Se antes de assistir
Colateral (
Collateral, 2004), você quiser tomar um choppzinho de leve, esqueça. Tome um whisky, um martini, ou qualquer drink que possa levar
on the rocks no sobrenome. Isso aqui não é Michael Bay, nem Simon West, nem Jan De Bont. Isso aqui é
Michael Mann, man. Puro e sem gelo. Nada de baixaria gratuita na telona. Tenha em mente conceitos como urbanidade, vida noturna,
decadence avec élegance e mundo-cão. Tudo realizado com muita classe e sem se importar com a urgência da geração MTV.
Mann não faz só "filmes para adultos". Ele faz "filmes para adultos inteligentes". Com a experiência adquirida em seus anos no memorável
Miami Vice, e dono de um talento nato para
thrillers policiais, Mann só escorregou uma vez em sua filmografia, no filme
Ali (mas pô, eu ainda estava sob o efeito dos filmaços
Quando Éramos Reis e
Don King, O Rei do Boxe – ainda insuperáveis na área).
Adepto das peregrinações noturnas de Martin Scorcese, Mann foca suas lentes no vasto e solitário palco da noite metropolitana. O filme retrata um dia na vida de
Max (o ótimo
Jamie Foxx, foda desde
Um Domingo Qualquer), um taxista pobretão, honesto, gente-boa, e que sonha em "brasileiro": ele encara o trampo como temporário, até ter grana suficiente pra montar o próprio negócio – e aí, vão-se os dias, meses e anos, sempre atrás do volante. Numa das corridas, ele é sorteado pelo assassino profissional
Vincent (
Tom Cruise, tentando, tentando) para ser o seu chofer enquanto ele vai "trabalhando". Max - sempre hesitante e refém das suas próprias limitações - e Vincent - sofisticado e ousado por natureza e profissão - são aparentemente dois extremos. A diferença entre as personalidades e motivações é explorada até eles surpreendentemente se identificarem.
Particularmente, eu sempre gostei da linha narrativa adotada por
Colateral. A ação "em tempo real", durante a noite de uma grande metrópole, já rendeu bons filmes, como
Uma Jogada do Destino e
Depois de Horas, do próprio Scorcese. A diversidade oferecida pela locação urbanóide é de uma realidade acachapante. As áreas suburbanas se emendam na selva de pedra, com seus modernos arranha-céus, avenidas largas e vazias, bares decadentes e boates lotadas. A noite é solitária, mesmo quando se está rodeado de pessoas. Hoje, o individualismo é extremo e as relações interpessoais estão falidas, o que foi muito bem captado pela câmera (digital) de Michael Mann.
Apesar dessas observações mais sociais, o filme não se prende à isso e traz boas seqüências de ação, como na boate onde se encontra um dos alvos de Vincent. E traz também seqüências inusitadas, como no momento em que Max vai conhecer
Felix (o grande
Javier Bardem), empregador de Vincent. A cena em que Vincent conhece a mãe de Max também é responsável por um momento bastante insólito, pra dizer o mínimo. Achei meio forçado no começo, mas mudei de opinião ao ver o desenrolar da situação.
Talvez pelo roteiro (de
Stuart Beattie, de
Piratas do Caribe) não tão à altura do talento individual do diretor, pode-se isolar, com tranqüilidade, as melhores cenas do filme: o diálogo pra lá de delicioso entre
Annie (
Jada Pinkett-Smith, cada dia mais bonita e melhor atriz – maldito Will) e Max é do tipo que eu gostaria de ter umas dez vezes ao dia, a social
cool as ice no single bar, com Max, Vincent, o
jazzman Daniel e
Miles Davis (a conversa foi tão bacana que eu bato uma aposta que ele estava lá), e o clima pré-tiroteio ao som da bela
Shadow On The Sun, do
Audioslave.
Apenas um porém causa um efeito colateral em
Colateral (nossa, péssima): o destino reservado ao policial
Fanning (o ótimo
Mark Ruffalo). O trabalho do cara foi tão bom que a decepção com o roteiro foi inevitável.
Pra finalizar, o vencedor foi
Jamie Foxx. Construir um personagem enfraquecido que depois se fortalece, como ele fez, é muito difícil. Já o Tom Cruise é um bom ator, do tipo que detona o
sparring, mas na hora da luta de verdade, ganha por pontos. É a herança adquirida por pérolas como
Cocktail,
Top Gun e
Dias de Trovão. Se ele não ganhou o Oscar de melhor ator por
Nascido em 4 de Julho, e o de ator coadjuvante por
Magnólia, aí não já não tem muito mais o quê fazer. O jeito é ralar por mais alguns anos e tentar ficar mais feio pra convencer os feiosos da Academia.
Não esperem ver em
Colateral a velocidade
non-sense de um videoclip. Michael Mann é
cool. Ele fala, você cala a boca e escuta. Se você não gosta da dinâmica estilosa e cadenciada dele, vá assistir à MTV e não me encha o raio do saco. Michael Mann é bróder.
Anexo 02/09:Se assistir propaganda durante uma sessão de cinema já é revoltante, imagina então ver a mesma propaganda
duas vezes seguidas. Foi o que fizeram com um
spot anti-pirataria que anda veiculando incessantemente pelos cinemas. Os caras devem estar desesperados pra chegar à esse ponto. Com uma edição rápida e trilha moderninha, o vídeo faz o estilão MTV de marketagem, e é até bem-feitinho. Tão bem-feito que em mim, particularmente, surtiu o efeito contrário. Após vê-lo, me bateu uma vontade incontrolável de baixar algum filme na web.
60 POSTS!
Seguindo a onda das "conquistas"... mas sem o glamour de um Blogs of Note (mesmo porquê, não sou mais de lá), nem de um contador registrando o milionésimo acesso (mesmo porquê, não tenho um contador - e sim, estou sendo despeitado :P).
Esse número é quase surreal visto que retomei o blog há pouco tempo e eu caio no rock praticamente todo santo dia. Agora, por exemplo... é pra onde estou indo. Mas deu tempo de postar antes. Conclusão: os posts do Black Zombie sobrevivem no underground do meu cotidiano. BZ é rock independente!
Hasta la vista!