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segunda-feira, novembro 17, 2014

LEFFEST: memórias de 1934


[ Garrel ] [ Ferrara, 1 ] [ Malkovich ] [ Ferrara, 2 ] [ Lynch/Alberola ] [ Dumont ] [ Ullmann ] [ Petzold ]
[ Jacquot ]


* SADIE McKEE, de Clarence Brown

Será a mais insólita das evidências: um dos melhores filmes vistos na oitava edição do LEFFEST tem data de produção de 1934! Sadie McKee, de Clarence Brown — protagonizado pela admirável Joan Crawford, e incluindo no seu elenco nomes como Gene Raymond e Franchot Tone — surgiu como uma escolha que Wes Anderson. Na sua apresentação, o realizador de Grand Budapest Hotel sublinhou o facto de se tratar de um filme pré-código — entenda-se: anterior aos efeitos normativos do Código Hays, posto a funcionar por Hollywood precisamente por volta de 1934 —, nessa medida encenando modos de relação, sobretudo entre homens e mulheres, que os grandes estúdios passariam a tratar em função de matrizes morais muito mais fechadas (que, por sua vez, como é sabido, deram origem às mais perversas formas de desmontagem interna).
Seja como for, o que mais surpreende não é tanto o pragmatismo dos perfis psicológicos das personagens — cada uma delas distante de qualquer fixidez dramática ou moral —, mas a extrema agilidade do argumento de John Meehan, escrito a partir de uma história de Viña Delmar [que surge, em destaque, no trailer original], elaborando uma estrutura de eventos que escapam a qualquer modelo de determinismo. Assim, por um lado, é verdade que vogamos no interior de um cinema em fase de consolidação dos seus sofisticados mecanismos de estúdio; ao mesmo tempo, por outro lado, há em Sadie McKee uma densidade humana que faz de cada ser (homem ou mulher) uma paisagem sempre em aberto, sempre em processo de fascinante descoberta e também, afinal, auto-descoberta.

domingo, novembro 16, 2014

"Amour Fou" vence LEFFEST

O filme Amour Fou, da austríaca Jessica Hausner, recebeu o prémio de melhor filme da oitava edição do Lisbon & Estoril Film Festival — o palmarés integral está disponível no site oficial do festival.

LEFFEST: uma tragédia contida


[ Garrel ] [ Ferrara, 1 ] [ Malkovich ] [ Ferrara, 2 ] [ Lynch/Alberola ] [ Dumont ] [ Ullmann ] [ Petzold ]

* TRÊS CORAÇÕES, de Benoît Jacquot

Charlotte Gainsbourg, Catherine Deneuve e, sobretudo, Chiara Mastroianni são os corações femininos do filme de Jacquot. No seu meio, talvez nas suas margens, ou até mesmo num continente de outro hemisfério, vai vogando a personagem de Benoît Poelvoorde. Que é como quem diz: Jacquot continua a colocar em cena as aventuras partilhadas do masculino/feminino, segundo uma lógica — ou falta dela — em que a verdade de cada um parece encalhar sempre numa dobra do real, por vezes nem sequer conseguindo inscrever-se nas mais banais palavras do quotidiano. Nesta perspectiva, pode dizer-se que Três Corações possui a beleza de uma tragédia contida, unindo sem esforço o sublime do amor e a sua irrisão, como se a moral deste conto moral (passe a redundância) brotasse do próprio absurdo com que cada personagem se confronta. Dito de outro modo: o cineasta que se revelou nos anos 70 com L'Assassin Musicien e Les Enfants du Placard permanece fiel ao mais sofisticado (melo)dramatismo.

sábado, novembro 15, 2014

LEFFEST: história de um rosto


[ Garrel ] [ Ferrara, 1 ] [ Malkovich ] [ Ferrara, 2 ] [ Lynch/Alberola ] [ Dumont ] [ Ullmann ]

* PHOENIX, de Christian Petzold

De novo com a brilhante Nina Hoss no papel central, Christian Petzold filma o fim da Segunda Guerra Mundial a partir da história de um rosto: Phoenix centra-se numa mulher que sobreviveu aos campos de concentração — gravemente ferida, terá de ser sujeita a uma operação plástica que transfigura a sua expressão, a ponto de não ser reconhecida pelo próprio marido... Através desse drama, íntimo como poucos, de viver num corpo assombrado por uma identidade à deriva, Petzold filma a extrema dificuldade da inscrição da memória nas relações sociais dos humanos — é, no limite, um filme sobre o modo como, literalmente, vemos e não vemos o que está à nossa frente.

sexta-feira, novembro 14, 2014

LEFFEST: Strindberg!


[ Garrel ] [ Ferrara, 1 ] [ Malkovich ] [ Ferrara, 2 ] [ Lynch/Alberola ] [ Dumont ]

* MISS JULIE, de Liv Ullmann

Digamos apenas, para simplificar, que Liv Ullmann não pede licença a ninguém para regressar à dimensão mais crua de Miss Julie, de August Strindberg, deslocando a acção para a Irlanda, é certo, mas nunca menosprezando a intensidade das suas componentes teatrais. Dito de outro modo: este é um filme em que a teatralidade sublinha, ampliando até ao delírio, a teia de desejos e constrangimentos em que Julie vive a sua ânsia de uma vida alternativa que, afinal, escapa à linearidade das palavras a que sabe recorrer. Eis um filme esplendorosamente fora de moda, alicerçado num amor radical pelos actores: e se Colin Farrell é um caso, talvez inesperado, de rigoroso casting, Jessica Chastain mostra como tem dentro de si esse misto de elegância e fúria que definem uma actriz fora de série.

quarta-feira, novembro 12, 2014

LEFFEST: as férias do menino Quinquin


[ Garrel ] [ Ferrara, 1 ] [ Malkovich ] [ Ferrara, 2 ] [ Lynch/Alberola ]

* O PEQUENO QUINQUIN, de Bruno Dumont

Afinal, é possível fazer televisão sem esquecer a energia cinematográfica. Ou, se preferirem, podemos proclamar, sem preconceitos, que algum do melhor cinema contemporâneo passa por algum tipo de aliança com a televisão: o filme/série de Bruno Dumont, O Pequeno Quinquin, aí está como um esclarecedor exemplo de tal dinâmica. Num registo de paradoxal ligeireza — que, de alguma maneira, ajuda a ver sob outra luz alguns dos seus títulos anteriores, como Hadewijch (2009) —, Dumont traça o retrato trágico-burlesco de um esquecido universo rural, encenando as férias do impagável Quinquin (Alane Delhaye), pelo caminho recuperando um realismo cru, sempre à beira da crueldade. Dito de outro modo: Dumont continua a ser um céptico face às atribulações do género humano, desta vez, ainda assim, mostrando-nos que o mais desconcertante humor não é estranho à sua démarche criativa.

segunda-feira, novembro 10, 2014

LEFFEST: humano, demasiado humano

FOTO: Nuno Galopim
[ Garrel ] [ Ferrara, 1 ] [ Malkovich ] [ Ferrara, 2 ]

* Here & Now, David Lynch e Jean-Michel Alberola

A exposição de Lynch/Alberola, criada para esta oitava edição do LEFFEST, segue um princípio dicotómico: trata-se de saber o que pode resultar do encontro entre um cineasta que gosta de pintar e um pintor que não é estranho aos prazeres da narrativa cinematográfica — sendo seu motor decisivo uma dupla litografia, que criaram em conjunto, “a quatro mãos”, em 2011, com o título emblemático de “Aplicação do princípio de equivalência” (na exposição, faz a ponte entre as 20 imagens de Lynch e as 28 de Alberola).
O resultado talvez se possa definir a partir de uma lógica narrativa cinematográfica: uma montagem paralela de imagens que, convocando ternos e cruéis fantasmas (Lynch) ou apelando a memórias ambíguas da arte Pop (Alberola), define uma narrativa em que o mundo desliza através de mapas imaginados, perversamente realistas (?), quanto mais não seja porque, mesmo nos traços mais lúdicos ou caóticos, o apelo da figura humana não se desvanece — o invisível é, provavelmente, uma secreta dobra do visível.

LEFFEST: a verdade, sempre a verdade


[ Garrel ] [ Ferrara, 1 ] [ Malkovich ]

* PASOLINI (2014), de Abel Ferrara

Ferrara de novo. Depois de Welcome to New York, parábola moral a pretexto de Dominique Strauss-Kahn, Pasolini é, num certo sentido, o mesmo filme. A saber: não uma biografia de uma personagem verídica, mas uma derivação fílmica em torno de alguém, Pier Paolo Pasolini, cujo efeito de verdade não é possível apagar. Que verdade? A de uma existência que se decide num limbo entre a verdade dos outros e a hipótese de uma redenção verdadeiramente interior. Em qualquer caso, as semelhanças acabam aí, já que o Pasolini de Ferrara — brilhantemente interpretado por Willem Dafoe — é, mais que tudo, um ser da palavra, da precisão da escrita, da contundência do dizer. Com a pontuação vital de Maria Callas, interpretando a ária 'Una voce poco fa', de O Barbeiro de Sevilha, de Rossini.

domingo, novembro 09, 2014

LEFFEST: Malkovich, Malkovich, Malkovich


[ Garrel ] [ Ferrara ]


Quando vemos estas reproduções das fotografias de Sandro Miller (patentes no Casino Estoril), podemos supor que se trata apenas de apostar numa espécie de curto-circuito figurativo com os originais. Que é como quem diz: John Malkovich "imita" Jack Nicholson, Marilyn Monroe, Andy Warhol... De facto, importa dizer que os retratos "imitados" (à direita) não constam da exposição — como sugere o título, estamos perante Malkovich + Malkovich + Malkovich, num elaborado jogo de máscaras em que, afinal, ironicamente, percebemos que ninguém se liberta da imagem do seu próprio corpo.
Jogo de ambígua sedução, até porque aceita brincar com a atracção do fake que, hoje em dia, circula através das fotos manipuladas da Net ou de algumas obsessivas evocações cinematográficas (p. ex.: Psico, refeito por Gus Van Sant). No limite, as fotos de Miller/Malkovich proclamam a perenidade do retrato como bilhete de identidade do retratado e sua implícita negação, num infinito to be or not to be que, hélas!, convoca o prazer do logro — saudemos, por isso, esse velho fantasma da expressão artística que a linguagem televisiva dominante ignora.

LEFFEST: um monstro em Nova Iorque


[ Garrel ]

* WELCOME TO NEW YORK (2014), de Abel Ferrara

Estranho filme, de facto. Abel Ferrara o disse, na sua apresentação no Estoril: esqueçam "Dominique" [Strauss Kahn], esqueçam [Gérard] "Depardieu", tentem ver Welcome to New York apenas como o resultado do trabalho conjunto de um realizador e um grupo de actores. Tarefa impossível, há que dizê-lo, quanto mais não seja porque vivemos tempos em que a intensidade mediática seja do que for não se apaga assim — e o escândalo sexual que envolveu o então director do FMI, num hotel de Nova Iorque, não é coisa socialmente vaga nem moralmente ligeira.
O certo é que o filme de Ferrara parte de uma insensatez radical (e fascinante): por um lado, mesmo não utilizando nomes de pessoas verdadeiras, convoca todos os sinais de um fait divers que se transformou numa convulsão política sem fronteiras; por outro lado, vai fazendo deslizar o seu Dominique — que, de facto, se chama Devereaux —para um domínio de muito crua especulação filosófica e religiosa. No limite, Ferrara refaz a dicotomia homem/mulher (que pontua quase todos os seus filmes), relançando a problemática cristã do pecado no coração da pulsão sexual. A pergunta que fica, aliás explicitada nos longos e magníficos diálogos entre Devereaux e Simone (Jacqueline Bisset), é se até mesmo o monstro pode ter direito a alguma hipótese de redenção — o cinema ganha com isso, mesmo se com isso o espectador fica sem saber quem pode (e, sobretudo, como) repor a ordem do mundo. E que ordem.

sábado, novembro 08, 2014

LEFFEST: memórias de Garrel

Zouzou, Marie pour Mémoire (1968)
* MARIE POR MÉMOIRE (1968), de Philippe Garrel

Presente na sessão que incluiu a sua primeira curta-metragem, Les Enfants Désarccordés (1964), precedendo o mítico Marie pour Mémoire (1968), Philippe Garrel recordou os tempos de expectativa, interrogação e angústia em que ambos os títulos foram rodados — o primeiro tinha ele 16 anos; o segundo, aos 19, em finais de 1967, sob o signo das atribulações (interiores e exteriores) que viriam a encontrar inusitadas configurações em Maio 68.
Evocando a inspiração tutelar de Godard, Garrel referiu a função dos artistas como "portadores de história", por vezes, inconscientemente, "apesar de si próprios". Marie pour Mémoire é, nessa perspectiva, um objecto de estranha e fascinante anarquia narrativa, traçando, entre a sociologia paródica do casamento e a mitologia inerente à personagem de Marie (interpretada por Zouzou, que os cinéfilos identificarão, sobretudo, a partir de O Amor às Três da Tarde, rodado quatro anos mais tarde por Eric Rohmer), uma parábola iniciática sobre uma época de muitas e radicais interrogações. No seu ponto de fuga vislumbra-se, afinal, um dos temas viscerais do universo de Garrel: a redenção através da utopia da infância.
Subitamente, lembrámo-nos que já existiu um cinema, tocante mas alheio a qualquer gratificação pueril, cuja lei sabia aceitar a aspereza das mais rudimentares imperfeições. Que lei era essa? Tudo é possível.

segunda-feira, setembro 08, 2014

Filme de David Lynch com Duran Duran
estreia no Lisbon & Estoril Film Festival


O filme Duran Duran Unstaged, realizado por David Lynch e que acompanha os Duran Duran em palco numa atuação em 2011 - na sequência do lançamento do álbum All You Need Is Now - é um dos títulos a integrar a edição deste ano do Lisbon & Estoril Film Festival. Esta é uma das revelações presentes no Press Release distribuído esta manhã na conferência de imprensa (no CCB) na qual foram reveladas primeiras informações sobre a edição deste ano do festival, que vai decorrer entre os dias 7 e 16 de novembro.

Além deste filme - que até aqui teve apenas exibições no quadro da edição de 2013 do Festival de Cannes e, depois, no auditório do MoMA (em Nova Iorque) - David Lynch estará também representado nesta edição do festival numa exposição conjunta com Jean-Michel Alberola, que será inaugurada no Centro de Congressos do Estoril no dia de abertura do festival. A exposição Here & Now irá apresentar diversas obras de JM Alberola e uma série de litografias (algumas inéditas) de David Lynch.


Outra das novidades apresentadas na conferência desta manhã foi a antestreia de Variações de Casanova, filme de Michael Strüminger que evoca a figura de Giacomo Casanova através de memórias lidas em História da Minha Vida, que se cruzam no grande ecrã com árias das três óperas que Mozart compôs com libretos de Lorenzo da Ponte (As Bodas de Fígaro, Don Giovanni e Così Fan Tutte).

O elenco deste filme que foi integralmente rodado em Portugal - com várias sequências filmadas no Teatro Nacional São Carlos - inclui grandes cantores líricos do nosso tempo, entre os quais Jonas Kaufman e Barbara Haningan. O papel protagonista é entregue a John Malkovich, que estará em Lisboa e no Estoril durante o festival e a quem será feita uma homenagem na forma de um ciclo que recordará não apenas a sua obra como ator de cinema, mas também no teatro, além do trabalho como produtor.

Além de John Malkovich, outra das homenagens já reveladas para esta edição do Lisbon & Estoril Film Festival vai destacar a obra de Maria de Medeiros.