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quinta-feira, 5 de março de 2009

...E JUSTICEIRO PARA TODOS


Há alguns quadrinhos atrás, o Justiceiro mantinha um diário/obituário de guerra onde registrava todas as suas "aventuras". Se o que acontece no filme Justiceiro: Em Zona de Guerra (Punisher: War Zone, EUA, 2008) estivesse descrito ali, seria quase um novo volume do Necronomicon. Mas que fique claro: o pacote é B. A produção é irregular e o roteiro tem mais buracos que uma rodovia federal brasileira, mas simplesmente não dá pra encanar com isso. Não enquanto somos subornados com galões de diversão cruel e doentia - experiência maximizada por uma trilha de rock absurdamente pesado e umas cervas acondicionadas ao alcance das garras. O nome do quadro é: "o que seria da vida se não fossem os guilty pleasures".

Mas confirmando minha pelegada punidora, a cineasta Lexi Alexander cometeu o melhor e mais fudêncio filme do Frank Castiglione. Matou a pau, a garota.

O resultado final é ainda mais notável quando lembramos da "zona de guerra" que rolou nos bastidores. Após sucessivos adiamentos, pressão da Lions Gate para diminuir a censura via sala de edição e até rumores sobre a demissão da diretora, pode se dizer que Lexi Alexander encarnou o próprio Frank Castle em defesa de seu filme. Paixão rara de se ver no esquemático cinemão americano. Porém, Justiceiro: Em Zona de Guerra parece estar pagando o preço da ousadia, com um circuito de exibições ultra-restrito e o sempre desmerecedor direct-to-DVD em alguns países - incluindo essezão aqui.

No frigir do Watchmovie, isso mata uma velha questão que assombra adaptações cinematográficas de personagens outsiders/anti-heróicos. Eles são mesmo comercialmente inviáveis. Exceções aos casos envolvendo marketagem massiva ou algum grande chamariz hollywoodiano, como foi o primeiro Blade com Wesley Snipes e Constantine com Keanu & cia.


O Justiceiro 2008 é o exemplo máximo dessa linha de raciocínio. É fiel aos quadrinhos até a medula oblonga, motivo de rusgas sem fim entre Alexander e o estúdio. E se na linha normal, o material que compõe o personagem já não ajuda muito no quesito PG-13, tenha em mente que a diretora adotou a versão MAX do personagem - muito mais extremista, séria e anti-comercial. Concebida pelo genial Garth Ennis, o Castle-MAX lida menos com vilões estilizados e mais com temas densos como tráfico de mulheres, conflitos regionais e abuso de menores. De fato, a diretora havia desistido do filme num primeiro contato, ainda com o script antigo, mas mudou de idéia após ler a versão MAX e ter a garantia de que poderia recomeçar tudo do zero.

O roteiro escrito por ela, Art Marcum, Matt Holloway e Nick Santora (do ótimo Prison Break), costura muito bem a atmosfera MAX com as bases da cronologia normal. A maior novidade foi a participação ativa da polícia na história, incluindo até uma subtrama paralela ao Justiceiro - o que é o oposto imediato (e a maior falha) do filme de 2004. Neste ponto, é de emocionar os fãs do caveirão.

Finalmente a origem do Justiceiro bate com as hqs - mesmo que em turvos flashbacks - e não há qualquer viés humanizador que facilite um personagem com mais de 150 homicídios (e contando) nas costas. Quer dizer, o único momento do filme em que isto acontece, muito en passant, está ligado diretamente ao trauma que o move. Então o efeito é o mesmo de um combustível reabastecendo uma máquina assassina. Numa caracterização consciente, o Frank Castle de Ray Stevenson (o Pullo, de Roma) é o Justiceiro MAX esculpido em C-4: inexorável, lacônico e objetivista. Não há volta, meio-termo ou tons de cinza. E não pára nem pelo inferno.

É o "bem" ultra-direitista diametralmente proporcional ao "mal" anarquista que enfrenta - vilões que são rated R da cara às atitudes.


Já li por aí (no caso, em detrimento ao Heath Ledger), que o Coringa é muito mais um presente do que um papel. É verdade. Com ele, o ator entra "armado" em cena. É um personagem biônico, cuja expressividade é potencializada por uma máscara parcial e com liberdade e devaneios que só a loucura proporciona. O Retalho é um filhote direto disso aí. Só que o ator Dominic West entra de sola e chega a arranhar o camp (versão gore, mas ainda camp). Especialmente após a transição Billy "The Beaut" Russoti-Retalho. Resta então ao ator Doug Hutchison, o eterno Eugene Tooms, a missão de personificar um antagonista equiparável ao Justiceiro. Loony Bin Jim, irmão doidão do Retalho, tem seus atributos (é canibal, briga bem e não está nem aí para auto-preservação), mas ainda falta muito pra representar uma real ameaça para a figura intimidante de Ray Stevenson - sensação que fica ainda mais acentuada com os dois capangas de terceira que os acompanham.

Se os vilões dão algum trabalho é só porque envolvem inocentes, como a personagem de Julie Benz (de Dexter) e sua filhinha. O cenário seria outro se a inspiração MAX fosse mais fundo e arregimentasse um inimigo do calibre do Barracuda, bandidão casca-grossa que eclipsa o próprio Justiceiro. Mas do jeito que está, a tradição dos filmes do personagem permanece: faltou vilão à altura pro velho Frank.

O que não quer dizer que a violência seja arrefecida. Não mesmo. Rapaz, o negócio aqui é punk.





A técnica do sangue digital, bastante aprimorada desde Zatoichi, confere uma estética bem quadrinhos à plástica das cenas. Aqui, um simples tiro na cabeça vira uma explosão coagulante, incrementa cenas antológicas como a da cadeira e efetiva o senso de justiça implacável do protagonista. Bons detaques também para os enquadramentos inspirados na arte sequencial, com ótimos resultados. A fotografia é bem menos sombria do que se espera de um projeto desse e se mostra bem versátil, em especial nos tons saturados da cidade à noite.

Contudo, o filme deixa claro até onde o orçamento vai - o que é um contrasenso, já que custou 22 milhões, o mais caro dos Punisher-movies -, gerando momentos meio esquisitos como os do Justiceiro cruzando New York a pé, entre uma justiçada e outra. Igualmente decepcionante é ver o Microchip, tão bem defendido pelo gorducho Wayne Knight, sem fazer jus ao codinome em nenhum momento.

Por fim, falta a Justiceiro: Zona de Guerra um aspecto que não faltou em nenhum dos dois anteriores (nem naquele com o Ivan Drago): peso cinematográfico. Tenha em mente Michael Mann. Um pouco mais de dimensão e grandiosidade até que não faria mal.


Mas essas bobagens são só pra acalmar o detrator casual. O filme relembra pontualmente o que ele se propõe a fazer de melhor. Cenas de um meliante explodindo no ar no meio de um exercício de parkour, um punho varando a fuça de um bandido e atrocidades quetais ao som de Slayer e Rob Zombie não deixam dúvidas. É o filme badass que o Justiceiro merecia desde a primeira vez.

Agora é torcer. Que venham os Escravistas, o Barracuda, o "Homem de Pedra" Alexandrovich Zakharov.

E, claro, Ray Stevenson e Lexi Alexander.