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sexta-feira, novembro 13, 2015

UM ACORDO POLÍTICO TEM DE SER LIDO POLITICAMENTE


• Augusto Santos Silva, UM ACORDO POLÍTICO TEM DE SER LIDO POLITICAMENTE:
    «Os três textos subscritos pelo PS com o BE, o PCP e o PEV constituem um acordo político, cujo objetivo é apoiar a formação de um governo do PS, impedindo a sua rejeição no Parlamento, e assegurar as condições de estabilidade que lhe permitam executar o seu programa, no quadro da presente legislatura.

    Este é o significado político do acordo, o seu único significado político.

    Para chegar aqui, os partidos tiveram de evoluir nas suas posições e procurar chegar a entendimentos uns com os outros. A história e as expectativas dos partidos explicam os diferentes textos a que chegaram e a base comum que deles resulta. O Partido Socialista queria erguer uma plataforma de máximo entendimento: um único texto de acordo e a materialização do compromisso político através de um Governo de coligação. O desenlace das negociações ficou aquém: entendimentos bilaterais, apoio parlamentar sem participação no Governo. Os historiadores terão oportunidade de analisar e explicar as vicissitudes deste caminho concreto de aproximação na esquerda portuguesa.

    Não foi e não é um caminho fácil. Nem é linear. Nem colhe a unanimidade interna em nenhum dos partidos, nem nos respetivos eleitorados. É, portanto, natural que, em particular no PS, se ouçam vozes críticas. Além de natural, é salutar. Já aqui escrevi, e repito, que a tarefa mais imediata do novo Governo tem de ser re-unir os portugueses.

    Nada disto retira, porém, significado ao acordo alcançado, nem altera o seu conteúdo político.

    Em primeiro lugar, o acordo deu sentido à rejeição do programa de Passos Coelho e Paulo Portas, isto é, a recusa da continuação das mesmas políticas dos últimos quatro anos. Esse programa pôde ser rejeitado exatamente porque o Parlamento dispunha de uma alternativa positiva, construtiva, isto é, condições para constituir um outro Governo.

    Em segundo lugar, o acordo exprime um compromisso de que as partes signatárias colhem todas benefícios – o que é um fator quase “sine qua non” para a solidez dos compromissos. Basicamente, BE e PCP podem legitimamente reclamar que é por sua influência que é acelerado o ritmo de reposição dos salários na função pública e são afastadas medidas de reforma do sistema de proteção social, propostas do PS, que lhes mereceram críticas. Do seu lado, o PS fica em condições de aplicar o seu programa, isto é, reorientar a política económica e orçamental no sentido do crescimento e do fortalecimento do tecido social, no respeito pelas regras da União Económica e Monetária.

    O que significa, em terceiro lugar, que o acordo celebrado pelas esquerdas portuguesas só tem uma leitura política possível. BE e PCP comprometem-se a viabilizar um Governo do PS, aplicando o seu programa de Governo, no quadro europeu e internacional a que Portugal pertence.

    Esta é, verdadeiramente, a novidade histórica do acordo. E por isso é tão importante que resulte. Ter a esquerda toda a reconhecer finalmente, por um lado, que o PS se distingue claramente da direita e, por outro lado, que um programa político moderado traz às pessoas os benefícios que o radicalismo ideológico lhes sonegou, é ultrapassar finalmente o nosso Cabo das Tormentas.

    Isto é, poder doravante chamar-lhe Cabo da Boa Esperança

terça-feira, novembro 10, 2015

Caiu com estrondo


A moção de rejeição do PS foi aprovada com 123 votos a favor e 107 contra. O PAN também votou a favor, o que põe em relevo o isolamento da direita radical de Passos & Portas na Assembleia da República.

quinta-feira, outubro 29, 2015

Assis contra Assis

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Para se ser rigoroso, não se pode dizer que o muro que separa o PS do BE e do PCP foi construído apenas pelos partidos que situam à esquerda do PS. Mas, se Francisco Assis não deveria imputar a responsabilidade em exclusivo à «extrema-esquerda», terá bastante razão quando considera: «(…) a extrema-esquerda parlamentar optou deliberadamente – com uma legitimidade, de resto, inatacável – por um acantonamento político impeditivo de qualquer participação não só na esfera estrita da governação, como no horizonte mais vasto de definição das grandes prioridades nacionais. Não foi excluída: auto-excluiu-se (…).»

Há no entanto um dado de que Francisco Assis se esquece: a devastação levada a cabo pela direita radical durante estes quatro anos provocou mudanças em todo o espectro político. Havendo neste contexto a possibilidade de construir uma plataforma de convergência que barre o caminho à direita radical, deveria o PS recusá-la?

Talvez a evolução do PCP tenha demorado mais tempo a ocorrer do que Francisco Assis previa em 1999 (cf. imagem supra), quando, na sequência de um discurso de Carlos Carvalhos, admitiu tratar-se de «um passo muito importante para uma efectiva alteração no plano doutrinário, que permite augurar uma importante evolução do PCP». O então líder parlamentar do PS antecipava que essa evolução poderia permitir uma aliança à esquerda: «Pode ser mais fácil, no futuro, conceber soluções de governação que passem pelo PCP

Já em 2011, quando disputou a liderança do PS com António José Seguro, Francisco Assis fez questão de alimentar esta possibilidade. A pretexto das eleições autárquicas, colocou como objectivo «a realização de coligações onde elas são essenciais para a derrota da direita», frisando que a estratégia não se esgotaria no dia das eleições. Seria um primeiro passo para «iniciar um diálogo construtivo à esquerda com o PCP e o BE», a fim de «superar a dificuldade histórica de relacionamento que prejudica as opções dos eleitores de esquerda».

Ora, no exacto momento em que parece estar a superar-se «a dificuldade histórica de relacionamento que prejudica as opções dos eleitores de esquerda», Francisco Assis pretende fazer marcha-atrás, repelindo o que vem defendendo desde o século passado, quando as condições eram mais adversas?

quinta-feira, outubro 15, 2015

Da série "Frases que impõem respeito" [949]


O Presidente terá de dar posse a uma maioria de esquerda senão seria um golpe de Estado.
      Eduardo Paz Ferreira, presidente do Instituto do Direito Económico Financeiro e Fiscal, numa alusão à possibilidade de haver entendimento entre PS, BE e PCP

Bagão: da excitação eufórica de 2011 ao estado depressivo de 2015

Jornal i, em 5.3.2011 (via João)

• Bagão Félix, em 2011 (a procurar uma solução no quadro parlamentar saído das eleições de 2009 para a substituição do Governo de Sócrates):
    - Há uma solução que é um governo PSD, CDS, PCP. Uma ideia "provocative". Não estou a dizer que pode vir a acontecer, mas nós precisamos de abanar a cabeça senão morremos atrofiados. É quase impossível chegar a acordo com o PCP, mas, se alguma vez se chegar a acordo, este será cumprido. O PCP é muito respeitador, institucionalista. Não é a fantasia do Bloco de Esquerda.

    - Como conciliaria tudo no mesmo governo?

    - É praticamente impossível. Mas, por exemplo, um governo PSD/CDS tem muita dificuldade na rua, enquanto o PS tem menos agressividade. Precisamos nesta fase histórica, em dois, três anos, de uma situação de "salvação", de um compromisso que rompa com esta coisa absolutamente bloqueante do bloco central e que ponha o BE na sua prateleirinha. É preciso encontrar novas formas. Não me repugnava que, num governo deste tipo, o PCP tivesse uma pasta social ou do trabalho. Jerónimo de Sousa é um homem sincero, um homem autêntico, um político sério. A certa altura sinto-me asfixiado pelas soluções equacionáveis. Precisamos de abrir o horizonte teórico das soluções. Sendo absolutamente não comunista, respeito o actual PCP e não o ponho no gueto. O BE, pelo contrário, é uma espécie de lógica aparentemente moral de quem depois nunca quer assumir responsabilidades.

• Bagão Félix, em 2015 (ontem à SIC-N):
    Trata-se de «de uma OPA sobre a vontade dos eleitores que votaram PS».

quinta-feira, outubro 08, 2015

«De onde é que pensam que vêm os votos no Bloco de Esquerda?»


Pacheco Pereira na Sábado:
    «(…) 3. Contrariamente ao que hoje se repete de forma arrogante, não é verdade que toda a gente assumisse como favas contadas a derrota da coligação. No último programa da Quadratura com António Costa, foi exactamente isto que lhe disse. No prefácio para o livro de Bernardo Ferrão e Cristina Figueiredo sobre Costa escrevi o seguinte, que reafirmo de novo como interpretação do que correu mal com o PS: "Daqui a poucas semanas, António Costa enfrenta o seu destino manifesto e não pode falhar. (...) O País precisa de gente zangada, indignada, furiosa com o estado em que Portugal está, com as malfeitorias que têm sido feitas aos portugueses, com o cinismo face aos desempregados, aos reformados, aos pensionistas, com a linguagem de divisão dos portugueses entre novos e velhos, com os velhos a 'roubarem' aos novos o seu futuro, com a apologia da lei da selva no trabalho, com o desprezo colateral e assistencial pela pobreza. São causas maiores e estes portugueses estão sozinhos e correm o risco de ficarem invisíveis. É com eles que se pode ganhar eleições a sério e, mais ainda, mudar o que é preciso. Se Costa passar ao seu lado, passa ao lado do destino que deseja."

    4. Foi o que aconteceu: Costa dirigiu a campanha do PS para um "centro" que não existe, e que é hoje um mito da análise, e que, se existisse, preferia o original, a PAF, à imitação, o PS. A coligação PAF não é do centro-direita, mas da direita, e o PS propôs no seu "programa dos economistas" uma variante do programa de "ajustamento". Contrariamente ao argumento ad terrorem da coligação, o PS fez uma campanha à direita e perdeu exactamente por isso. Ou de onde é que pensam que vêm os votos no Bloco de Esquerda? (…)»

terça-feira, outubro 06, 2015

A austeridade ganhou ou perdeu as legislativas?
E vai ganhar ou perder as presidenciais?

• Paulo Pedroso, A austeridade ganhou ou perdeu as legislativas? E vai ganhar ou perder as presidenciais?:
    «Há duas perguntas incómodas mas a meu ver decisivas na interpretação dos resultados eleitorais de domingo e na escolha dos caminhos políticos nos meses que aí vêm. A austeridade ganhou ou perdeu as eleições? Se perdeu, há capacidade política e apoio popular suficientes para lhe gerar alternativas políticas nesta legislatura? Se a austeridade tiver perdido, como acho que perdeu, a prioridade principal é a da construção de alternativa consistente e com apoio popular à essa austeridade, o que o "quadro macroeconómico" do PS manifestamente não conseguiu e implicaria muito trabalho político, com espíritos abertos em toda a esquerda, que está por fazer. Se as esquerdas escolherem o caminho da construção de alternativas, o modo como se relacionam com as candidaturas presidenciais é uma grande prioridade imediata. Vai Portugal eleger um Presidente da República solidamente comprometido com as alternativas à austeridade ou vai escolher um Presidente que referende o caminho actual? O empenhamento das esquerdas nas presidenciais e a capacidade política para gerir o caminho que escolherem vai determinar se o pêndulo está ainda a balançar contra o PSD+CDS ou se está já de regresso ao crescimento da direita.»

segunda-feira, setembro 28, 2015

Como tornar útil o voto inútil

Distribuição de deputados de acordo com o barómetro da Eurosondagem
(in última edição do Expresso)

António Costa apresenta-se às eleições com um programa que se pode sintetizar em poucas palavras: fazer crescer a economia para estimular o emprego e proteger o Estado Social, designadamente impedindo a concretização do corte nas pensões. Mas António Costa faz questão de assumir que tem um plano B: ao mesmo tempo que se dispõe a procurar cumprir as regras em vigor na zona euro, o PS empenhar-se-á para modificar essas mesmas regras.

Neste quadro, eu não quereria estar na pele daqueles eleitores que, tendo vontade de apear o governo de Passos & Portas, se mostram indecisos em entregar o seu voto ao PS, único partido que está em condições de afastar do poder a direita mais radical desde o 25 de Abril.

No entanto, na maioria dos distritos e das regiões autónomas, os eleitores debatem-se com um problema que ultrapassa a questão do voto útil. Com efeito, relembrando o passado e observando as previsões disponíveis, há muitos círculos eleitorais em que os partidos de esquerda, salvo o PS, não têm elegido nem têm qualquer possibilidade de vir a eleger deputados: nestes casos, os votos no PCP, no BE, no Livre, etc. são votos desperdiçados, porque não concorrem para a eleição de deputados destes partidos de esquerda e retiram ao PS a hipótese de eleger mais deputados, que assim vão direitinhos para a coligação de direita.

De Bragança a Portalegre, passando pelas regiões autónomas e pela emigração, são muitos os círculos em que os votos nos pequenos partidos se convertem em votos inúteis (para a esquerda). Havendo tantos apelos à aproximação entre os partidos da esquerda, não seria o momento certo para que esses pequenos partidos, designadamente o BE e o Livre, convidassem os seus eleitores nos distritos em que não têm hipótese de eleger deputados a concentrar os votos no PS para barrar o caminho à direita?

Ao assumirem um tal postura, os pequenos partidos dariam um sinal inequívoco de que haveria uma vontade genuína de convergência. E seria a única forma de transformar um voto inútil num voto útil.

«Por cá, foi o PS que governou desde 2011?»

    «(…) alguém que não conhecesse o país suporia que foi o PS que esteve no Governo nos últimos quatro anos. Da direita à esquerda só se discute o PS, o programa do PS, as promessas do PS, os cortes na segurança social do PS, o acordo da troika que o PS assinou, o plano secreto que o PS tem para se aliar à CDU e ao BE para não deixar o centro-direita governar. A coligação Portugal à Frente acusa o PS de criar instabilidade e insegurança, a CDU e o BE acusam o PS de subscrever as políticas da direita.

    E ninguém debate os últimos quatro anos, os 485 mil emigrantes que vão de engenheiros, economistas e médicos a investigadores, enfermeiros e bombeiros, os cortes nos salários da Função Pública e nas pensões dos reformados, a desmotivação completa dos funcionários públicos, o desemprego, o emprego que está a ser criado (90% é precário), os 50% de portugueses que ganham menos de 8000 euros por ano, o facto de estarmos a trabalhar mais 200 horas por ano e a ganhar em média menos 300 euros, o descalabro na educação (com o silêncio ensurdecedor de Mário Nogueira e da FESAP, ao contrário do que aconteceu quando Maria de Lurdes Rodrigues era ministra da Educação), a miséria que se vive no Serviço Nacional de Saúde (onde muitos profissionais são obrigados a comprar luvas ou a fazer garrotes com material improvisado), os medicamentos que faltam nas farmácias e só estão disponíveis daí a dois dias, a machadada que levou a ciência e investigação, os problemas que se continuam a verificar na justiça, a inexistência de respostas ao envelhecimento da população (em 2014 já havia mais de 4000 pessoas acima dos 100 anos em Portugal e há 595 mil portugueses com mais de 80 anos), a irrelevância do ministro dos Negócios Estrangeiros, a fragilidade da ministra da Administração Interna, as múltiplas garantias de Passos Coelho que foram sempre desmentidas por decisões do próprio Passos Coelho, o programa da coligação que não se discute porque não existe, etc, etc. (…)»

sábado, setembro 26, 2015

sábado, setembro 19, 2015

Quem foi que não pediu a troika?

• Miguel Sousa Tavares, Quem foi que não pediu a troika? [hoje no Expresso]:
    «1. (…) Porém, o segundo Governo Sócrates apanhou em cheio com as consequências da crise das dívidas soberanas, desencadeada pelo estouro da economia de casino fomentada nos Estados Unidos. Foi Sócrates quem ouviu então, da boca de Merkel, que os tempos não estavam para cortes, mas sim para políticas de expansão que evitassem uma crise global, como a de 29. E foi ele que, logo a seguir, ouviu a orientação oposta: cortar, cortar, cortar, só o controlo do défice público interessava. Durante esses anos de inconsciência final, não me lembro de ter ouvido alguém - partidos, empresários, banqueiros, gente da cultura, das FA - que pregasse consistentemente o corte da despesa do Estado. Pelo contrário: se os governos de Sócrates fizeram auto-estradas e criaram uma imensa massa salarial no Estado, os governos de Cavaco haviam feito bem pior; se o Governo Sócrates sonhou com uma linha de TGV assumidamente condenada ao prejuízo, o Governo de Durão Barroso chegou a projectar seis (!). Alguém se lembra de ter ouvido o país ou os seus representantes pedirem menos hospitais, menos estradas, menos gastos com medicamentos, menos autarquias, menos institutos públicos? Julgo que todos nos lembramos do que aconteceu no estertor final do segundo Governo Sócrates. Ele tinha vindo de Bruxelas e de Berlim com o apoio da UE e de Merkel ao PEC 4. Ninguém pode saber se mais um PEC teria sido suficiente para evitar o pedido de assistência e a vinda da troika, como sucedeu em Espanha. Mas, no imediato, que o teria evitado, isso é incontestável. Mas o PEC 4 foi chumbado no Parlamento por uma coligação contranatura entre a direita e a extrema esquerda. O PSD votou contra porque sabia que isso significava a queda do Governo e a possibilidade de voltar ao poder - o que de há muito constitui o único substracto ideológico do partido; o CDS votou contra porque Portas sentiu que tinha uma oportunidade rara de, através de eleições, arrumar com o fantasma do "partido do táxi" por alguns anos; o PCP votou contra e aliado à direita, porque, vivendo ainda em 1917, tem como principal inimigo qualquer governo do PS e como principal pesadelo o sucesso de um governo PS; e o BE votou contra porque Louçã não teve coragem nem liberdade para se abster. Derrotado o PEC 4 e derrubado o Governo, a situação financeira entrou, como era de prever, em descontrolo acelerado. Mesmo assim, José Sócrates ainda quis resistir e não se cansou de avisar o que significaria a vinda da troika. Mas, finalmente, já não havia nada a fazer: era chamar a troika ou cessar pagamentos.

    Basta ler os jornais de então para relembrar uma quase unanimidade nacional no apelo à troika - com excepção, é claro, do PCP e do BE, que, por direito divino, estão sempre dispensados de terem alternativas sérias para apagar os incêndios que ateiam. Foi isto que aconteceu há quatro anos e meio. A discussão sobre os factos históricos então ocorridos só pode ser feita num quadro de desonestidade intelectual chocante. Concedo que a actual maioria foi exímia em distorcer os factos e apagar memórias ao longo destes anos, até chegar ao ponto em que Passos Coelho é capaz de exclamar, com um ar ofendido, que dizer que o PSD também chamou a troika é uma grosseira mentira. Mas, chamou sim, chamaram- -na todos. Chamaram-na todos os partidos e, de certa forma, todos nós. Pelo menos, todos os que nunca cessaram de exigir mais e mais dos dinheiros públicos, sem quererem saber quem e como pagará a factura. Nem é tanto a tão criticada afirmação de que vivemos acima das nossas possibilidades. Não sei se vivemos ou não, cada um sabe de si e das suas dívidas. Mas sei que o Estado vive acima das nossas possibilidades. E é essa verdade que ninguém quer enfrentar.

    (…)

    3. (…) Ora, falemos claro: o "caso Sócrates" não tem que ver com a culpabilidade ou inocência dele, que é coisa que, pelo menos para mim, só se apurará em tribunal, produzida a prova e a contraprova. O "caso Sócrates", no que tem de importante, não é, por enquanto, a questão de fundo, mas a questão instrumental: pode alguém ser preso com as televisões a filmar em directo, pode ficar preso com requintes de humilhação, como a história das botas ou do cachecol do Benfica, pode ficar preso nove meses sem acusação, enquanto todos os dias é publicamente linchado num julgamento popular feito nos jornais, através de uma indecente e descarada violação do segredo de Justiça e da banal presunção de inocência? O "caso Sócrates" é isto, e isto merece ser discutido, em quaisquer circunstâncias, aproveite a quem aproveitar, prejudique quem prejudicar. Escudado na hipócrita frase de "à justiça o que é da justiça", o PS não apenas abandonou Sócrates à sua sorte, como finge não ver aquilo que é essencial: a questão de saber se para a Justiça vale tudo e qualquer método é aceitável, desde que escudado no julgamento popular - que é a forma como a investigação dos chamados "processos mediáticos" tantas vezes supera a sua incompetência investigatória. Que o PS queira que o homem fique muito caladinho para não prejudicar a campanha em curso, é entre eles e ele. Que queiram que todos os outros fiquem também muito caladinhos, ao serviço dos interesses circunstanciais do partido, é pedir de mais e sem vergonha.»

sexta-feira, maio 29, 2015

A verdade contra cinco mentiras


• Augusto Santos Silva, A verdade contra cinco mentiras:
    «Qualquer observador/a minimamente atento/a já percebeu que a campanha da direita se vai basear no lançamento de falsidades sobre as propostas do PS e na criação de um clima de medo entre as pessoas. Deixo aqui um pequeno contributo para a desmontagem de tais falsidades. Indicarei cinco argumentos repetidos até à exaustão contra o PS e António Costa, que têm em comum faltarem à verdade dos factos.

    Primeiro argumento: o PS não pode voltar ao Governo porque o PS é o responsável pela troica e o programa de ajustamento.

    Falso: quem obrigou o país a recorrer ao resgate foi a coligação negativa de todas as forças políticas então na Oposição que chumbaram em março de 2011, no Parlamento, a alternativa que o Governo do PS tinha negociado com a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu. Essas forças chamam-se: PSD, CDS, PCP e BE. Foram elas que chamaram a troica.

    Segundo argumento: o Governo Passos Coelho-Paulo Portas fez o que fez, porque tinha de cumprir o Memorando de Entendimento assinado pelo Governo anterior com a troica; não havia alternativa à política que foi seguida.

    Falso: havia desde logo a alternativa de cumprir esse mesmo Memorando! O Memorando não previa nem obrigava a cortes adicionais de salários e pensões, nem ao aumento do IRS, nem à subida do IVA para a restauração. Foi o Governo PSD-CDS que forçou esses cortes, “indo além da troica”. Por outro lado, o Memorando previa medidas que o Governo da direita se recusou a cumprir: por exemplo, intensificar a criação das Unidades de Saúde Familiar e implementar o Mapa Judiciário aprovado pelo PS.

    Terceiro argumento: o programa de ajustamento foi duro (a terapêutica causou dor), mas produziu resultados (o “doente” ficou melhor).

    Falso: Portugal ficou pior. Ficou pior a dívida pública, que subiu em mais de um terço, em relação ao PIB. Ficou pior a economia, que caiu mais de 5%. Ficou pior o emprego, tendo-se perdido mais de 400 mil postos de trabalho. Ficou pior o desemprego, cuja taxa subiu até aos 14%. Ficou pior a pobreza, designadamente entre as crianças e os jovens. Ficaram pior as desigualdades, tendo aumentado o fosso entre os rendimentos dos mais ricos e os dos mais pobres. Ficou pior a proteção social aos mais desfavorecidos. Ficou pior o rendimento disponível para as famílias. Ficaram piores os cuidados de saúde. O investimento recuou 30 anos e a emigração voltou aos níveis da década de 60.

    Quarto argumento, que é variante do terceiro face à demonstração da sua falsidade: a sociedade perdeu, mas houve elementos económico-financeiros que melhoraram por responsabilidade do Governo.

    Falso: os elementos que melhoraram, no plano financeiro, foram o valor dos juros e a acessibilidade aos mercados de dívida pública. Eles resultam da nova política do BCE, exatamente aquela contra a qual se pronunciou Passos Coelho. No plano económico, nenhum dos fatores do, aliás tímido, crescimento de 2014 e 2015, se deve ao Governo: no plano externo, o crescimento da Zona Euro, a desvalorização do euro e a descida do preço do petróleo; no plano interno, a minoração dos cortes nos salários e pensões imposta pelo Tribunal Constitucional.

    Quinto e último argumento: o Governo vincula-se à política de austeridade, mas ao menos tem as contas feitas; ao passo que o PS quer deitar para trás a austeridade mas não apresenta os custos das medidas que propõe.

    Falso: é exatamente ao contrário. Os compromissos do PS estão quantificados e o Cenário Macroeconómico que serve de referência ao seu Programa de Governo mostra precisamente como se enquadram na evolução financeira e orçamental antecipada para 2015-2019. Quem se comprometeu com 600 milhões de cortes nas pensões e não quer dizer como é que tencionaria obtê-los é o Governo!

    Caras e caros leitores: só há uma maneira de derrotar a mentira: é desmascará-la com a verdade dos factos.»

quarta-feira, maio 13, 2015

O BE e o complemento salarial


Via Rui Pedro Nascimento

Há esperança de que o BE (cf. artigo de Porfírio Silva) apoie o complemento salarial, uma das medidas que constam do documento dos 12 economistas – Uma década para Portugal.

Por um debate decente à esquerda

Hoje no Público (via Nuno Oliveira)
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quinta-feira, maio 07, 2015

Eu ainda sou do tempo em que o Bloco de Esquerda
propunha a descida da TSU dos patrões (e só essa)

Num das últimas emissões do programa que tem na SIC Notícias, Francisco Louçã criticou a redução da TSU que consta do documento dos 12 economistas. Louçã fez uma breve alusão à descida da TSU para os trabalhadores e centrou-se na proposta de redução da TSU dos empregadores, colando-a à abortada intenção da direita de proceder, também no âmbito da segurança social, a uma transferência brutal dos rendimentos do trabalho para o capital.

Muito embora Louçã tenha recorrido aqui ou ali a uma argumentação demagógica e pouca rigorosa, contendo até omissões e distorções, pretendo apenas sublinhar dois aspectos:

1. A proposta dos 12 economistas não tem nada a ver com aquilo que o Governo quis impor em 2012. Nessa altura, Passos Coelho, antes de ir alegremente ouvir cantar ‘Nini dos Meus 15 Anos’, fez uma declaração ao país para anunciar que o Governo decidira reduzir a contribuição patronal para a segurança social, que teria como consequência que o alívio nos bolsos dos empregadores seria suportado pelos trabalhadores, com o agravamento dos seus descontos para a segurança social.

Nada disto está em causa no estudo dos 12 economistas. Com efeito, é proposta, por um lado, uma redução dos descontos dos trabalhadores para a segurança social para aumentar o seu poder compra, o que não deixará de estimular a actividade económica. Por outro lado, admite-se uma diminuição da contribuição patronal, mas apenas para os casos em que haja contrato de trabalho definitivo.

Acresce que, para compensar a perda de receitas, o documento dos 12 economistas sugere a criação de fontes alternativas de financiamento da segurança social: o IRC social, o imposto sobre as heranças de valor superior a um milhão de euros e uma taxa que penalize as empresas que recorram uma rotação excessiva de contratados a prazo.

2. A posição assumida por Francisco Louçã surpreendeu-me, porque, se a memória não me atraiçoa, ele defendeu uma medida semelhante por alturas de umas eleições presidenciais. Acresce que Louçã não apenas distorceu a proposta dos 12 economistas como também omitiu que o próprio Bloco de Esquerda apresentou, há alguns anos, dois projectos de lei que visavam a redução da TSU do patronato, os quais, de resto, eram menos ambiciosos do que o que está em discussão agora e esses projectos assentavam em premissas, essas sim, frágeis.

Com efeito, o BE apresentou, em 10 de Março de 2006, um projecto de lei (o n.º 227/X) de alterações à Lei de Bases da Segurança Social, subscrito por Mariana Aiveca, Luís Fazenda, Fernando Rosas, João Semedo, Ana Drago, Helena Pinto e Alda Macedo, o qual visava a redução da TSU do patronato em 3,5%:

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Mais tarde, em Novembro do mesmo ano, o BE apresentou um novo projecto de lei (o n.º 322/X), elaborado por Mariana Aiveca, Alda Macedo, Fernando Rosas e Luís Fazenda, no qual propôs que a redução da TSU do patronato fosse de 3%. Veja-se uma passagem da intervenção da deputada Mariana Aiveca na Assembleia da República:


Ou este vídeo da intervenção de Mariana Aiveca em defesa da redução da TSU patronal:



A infografia que abaixo se transcreve compara a proposta do PS com o primeiro projecto de lei do BE. Repare-se que não só as fontes alternativas de financiamento propostas pelo PS são mais consistentes como a redução da TSU patronal só é admitida para os trabalhadores com vínculo definitivo às empresas, ao contrário do que pretendia o BE:


O documento dos 12 economistas — Uma Década para Portugal — contém um conjunto articulado de propostas para promover o crescimento económico e o emprego, rompendo com a estagnação económica provocada pela política de «ir além da troika» do Governo de Passos & Portas. Como é bom de ver, há o propósito, relativamente à TSU, de aumentar o poder de compra dos portugueses, em particular dos mais pobres, procurando assim estimular a actividade económica. Isto distancia-se do argumento da direita de que a redução da TSU dá incentivos a contratar e, assim, a aumentar o emprego. Curiosamente, é o argumento a que o BE se agarra nos seus projectos de lei.

quarta-feira, abril 22, 2015

Variações sobre o pensamento único

    «Pena que Mariana Mortágua tenha caído na armadilha da Direita.

    Segundo a Lusa, a deputada do BE Mariana Mortágua classificou hoje o cenário macroeconómico do PS de "irrealista", nestes termos: "Parece-nos irrealista, do ponto de vista do PS, apresentar um cenário em que diz acabar com a austeridade e, ao mesmo tempo, cumpre à letra e à risca as determinações de austeridade da União Europeia (UE). Nós acabamos com a austeridade, mas conseguimos ter saldos orçamentais positivos e reduzir a dívida na proporção que a UE nos exige. Isto, em si, é a quadratura do círculo e é o que torna este documento irrealista", afirmou a deputada na Assembleia da República.

    Tenho imensa pena que a Mariana Mortágua, que não conheço pessoalmente mas da qual tenho a melhor impressão, tenha caído na armadilha da Direita. A tese da Direita sempre foi: se querem Europa, têm de engolir o empobrecimento. Infelizmente, a Mariana Mortágua não encontrou melhor maneira de tentar reagir ao Relatório dos Economistas ao PS do que fazer coro com a Direita, fazer coro com a tese central do "pensamento único": ou se submetem ou saem da UE (ou, pelo menos, do euro).

    Pois, o PS não engole o pensamento único. Vamos ficar na Europa e vamos acabar com a austeridade e o empobrecimento. E faço um apelo à Esquerda para que encontre uma linha de debate que não ressuscite a coligação negativa, com a esquerda da esquerda a fazer o mesmo discurso da Direita.»