Mostrar mensagens com a etiqueta Filipa Leal. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Filipa Leal. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, março 14, 2017

A cidade esquecida


Ela disse: Sou uma cidade esquecida.
Ele disse: Sou um rio.

Ficaram em silêncio à janela
cada um à sua janela
olhando a sua cidade, o seu rio.

Ela disse: Não sou exactamente uma cidade.
Uma cidade é diferente de uma cidade
esquecida.

Ele disse: Sou um rio exacto.

Agora na varanda
cada um na sua varanda
pedindo: Um pouco de ar entre nós.

Ela disse: Escrevo palavras nos muros que pensam em ti.
Ele disse: Eu corro.

De telefone preso entre o rosto e o ombro
para que ao menos se libertassem as mãos
cada um com as suas mãos libertas.
Ela temeu o adeus, disse: Sou uma cidade esquecida.
Ele riu.

Filipa Leal

domingo, fevereiro 28, 2016

Quando a ti, meu amor

Vi, na lateral, o título de um post do Francisco José Viegas, "Vem à Quinta-Feira" (que é, afinal, o título do último livro da Filipa Leal) e, inevitavelmente, vieram-me à cabeça as palavras de Mário de Sá-Carneiro, que são recorrentes em mim, aliás como outros versos de "Caranguejola":

Quanto a ti, meu amor, podes vir às quintas-feiras,
Se quiseres ser gentil, perguntar como eu estou.
Agora, no meu quarto é que tu não entras, mesmo com as melhores maneiras:
Nada a fazer, minha rica. O menino dorme. Tudo o mais acabou.

O resto do texto aqui.

quarta-feira, fevereiro 11, 2015

Nesta brisa quase suave

Nesta brisa quase suave
de plantas já anoitecidas
quase te toco entre as regas,
e entristeço.
A tua ausência é tão real
como os vastos campos de girassóis
secos, envelhecidos, quase mortos.
Alugo a voz e a expressão
a par de todos os espaços
deste lugar que se inicia.
Tudo isto é simples:
tenho o coração desarrumado.
Vem.

Filipa Leal

domingo, novembro 16, 2014

No fundo dos relógios

("A persistência da memória", de Salvador Dali)
Demoro-me neste país indeciso
que ainda procura o amor
no fundo dos relógios,
que se abre
como se abrisse os poros solitários
para que neles caiam ossos, vidros, pão.
Demoro-me
no ventre desta cidade
que nenhum navio abandonou
porque lhe faltou a água para a partida,
como por vezes desaparece a estrada
que nos conduz aos lugares
e ali temos que ficar.

Filipa Leal, A Cidade Líquida e outras texturas