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sábado, 29 de dezembro de 2012

20 Years Later


Não, não são zumbis.

1992 no Brasil não foi para fracos. Éramos um país quebrado. Ainda novatos nos meandros da democracia, tivemos nosso primeiro presidente impedido de fazer mais besteiras exercer sua função. Nosso mais alto funcionário público sendo demitido por justa causa. Um arrojo só. Foi bonito ver como os brasileiros ainda se importavam o suficiente após tanta porrada no bolso e na auto-estima. E deu resultado, com ou sem ação Illuminati por trás (epa!). Mas sem querer apagar o brilho patriótico daquele momento, a coisa toda funcionou mais para as primeiras páginas dos jornais e para as capas das revistas. Na prática, aqui no front da guerra civil brasileira, a coisa seguiria praticamente imutável até... bom, até hoje.

(sim, temos banda larga, sinal digital, smartphones, tevês de última geração por preços palatáveis... pena que não se pode dizer o mesmo de bobagens como segurança, saúde, educação, transportes, urbanização, etc ad infinitum e vai embora. De quebra, aquele nosso antigo funcionário voltou das trevas como se nada tivesse acontecido... e fazendo mais alianças que um joalheiro)

(claro que nada disso nos surpreendeu, calejados brasileiros velhos de guerra. Nós comemos PIBs de 0,6% no café da manhã. Com guaraná Dolly! E segue a vida)

Essa síntese rasteira do Brasil de 1992 - as melhores partes ficam pra versão director's cut de quem vivenciou aquilo - serve pra contextualizar o sucateado cenário do pop-rock brasileiro daquele período. A geração da década de 1980 ainda não havia encontrado seus sucessores. Aquele divisor de águas essencial em qualquer cena musical saudável não despontava no horizonte. No mainstream, as gravadoras apostavam todas as fichas no pagode, no breganejo e na novidade axé.

Até haviam alguns esforços heróicos de renovação criativa, como foi o selo Tinitus, do produtor Pena Schimdt, que apesar de algumas boas apostas (Virna Lisi, Yo-Ho Delic) não vingou ninguém no 1º escalão (excetuando, talvez, o ex-cantor da Banda Bel?). Enquanto o pop-rock agonizava, o metal, o punk, o eletrônico e o hip-hop seguiam isolados em seus guetos. O mar não estava pra peixe.

Foi ano de Hollywood Rock, com um cast não tão impressionante - especialmente em comparação com a incendiária edição seguinte. Lá fora o bicho pegava: Metallica excursionando com Guns 'N Roses, mais Body Count, Motörhead e Faith No More abrindo (Nirvana foi chamado, mas recusou); um Reading Festival muito bacana (e bem transmitido aqui pela TV Bandeirantes!); e um Lollapalooza mais bacana ainda.

E sim, também saíram vários discos legais. Muitos deles foram minha trilha sonora diária, rolando no walkman durante o trajeto do meu 1º emprego remunerado até a escola (era o 2º ano do 2º grau). A primeira vez que ouvi "N.W.O." e "Mouth for War" foi num ônibus abarrotado em pleno fim de expediente. Imagina o perigo de um mosh descontrolado ali...

Nos moldes da lista de 1991, segue abaixo uma relação desses álbuns que tanto me marcaram há vinte anos atrás e que ainda ouço regularmente, como se tivessem sido lançados na semana passada. Única ressalva: não inseri discos daquele ano que só descobri tempos depois e hoje teria como essenciais - portanto nada de The Chronic, In Search of Manny, Dry, Little Earthquakes, Check Your Head, T.V. Sky...



Psalm 69: The Way to Succeed and the Way to Suck Eggs (ou ΚΕΦΑΛΗΞΘ) é uma obra-prima da música pesada. O bonde Ministry e sua fusão perfeita de thrash metal, hardcore, eletrônico e industrial tomou o mundo de assalto e influenciou muita gente em várias esferas da música pop. Nunca foi igualado em equilíbrio, definição e intensidade, nem mesmo pelo próprio grupo. Ao lado de Reign in Blood, Psalm 69 segue como a trilha sonora oficial do fim do mundo.



Confesso que não recebi muito bem o sucesso dos cowboys from hell. Um novo nome forte no metal USA justo na hora em que nossos "garotos da selva" conquistavam o mundo? Mas acabei ouvindo a banda praticamente sem querer, no rádio. Fui fisgado na hora. Eram tempos difíceis e, desde a capa até o som, o Pantera nos fazia extravasar todo aquele sentimento de raiva e frustração diante de um futuro incerto. Vulgar Display of Power funciona até hoje.



No EP Broken, o Nine Inch Nails (codinome: Trent Reznor) pavimentou uma vicinal alternativa ao espectro sonoro inaugurado pelo Ministry. O mix partia de suas origens no cenário synthpop e das esquisitices do pós-punk e chapava forte em Bowie (da aclamada "fase Berlim" até Scary Monsters). Tudo absurdamente caótico, selvagem e visceral, com algumas das maiores perversões de sintetizadores e baterias eletrônicas já registradas. Um memorável passeio pelo inferno.



"O futuro do death metal". Ah, esses revisionismos editoriais... Não era nada disso, mas o Helmet projetou algumas saídas para o rock pesado e influenciou muita gente. É verdade que o grupo veio de uma seara de bandas post-hardcore do underground nova-iorquino, mas Meantime era um inédito passaporte pra fora do gueto. Tinha todo o barulho e a violência minimalista daquela turma ao mesmo tempo em que soava acessível na medida. Além disso, os caras tinham o diferencial de uma formação musical mais clássica, inserindo nuances de jazz ao contexto - vide "Give it", uma das músicas mais groovy e pesadas já compostas. Experimentalismo para iniciantes e bastante satisfatório para veteranos. Um discaço.



Era ponto pacífico que o Faith No More não iria parir um novo The Real Thing cheio de hits para as rádios. Não com o fugitivo do manicômio Mike Patton por lá. Mas também ninguém esperava por Angel Dust. O álbum era uma espécie de avant-garde demencial na forma de um metal progressivo com grooves bizarros e enlouquecidamente anticomercial, mas que não reprime a vocação natural do grupo para montar as estruturas básicas do pop (melodia, cadência, refrão, etc.). A ensolarada "A Small Victory", por exemplo, tocou bastante no rádio. Já "Malpractice" nem sonhando.

Foi um disco de difícil digestão, mas que, ouvindo hoje, soa quase totalmente decodificado. De razoável assimilação até para os moleques mais novos, o que creio ser o reflexo de 20 anos de uma profunda influência dentro do cenário do rock pesado. Nem sempre bem administrada, claro.



Apesar de ter curtido o debut, achava que o Alice in Chains não iria muito além daquele grunge hard rock qualquer coisa. Ledo engano. Dirt é um dos melhores álbuns daquela década, um refinamento do melhor aspecto do grupo em seu disco de estreia: temáticas depressivas e mórbidas embaladas por um som opressivo e claustrofóbico. A sensação é de estar preso debaixo de toneladas de escombros - ou fundido inexoravelmente ao chão, tal qual a garota da capa. Absorvendo de forma inteligente o legado do Black Sabbath, o AiC exibia uma versatilidade sonora invejável, sendo as estrelas do show o guitarrista e cantor de apoio Jerry Cantrell e o finado frontman Layney Staley. Viciante.



Fui um dos entusiastas do funk metal durante seu auge, do fim dos anos 1980 até o início dos 1990. Mas em 92, o estilo era notícia velha. Daí o pouco crédito que dei logo de cara ao debut do Rage Against the Machine e seu discurso politizado. Com o tempo, percebi que o som demandava audições mais atenciosas para uma assimilação decente. Culpa das bases que emulavam espertamente o DNA zeppeliniano e um guitarrista que era um dos mais inventivos a despontar no cenário pop em muito tempo.

Mais que um simples registro funk metal (ou rap-metal, etc), Rage Against the Machine, o álbum, passou com louvor no teste do tempo - como ainda atesta um dos finais de filme mais bacanas dos anos 90.



Com seu álbum de estreia homônimo, o Body Count jogou gasolina no incêndio dos distúrbios raciais de Los Angeles em 1992. Além das várias provocações espalhadas pelo disco, uma música em particular foi endereçada aos policiais de LA com a sutileza de um Tomahawk: "Cop Killer". O lobby caucasiano reagiu rápido: banida das rádios e das lojas, a faixa teve que ser cortada das prensagens seguintes, sendo apenas encontrada em compactos vendidos nos shows do grupo. Virou artigo de colecionador, mas na prática era só mais uma engrenagem do disco, que metralhava tudo e todos sem piedade. E sem esquecer da bandidagem e putaria características das rimas de Ice-T - ainda estou pra ver alguém compor algo mais sacana que "Evil Dick". Já o som, era uma maravilha de hardcore/thrash/rock 'n' roll barulhento, tosco e furioso. Divertido até hoje.

Tive esse disco em várias edições. Com exceção do K7 lançado na época, "Cop Killer" estava em todas, provavelmente solta sob condicional. Sinal dos tempos. E Rodney King, pivô daquilo tudo, morreu em junho último, com 47 anos. Sem revolução dessa vez.



O melhor show do Hollywood Rock '93, fácil. A discografia do L7 beira o impecável, sendo Bricks Are Heavy seu momento mais pop. A equação sonora era perfeita (Ramones + Motörhead + Joan Jett + Black Sabbath x Suzi Quatro), mas para domar o furioso punk metal de garagem dessas belas-feras foi preciso ninguém menos que o Midas grunge Butch Vig. O resultado não podia ser diferente: um álbum pesado, ganchudo, espirituoso, emputecido e acima de tudo divertido, vertendo uma velha máxima dos 80's para os 90's: "Riot grrrls just wanna have fun".

Eu amo essas garotas e queria ser o cachorro delas.



Dirty ainda é meu disco favorito do Sonic Youth. Sei, sei, Sister, Daydream Nation e Goo são os queridinhos da torcida, mas o páreo é duro. Novamente, culpa do então onipresente Butch Vig na produção e um senso mais palpável de acessibilidade envolvendo o noise obsessivo do grupo. Logicamente foi mais uma das tentativas das grandes gravadoras de encontrar um novo Nirvana. Não vingou simplesmente porque o Sonic já tinha uma personalidade muito bem definida e nem um pouco preocupada em agradar a todos. Mas rendeu um discaço.



Incesticide não era exatamente o disco que estava nos planos de Kurt Cobain para o Nirvana pós-Nevermind. Mas seu aval foi relativamente barato: o controle criativo do design gráfico do álbum, incluindo a pintura (dele mesmo) que ilustra a capa. Ainda bem, já que Incesticide - composto por lados B, demos, outtakes, covers e performances em rádios - foi a última chance dos admiradores do excelente Bleach de ouvir o Nirvana cáustico e cru dos primórdios.

Esse eu tive em fita cassete. Tempos depois, em CD. Atualmente voltou aos fones de ouvido em formato, digamos, "compacto".



Os anos 70 estavam sendo pilhados naquele início de década, mas o grupo californiano Kyuss abraçava uma vertente mais underground (e mais legal) que seus colegas de Seattle. Se era pra seguir os passos de Ozzy, Iommi & cia, então que fosse pra valer. E dá-lhe afinações subterrâneas fazendo a ponte entre a psicodelia e o groove dos power trios dos 60's e o heavy metal dos 70's. Blues for the Red Sun era apenas um bando de moleques se divertindo. E fazendo história.



Na época, comprei esse LP num sebo pouco depois do lançamento, por uma ninharia, junto com o New York. Deus abençoe a ignorância alheia. Lou Reed compôs Magic and Loss inspirado pelas mortes de dois amigos (Doc Pomus e Rotten Rita). É um álbum conceitual sobre a morte e o processo que leva a isso. É sobre resignação, arrependimentos, dor, solidão e... lâminas. Apesar de parecer muito deprê - e é - o disco tem um certo humor cruel, uma riqueza textual e uma beleza dramática únicas. Musicalmente, é rock de raiz interiorana, soturno e intimista ao extremo, pra ouvir em silêncio e de luzes apagadas. Esse merece a total atenção.

Foi o 1º disco em que não larguei o encarte até conseguir traduzir e interpretar tudo do início ao fim. Foi um parto, mas valeu a pena. Era eu e meu fiel dicionariozinho do cursinho de inglês contra o mundo...



O Screaming Trees já era um veterano quando estourou com a faixa "Nearly Lost You" na esteira da onda grunge. Ao ouvir o bolachão de Sweet Oblivion logo percebi que a musicalidade do grupo estava muito acima de seus colegas de cavanhaque e camisa de flanela. Mais ligado ao hard blueseiro e ao southern rock (Allman, Lynyrd) com boas doses de psicodelia e country do bom (Gram Parsons), os Trees eram músicos de verdade. Na bateria estava o grande Barrett Martin (QotSA, REM, Nando Reis), na guitarra e no baixo estavam os hermanos Gary Lee Conner e Van Conner e na voz curtida à bourbon e gin tônica, a entidade estradeira Mark Lanegan. Aí compadre, é calar a boca, abrir um JD e apertar o play...



Eu já desconfiava que a pecha de "melhor banda ao vivo do mundo" era viral de assessoria de imprensa. Mas na época ouvi muito o LP de Grave Dancers Union, do Soul Asylum (que comprei junto com o Sweet Oblivion... incrível como a gente lembra dessas coisas após tanto tempo). O disco sentiu um pouco os efeitos do tempo, mas ainda sinto o feeling verdadeiro registrado ali, que tem muito a ver com a evocativa e belíssima capa - retirada de uma fotografia do artista tcheco Jan Saudek - e a interpretação desavergonhadamente entregue de Dave Pirner.

Ainda me arrepio com o clipe de "Runaway Train". E mais ainda com seus diferentes resultados, felizmente em sua maioria positivos.



Difícil descrever a sensação que tive ao ouvir esse álbum pela 1ª vez. Em Images and Words, o Dream Theater promovia uma inesperada fusão de Metallica e Rush com arranjos soberbos e revelando uma técnica absurda ao lidar com o progressivo, o jazz e o AOR. E sem soar chato ou elitista, ainda que muito pretensioso (também, né!). Pra mim, é o ponto de perfeição do grupo e certamente o disco que definiu o prog metal.



Quando ouvi o White Zombie pela 1ª vez achei que se tratava de alguma incursão solo ou mesmo um projeto paralelo do James Hetfield. Isso graças ao timbre da voz do Rob Zombie, idêntico ao do colega da Bay Area. La Sexorcisto: Devil Music, Vol. 1 era um pandemônio sonoro: riffs à Slayer conduzindo um climão de horror B sugado diretamente da fonte de Cramps, Kiss e Black Sabbath com uma massa ectoplásmica de samples que iam de Faster, Pussycat! Kill! Kill! e Despertar dos Mortos à Plano 9 do Espaço Sideral e O Massacre da Serra Elétrica. Em suma, irresistível.



Burning in Water, Drowning in Flame é o primeiro e melhor álbum do Skrew. Metal industrial über-abrasivo, com um paredão de guitarras e drum machines que socam no peito até romper a caixa toráxica. A versão do clássico "Sympathy for the Devil" lembra um Slayer acordando de ressaca dentro da Matrix. Segundo consta, o disco teve co-engenharia de Al Jourgensen, além de contar com a participação do mesmo e do recém-falecido guitarrista Mike Scaccia, também do Ministry. Perfeitas más companias, como convém.



Cool World - por aqui, Mundo Proibido - só fui assistir tempos depois, quando já sabia quem era Ralph Bakshi. Mas a trilha sonora caiu em minhas mãos bem cedo, num daqueles saldões "pague 2, leve 3". Peguei só pra completar. E, sim, pela loira cartunizada da capa. Mas quando ouvi tive uma bela surpresa. Com exceção de David Bowie, Electronic, The Cult e talvez Brian Eno, o disco reunia nomes ainda pouco conhecidos no Brasil (Moby, The Future Sound of London, Pure), traçando um instigante cenário da música alternativa lá de fora. Por exemplo, foi aqui que tive acesso pela 1ª vez a algum material do My Life with the Thrill Kill Kult, que comparece em duas faixas.

Analisando em perspectiva, a seleção ainda hoje surpreende pela qualidade e ousadia. Mesmo os momentos puramente dançantes (Da Juice, Mindless) ou cabeções (Eno) são bacanas, além de terem contrapontos de peso. Que tal curtir o trance viajandão do Future Sound of London e logo após se deparar com o terremoto provocado pelo Ministry em "N.W.O."? Insano.



Sem contar a fase inicial insuperável, Mondo Bizarro talvez seja o meu álbum favorito do Ramones. O disco não trazia nenhum clássico per se, nem um hit do calibre de "Pet Sematary" - no máximo, "Strength to Endure", a balada "Poison Heart" e a porrada "Tomorrow She Goes Away" foram relativamente bem veiculadas. Mas era o Ramones se preocupando apenas em ser o Ramones. Punk rock 'n' roll alto, rápido e bagunceiro, com a guitarra do inesquecível Johnny soando como há tempos não soava e a voz do Joey idem.

A inspiração e o tesão haviam voltado. Boa parte do crédito é de Ed Stasium, produtor da maioria dos principais álbuns do quarteto e que não comparecia ali desde Too Tough to Die, de 1984. Ainda ouço no volume 10, com a mesma frequência de quando saiu.


Bonus tracks:



Somewhere Between Heaven and Hell, do Social Distortion, é o azarão da vez. Fiquei na dúvida se incluiria, já que nunca tive em formato oficial, pois era muito difícil - pra não dizer impossível - encontrá-lo por essas bandas. Tive foi uma fitinha Scotch gravada do LP importado de um amigo (pirataria à moda antiga), já bastante detonada pelo tempo e pelas execuções infindas. Não era pra menos. Difícil crer que uma combinação de country e hardcore seria tão acachapante. Não tem bola perdida aqui, todas as faixas são arrasadoras. All killer, no filler total.



RDP ao Vivo do Ratos de Porão não podia faltar, claro. Esporro altamente concentrado de Gordo & cia e um dos melhores discos ao vivo já registrados em terras tupinambás - mas vou te dizer... se tiver a chance de conferir o show do Ratos in loco não perca. É a versão Godzilla disso aqui.



Lançado lá fora no final de 91, Decade of Aggression até que não tardou em aportar em terra brazilis. Eu ainda nem conhecia todos os discos - só o Reign in Blood e o South of Heaven - mas quando a agulha começava a correr naqueles sulcos de vinil enxofrento a sensação de violência e malevolência (não confundir com malemolência) era indescritível.

Ou melhor... até era descritível, mas pra isso terei que apelar para um excerto um tanto quanto "empolgado" da revista Rock Brigade da época em que ainda era datilografada e mimeografada (sério):

“Os guitarristas do Slayer rasgam os seus dedos, destroçando as cordas do mais perfeito instrumento projetado pelo capeta. Power metal (sic!) elevado á última instância, tempestuoso e corrosivo, feito somente para headbangers. Roncando e vomitando fogo, como se um cometa explodisse dentro de um vulcão em erupção!”

(...)

“Misericórdia não existe! Não cabe na filosofia Heavy, por isso que Dave Lombardo pulveriza as moléculas do ar com suas patadas letais na mesma medida em que o terremoto provocado pelo baixo de Tom Araya invoca Satanás para a destruição! Não tem música melosa! A mais lenta faz qualquer um sair por aí chamando urubu de ‘Meu Loro’ e Jesus de Jenésio.”

Créditos da resenha headbanger-true-of-death: Berrah de Alencar (sério²).


Como vociferava o Gordo nos bons tempos do Garganta e Torcicolo...

SLAAAAAAAAAAAAYEEERRRRR!!!

domingo, 6 de junho de 2004

"...SIN PERDER LA TERNURA JAMÁS!"


Odeio me flagrar tendo uma atitude idealista de araque. Dá pra sentir até aquela boina com uma estrelinha vermelha enfiada na cabeça. O próprio Che de final de semana. Só que às vezes não consigo me render ao capitalismo selvagem e simplesmente viro as costas (ainda que esteja devorando um Big Mac® com Coca-Cola®). É justamente como eu me senti quanto à infame versão lusa do Rock In Rio, um desserviço à preservação do amor à pátria amada, devidamente coroada pelo nosso ministro da Cultura - que também tocou lá. Eu já conhecia muito bem a mania do Roberto Medina de vender a alma ao diabo pela enésima vez, afinal, como se explicaria Sandy & Junior, Britney Spears e atrocidades afins na 3ª edição do festival...? Mas pior que isso foi ver o Medina vender a alma aos portugueses. Rock in RIO em... LISBOA?! Prestigiar um festival nosso feito em outro país?! Tô fora. E outra: quem no mundo tem interesse em conhecer uma banda chamada "Xutos & Pontapés"? Fala sério, seu Joaquim. Isso foi demais pra minha pobre cabecinha headbanger e, revoltado, pensei em me alistar no exército Zapatista ou então nas FARC.


A ficha demorou bastante pra cair dessa vez. Quando assisti um pedaço do show do Evanescence que passou na Rede Globo, fiquei impressionado e logo quis estar do "lado direito" do Atlântico. Eu já vi vários shows deles, mas este foi especial. As dimensões do local eram muito desproporcionais à proposta da banda, que funciona bem melhor em um lugar pequeno, como um ginásio ou mesmo um pub. Na vastidão daquela arena, o som se desvanescia (consegui, hohoho), principalmente pra quem estava lá atrás.

Mesmo assim, com o auxílio de alguns playbacks, o Evanescence revelou uma front-woman que é um verdadeiro paradoxo: do "alto" de seus 1,63m de altura, Amy Lee mandou ver numa performance arrebatadora, que de quixotesca não teve nada. Ela venceu aquele jogo praticamente sozinha. Cantou, correu, agitou, se esgoelou, tocou soberbamente um piano de cauda e ainda arrumou tempo para exibir uma sensualidade estonteante. E que olhos, meu Deus... (será que eles brilham no escuro?)

Já o restante da banda era só... restante. Nem dava pra notar a presença de alguém ali. Parecem aquelas orquestras que ficam escondidas embaixo do palco.


No final, suspirei profundamente, deitei no sofá e assisti à reprise do Gilberto Gil. Causa? Que causa? Anarquistas, graças a Deus.


STONER ROCK
MÚSICA P/ DESABAMENTOS



Deuses do Rock sessentista como Jimi Hendrix, Cream e Blue Cheer, entre outros, já encerraram as atividades há muito tempo, mas o seu legado ecoa até hoje. E as bandas do chamado Stoner Rock, estão aí pra confirmar. A primeira referência para esse estilo são as bandas citadas aí em cima que, aliás, inseriram o conceito do power-trio no rock - baixo/guitarra/bateria a serviço de um som sujão, ultra-distorcido e "viajante" (ou stoned, gíria pra chapado e origem do neologismo "stoner"). Lisergia total. Mas a inspiração do stoner não parou por aí e ainda abraçou o que os anos 70 tiveram a oferecer - e como...! Bandas emblemáticas do rock setentista, como Led Zeppelin, Deep Purple, Motörhead, Thin Lizzy, Jethro Tull, Free, Mountain, AC/DC e, principalmente, Black Sabbath forneceram a matéria prima para o estilo.


Os Cavaleiros do Sabá Negro. Quem diria que Ozzy faria um reality show...

Mas quem pensa que esse revival começou com o grande Queens Of The Stone Age, calma lá. A coisa toda começou lá atrás, no início dos anos 90, com o pessoal de Seattle ou, mais precisamente, com o famigerado grunge. Muitas das bandas que estouraram naquele movimento já tinham muitos anos de estrada e, não raro, vários discos lançados. Soundgarden, Screaming Trees, The Melvins e mais uma batelada de grupos já eram putas velhíssimas, enquanto o Nirvana, Pearl Jam e Alice In Chains ainda estavam choramingando no berçário.


É só ligar a Harley Davidson e pegar a Rota 66

Dessas todas, a que mais se aproximava do que viria a ser o stoner rock era o Soundgarden (banda do Chris Cornell, atual Audioslave). Essa banda alcançou o sucesso um pouco mais tarde que seus conterrâneos de Seattle. Mainstream pra eles, só em 94, com o multi-platinado Superunknown. Mas, na minha opinião, o verdadeiro Soundgarden está no disco anterior, Badmotorfinger, de 1991, esse sim, uma paulada tipicamente stoner. Ouça preciosidades como Outshined, Rust Cage ou Jesus Christ Pose no volume 10 e sinta o chão tremer como se um T.Rex estivesse se aproximando à mil por hora.


Mais influente que o monolito negro, do filme 2001

Um ano depois, em 92, mais um disco simplesmente memorável, Blues For The Red Sun, da banda californiana Kyuss (embrião do QOTSA e de boa parte da cena). Era Nick Oliveri (baixo), Josh Homme (guitarra), Brant Bjork (bateria) e John Garcia (vocais), todos por volta dos 16/17, na época. Pra se ter uma idéia das experimentações dos caras, a guitarra era plugada num amplificador de baixo, com a afinação mais grave possível. Parecia o ronco enfurecido de um V8. O efeito era digno de um terremoto, alterava até o batimento cardíaco. Mais outra moda stoner inaugurada pelos caras: festas regadas à muito álcool (e outros "aperitivos") em pleno deserto californiano, onde eles, com auxílio de geradores, tocavam por horas e horas sem parar. Kyuss era isso aí, pra ouvir em alto e bom som, de preferência, com os olhos fechados (o mundo seria perfeito se desse pra dirigir de olhos fechados).

O Kyuss acabou cedo, em 95, e os estilhaços formaram as galáxias e os planetas do universo stoner. Das bandas diretamente ligadas ao Kyuss, estão o Fu Manchu, Slo Burn, Unida, Che, Brant Bjork & The Operators e, agora sim, o Queens Of The Stone Age, que herdou Josh Homme e Nick Oliveri - aquele cara que ficou peladão no palco do Rock In Rio 3. O QOTSA é, de uma certa forma, uma versão mais polida do Kyuss, sem o lado lisérgico e experimental, mas mesmo assim, é uma puta banda (meu disco preferido dos caras é o Songs For The Deaf, o mais recente).


O bom e o mal. Ambos são feios.

Outro grupo digno de nota é o Monster Magnet, do malucão Dave Wyndorf. Hoje, a banda é meio como um artigo de luxo na cena stoner, transitando entre o industrial, uma certa nuance pop e o stoner. Pra quem quer conhecer o MM atual, recomendo o excelente disco Powertrip, de 98 e presença constante no seleto Top5 at your left. Já para conhecer a pré-história do MM, pode ir de Spine Of God e que a Força esteja com você. Esse disco, de 92 (o ano do stoner!), subverte a rifferama do Black Sabbath e é uma das wild trips mais singulares do rock. Tem até um solo de bateria no meio, ao melhor estilo In-A-Gadda-Da-Vida (do também seminal Iron Butterfly).

Nessa linha, vale à pena conhecer também o Orange Goblin, Spiritual Beggars, Nebula e Corrosion Of Conformity, que são ótimas bandas e mandam ver num som pauleiríssimo, e sem chance alguma de rolar nas FMs (isso é um elogio!).

Até algumas figuras da cena metal têm se rendido ao estilo, como Phil Anselmo (ex-Pantera), que formou o Down - que, embora não seja exatamente stoner, tem muitos elementos dele. O ex-Napalm Death Lee Dorrian também é uma referência na cena, visto que sua banda Cathedral, há muito tempo saiu do doom metal que praticava no começo, para um som bem mais "sabbático", obviamente mais próximo do stoner. Aliás, no álbum The Carnival Bizarre, a banda contou com ninguém menos que Tony Iommi, tocando guitarra na música Utopian Blaster. Reverência maior, impossível.

O onipresente Dave Grohl também embarcou de cabeça no estilo, já que seu projeto paralelo Probot é predominantemente stoner. Pra arrematar qualquer dúvida, é só lembrar dos convidados presentes no disco de estréia - gente do porte de Lemmy, Mike Dean (do Corrosion Of Conformity), Eric Wagner (do Trouble), Kurt Bretch (do D.R.I.), além do próprio Lee Dorrian, entre outros.


Firebird é retrô até na capa

Outro caso parecido é o do ex-Carcass Bill Steer, que formou o excelente Firebird. A banda segue à risca o esquema dos power-trios sessentistas, desde a formação propriamente dita (ele, Ludwig Witt, do Spiritual Beggars e Leo Smee, do Cathedral - timaço), até o visual, como visto nessa capa aí, do álbum Deluxe (o 2º, de 2001). O som é um primor de blues rock deliciosamente distorcido, mas com um certo apuro instrumental em relação aos demais. Aqui, o som é muito bem executado, lembrando por vezes os devaneios instrumentais do Deep Purple (em especial, do álbum Purplendicular). Conheci a banda através de um cover de Working Man, do Rush, que estava disponível nesse site. Pena que apagaram o arquivo (mas vale conferir a info que ficou). De qualquer forma, não se deixe abater e faça como este que vos escreve. Caçe essa banda no DC++, e-Mule, ou qualquer outro compartilhador desses, mas passe à quilômetros de distância dos KaZaAs da vida (lá só tem de Britney Spears pra baixo). Vale (muito) à pena, se você curtir esse estilo.

Em tempo: o Rush (banda-tia do stoner) adicionou a música Summertime Blues, de Eddie Cochran e imortalizada pelo Blue Cheer (banda-bisavó do stoner), no set-list do seu novo álbum, Feedback (só de covers). Clique aqui pra conferir um trecho (ficou bem mais pesada que a original, claro).

Além dos links que passei (os sublinhados não foram porque achei bonitinho não), é parada obrigatória também o Planeta Stoner, o melhor site dedicado ao estilo no Brasil. Essa matéria, da central rock Whiplash, também ficou muito boa, bem esclarecedora para iniciantes.

Outra coisa, o stoner sempre caminhou lado a lado (mas sem boiolagem) com o gothic e o já citado doom metal. À primeira ouvida, parece tudo a mesma coisa, mas para o ouvido treinado é quase uma blasfêmia proferir tal afirmação. Doom é pesadaço e arrastado, gothic é... gótico e depressivo e stoner é isso tudo, só que cheio de marijüana, e todos os três nem sonhariam em existir se não fosse o Black Sabbath. Pra saber diferenciá-los "profissionalmente", recomendo essa excelente matéria, onde Jorge Vitzac destrincha legal toda essa viagem lisérgica e incandescente. Pra visitar tomando uma cerva trincando de gelada.


Post ao som de Kyuss, Firebird, Helmet e Black Sabbath - e haja café!!