Em repetição por aqui, porque Dezembro não é apenas o Natal e todo o consumismo inerente. Dezembro é, mais do que isso, as memórias do frio, dos gestos pequenos que enchiam o coração e das pessoas cuja presença serena nos abraçava.
Tu ignoras esse Natal
que persiste na minha memória
e me aconchega.
Falo desse Natal que é ainda o meu avô
a abrir, às manhãs frias, a porta
que dava para o cortinheiro*.
Ou um santo António
a assomar numa nota de vinte escudos,
a cor e o aroma das tangerinas
e das laranjas, que se ofertavam ao menino.
O Natal em que a roupa dormia, gelada,
no estendal da varanda,
a chama e o calor da fogueira que procurávamos
depois da missa do galo, quando as luzes da aldeia
se apagavam.
Os almanaques do tio, o arroz doce da tia,
que repousava na sala que só se abria
para as visitas em dias de festa.
Foi num desses natais
que recebi o meu primeiro relógio.
A partir de então,
aprendi a voracidade das horas,
o efeito corruptor do tempo.
deep, Dezembro de 2013
*quintal