Entenda-se: não uma “aplicação” simplista do seu pensamento ao nosso século XXI, mas uma releitura crítica da sua fascinante pluralidade argumentativa, sem esquecer que tal pensamento não pode ser dissociado do contexto geo-político em que os nazis puseram em marcha o Holocausto, nessa medida envolvendo o estudo dos totalitarismos antes, durante e depois da Segunda Guerra Mundial.
As propostas de reflexão são tanto mais interessantes quanto, mesmo quando não o explicitam, ecoam uma fundamental disponibilidade intelectual que vai pontuando a obra de Arendt. A saber: o desejo de libertar a política — enquanto pensamento e acção — da dicotomia compulsiva “direita/esquerda”. Escusado será dizer que a resistência às facilidades de tal dicotomia não se confundem com qualquer forma de fusão, que seria pura confusão, dos ideários dos diferentes adversários políticos.
O que está em causa é a possibilidade de pensar além (porventura aquém) da sua pressão ideológica e, hoje em dia, mediática, infelizmente dominante no espaço televisivo. A esmagadora maioria das “análises” que acompanhamos no pequeno ecrã aplicam a fórmula “direita/esquerda”, não para tentar compreender a dinâmica das ideias políticas, apenas para avaliar se tais ideias satisfazem ou não a fórmula dicotómica enunciada antes do próprio conhecimento dos factos e das suas nem sempre previsíveis dialécticas.
Numa das entrevistas deste número da revista, Roger Berkowitz, filósofo e professor do Bard College (Nova Iorque), fala, em particular, do que significa “defender uma certa ideia da América” face à presidência de Donald Trump. A esse propósito, analisa os prolongados efeitos da acção da “nova elite” que, na sequência das convulsões da década de 1960 contra as elites conservadoras, se apresentou como uma entidade que sabe “tudo sobre tudo”, tentando impor “novas normas para todos”.
Berkowitz recorda que semelhante ditadura do novo (a expressão é apenas minha) “é o que Hannah Arendt critica, por exemplo, na vontade dos militantes dos direitos cívicos imporem pela força que os autocarros escolares se abram à diversidade racial, sobrecarregando as crianças com a reparação do fardo da segregação herdado do passado” — sem esquecer, repito, que tudo isto deve ser citado em função de uma conjuntura americana vivida há 60 anos.
De qualquer modo, Berkowitz reflecte também sobre o presente de uma certa cultura política “liberal” (as aspas são dele), prolongando o seu raciocínio com uma alusão muito pessoal: “Sou favorável ao aborto, mas não pretendo impor os meus pontos de vista aos que não pensam assim. Sou favorável à mudança de género, mas não pretendo impor a toda a gente a ideia segundo a qual o género não existe. Acima de tudo, não estou a afirmar que aqueles que discordam de mim são racistas sexistas e transfóbicos que deviam ser excluídos do debate público.”
A herança de Hannah Arendt não pode ser separada deste misto de agilidade e contundência — e, nessa medida, do conceito (e, sobretudo, das práticas) daquilo a que damos o nome de espaço público. Recordando Thomas Jefferson, escreveu ela em 1967, no seu Ensaio sobre a revolução: “O que, segundo ele, constituía o perigo mortal para a república era que a Constituição tivesse conferido todo o poder aos cidadãos sem lhes proporcionar a possibilidade de serem republicanos e de agirem enquanto cidadãos.”
O que nos encaminha para uma pergunta que assombra as nossas democracias: porque é que o único espaço público activo, diariamente activo, passou a ser o espaço televisivo? Para lá do afunilamento dos pensamentos, não estará o mesmo espaço a promover uma noção meramente virtual da consciência política, sustentada pelo fluxo quotidiano de imagens sem imaginação? Resta saber se há algum político com coragem para pensar sem se submeter às regras desse espaço, mas também não desistindo das suas potencialidades democráticas.
quarta-feira, outubro 29, 2025
O equilíbrio do dia [citação]
>>> O gatilho cedeu, toquei na superfície lisa da coronha, e foi aí, com um barulho ao mesmo tempo seco e ensurdecedor, que tudo principiou. Sacudi o suor e o sol. Compreendi que destruíra o equilíbrio do dia, o silêncio excepcional de uma praia onde havia sido feliz. Voltei então a disparar mais quatro vezes contra um corpo inerte, onde as balas se enterravam sem se dar por isso. E era como se batesse quatro breves pancadas à porta da desgraça.
ALBERT CAMUS
O Estrangeiro
> tradução de António Quadros
(ed. Livros do Brasil, 2015)
domingo, outubro 19, 2025
Easy Riders, Raging Bulls — o filme
Easy Riders, Raging Bulls (Simon & Schuster, 1998), de Peter Biskind, é um livro fundamental para compreender as convulsões do cinema americano ao longo das décadas de 1960/70 e os seus efeitos, realmente revolucionários, nas estruturas de Hollywood. O respectivo subtítulo é esclarecedor: How the Sex-Drugs-and-Rock 'N Roll Generation Saved Hollywood.
O livro deu origem a um documentário, homónimo, realizado por Kenneth Bowser. Revelado, extra-competição, no Festival de Cannes de 2003, é uma peça preciosa para conhecer o que aconteceu entre Easy Rider (1969) e Raging Bull (1980) — aqui está, em ficheiro do YouTube.
sexta-feira, outubro 17, 2025
Pensar [citação]
| philomag.com |
>>> O simples facto de pensar é, em si mesmo, um empreendimento muito perigoso.
[...] Mas não pensar é ainda mais perigoso.
HANNAH ARENDT
(entrevista televisiva com Roger Errera,
ORTF, outubro 1973)
quarta-feira, setembro 24, 2025
O regresso de Jimmy Kimmel
Suspenso pela ABC, reposto pela ABC no seu lugar de trabalho e comunicação — aí está Jimmy Kimmel. A sua exclusão e o seu rápido regresso definem um capítulo exemplar da história da televisão (americana e não americana), nessa medida apelando a um pensamento activo, inteligente e tolerante sobre as responsabilidades (e a sua prática) de quem detém algum tipo de poder no chamado pequeno ecrã.
Dito de outro modo: eis alguns preciosos minutos de televisão, capazes de nos ajudar (também) a reflectir sobre o nosso aqui e agora.
>>> Jimmy Kimmel defende liberdade de expressão [Reuters].
domingo, setembro 21, 2025
A IMAGEM: Thomas Hoepker, 1972
| THOMAS HOEPKER / Magnum Berlim Leste 1972 |
terça-feira, setembro 09, 2025
A IMAGEM: Niranjan Shrestha, 2025
| NIRANJAN SHRESTHA / New York Times Protestos em Kathmandu, capital do Nepal 09 set. 2025 |
domingo, agosto 17, 2025
20 anos na companhia de Vladimir Putin
Com produção de Adam Westbrook, eis um video do New York Times sobre os jogos diplomáticos de e com Vladimir Putin. Publicado há cerca de três anos, nele se faz o balanço breve (3 min.), mas eloquente, das relações dos líderes do "mundo ocidental" com o novo czar russo — vale a pena rever, atentamente. Para contrariar, pelo menos, a ideologia televisiva que tende a resumir a complexidade do mundo através do que aconteceu nas últimas 24 horas...
sábado, agosto 16, 2025
"Se os humanos são tão espertos,
porque somos tão estúpidos?"
— Yuval Noah Harari
Como defender o nosso espírito na idade do lixo informativo — mais do que uma interrogação, eis um método de resistência proposto por Yuval Noah Harari, autor de livros como Nexus em que se pensa e problematiza este nosso mundo de redes e avalanches de (des)informação — ei-lo, partilhando alguns contagiantes minutos de reflexão.
A IMAGEM: Saher Alghorra, 2025
| SAHER ALGHORRA / New York Times Campo de deslocados numa praia de Gaza 2025 |
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quarta-feira, agosto 13, 2025
Taxi Driver: a cor do sangue
Mr. Scorsese: assim se chama o documentário (5 episódios) sobre Martin Scorsese, realizado por Rebecca Miller, com estreia agendada para 17 de outubro, na Apple TV+. Eis uma primeira amostra, sobre o tratamento cromático do sangue em Taxi Driver — a história é conhecida, mas contada assim adquire uma nova dimensão.
sexta-feira, agosto 08, 2025
Bob Woodward
— uma análise do comportamento de Trump ("patético")
Autor da investigação do escândalo Watergate, com o seu colega Carl Bernstein (escândalo que acabaria por pôr fim à presidência de Richard Nixon, em 1974), Bob Woodward continua a ser um observador paciente e rigoroso da cena política noprte-americana e, nos últimos anos, do "reinado" de Donald Trump — The Trump Tapes (20 horas de entrevistas gravadas com Trump) é um exemplo esclarecedor da sua admirável saga jornalística.
No dia 6 de agosto, Woodward esteve na MSNBC, em diálogo com Ari Melber, para analisar as mais recentes manifestações do "patético" comportamento de Trump — eis alguns breves minutos de uma maneira exemplar de conversar em televisão.
domingo, agosto 03, 2025
Para compreender a política brasileira
| Apocalipse nos Trópicos: Brasília como símbolo nuclear de todo um país |
Petra Costa acompanhou o confronto entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro, desembocando nas eleições presidenciais no Brasil, em 2022: o resultado chama-se Apocalipse nos Trópicos e é um caso exemplar de investigação cinematográfica — este texto foi publicado no Diário de Notícias (17 julho).
A avalanche de documentários que podemos encontrar (nas plataformas e também nas salas) não significa, por si só, que o género esteja num período radioso de criatividade. Porquê? Sobretudo porque muitos dos títulos que vão surgindo são derivações esquemáticas de matrizes televisivas. Sublinhemos, por isso, uma excepção que, pelo didactismo de investigação e também pela elaborada montagem, merece destaque: Apocalipse nos Trópicos, de Petra Costa, há dias lançado na Netflix, é um objecto capaz de nos ajudar a compreender um pouco melhor o momento presente do Brasil e, sobretudo, a sua conjuntura política.
Na trajectória da realizadora brasileira (nascida em Belo Horizonte, em 1984), este não é um trabalho isolado, funcionando mesmo como um “prolongamento” do seu título anterior, The Edge of Democracy (2019), também com chancela Netflix e nomeado para o Oscar de melhor documentário. Nesse filme, tratava-se de analisar as convulsões políticas e sociais que marcaram o primeiro mandato de Lula da Silva (2003-2011), a sucessão e, por fim, o “impeachment” de Dilma Rouseff (2016). Agora, Apocalipse nos Trópicos desemboca no confronto eleitoral entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro, com a eleição do primeiro para um novo mandato, iniciado a 1 de janeiro de 2023.
Foi um confronto entre duas personalidades com características muito próprias e, escusado será sublinhá-lo, com agendas políticas bem diferentes. Ora, precisamente ao contrário do maniqueísmo por vezes favorecido por algumas matrizes televisivas, Petra Costa está longe de reduzir a questão a uma "luta livre” de dois homens que tudo distingue. Assumindo o documentário como uma investigação muito pessoal, a realizadora propõe-se reconhecer e desmontar o peso do movimento evangélico nas práticas políticas de Bolsonaro e, em boa verdade, nas dinâmicas da sociedade brasileira.
O resultado tem qualquer coisa de dantesco e perturbante. Desde a primeira sequência, Apocalipse nos Trópicos é pontuado (e, em certa medida, assombrado) pela utopia de uma sociedade espelhada na construção da cidade de Brasília, símbolo de uma paz alicerçada na harmonia dos poderes, definidos e exercidos à margem das crenças religiosas.
De forma pedagógica, assistimos à transformação de um movimento religioso, liderado pelo tele-evangelista Silas Malafaia, numa força política (até à invasão do Congresso por apoiantes de Bolsonaro a 8 de janeiro de 2023). A complexidade de tudo o que está em jogo ecoa nas palavras de Lula da Silva, em diálogo com Petra Costa: “Eu tenho uma tese de que o que levou o socialismo ao fracasso foi a negação da religião”. Ou ainda: “Pode ser que algum comunista ortodoxo não aceite a minha tese, mas você não pode negar os valores em que as pessoas acreditam.”
Ditadura, aqui e agora [NYT]
Três depoimentos: Jason Stanely (professor de filosofia), Marci Shore (professora de história) e Timothy Snyder (professor de história) reflectem sobre o momento histórico dos EUA e a proliferação de elementos ditatoriais, não apenas na cena política, mas, transversalmente, em todos os circuitos sociais — testeumhos tão concisos quanto perturbantes num video da secção de Opinião do New York Times.
domingo, junho 29, 2025
Warfare — revendo a guerra do Iraque
em tom hiper-realista
| Uma ficção sobre a guerra, mas com a respiração de uma reportagem |
Para conseguir concretizar o projecto de Warfare (Prime Video), Alex Garland contou com a colaboração de Ray Mendoza, um veterano da guerra do Iraque, de tal modo que ambos acabaram por assinar a realização do filme — este texto foi publicado no Diário de Notícias.
Lançado na plataforma Prime Video, Warfare é o segundo filme em que o realizador inglês Alex Garland conta com a colaboração de Ray Mendonza. Em Guerra Civil (2024), Mendonza funcionara como conselheiro militar para as cenas de combate; agora, tendo como inspiração a sua própria experiência enquanto elemento dos Navy SEALS americanos durante a guerra do Iraque, Mendonza co-assina a realização com Garland.
Ambos os filmes resultam de uma aposta em elementos genuinamente realistas, embora com diferenças de tom que importa sublinhar. Também disponível na Prime Video, Guerra Civil desenvolve-se como uma parábola sobre as clivagens internas dos EUA — e escusado será dizer que as atribulações destes tempos apenas têm contribuído para reforçar o seu valor simbólico. Agora, o olhar realista gera uma crónica detalhada sobre uma missão de uma unidade de Navy Seals, em 2006, na guerra do Iraque, durante a Batalha de Ramadi.
Num cenário de ruas poeirentas, desertas e inquietantes, começamos por ver o grupo a ocupar a casa de uma família: procuram recuperar forças e tentar perceber, via rádio, qual a sua posição relativa no interior do dispositivo das tropas em movimento. O realismo começa no detalhe, no cansaço dos rostos, na sensação de peso do material que cada soldado transporta, no assombramento do silêncio, enfim, na ameaça que a mais pequena perturbação sonora pode conter. A precisão dos pormenores justifica mesmo que reconheçamos neste realismo uma passagem para o domínio tão peculiar (e também tão made in America) do hiper-realismo.
Em qualquer caso, não se julgue que tal efeito “excessivo” se esgota numa mera acumulação de determinados elementos cenográficos ou objectos realistas. Desta vez, e de modo francamente diferente de Guerra Civil, a dimensão realista adquire grande parte da sua contundência através da linearidade do tempo, ou melhor, da continuidade de uma acção tecida de medo e solidão. Os cerca de 90 minutos do filme serão vividos pelo espectador como uma experiência com a mesma intensidade dramática de Guerra Civil, mas desta vez o tempo redobra as incertezas do espaço. Warfare existe, assim, através de uma saturação de pequenos acontecimentos tão perturbantes quanto discretos, acontecimentos que vão explicitando o misto de racionalismo e absurdo da própria situação de guerra.
Espera e combate, quietude e violência, calma aparente e brutal agitação — tudo se enreda num labirinto de pormenores que, em termos narrativos, possui qualquer coisa de reportagem, mesmo se Warfare não deixa de ser um trabalho ficcional apostado em “reconstituir” a experiência emocional, perversamente claustrofóbica, de um grupo de homens entregues a um cenário cujas determinações desconhecem. É para tomar à letra a informação da legenda inicial que lembra que o filme “apenas usa as suas memórias”.
Da longa lista de filmes de guerra, ou melhor, de filmes sobre muitas guerras somos levados a recordar aqueles que, para lá de todas as óbvias diferenças, apostam também em alguma exacerbação realista — penso, por exemplo, em A Vergonha (Ingmar Bergman, 1968) ou Platoon (Oliver Stone, 1986). De facto, não faz sentido amalgamá-los nas coordenadas de um “género” supostamente estável. Em qualquer caso, há neles um desafio realista e, insisto, hiper-realista que decorre da dificuldade (física e formal) de encenar a iniquidade da guerra.
No caso de Warfare, de modo original, bem diverso das evocações dramáticas de muitas guerras, nem sequer se exploram os antecedentes de cada um dos soldados como componente “psicológica” da acção. Afinal de contas, aquele grupo entrou num limbo em que a brutal nitidez da morte reduz o mundo a um acidente narrativo e moral. Escusado será dizer que, aqui, já não há heróis nem heroísmo.
terça-feira, junho 24, 2025
Death of a Fantastic Machine
— um documentário de The New York Times
Chama-se Death of a Fantastic Machine, tem assinatura de Maximilien Van Aertryck e Axel Danielson, e está disponível na secção de documentários de The New York Times. Ou como a câmara não é um mero instrumento de reprodução do mundo, mas um elemento determinante da nossa visão e para a nossa visão. Mais do que isso, um objecto actuante no modo como escolhemos e ocupamos um lugar nesse mundo — eis um exemplo maior de um jornalismo brilhante a integrar as imagens, sem nunca desistir de as questionar.
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