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quarta-feira, maio 15, 2013

Os filmes do Timishort 2013 (5)


É uma ideia simples, mas de execução certamente trabalhosa. Em Tape Generations o realizador holandês Johan Rupma explora as formas e os sons gerados por fitas adesivas que se desenrolam para criar uma espécie de pequeno bailado feito de movimentos e ruídos de cola a descolar. É uma animação de pouco mais de dois minutos e meio. Uma composição que explora as características dos objetos (os pequenos rolos de fita adesiva transparente) e a presença dominante da força da gravidade. Foi, sem dúvida, o título mais interessante apresentado na secção Videorama – dedicada ao cinema mais experimental – do Timishort 2013. 

segunda-feira, maio 13, 2013

Os filmes do Timishort 2013 (4)

Regressamos ao Timishort 2013 para apontar um outro título que vale a pena reter entre o que nos revelou a competição local. Com estreia mundial neste festival de curtas-metragens na cidade de Timisoara, Vocile Marii, do romeno Stefan Munteanu, é um filme que se junta a outros que estão a construir uma nova via, claramente distinta dos dispositivos televisivos, para o documentarismo para grande ecrã. Estamos no Canal da Mancha, a bordo de um veleiro de recreio, a câmara partilhando com a pequena tripulação o labor dos gestos, o espaço reduzido de manobra que vivem a bordo, a presença dos elementos... Podemos tropeçar em eventuais afinidades com Leviathan, que recentemente venceu o IndieLisboa, se repararmos apenas no facto de estarmos a bordo de uma embarcação, algures no mar, entre as rotinas de quem habita aquele espaço. Mas na verdade os pontos de vista, a busca de ângulos, e até o próprio contexto da viagem em que embarcamos, é distinta. E vale a pena ser vista.

terça-feira, maio 07, 2013

Os filmes do Timishort 2013 (3)

O primeiro prémio atribuído pelo júri da competição nacional no Timishort Film Festival deste ano distinguiu Dupa Fel Si Chip (na tradução inglesa As You Like It) um documentário assinado por Paula Onet que antes tinha já conquistado outras distinções. Que foto é a foto certa para colocar na campa, no cemitério? Que imagem é aquela que se pretende que fique como memória para os que cá ficam? Da constatação da relevância destas questões junto da própria avó, Paula Onet partiu rumo à descoberta de uma série de casos. E discretamente vai observando como os vivos resolvem estes dilemas e prepara, inclusivamente com passagem pelo cabeleireiro e fotógrafo da aldeia, a imagem que desejam ali colocar ainda em vida. Nem lúgubre nem gótico, este é um olhar dos vivos pelo que será a sua memória num futuro em que o que restará não será senão uma campa e aquelas fotografias. No final, mesmo traduzindo uma vivência cultural romena, as dúvidas e as noções de tempo e memória que por ali passam revelam-se afinal universais.

segunda-feira, maio 06, 2013

Os filmes do Timishort 2013 (2)

Estamos num telhado lisboeta, em dia de verão. O Tejo ao fundo. Alguém nos olha de frente, em silêncio... Ao longo dos doze minutos seguintes a câmara não se moverá. O ator manter-se-á ali mesmo. Olhamo-lo mais três vezes. Muda a luz do dia, que sugere um tempo que passa. Muda a forma de ouvirmos a mesma canção de Cartola que escutamos. Primeiro numa primeira gravação que sugere um tempo distante. Depois cantada ali, ao vivo, com apenas o vento como possível fundo “instrumental”. E em mais uma gravação, mais segura, recente, nítida... O que passa por aquele olhar. Que amor é este que nos vê? Como começou, quem vê, para onde vai?...

Com o título Ce Que Mon Amour Doit Voir, com imagem de Rui Poças e som de Vasco Pimentel e protagonizado por João Vieira Torres, o filme representa a estreia na realização de François Bonenfant, antigo programador na Cinemateca Francesa e presentemente head of studies de cinema e artes visuais na escola Le Fresnoy, em França. O filme já tinha passado no Cinéma du Réel e no IndieLisboa mas só o consegui ver em Timisoara, onde ganhou uma menção especial do Júri. Foi, garantidamente, um dos mais belos filmes que ali vi.

sexta-feira, maio 03, 2013

Os filmes do Timishort 2013 (1)

Onde estamos? Com quem estamos? Em que tempo estamos? O que se passou para ali chegarmos? Mais ainda que no arrebatador A Estrada de Cormac McCarthy (o livro, naturalmente, que a adaptação cinema foi risível coisa menor), onde pelo menos sabíamos que tínhamos um pai, um filho, uma estrada e medo, em Pude Ver Un Puma nenhuma destas questões terá nunca resposta. Assim como não ficará nunca muito claro o que se passa (se bem que, depois de visto o filme várias vezes, acabei por nele encontrar o meu lugar e uma possível leitura, levando a bom porto um processo de reflexão sobre a obra que, afinal, acontece apenas com a melhor arte).

Pude Ver Un Puma, que passou há um ano em Cannes, foi há menos de uma semana o grande vencedor do Timishort 2013, festival de curtas metragens na cidade de Timisoara, na Roménia. Curta-metragem assinada pelo argentino Eduardo Williams – presentemente a frequentar a mui recomendável escola francesa Le Fresnoy e que em breve apresentará no filme em Cannes, desta vez na Quinzena dos Realizadores – é não só a melhor curta que vi nos últimos tempos como, certamente, um dos mais certos candidatos a morar na lista dos melhores filmes que verei ao longo do presente ano.

As primeiras imagens, num espantoso plano sequência (que nos apresenta magnificamente o espaço e quem o habita), colocam-nos entre telhados de uma qualquer zona degradada. Despreocupado, um grupo de rapazes fala. Fala de programas de divulgação científica que em tempos viram na televisão (um deles refere as visões de um mundo futuro, quando o homem já não existir e a natureza tiver voltado a vencer o planeta). Mais adiante um outro falará de tatuagens. De extensões enormes de tempo. De um outro documentário científico. Palavras aparentemente sem rumo, mas que na verdade são como os espaços desolados onde deambulam: fragmentos de um tempo que desmoronou sobre eles (e, no fundo, nós mesmos).

Caminham entre as ruínas (que na sessão em Timisoara o realizador explicou serem os “restos” de um antigo complexo turístico de luxo na Argentina). Como num sonho, onde os espaços mudam sem que ninguém o explique, dos telhados passam para o que restam de ruas, chegam a uma área alagada, terminam na floresta. Como que se aproximassem, a cada passo, da tal vitória da natureza sobre o homem.


Já houve quem apontasse familiaridade possível com as deambulações dos dois ‘Gerrys’ de Gus Van Sant. Em Timisoara alguém do público apontou afinidades (contudo não intencionadas pelo realizador) com um conto de Kafka. Lembrei-me das “zonas” criadas pela dupla Arkady e Boris Strugatsky em Roadside Picnic (entre nós editado pela Caminho como Slatker) e que Tarkovsky filmou em Stalker. No fim, a capacidade de cada encontrar aqui ecos das suas vivências e experiências, reforça capacidade do belíssimo filme de Eduardo Williams em, mais que nos conduzir a um caminho fechado, nos convidar antes a “cair” (literalmente) com aquilo que temos (e faz de cada um de nós quem somos) no limiar de um abismo que sentimos morar perto daqueles lugares que as imagens nos mostram.

Aparentemente fragmentário, mas na realidade sugerindo um rumo concreto e uma evolução de passos entre espaços que nos levam da cidade e das suas ruínas a uma natureza, onde literalmente acabamos por cair (o solo reclamando-nos) Pude ver un Puma é uma experiência cinematográfica maior. Perturbante, mas ao mesmo sedutor, convida-nos a que nos percamos naquele tempo e naquele lugar. E nós rendemo-nos, mesmo que ninguém nos explique com quem vamos nem para onde nos dirigimos.



Imagens do trailer de Pude Ver Un Puma