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quarta-feira, novembro 22, 2017

Morrissey em Manchester

* DESCOBRIR MORRISSEY, de Mark Gill
[DN, 16-11-17]

O título português preocupa-se em identificar Morrissey, fundador de The Smiths. Na verdade, este é um filme sobre Steven Patrick Morrissey antes da consolidação da aliança criativa com Johnny Marr e da formação da banda — o título de trabalho foi Steven, tendo sido lançado como England Is Mine (de um verso escrito por Morrissey: England is mine, it owes me a living). Eis um caso de exemplar sobriedade biográfica, evitando qualquer determinismo “artístico”, antes retratando Morrissey como um jovem à deriva na cena musical de Manchester, numa solidão assombrada pelo fascínio da escrita poética. O tom directo e realista da realização de Mark Gill encontra o adequado complemento nos actores, sendo inevitável destacar, no papel de Morrissey, o magnífico Jack Lowden (vimo-lo, por exemplo, em Dunkirk, de Christopher Nolan).

sexta-feira, junho 26, 2015

Ver + ouvir: Morrissey, Kiss Me a Lot



O álbum é de 2014 mas continua a ter vida pública. Morrissey passou pelo Tonight Show para apresentar o single. Aqui ficam as imagens.

terça-feira, outubro 07, 2014

Uma noite com Morrissey em Lisboa

Foto: DN
Publiquei hoje no DN um texto sobre o concerto que Morrissey levou ao Coliseu dos Recreios, em noite de abertura de uma nova digressão europeia na qual a expressão nostalgia não parece morar entre as preocupações do músico. E ainda bem...

Ali conto que:

"De fato branco - e quase fazia lembrar a silhueta de um Elvis em finais dos sessentas quando entrou em palco - e vocalmente seguro (houve apenas um engano mais evidente, coisa típica de arranque de digressão), Morrisey não junta ao palco nem tiradas espirituosas nem grandes discursos. Foi poucas vezes para lá do "obrigado" (ou "gracias" noutras duas ocasiões), sublinhou um "porque tem de ser" quando evocou "Hand in Glove" dos Smiths e não gastou muito do seu latim em conversas com a plateia. O que não fez contudo da sua passagem por Lisboa uma presença muda além do canto. Pelo contrário, as imagens de touradas que passaram pelo ecrã que escondia o palco antes do início da atuação, a sequência de imagens de violência e maus tratos sobre animais que acompanharam o poderoso Meat is Murder ou novamente as touradas no mais recente The Bullfighter Dies (e talvez valha a pena refletir sobre até que ponto foi ou não igualmente violenta a sua exposição) e as representações jocosas da família real britânica que exibiu duas vezes - uma delas sob a legenda "United King-dumb" - deram à passagem de Morrissey pelo palco lisboeta uma dimensão política que não passou despercebida a ninguém.

Não foram muitos os singles revisitados e contaram-se ao todo nove os temas do novo disco (um deles um extra da edição especial em CD) no alinhamento de 19 canções que trouxe a Lisboa. Não é propriamente uma aritmética para consumidores de nostalgia nem cultores de uma visão de uma obra na perspetiva da "fama" (leia-se os êxitos). Mas a verdade é que, no fim, eram sorridentes e satisfeitos os rostos que saíam do Coliseu, minutos depois de um festivo First of The Gang que fechou o encore. Morrissey mostrou como carisma, personalidade e uma obra ainda viva são argumentos bem mais entusiasmantes para partilhar num serão frente a uma plateia que os desfiles de clássicos de outros tempos que tantos outros da sua geração apresentam por aí."

Podem ler aqui o texto completo.

Ontem, também no DN, apresentei um texto de antecipação sobre o regresso de Morrissey a Portugal. O texto foi publicado com o título 'Entre memórias e canções vamos aprendendo a conhecer Morrissey'.

Alguém que nos conta que a sua infância foram “ruas sobre ruas sobre ruas”, falando de “ruas que nos definem e ruas que nos confinam” é alguém com a alma (e o talento) de um grande escritor. Estas são porém palavras escritas e já publicadas de um músico. E ele é, contudo, mais do que apenas um músico. É um dos mais inspirados, demarcados e importantes autores dos últimos 30 anos, em tempos tendo criado com o guitarrista Johnny Marr um par criativo do calibre de duplas como as que juntaram Lennon com McCartney ou Jagger com Richards. Ele chama-se Morrissey. E após longa ausência está de regresso a Portugal para o arranque da fase europeia de uma digressão que foi atribulada na sua etapa norte-americana (que viu parte dos concertos serem cancelados na sequência de uma infeção pulmonar que impediu o músico de subir ao palco durante algum tempo).

Durante anos foi pelas canções que o tentámos conhecer. E dele, tal como de tantos outros que fazem da escrita de canções a sua principal “voz”, fomos somando referências, retratos, vivências, sugestões, por vezes suposições mais as inevitáveis dúvidas. É assim a escrita de canções, mesmo quando alicerçada no real e cruzando ecos factuais: uma construção de pequenas ficções, muitas vezes com uma personagem (real ou criada) como protagonista. Há pouco mais de um ano, Morrissey decidiu contudo juntar outras palavras à sua escrita. E numa autobiografia a que chamou, simplesmente, ‘Autobiography’ (e que em breve terá tradução para português publicada em livro pela Marcador), deu-nos um retrato de si mesmo pelo seu prisma e suas frases. Tudo mudou a partir desse momento. E o homem que vamos reencontrar no palco do Coliseu dos Recreios é, sendo o mesmo, alguém que talvez agora possamos conhecer (leia-se “compreender”) um pouco melhor.

Musicalmente temperado com a algo inesperada presença de alguns elementos da cultura latina, o mais recente disco ‘World Peace Is None of Your Business’ (editado este ano) foi o seu primeiro conjunto de inéditos gravados depois da edição do livro e, por isso mesmo, um disco escutado na posse de novos dados. O álbum, que o próprio Morrissey mandou retirar das lojas na sequência de um desentendimento com o que criticou ter sido um mau trabalho promocional da editora (tendo entretanto já prometido nova edição em nova etiqueta), traduz uma saudável inquietude de quem não deseja cristalizar nas suas referências mais “clássicas” e ensaia ligações a novas geografias musicais, ao mesmo tempo que aprofunda um sentido de cenografia sonoplasta (que não é, todavia, estreia absoluta na sua discografia). Se musicalmente o disco gerou surpresa – inevitavelmente dividindo opiniões –, tematicamente acrescenta à sua obra um novo conjunto coerente de imagens e reflexões. Aos 55 anos fala-nos de Allen Ginsberg, de modelos de masculinidade e dos direitos dos animais, fechando o alinhamento com um ‘Oboe Concerto’ em que olha de frente o envelhecimento, reparando que uma geração mais velha já partiu e que ele mesmo começa a tomar o seu lugar numa fila de espera.

Nos concertos da etapa norte-americana da presente digressão Morrissey levou a palco canções dos tempos dos The Smiths. Em Boston, por exemplo, cantou ‘The Queen Is Dead’, ‘Asleep’ e ‘Meat Is Murder’. Em Miami cantou também ‘How Soon Is Now’ e ‘Hand in Glove’. E entre estas memórias tem garantido a evocação da parceria criativa com o guitarrista que, quando o conheceu (estando “imaculadamente penteado”), a primeira coisa que lhe terá dito era que tinha “uma voz estranha”, como recorda na sua autobiografia. Nessas mesmas páginas Morrissey comenta inclusivamente as aptidões naturais do velho parceiro de trabalho e questiona porque é que, entre tantos outros possíveis colaboradores em Manchester, teria acabado junto de alguém tão “amedrontado e complicado” como ele mesmo...

A verdade é que, a bordo dos The Smiths, Morrissey viria não apenas a assinar uma obra que reativou a presença das guitarras no mapa das atenções da música pop/rock inglesa de então, como se transformou, pelas características únicas da sua voz, palavras e atitude, num dos maiores ícones que a cultura “alternativa” viu nascer nos anos 80. Foram poucos discos (apenas quatro álbuns de originais e um conjunto mais extenso de singles), mas todos eles marcantes, raras sendo as listas de títulos fundamentais dos oitentas em que não figurem uma ou mais entradas dos The Smiths. O desmembramento do quarteto, em 1987, abriu espaço a uma carreira a solo de Morrissey que, com melhores e piores momentos, acrescentou à sua obra em disco pérolas maiores como ‘Viva Hate!’ (1988), ‘Vauxhall and I’ (1994) ou ‘You Are the Quarry’ (2004). O novo disco juntou este ano um novo episódio a um corpo criativo que, agora, partilha atenções com os livros (falou-se já de uma estreia como romancista para breve, como avançou o The Guardian em janeiro). Em palco, porém, as canções serão novamente as protagonistas.

segunda-feira, outubro 06, 2014

Ver + ouvir:
Morrissey, Earth is the Loneliest Planet



No dia em que se assinala o reencontro de Morrissey com os palcos portugueses - atua logo à noite no Coliseu dos Recreios - aqui fica um olhar diferente sobre um dos temas do seu mais recente disco. Sem a música, fica a letra.

quinta-feira, agosto 21, 2014

Para ler: Morrissey explica razões
para o afastamento da editora

Poucas semanas depois de ter editado o seu mais recente álbum, de título World Peace Is None Of Your Business, Morrissey afastou-se da editora que o lançara: a Harvest. Segundo avança a Pitchfork o disco poderá ser em breve lançado por uma outra editora.

Podem ler aqui a notícia, que inclui citações do próprio Morrissey, que explica o que justificou este afastamento da editora.

segunda-feira, julho 21, 2014

Três meses, três discos (pop/rock)


Depois da relativa dieta que vivemos nos três primeiros meses de 2014, o segundo trimestre do ano foi farto em grandes edições discográficas. E a ter de destacar três, apontaria desde logo In Conflict, álbum de Owen Pallett no qual o músico canadiano alarga horizontes e integra as eletrónicas concebendo um disco que representa o seu melhor momento até à data. Depois teremos de passar pelo belíssimo World Peace Is None Of Your Business, o primeiro álbum de inéditos que Morrissey grava depois de editada a autobriografia (lançada internacionalmente em 2013 e com edição local prevista para o fim do ano). E ainda Someday World, magnífico exemplo de domínio sobre a canção pop por Brian Eno, devidamente acompanhado por Karl Hyde, dos Underworld.

A lista dos bons discos da colheita pop/rock internacional deste trimestre não pode contudo deixar de referir o álbum ao vivo dos LCD Soundystem (apenas disponível em lançamento digital e em vinil) e os novos discos de nomes como os de Tori Amos, Eels, Fujyia & Myiagi, Silva ou os Teleman.

terça-feira, julho 15, 2014

Novas edições:
Morrissey

"World Peace is None of Your Business"
Capitol / Universal
4 / 5

Há precisamente um ano o mundo esperava pela chegada Autobiografia de Morrissey. Com edição portuguesa marcada para o final de 2014 (pela Marcador, com tradução de Pedro Gonçalves), o livro não só confirmou a excelência da escrita do autor como nos deu olhares nunca antes tão profundamente explicados da sua infância e adolescência, da sua descoberta da música e dos livros ou das origens dos Smiths, aqui e ali juntando pontos de vista sobre temas, acontecimentos e discos que dele fizeram um dos maiores escritores de canções de sempre. World Peace In None of Your Business representa o seu primeiro lançamento em álbum após as revelações da autobiografia. E nem que apenas por isso mesmo, por ser o primeiro novo conjunto de canções que nos mostra depois de nos dizer, de sua viva voz (e como nunca antes o fizera), quem é, o que conta e pensa, é um álbum que podemos escutar com outra consciência de quem o criou.

Na verdade, e depois da autobriografia, Morrissey tinha lançado um single com uma versão sua de Satellite of Love, de Lou Reed. Mas neste novo disco mostra-nos caminhos (sobretudo na música) que em muito vão para lá do corpo das suas referências históricas, experimentando não apenas espaços de outras geografias (nomeadamente as já muito faladas sonoridades latinas ou orientais) como até mesmo ensaiando modelos de arranjos com um interesse sonoplasta, ocasionalmente gerando instantes de surpresa como em tempos encontrara na sequência de abertura de Last Night I Dreamt That Somebody Loved Me, uma das canções de formas mais elaboradas na obra dos The Smiths.

Se bem que este novo disco não seja necessariamente expressão de um focar de atenções numa geografia concreta, em World Peace is None of Your Business Morrissey visita de várias formas a cultura espanhola, seja por citações musicais (de dedilhados de guitarra acústica a formas latinas presentes em alguns arranjos) ou quando fala de toureiros. Estas presenças são mais evidentes que as que Ringleader of the Tormentors (2006) fez relativamente a Itália, onde Morrissey gravou esse seu oitavo álbum de originais, mas não fazem do disco um álbum latino nem mesmo espanhol, já que musicalmente as referencias que visita são aqui mais vastas que nunca.

Se musicalmente este é um dos álbuns mais inesperados na obra a solo de Moorrissey (como que, depois da “autobiografia” explicada pudesse dizer, “e agora algo completamente diferente”) e, podemos acrescentar, um dos mais intrigantes e sedutores, tematicamente é mais um firme episódio num corpo de trabalho sólido e coerente. Fala-nos de Allen Ginsberg, dos modelos de masculinidade (como seres carnívoros, agressivos ou mulherengos nos quais não se reconhece ou dos direitos dos animais, fechando o alinhamento com o magnífico Oboe Concerto onde aborda o envelhecimento, olhando uma geração mais velha que partiu, dizendo como está agora a tomar o seu lugar na mesma fila de espera. Aos 55 anos, e numa altura em que escreve o seu primeiro romance (como revelou o Guardian), Morrissey é um veterano a viver mais um momento de pico de forma.


Este texto é uma versão editada de um outro publicado na edição de 14 de julho do DN com o título 'Novo álbum revela Morrissey em pico de forma'.

terça-feira, julho 08, 2014

Para ler: o novo álbum de Morrissey

Em contagem decrescente para a chegada de um novo álbum de Morrissey (sai dia 14). O Guardian já o escutou. E revela cinco grandes ideias sobre aquilo que podemos dali esperar.

Podem ler aqui.

sexta-feira, junho 20, 2014

Reedições:
Morrissey, Vauxhall and I

Morrissey
“Vauxhall And I”
PLG UK Catalog
5 / 5

Bastava a obra que gravou com os The Smiths para dele fazer um dos maiores de sempre na história da música. Mas nunca baixou os braços. E ainda a notícia do fim do grupo tinha sabor a (triste) novidade, já Morrissey preparava um primeiro passo em nome próprio que veria a luz do dia em 1988 no belíssimo Viva Hate. Desde então lançou um total de dez álbuns de estúdio em nome próprio, uns melhores, outros menos brilhantes. E do balanço do que já nos mostrou o magnífico Vauxhall And I, de 1994, continua a ser a sua obra-prima pós-Smiths. Apesar das claras marcas de identidade da sua escrita e de ter como protagonista uma das mais distintas vozes da história da música popular, este é um disco algo “diferente” no quadro da sua obra a solo. É um álbum profundamente melancólico, por vezes sugerindo tonalidades quase elegíacas – que muitas vezes são atribuídas ao facto de se ter sucedido à morte de três figuras que lhe eram próximas, entre elas Mick Ronson (que produzira o anterior Your Arsenal). Cabendo a Billy Budd a ligação mais evidente à matriz rock’n’roll que habitara o tutano do álbum anterior, as canções que aqui apresentava procuravam caminhos cenicamente mais plácidos, recatados, procurando a expressão de outras vozes interiores, a produção de Steve Lillywhite ajudando a definir a nitidez dos novos pontos de vista aqui procurados. O alinhamento revela depois uma coleção invulgarmente inspirada, fazendo este um daqueles raros casos de álbuns dos quais quase todas as faixas se apresentam como singles potenciais (os escolhidos oficiais tendo sido The More You Ignore Me The Closer I Get, Now My Heart Is Full e o sublime Hold On To Your Friends, esta uma das melhores canções dos anos 90). Na hora de assinalar os 20 anos do lançamento deste álbum eis que surge uma edição comemorativa que junta ao alinhamento original, devidamente remasterizado, um disco extra registado ao vivo. As duas décadas que passaram quase fizeram esquecer as cores do mapa brit pop que dominava o panorama musical inglês à data do lançamento deste disco, assim como o período de “má imprensa” que Morrissey viveu por conta de acusações de uma agenda nacionalista por aqueles dias. As canções, essas sim, venceram o tempo. E, juntas, dão-nos um daqueles discos que ajudam a contar a História.

terça-feira, junho 10, 2014

Para ouvir: nova canção de Morrissey

Mais um tema para ir, aos poucos, descobrindo o novo álbum de Morrissey, a editar a 15 de julho. Desta vez a Consequence of Sound revela o tema Kick The Bride Down The Aisle.

Podem ouvir aqui.

Entretanto foi noticiado que a Autobiografia de Morrissey terá lançamento entre nós no final do ano numa edição pela Marcador, uma chancela da Presença. A tradução ficará a cargo de Pedro Gonçalves, antigo diretor do Blitz.

quarta-feira, junho 04, 2014

Para ouvir: novo tema de Morrissey.


Morrissey acaba de apresentar no Spotify aquele que é o single com que apresenta o seu novo álbum de originais. Podem escutar aqui este Earth Is The Loneliest Place.

quarta-feira, maio 21, 2014

Para ouvir: nova canção de Morrissey



Um novo tema de Morrissey, a integrar o novo álbum de originais que tem lançamento previsto para meados de junho. Para ouvir em exclusivo via Spotify.

domingo, janeiro 05, 2014

Ver + ouvir:
Morrissey, Now My Heart Is Full (1994)



Um dos temas de Vauxhall and I, que é um dos melhores álbuns da discografia a solo de Morrissey e faz este ano duas décadas de vida. Esta gravação recorda um momento da sua atuação no Festival de Reading.

terça-feira, dezembro 24, 2013

Os melhores livros de 2013 (N.G.)


Andei a trabalhar demais em 2013, está visto... (ou seja, a ter de ler para poder escrever...) E a dedicar depois mais tempo livre ao cinema que aos livros. Na verdade li mais títulos de outros anos, para um work in progess que a seu tempo se materializará. De 2013 a colheita foi sobretudo feita de coisas para ouvir. Ou, pelo menos, com música por perto. A autobiografia de Morrissey foi naturalmente o livro do ano. Não apenas por ser de quem é. Não apenas por falar dos Smiths e de nos dar pontos de vista sobre uma obra ímpar sem a qual seríamos quem somos (falo por mim, claro). Mas também pela forma como Morrissey a escreve e de como, através do seu percurso e das músicas que nos fala, traçamos também um retrato de realidades do nosso tempo. Do universo de Blake & Mortimer, mesmo com um novo álbum menor recentemente publicado, chegou-nos um volume de memórias de Edgar P. Jacobs precisamente sobre estas personagens e o universo que o autor criou ao seu redor. O volume de leituras passou pelo (excelente) catálogo que acompanhou a exposição dedicada a David Bowie no Victoria & Albert e por um guia publicado pelo British Museum documentando, através de peças da sua coleção, exemplos de expressão de amor entre pessoas do mesmo sexo ao longo dos séculos e através de diversas culturas. Da obra de Siza às fotos de Tom Waits por Anton Corbijn, passando por um primeiro volume de uma abordagem de grande fôlego à biografia dos Beatles, uma coleção de textos de Carl Sagan passa ainda um ano que, de ficção pouco foi lido (entre títulos novos, ou traduções recentes). Um retrato dos últimos dias de Alexandre, O Grande, por Laurent Gaudé e um espantoso exercício de teoria da conspiração de Don DeLillo ficam mesmo assim entre os melhores de 2013.

1. Morrissey, Autobiography (Penguin) 
2. Edgar P. Jacobs, Un Opera en Papier (Gallimard) 
3. Victoria Broackes e Geoffrey Marsh, David Bowie is Inside (V&A Museum) 
4. R.B Parkinson e Kate Smith, A Little Gay History: Desire and Diversity Across The World (British Museum) 
5. Mark Lewisohn, The Beatles – All These Years – Vol. 1: Tune In (Little) 
6. Don DeLillo, Libra (Sextante) 
7. Philip Jodidio, Álvaro Siza – Complete Works 1954-2012 (Taschen) 
8. Anton Corbijn, Waits ’71-‘11 (Schrimer/Mosel) 
9. Laurent Gaudé, A Última Viagem (Sextante) 
10. Carl Sagan, Biliões e Biliões (Gradiva)

segunda-feira, dezembro 23, 2013

As figuras de 2013: Morrissey


O ano que assinalou as três décadas sobre a estreia em disco dos The Smiths (com o single Hand In Glove) fez de Morrissey uma figura no centro das atenções. O lançamento da sua muito aguardada autobiografia representou simplesmente o momento mais importante do ano editorial no universo do relacionamento entre a música e os livros. Houve ainda a edição do filme-concerto Morrissey - 25 Live. E ainda a chegada a single de uma versão de Satellite of Love, de Lou Reed, com letra a assinalar uma posição clara do músico quanto à televisão.

Já a seguir fica o texto que publiquei na edição de 21 de dezembro do suplemento Q. do DN onde apontava precisamente a Autobiography de Morrissey como o meu livro do ano.

“A minha infância foram ruas sobre ruas sobre ruas sobre ruas”... Começam assim (em tradução livre) as 457 páginas de relato na primeira pessoa de uma das figuras mais importantes da história da música popular e, convenhamos, uma das (auto)biografias musicais mais aguardadas dos últimos anos. Morrissey chamou-lhe muito simplesmente Autobiography (num registo que quase parece tirado do livro de estilo dos títulos de uns Pet Shop Boys). E, tal como em tempos tinha feito questão de editar música por um selo “clássico” da Decca, também desta vez o lançamento chegou com igual identificação com uma herança maior, surgindo o volume como parte da mui notável série Penguin Classics, com capa com design a rigor e tudo.

Ainda sem sinais de eventual edição (traduzida, claro) por estes lados, o livro traz uma expressão daquele jogo de confiança no registo “para o melhor e para o pior”. Sabemos que quem conta sabe o que conta (e como mais ninguém pode contar). Mas, também, que o ponto de vista será sempre “oficial” e eventualmente com as marcas vincadas de posições tomadas em casos de confrontos (uns mais conhecidos, outros nem por isso).

Se as disputas pós-Smiths representam os pedaços de texto menos empolgantes do livro, já as memórias das vivências de descobertas são janelas que nos levam por mergulhos na compreensão de uma figura ímpar na história da música do nosso tempo. Morrissey confessa-nos que “as propriedades mágicas do ruído gravado” o armadilharam a partir de 1965. Com ele andamos por ecos do que recorda de discos de Marianne Faithfull ou Nico, de David Bowie ou dos Roxy Music. O primeiro concerto, ao som dos T-Rex (em 1972). O encantamento pelos New York Dolls. E depois as palavras inspiradoras, de Auden, de Houseman. Há aqueles episódios de mitologia, do concerto dos Sex Pistols em Manchester à “invasão” do escritório de Geoff Travis na Rough Trade, de gravação dos Smiths na mão, de lá saindo com um “sim” e um primeiro single pouco depois.

Muito do que aqui lemos é coisa de ouvir. A música habita os canos das frases, os episódios das suas canções ou das canções dos outros fazendo o tutano de um texto que sabe também ser pessoal (franco mesmo na intimidade) e espaço de reflexão sobre o seu espaço e o seu tempo. E mesmo com (a esperada dose de) recados, Autobiography foi a melhor leitura com música por perto que chegou às páginas de um livro este ano.