A procura da perfeição
A biografia é uma arte e um modo do biógrafo interpretar o autor tratado. Gaspar Simões dizia-o –ele, exemplar biógrafo de Eça e Pessoa- e refere-o Campos Matos no interessante trabalho sobre o autor d' Os Maias (Eça de Queiroz, uma Biografia, Edições Afrontamento).
Claire Tomalin numa das biografias que escreveu (Tomalin é excelente especialista na matéria), Thomas Hardy, The Time-Torn Man (Penguin Books), confirmou-me a ideia de JGS: a figura de Hardy surge-nos recuperada da morte, em três dimensões: é um homem, uma figura apaixonante, tal qual os seus heróis e as suas heroínas –as suas personagens, prolongamentos de alma e do entendimento profundo que teve da vida.
O grande romancista, com certeza um dos maiores de sempre, tocou dois séculos: nasceu em 1840 e morreu, lúcido, sempre a “escurecer papel”, em 1928. Deixou obra vasta de prosa e poesia. Amou intensamente, interiorizou e expressou, superiormente, a paixão humana: o correr dos dias, a meio da natureza fascinante e da fragilidade e necessidade dos sentimentos. Cheguei aos romances do sublime criador de Tess of the d’Urbervilles há pouco tempo, sete anos, depois da convivência com outros Mestres, e impressionou-me a extraordinária actualidade que poderá (aparentemente) faltar aos ingleses George Elliot, Jane Austen, Dickens. Talvez as paixões (amor e ódio) sejam intemporais e assim nos apareçam, quando perfeitamente expressas.
Tomalin cita uma frase-chave de Hardy: “Não há dia em que não escreva. Pegar na caneta basta-me e não sei pensar de outro modo. É necessário não esperar a forma perfeita ou ela demorará sempre mais a aparecer.” Ou seja: o escritor não passa de um artesão que sacrifica, dia a dia, aos seu mester.
publicado na Página de Cultura do Jonal de Notícias de hoje
Sem comentários:
Enviar um comentário