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terça-feira, 1 de janeiro de 2019

O Tao do tal Chen Hsu

Fodam-se resoluções de início de ano. Não projete a mudança, seja a mudança, é o que digo. Mas claro que às vezes o copo transborda - ainda mais depois de um ano pavoroso como 2018. Alguma atitude se faz necessária. Novas perspectivas, talvez.

Pessoalmente, me cai como uma luva um trecho que adoro de uma história publicada em O Incrível Hulk #130 (abril/1994), parte indireta da saga Guerra das Armaduras II. Um corrompido Mandarim é recuperado após um esgotamento físico, mental e existencial. Alguma identificação com pelo menos 104 milhões de almas por aí?

Com a palavra, o velho Chen Hsu:


Após uma epifania matinal, entre uma bela e perfeita ressaca e uma caneca de café fumegante, removi todos os meus novelos/filamentos/teias acumulados perigosamente nos últimos tempos. Eles com certeza já cumpriram seu propósito no meu pequeno universo.

Vamos apenas ver no que vai dar. Nada de pré-concepções. Olhar mais para os lados, ao invés de invariavelmente para frente ou para trás. Aproveitar o dia. Fazer o melhor possível. Ajudar sempre. Sou estóico por natureza, será brincadeira de criança.

Vai ser uma boa vida.

Sorrio.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Fui metralhado, esmagado, despejado, sequestrado, traído, espancado e tudo que ganhei foi essa camiseta da I.M.A.


Uma coisa é certa: Homem de Ferro 3 (Iron Man 3, 2013) não joga na retranca. O filme é uma surpresa total. Recapitulando, Jon Favreau trouxe uma bagagem muito bem definida quando assumiu a franquia e a mesma se fez sentir em cada frame de Homem de Ferro e Homem de Ferro 2. Houve uma saudável relação de troca entre mitologia e contador. Com Shane Black não foi diferente, por mais heterogêneos que os elementos pudessem parecer. E nem eram tanto assim, afinal. Favreau é cria pop dos anos 2000, enquanto Black foi um dos principais idealizadores do cinema de ação dos anos 80. De tal modo que a bagagem, dessa vez, era pop, mas numa versão estrondosa. Para manter a coesão, prevaleceu a melhor constante da série: o bem-calibrado elenco conduzido por um Robert Downey Jr. tão viciado em dopamina quanto o Wolverine de Rafael Grampá. Ainda assim, os efeitos da nova fórmula foram mais visíveis que uma superdosagem do Extremis do filme.

Homem de Ferro 3 é um curioso exercício de estilo feito pelo cara que criou alguns dos meus heróis de adolescência. É bem interessante fruir o filme por essa perspectiva, ainda que aqueles que nasceram a partir de 1988 (como eles estão se proliferando!) não façam a menor ideia do que eu estou querendo dizer. O ponto é: estreitam-se os laços com o cinema, projetando os personagens e seu universo a um status cada vez mais liberto de suas origens, só que preservando suas características mais caras e sua paixão. O que os torna cinematograficamente mais genuínos, por assim dizer, e com menos fuça de fast-food prensado na chapa por uma joint venture.

O que pode advir disso, no futuro? Filmes "de super-herói" com tramas totalmente originais, sem relação direta com histórias ou arcos pré-existentes? Um universo 100% autossuficiente e independente dos quadrinhos, com legitimidade o bastante para interagir com eles como uma autêntica realidade alternativa from another media? Só Stan Lee sabe.

Por hora, o pacote garante apenas o que estava no anúncio - Shane Black dirigindo um Homem de Ferro. Para bom comedor de pipoca na casa dos 30, a sensação de déjà-vu era até esperada: uma aventura com obstáculos aparentemente intransponíveis para os (as) mocinhos (as), um vilão com delírios de grandeza, conhecedor do potencial destrutivo da mídia e com tentáculos estendidos até a banda podre do sistema e, claro, um ato final nitroglicerínico em uma enorme estrutura de trabalho operário onde os dois pólos finalmente colidem num porrada-palooza que resolve até questões que não podem ser resolvidas via porrada. Black não se furta nem em detonar a casa do herói, ao melhor estilo Máquina Mortífera.

Riggs & Murtaugh approves!


O roteiro, escrito por Black em parceria com Drew Pearce (Pacific Rim), trabalha o protagonista fora do contexto a que todos se acostumaram. Mas antes faz questão de marcar o território em que pisa, resgatando o típico m.o. hedonista de Stark, que já começa o filme estendendo uma festa de reveillon para uma one night stand de responsa com a cientista Maya Hansen (Rebecca Hall). Na mesma tocada, aproveita para reconstituir o background típico do vilão-cientista louco com um Aldrich Killian (Guy Pearce) socialmente disfuncional e sumariamente humilhado pelo herói em seus dias pré-redenção. Clichê, é verdade, mas daquele tipo que funciona pela simplicidade.

A mesma impressão se faz presente na figura do misterioso Mandarim (Sir Ben Kingsley), o clássico antagonista do Homem de Ferro nos gibis, aqui introduzido por flashes televisionados que o vendem como a maior ameaça ao "mundo livre". O que inicialmente gera certa dúvida sobre quem é o vilão principal, tal qual ocorreu com a dupla Ivan Vanko-Justin Hammer na aventura anterior. Mas à medida que a trama avança, os papéis vão sendo gradativamente ajustados - e que papéis.

Também revemos a gangue Stark quase intacta, à exceção da Viúva Negra e do agente Coulson, compreensivelmente indisponíveis. Estão lá o best buddy de Tony, ex-Máquina de Combate e atual Patriota de Ferro, Rhodey (Don Cheadle), o ex-motorista e atual chefe de segurança Happy Hogan (Fraveau, ex-diretor) e a adorável Pepper Potts (a adorável Gwyneth Paltrow), como sempre cobrindo os plantões do chefe/namorado. Mas ao contrário do que parece - e isso é uma constante na franquia - ela não fica relegada ao arquétipo da mocinha em perigo e influi ativamente na história, mesmo nas sequências de ação. E o faz de forma séria, sem autocaricatura, com entrega e conteúdo, inclusive na bonita cena inspirada na irmã do Ayrton Senna, Viviane.

Tudo bem que Pepper é raptada e amarrada lá pelas tantas, tal qual uma pin-up dos anos 40, mas isso ainda é Hollywood... a quase-festa do pijama dela com a fabulosa Rebecca Hall valem por qualquer deslize e minutinhos extras lá na terra de Morpheus.


Essa característica mainstream também se estende à Cheadle, dono de uma grande capacidade dramática, mas aqui a serviço de um thriller de ação dos anos 80 - e se divertindo muito com isso, diga-se. Definitivamente está mais à vontade e afinado com a proposta. A gag em que ele recebe um telefonema de Stark durante uma batida como o "Patriota de Ferro" é ótima. Já Favreau se destaca mais pela imensa humildade aqui demonstrada (artigo raro naquelas colinas) do que pelo perfil canastrão de seu Happy Hogan. A saída meio à francesa foi sob medida.

Obviamente, a produção é esteticamente desnorteante, explosiva e frenética, mas sem muita aderência nos neurônios. É um autêntico blockbuster padrão da Hollywood atual, ainda carente de novos Steven Spielbergs, Ridley Scotts e James Camerons. Podia muito bem ser o Michael Bay ali, sem que isso seja necessariamente algo ruim - e muito menos um elogio. O diferencial é o crossover envolvido: heróis que se arrebentam, sangram, erram, precisam de ajuda e vazam quando estão em desvantagem é herança oitentista do diretor; esses mesmos heróis sendo arremessados de um lado pro outro por uma explosão ou invés de morrerem carbonizados, desmembrados ou retalhados é convenção cartunesca daquele cinemão. Shane Black, por sinal, fez um excelente estudo sobre isso há alguns anos.

Da mesma forma, para espectadores veteranos, colocar Miguel Ferrer como o vice-presidente daqueles estados é entregar o jogo muito antes dos play-offs. Ficou tudo meio óbvio no momento em que seu nariz cruzou a tela. "Let the sun come out, you big, bad G.I. Joe"...

Eventualmente, a tal credibilidade cinematográfica entra em rota de colisão com tudo aquilo que faz os quadrinhos tão apaixonantes para os leitores - e que é aguardado silenciosa e khomeínicamente numa transposição o mais literal possível, ignorando até mesmo o fato de ser uma experiência em celulóide, não celulose. E o que vi em Homem de Ferro 3 foi o prenúncio de uma inssurreição fanboy.

Sabres de luz, pistolas Zillion e nunchakus do Panthro em riste! Morte aos infieis! Excelsior!!


O Mandarim clássico das HQs personificava o velho estereótipo chinês negativo tão disseminado na ficção ocidental de tempos idos, de Ming, o Impiedoso até o Dr. Fu Manchu. Com a escalação de Kingsley e seu visual sugestivo, com calça militar, óculos Ray-ban e pose de “el General”, era fácil chutar que a coisa não seria a epítome da fidelidade. O Mandarim aqui lembra uma batida de frente entre o comandante Fidel Castro e o extravagante Muammar Gaddafi. É um mashup de ditadores terceiro-mundistas que desqualifica até mesmo as raízes chinesas de seu codinome. Parecia até proposital...

Apesar das suspeitas, não cheguei a ir tão longe a ponto de decifrar o "Código Mandarim" antes do tempo. Me perguntava sim, onde um icônico, épico e defasado vilão se encaixaria numa trama já comprometida com Extremis, dra. Hansen e Killian com sua agenda de vingança contra Stark. Seria muito longa pra pouca metragem. Naturalmente, a surpresa foi grande quando a cortina finalmente se abriu, aliada a uma boa dose de incredulidade e confusão. Curti or not curti, eis a questão.

Igual à maioria dos leitores de gibis com barba na cara e contas chegando sem parar, sou um entusiasta dos clássicos. Detesto quando modernizam meus personagens favoritos ou quando pretensamente os "melhoram". Mas tento ser razoável e sensato na medida do possível, pautando minhas opiniões nos resultados práticos. Mandarim era um mastermind megalomaníaco e estilizado cujas motivações arcaicas já não cabem na concepção cinzenta de mundo que se tem hoje. Particularmente, a última vez que o vi em ação nos quadrinhos, semi-repaginado, a coisa terminou muito mal pra ele.

O que fariam agora? Descaracterizariam tudo em nome dos novos tempos? O reciclariam para uma melhor analogia ao cenário atual, com uma China comercialmente aquecida e economicamente instável? Ou mergulhariam como kamikazes na Era de Prata, o fazendo encontrar dez anéis místicos dentro da espaçonave avariada de um dragão alienígena? Realmente esse não é dos personagens mais fáceis de se trabalhar em outro contexto - isso já tinha ficado claro em sua versão "abstrata" na animação O Invencível Homem de Ferro.

Mesmo assim, a saída pela esquerda foi de uma frieza estratégica notável. Ainda mais sabendo que foi aprovada pelo crivo da Marvel Studios, até aqui bastante criteriosa com a adaptação de seus personagens. Essa bateu até o "Sentinela" de X-Men 3. No âmbito narrativo, no entanto, foi genial o recurso do hoax. Impactante e desconcertante ao mesmo tempo, contrariando todas as expectativas. Gostando ou não, ninguém ficou incólume: todos se importaram o suficiente para defender uma opinião a respeito. Tal qual o herói, o espectador também foi arrastado pra fora da sua zona de conforto. Missão cumprida, roteiro.

Ainda acho que o Mandarim daria um grande vilão numa adaptação pra valer (é difícil, não impossível), assim como acho que uma coisa necessariamente não invalida a outra. A facção terrorista Os Dez Anéis realmente existe naquele universo, tendo sequestrado Stark no primeiro filme. E provavelmente não adotaram esse nome porque são fanboys de J.R.R. Tolkien. Killian pode ter se apropriado de uma lenda urbana à Keyser Soze sobre um suposto Mandarim que seria o #1 da organização. Talvez tenha até despertado a fúria do verdadeiro Mandarim, que até então só operava nas sombras, providenciando assim um arqui-inimigo definitivo para futuras sequências.

Sabe o que dizem sobre sonhar...


É notório o quão estreitos são os vínculos de Robert Downey Jr. com o personagem Tony Stark. Chega ao ponto de poucos saberem exatamente onde termina a persona de um e onde começa a do outro. E os filmes anteriores espertamente trataram de deixar isso bem nítido, às vezes até em sacrifício da narrativa. Com as regras ligeiramente alteradas, foi fascinante observar "ambos" despidos de seus superpoderes e comendo poeira ao nível do cidadão comum. Boa parte de Homem de Ferro 3 envereda no formato road movie + cidadezinha do interior, com direito a ajudinha de ilustres desconhecidos, como o hilário "cara da TV" e até um coadjuvante cômico mirim (não-chato, o que já é algo positivo). Chega a evocar o mesmo sentimento de solidariedade popular visto nos filmes do Aranha pelo Sam Raimi - aliás, uma de suas qualidades mais pungentes. E, principalmente, foi uma jornada que serviu para reparação não apenas da nova armadura, mas do próprio Tony, em plena ressaca de Os Vingadores.

Foi uma bela sacada focar o impacto psicológico sofrido por um gênio narcisista convicto após ser atropelado por uma situação muito além de seu controle e compreensão. Deuses, alienígenas, monstros, tecnologias desconhecidas, buracos de minhoca... o estrago pós-traumático beira o colapso total e, apesar de Tony se desconectar do espectador algumas vezes em decorrência disso, rende muito em tridimensionalidade. Afinal batia mesmo um coração lá dentro daquela armadura.

Claro, como fã da obra de Warren Ellis e Adi Granov, eu gostaria que a história fosse adaptada na íntegra, com todo seu potencial intacto, não que o Extremis fosse reduzido a uma mera batidinha de chili com lava. Talvez fosse pedir demais que Tony sofresse tal upgrade, ao invés do downgrade brochante, mas coerente, do final. Fora a negligência criminosa do roteiro ao mandar aquele maravilhoso e vasto catálogo de armaduras direto pro Valhalla. Mas, felizmente, o filme se garante como puro entretenimento à moda (não tão) antiga. Então consigo lidar com tudo isso numa boa.

Talvez com exceção de uma coisa... sem AC/DC?

sexta-feira, 23 de maio de 2008

A GUERRA DE MARK III-A / MODELO XIV


Quando as coisas vão mal, nada melhor que uma guerra. Ou duas. Até nisso a trajetória do Homem de Ferro avança em paralelo com o sistema tecnocrata que defende (já concluindo aqui o rompante Jabor'esco). E no caso do Latinha, as coisas estavam indo realmente mal. Após A Guerra das Armaduras, a clássica dupla formada por David Michelinie (argumento) e Bob Layton (desenhos e arte-final) permaneceu no título por algumas poucas edições. A saideira de Michelinie foi na divertida Iron Man #250 (lançada em GHM #41) e Layton apenas roteirizou esporadicamente. Com o rodízio de profissionais duvidosos que se seguiu - gente do calibre de Fabian Nicieza, Dwayne McDuffie e o terrível Herb Trimpe - praticamente todos os ganchos em andamento foram descontinuados em edições pra lá de capengas.

Foi neste clima que estreou a aguardada Guerra das Armaduras II, seqüência notável pela colaboração entre John Byrne e John Romita Jr. Mas antes de reingressar ao campo de batalha, o Vingador Dourado enfrentou algumas turbulências. Na derradeira fase escrita por Michelinie, Tony Stark fez uma série de "acordos" com o governo para escapar dos processos provenientes dos estragos causados na primeira guerra das armaduras. Depois, se aliou a um de seus piores inimigos com resultados desastrosos e, em seguida, foi baleado por uma ex-amante enciumada. Ficou paraplégico nessa (em um cliffhanger digno da novela das oito!), mas se recuperou com o implante de um microchip que substituía as terminações nervosas afetadas. Por fim, um quase-alento: a trégua com o Cap - embora constatando que a velha amizade havia acabado e as coisas nunca mais seriam as mesmas.

Já sem a batuta de Michelinie, o herói ainda teve de assistir sua nova e poderosa armadura sendo destruída por um subvilão de quinta. O que deu lugar à série Mark III-A e ao modelo XIV, o primeiro com o prático "display de interface por neurosistema", permitindo a Stark o acesso remoto às armaduras através de ondas cerebrais, mesmo a grandes distâncias. Uma espécie de embrião do conceito do Extremis.


Originalmente, a solicitação de Guerra das Armaduras II contava com Bob Layton no roteiro e Romita Jr. nos desenhos, mas a parceria durou apenas 1 edição (a sensacional Iron Man #256, publicada no Brasil estranhamente em Wolverine #21, ao invés da Incrível Hulk habitual). Num lance mal-explicado, Layton pulou fora para a Valiant Comics, sendo substituído por John Byrne em cima da hora. Sendo assim, o início oficial da continuação se deu em Iron Man #258 e durou até IM #266 (aqui, Incrível Hulk #127-136).

O arco começa com Stark e Rhodey testando as novas instalações de treinamento - um tipo de Sala de Perigo versão Latinha - e o desempenho de sua mais recente armadura. A seqüência inicial é eletrizante, com Stark controlando duas armaduras ao mesmo tempo contra um droid monstruoso e o traço do Romitinha em sua pegada mais hardcore. Após o "exercício", Stark sente algumas dores estranhas, logo preteridas por um incidente na usina nuclear da Stark Enterprises.

Chegando lá, o Homem de Ferro tenta conter um vazamento radioativo e enfrenta ninguém ninguém menos que o Homem de Titânio (morto durante Guerra das Armaduras). Incrédulo, o Latinha dribla o "fantasma" e consegue impedir a tragédia nuclear deslocando o reator inteiro para o fundo do oceano. O Greenpeace não aprovaria, mas...

Depois do sufoco, Stark tenta descansar e sofre um baita lapso de tempo, acordando após 3 dias, em outro estado (!), num quarto de hotel com uma ilustre e deliciosa desconhecida. Por sinal, este é um dos três subplots constantes em GdA II. Os outros dois respondem pela melhor personificação do vilão Laser Vivo e pelo retorno/releitura do adversário mais clássico do Homem de Ferro: o Mandarim.


O estado clínico de Stark se agrava, passando para perda total de coordenação motora e movimentação involuntária. Com isto tudo, o playboy (no bom sentido!) ainda tem de enfrentar a fúria do sindicato dos funcionários da Stark Enterprises, que estão em greve e ameaçam invadir a sede da empresa - revolta fomentada por um ex-empregado sindicalizado e baderneiro de carteirinha (qualquer semelhança com o atual MST é uma triste coincidência). O clímax é algo insólito, com o herói contendo uma multidão de grevistas, ao melhor estilo batalhão-de-choque-de-um-homem-só. Faltou só rolar "Street Fighting Man"... ou "Street Fighting 'Iron' Man".

Após vários exames em uma sala isolada, Stark descobre que estava sendo manipulado através do microchip que lhe possibilitou andar novamente. O microchip foi criado por uma subsidiária "laranja" da Corporação Marrs, dos irmãos Desmond e Phoebe Marrs, notórios desafetos do herói. A conspiração estava sendo dirigida pelo obcecado Kearson DeWitt, que buscava vingança por achar que Stark roubou o projeto do Homem de Ferro de seu pai, um brilhante engenheiro que morreu na miséria.

Vilão tridimensional, ponderado e, diria até, bem passível de uma adaptação cinematográfica.


No geral, a saga mantém uma narrativa acelerada, dinâmica, sem muitas pausas entre um gancho e outro. Mesmo com três plots intensos se desenvolvendo ao mesmo tempo, a unidade do arco é invejável. A reinvenção do Mandarim é simplesmente genial. Com uma roupagem bastante influenciada pelo nosferatu chinês Lo Pan (preciso informar o filme?), ele ainda ganhou a companhia de um ótimo personagem, o enigmático Chen Hsu. É de longe a versão mais interessante e poderosa do velhusco vilão, agora com bala na agulha até pra colocar o infame Fin Fang Foom como seu cão de guarda.

Curiosamente, toda essa linha narrativa transcorre independente das demais. O Mandarim e suas ações nunca chegam a interagir com o Latinha, servindo apenas como intro para a saga posterior - concluída em Iron Man #272 (GHM #48), já sem o nanquim abençoado de Romita Jr. Contudo, acabou rendendo uma edição espetacular (Iron Man #261/Incrível Hulk #130), onde cada página é dividida em duas situações distintas ocorrendo ao mesmo tempo. Uma grande sacada de Byrne, inquestionavelmente em seu auge como roteirista - detalhe que, sem dúvida, faz transparecer o espírito por trás do arco.

Guerra das Armaduras II vence pelos talentos individuais. Não tem qualquer ligação com a primeira aventura e acaba sendo comparativamente inferior - apesar da arte fabulosa e dos vários pontos altos do argumento. Se não fosse pelo final, com uma pancadaria titânica entre dois Homens de Ferro e o calculista DeWitt devidamente 'tunado', nem o nome da saga faria sentido. Fica óbvio que foi apenas uma estratégia comercial, visto que a idéia de uma seqüência tinha boa aceitação por parte dos leitores e o título (um dos mais longevos da Marvel) afundava numa crise interminável após saída de Michelinie.

Em seu site oficial, John Byrne chega a comentar a situação Defcon-1 a qual foi submetido pelo então editor da revista, Howard Mackie. Foi o seu melhor dentro de uma deadline absurda. Se isto for levado em consideração, o resultado final passa de ótimo para impressionante. E imperdível, note bem, pela química rara entre Romitinha e Byrne. Para admiradores da composição estética e narrativa da arte seqüencial, é um show de emocionar até o Scott McCloud. Resumindo, ficaria lindo num encadernado em cima da estante.

Há rumores de que a idéia original de Bob Layton para Guerra das Armaduras II - com Romita Jr. no traço - era fora-de-série. Tendo em vista a qualidade da edição única em que os dois trabalharam juntos (a já citada Iron Man #256), só posso imaginar o melhor. Mas isso é algo que jamais saberemos.


Na trilha: Sucking The 70's na agulha do winamp, fazendo a festa stoner aqui.

segunda-feira, 26 de março de 2007

O INVENCÍVEL STARK


Depois de assistir The Invincible Iron Man (2007), tive a impressão de que o próprio Tony Stark anda dirigindo seu departamento de érrepê. Sem mais polêmicas sobre cachaçadas homéricas ou acusações de superfaturamento em cima da máquina de guerra texana - erros do passado que o humanizam perante a sociedade e lhe conferem agora até certo charme. O Tony Stark atual é a imagem do pop businessman calibrado para este iniciozinho de milênio. Uma cruza entre Larry Ellison, Howard Hughes e o Al Gore pós-An Inconvenient Truth com a vontade política que o cargo da Condoleeza Rice demanda. Vá passar por cima disso pelos canais oficiais.

Com passe livre pela Casa Branca e agora o frontman absoluto em todas as linhas de defesa, Tony Stark está em todas. Desmantela velhos símbolos e professa outros novos como se adicionasse um link no Favoritos da opinião pública. Mais que a fórmula mágica de Extremis, Stark injetou os Estados Unidos da América na veia. E o barato ainda está longe de acabar.

Pois toda esta reformulação no status-quo da Marvel (que terá reflexos durante o ano inteiro - quem aqui cria mega-sagas que não mudam nada, cara-pálida?) também teve seu devido impacto no novo desenho do Homem de Ferro. Não no sentido temático, não... mas na revisão de um super-herói tecnológico em atualização constante e nas analogias ao corporativismo, à globalização de assalto e ao Second Life-encontra-War que é o cenário geopolítico mundial. Se já não é, o Latinha, hoje, tem toda a vocação pra übermensch do Estado. Como visto na conclusão de Civil War, falta pouco pra chegar lá e o único limite parece ser o do elemento humano que existe debaixo de toda aquela parafernália de última geração. Ironicamente, Stark periga ser o seu próprio ponto fraco. De inferno pessoal ele entende bem e já pipocam indícios que a inevitável Queda se avizinha no horizonte.

Mesmo irregular, The Invincible Iron Man surpreende. De cara, é muito superior a qualquer longa animado que a Marvel já produziu, simplesmente por fugir daquele aborrecido standard animado - meio que desajeitadamente, mas foge. Consegue readaptar o rascunho minimalista que foi a origem do personagem, na esteira da Guerra do Vietnã (atualizada recentemente para a Guerra do Golfo). Provavelmente, os puristas renegarão a releitura, mas pensando bem... porque um purista perderia tempo com um personagem cuja maior característica é sua própria reinvenção?


Passado o espanto inicial, até que não ficou tão diferente assim. Só enxugaram a premissa (o famoso "cut the crap") e remodelaram algumas situações. Dos elementos tradicionais, Stark pessoa física continua tentando fazer do mundo "um lugar melhor" e o Stark pessoa jurídica ainda é a última palavra em lifestyle e commodities de tecnologia. Estão lá James Rhodes, amigaço do tipo que dinheiro não compra, e Virginia "Pepper" Potts. O Mandarim é o arqui-jurássico-vilão. De novidades, quem manda mesmo na Stark Enterprises é Howard Stark (o - ooopa - pai de Tony), o fiel escudeiro "Happy" Hogan sequer é citado, os vilões secundários são de uma milícia chinesa (rá! É claro!) e, aparentemente, chegamos muito atrasados pra festa das armaduras que Stark preparou. O legal mesmo é perceber que estas modificações deixaram a história muito mais dinâmica e verossímil.

O desenho começa mostrando uma grande escavação das empresas Stark em território chinês. A obra está sofrendo seguidos atentados terroristas de uma antiga facção chamada Jade Dragons, que reinvidica a retirada dos trabalhadores daquela área. Segundo uma crença local, uma profecia diz que o espírito do Mandarim, imperador da mais negra e sangüinária dinastia da História, está próximo de seu despertar. Num destes ataques, Rhodes e Tony, que foi mortalmente ferido, são capturados pelos terroristas e obrigados a fabricar armas de destruição em massa. Ao invés disto, Rhodes cria um suporte vital para salvar a vida de Tony e, juntos, desenvolvem a "primeira armadura" (aquela cinza metálica, à la Gort). Com equipamentos precários, eles garantem um poder de fogo limitado, mas suficiente para escapar do cativeiro.

Entre um fusível e outro, Tony acaba se envolvendo com uma bela insurgente chamada Li Mei.

Claro que o caldo acaba entornando e os Elementais, quatro guerreiros místicos leais ao Mandarim, são libertados durante o conflito. Cada um manipula um determinado elemento da natureza, e o objetivo deles é encontrar cinco anéis sagrados que estão espalhados pelo planeta. Estes anéis deverão ser utilizados pelo último descendente vivo do Mandarim para trazê-lo de volta à vida. Cabe a Tony Stark impedí-los, com a devida a carenagem do Homem de Ferro, enquanto resolve suas (muitas) diferenças com o Stark Sênior, escapa do cerco de uma desconfiada SHIELD e tenta salvar sua multinacional das garras de acionistas gananciosos.

Em outras palavras, serviço é o que não falta pro Latinha.


A maior surpresa, sem dúvida, fica por conta das generosas inserções em CG no ambiente 2D. Nada muito sofisticado: patinadas são freqüentes e o senso espaço-dimensional deve ter sido calculado sob efeito de muita erva do condado. Isso fica evidente nas quarenta vezes que H.d.F. é atirado pra longe e se espatifa no chão. Meio que sem querer, acabou conferindo uma sensação de imprevisibilidade e até certa coerência ao enredo, visto que Tony ainda está se adaptando à máquina. Este mix de animação tradicional com CG overdosado na tela ficou tão esquisito quanto atraente, como nas batalhas eletrizantes contra os Elementais dentro de um vulcão, contra uma legião de guerreiros de pedra (copy/paste do impressionante Exército de Terra Cotta) e contra um óbvio, maniqueísta e maneiríssimo dragão. Certamente, os melhores momentos no que tange à ação.

Também tenho de destacar a mão pesada dos diretores Patrick Archibald e Frank Paur. Apesar do desenho vir com suspeita classificação PG-13, não existe qualquer hesitação gráfica quando o pau quebra. Pessoas são assassinadas à sangue-frio aqui. Só na seqüência em que os Elementais arrebentam um túnel de metrô, morrem dezenas de homens, mulheres e, pasme, até um cachorro (matar cachorro no cinemão pop é impensável, num desenho então...), sem contar os infelizes que estavam dentro do trem. A cena da discussão de Tony com o pai é lavação de roupa suja da grossa, anos-luz distante daquelas xaropadas de matinê com lição de moral embutida. Há também nudez feminina sugerida, especialmente no final (e bem que podiam ter sido mais generosos ali).

Já as escorregadas ficam por conta de algumas falhas bestas na parte da animação tradicional (repare quando Pepper limpa uma marca de batom no rosto de Stark) e em vacilos escandalosos na continuidade (os óculos do Rhodey são ninja - confira no 1º ataque dos terroristas). Os agentes da SHIELD mais parecem os Intocáveis durante o reinado de Al Capone. O trauma físico sofrido por Tony é totalmente ignorado da metade pro final. E a ameaça dos Elementais em contraponto ao Latinha quase se restringiu ao equivalente da terra (um cover do Akuma, da série de games Street Fighter, com a grosseria de um Hulk), visto que os outros 3/4 do bando beiravam o estágio "bucha" de vilania.

Outro item discutível é sobre a maneira como o Mandarim se apresenta. Ficou inesperado e, sim, funcional, em concordância com sua natureza mística... mas sinceramente, detestaria se Jon Favreau aderisse à idéia.

Após esta análise toda - careta ainda -, uma dúvida persiste: ainda que não seja a Scarlett Johansson dos desenhos de super-herói, porque The Invincible Iron Man saiu tão bom? Algo me diz que é porque não teve nem um décimo do investimento em publicidade que os dois Ultimate Avengers tiveram. Estou quase certo disto. Só preciso de uma cerva gelando o bucho pra formular esta questão a contento.


Queria muito saber o que o cara do Âmago achou deste desenho.