Pelos
números, é quase certo que
BrainDead não terá uma vida longa e próspera. Se mantiver a pegada até o final da temporada (única?), ao menos terá crivado seu logo nos neurônios de alguns poucos abnegados.
Ao contrário do que se imaginava... tá bom, do que
eu imaginava,
BrainDead não tem relação com
Braindead, conhecido aqui como
Fome Animal, crássico splatter do Peter Jackson moleque catarrento de várzea.
Mesmo assim, a premissa é, digamos, familiar.
Após meteoritos causarem um estrago numa cidadezinha da Rússia em meados dos anos 2010, o mundo dá sinais de que está enlouquecendo. Taylor Swift é o grande ícone jovem, o orçamento mundial está no vermelho e, o mais absurdo, Hillary Clinton e Donald Trump disputam a presidência dos Estados Unidos.
A explicação? A Terra está sendo dominada por alienígenas invasores de corpos. Justo.
A série é invenção do casal Robert e Michelle King (
The Good Wife). Entre os produtores, estão David W. Zucker e o alien Ridley Scott, o que não é pouca coisa. A trama é protagonizada pela documentarista indie Laurel Healy, interpretada pela hors-concours Mary Elizabeth Winstead.
Com seu novo projeto encalhado na fase de captação, ela se vê obrigada a aceitar um carguinho no gabinete de seu irmão, o senador democrata Luke Healy (Danny Pino). Lá, ganhamos um intensivão sobre a doce arte de fazer política e inimigos.
Entre o fogo cruzado nos bastidores do Capitólio, Laurel se vê às voltas com coisas ainda mais estranhas que a cota habitual de estranhezas do lugar. Como várias pessoas repetindo as mesmas frases, palavra por palavra,
cabeças explodindo no meio de uma acalorada discussão e coisas parecidas.
Os nomes dos episódios parecem tema de mesa redonda com analistas políticos. Tipo
"Como o Extremismo Político Está Ameaçando a Democracia no Século 21" (ep. 1),
"Fazendo Política: Vivendo à Sombra dos Bloqueios Orçamentários - Uma Crítica" (ep. 2) e por aí vai. As sequências com as rinhas e falcatruas de republicanos e democratas monopolizam e são deliciosas. Sátira política farsesca (ou não) no seu melhor.
Salta aos olhos a química entre Laurel e Gareth Ritter (Aaron Tveit), assessor do congressista republicano e picareta-mor "Red" Weathus, papel do genial Tony Shalhoub. Bons achados também são os sidekicks Rochelle (Nikki M. James) e o hilário Gustav (Johnny Ray Gill), fanboy de conspirações que poderia figurar tranquilamente nos
Pistoleiros Solitários.
A dinâmica não faz prisioneiros. Ao mesmo tempo em que tece uma narrativa fácil, nunca se rende ao didático. O que é ótimo a princípio, mas eventualmente requer a caça de alguma info. No 5º episódio, por exemplo, há um trocadilho fulminante envolvendo o termo
Sharia. Esse era nível pro. E tem vários mais.
Não é todo mundo que compra esse humor corrosivo e cínico. Mas quem é chegado em artefatos como
Veep,
Arrested Development,
The Office,
Parks and Recreation ou
Community vai fazer a festa.
Apesar dos aliens influírem diretamente nos rumos da história, eles são quase um detalhe - literalmente,
formiguinhas. A fatia sci-fi é sutil, mas frequente - chega a ser generosa no 6º episódio,
"Notas Relativas à Teoria Pós-Reagan de Aliança Partidária, Tribalismo e Fidelidade: Passado Enquanto Prólogo" (heh!). Tivemos contatos imediatos de terceiro, quarto e até quinto graus, planos de invasão e até os infames círculos em plantações, mas nada disso do modo tradicional.
Ainda nesse (extra)terreno, particularmente bem sacada foi a explicação para o uso ostensivo - e, até ali, aparentemente gratuito - do hit chicletudo
"You Might Think" (The Cars). Tão bacana que se sobrepôs até à forçada de barra do contexto. Essa nem Ellie Arroway viu chegando. Isso, mais os inacreditáveis resuminhos
"previously" no início de cada episódio (cortesia do cantor folk Jonathan Coulton) já resolve a vida da série no quesito trilha.
Não sei se
BrainDead é o
Arquivo X que precisamos hoje - e Mulder & Scully deram uma patinada sinistra naquele final da 10ª "temporada". Também duvido que vá vingar na audiência em algum ponto. Só sei que o payoff é instantâneo e nossos
homenzinhos verdes estão de volta... ainda que sejam formigas. E nem ao menos verdes. Mas são da constelação de Draco, o que rende mais trocadilhos bestas com a capital americana.
E o melhor de tudo, agora a belezura suprema Winstead é oficialmente a nossa mulher para assuntos ufológicos. Revisionou
invasores clônicos,
invasores de mundos e invasores de corpos num espaço de 5 anos e com uma média muito boa!
E tem algo mais supimpa que ela correndo pelo Capitólio de salto alto e saia executiva?
Ah, Maria Elizabete...