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quinta-feira, novembro 19, 2015

Já não é possível ajudar Cavaco a terminar o mandato com dignidade

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Julgo que Carlos Blanco de Morais entenderá como um elogio ser qualificado como alguém que se revê nas posições mais extremas da direita portuguesa. Este constitucionalista, que há pouco tempo justificou deixar de ser consultor de Cavaco Silva por considerar que em Belém se vive «o final de ciclo político», foi convidado a participar no conventículo que juntou os cérebros da direita, anunciado como uma reflexão sobre a revisão da Constituição da República. Esperar-se-ia o pior, atendendo a que o próprio Blanco de Morais nunca se coibiu de apresentar as propostas mais extravagantes.

Neste contexto, é de supor que, na reunião convocada por Passos & Portas, tenham sido submetidas à apreciação dos presentes as propostas mais estrambólicas, a ponto de ter sido entendido conveniente não divulgar as conclusões do evento.

Acontece que Blanco de Morais acabou por levantar a ponta do véu, ao se demarcar da posição que parece ter prevalecido no conventículo: «Desconsidero a viabilidade política dessa opção». A «opção» a que se referiu o constitucionalista é a possibilidade de Cavaco Silva, instado por Passos & Portas, querer dar posse a um «Governo técnico de iniciativa presidencial».

Ou seja: frustrada a possibilidade de um governo de gestão conduzido pelo pantomineiro-mor, excluída a hipótese de um governo de iniciativa presidencial, a direita congeminou uma terceira via: o «Governo técnico de iniciativa presidencial». Presume-se que seria um executivo destinado a aprovar o Orçamento do Estado para 2016 (na esteira do indelével pensamento cavaquista de que «duas pessoas sérias com a mesma informação têm de concordar») e, em seguida, a fazer-se de morto até receber a extrema-unção do futuro presidente da República. Para isso, seria preciso encontrar um factótum que se dispusesse a desempenhar a missão de impedir a nomeação de António Costa.

Ora Cavaco Silva falhou quando tentou dividir a bancada parlamentar do PS. Voltará a falhar se tentar pescar à linha uma figura para dividir a actual maioria na Assembleia da República. É provável, por isso, que acate a decisão do parlamento e desencadeie, no tempo que lhe resta, uma guerrilha constante, a exemplo do que fez com os anteriores governos do PS.

O PSD e «o nosso mais talentoso crítico da democracia»


João Cardoso Rosas faz um bom resumo, num artigo intitulado A crise do PSD, do que a maioria dos portugueses pensa do partido de Passos, Cavaco, Marco António e CIA. LTDA.:
    «O PSD é hoje um partido populista e radical de direita. Tem um discurso antiparlamentar e demagógico. Faz apelo directo, não mediatizado pela representação política, ao povo, como se tivesse a apoiá-lo alguma maioria popular invisível. Procura, através do seu Governo de gestão, exercer poderes que é duvidoso que a Constituição lhe confira. Tenta a todo o custo salvaguardar os negócios dos amigos. Não hesita em fomentar alarmismos a nível nacional e internacional, apenas por tacticismo político.

    A crise do PSD é, portanto, profunda. É uma crise de identidade.»

Mas a parte mais interessante do artigo é aquela em que procura responder a esta questão: «Então por que razão entrou o PSD numa deriva radical?» Eis a sua resposta:
    «Creio que isso aconteceu, contra toda a racionalidade política, por puro farisaísmo ideológico. Aliás, esse farisaísmo não vem directamente de Passos Coelho, mas do grupo que o rodeia e é responsável pelos seus discursos. Se o militante médio do PSD soubesse como pensam e falam em privado essas pessoas ficaria seriamente preocupado. No fundo, esse grupo sempre esteve em torno de Passos Coelho desde o início da anterior legislatura. Mas conseguiu disfarçar a sua incivilidade e ódio à democracia. Agora, com o poder a fugir-lhe das mãos, revela a sua essência.»

Para compreender aonde Cardoso Rosas pretende chegar, é preciso recuar a um outro artigo que escreveu em 2011, no qual tira uma radiografia a Miguel Morgado, assessor político de Passos Coelho durante os últimos quatro anos e que, na hora actual, é vice-presidente do grupo parlamentar do PSD:
    «Um aspecto em aberto é o de saber se o liberalismo anti-igualitário e conservador deste Governo será ou não democrático. Parece-me significativo que Passos Coelho tenha nomeado como seu assessor político alguém que considero ser o nosso mais talentoso crítico da democracia: o meu amigo e ex-aluno Miguel Morgado. Uma das ideias fortes do Miguel é a de que "todos os Governos funcionantes são autoritários" e que, em democracia, não é possível a existência de autoridade. Isso leva-me a pensar que a grande tentação do actual Governo, no seu afã de ser "funcionante", consistirá em invocar uma espécie de estado de emergência - a lembrar Carl Schmitt - devido à ameaça de bancarrota, impondo autoritariamente à sociedade portuguesa uma liberalização radical da economia e das funções sociais do Estado, muito para além do memorando de entendimento e contra o espírito da Constituição. Para isso não será necessário um golpe de Estado no sentido clássico. A invocação da absoluta excepcionalidade do momento será suficiente, desde que os restantes órgãos de soberania, em especial o Presidente, deixem passar a procissão.»

«O nosso mais talentoso crítico da democracia» é uma figura que acompanha Passos Coelho desde que o primeiro-ministro (agora demitido) se alçou a São Bento. Ou talvez antes.